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domingo, 7 de novembro de 2010

O Direito à indignação é uma norma Moral

A informação da imagem é apenas simbólica
A palavra moral vem do vocábulo latino "mores" e significa costume. Foram as primeiras normas que os romanos conheceram, chamadas "mores maiorum" ou os costumes dos antepassados. Também distinguiram o ius (direito humano) do fas (direito divino), mas não estavam totalmente diferenciados, já que o fas outorgava o conteúdo ius.
Como vemos, todo o sistema normativo, tende a criar regras de conduta para que a sociedade funcione harmonicamente. É que as regras de conduta foram criadas para isso, para que o homem consiga atingir os seus objectivos particulares, tendo em conta o fim social dos seus actos, ou pelo menos sem prejudicar os outros.
Desde que a criança nasce vai-se-lhe ensinando certos comportamentos como bons ou maus, valiosas ou sem valor, e assim as vai interiorizando, comparando-as com o que observa. Se o seu pai é um trabalhador, responsável, sem por isso deixar de se preocupar com o seu filho, a criança vai aprender mais em vê-lo do que a ouvi-lo, que ser trabalhador e responsável é bom, e essa norma se incorporará na sua consciência moral. Se alguém lhe diz "hoje não vás à escola", seguramente a sua consciência se encarregará de lhe dizer: "Vai à escola, pois é errado não assistir às aulas. O teu pai vai sempre para o trabalho, e ensinou-te que é errado não cumprir os teus deveres."
Quem recebe uma educação  teórica e prática valiosa, aprenderá normas morais, que se instalarão na sua consciência, mesmo sem se aperceber, e vão dizer-lhe "não furtarás”, “não matarás," “não discriminarás”, etc, mas pode acontecer, que por influências estranhas ao núcleo familiar, ou por má formação ética dos seus próprios progenitores, ou por patologias individuais, o ser humano não consegue configurar uma adequada conduta moral e viola as normas que a maioria das pessoas consideram eticamente correctas. Em alguns casos, a sua consciência reprová-lo-á, pois pode discernir entre o bem e o mal, em outros casos, não.
A religião desempenha um papel semelhante na formação da consciência, pois a consciência religiosa interage com a moral. Se dizemos a uma pessoa que roubar é errado, mas se acrescentamos que se roubamos Deus nos castigará, adicionamos às normas morais um novo ingrediente, o medo ou a obediência a um Ser Supremo.
Mas, apesar de tudo, pode ocorrer que o homem não escute nem as chamadas da sua consciência, nem os da sua religião e viole essas normas, pondo em perigo a sociedade, e é aí onde intervém o direito, que evidentemente se nutre dessas normas morais e religiosas, pois o legislador que cria as normas jurídicas é um ser humano com consciência moral, e em alguns casos religiosa. Essas normas jurídicas que integram o direito são de aplicação obrigatória: não há escolha, temos que acatá-las, quer queiramos quer não, caso contrário, seremos multados, desqualificados ou iremos para a prisão.
Geralmente, moral e direito coincidem. Assim, a moral diz-nos que não devemos matar ou roubar, e o Código Penal, sanciona com pena de prisão que mata ou rouba. Por esse motivo, é comum que as pessoas não conheçam o Código Penal, e ainda assim não o violam, porque agem de acordo com sua consciência bem formada (geralmente não se mata, ou não se rouba, não por não ir para a cadeia, mas porque se sente que é errado, e são condutas eticamente reprováveis), mas em outros casos, como a moral não é única e pode variar de um indivíduo para outro, surgem dilemas. Os casos que apresentamos são indiscutíveis, ninguém pode acreditar que matar, ou roubar não deveriam ser condutas puníveis, mas outra coisa acontece se nos metemos a legislar sobre o aborto ou o consumo de drogas, ou o divórcio. Há consciências formadas por influência de estritas regras religiosas, que rejeitam a despenalização de tais figuras como delituosas.
A moral evolui, pois como o diz a sua etimologia, é composta por costumes. Por exemplo, a aceitação do divórcio, na maioria dos códigos actuais foi um processo lento de evolução moral, que esteve na mão do avanço do liberalismo.
Quando uma lei é injusta ou imoral, indiscutivelmente, surge a discussão sobre se deve ou não ser obedecida. A escola de Direito Positivo, argumenta que uma lei é lei, independentemente do seu conteúdo moral, enquanto não revogada, pois se criaria grande insegurança jurídica, se as pessoas pudessem questionar e não cumprir os mandatos do legislador. A escola de Direito Natural diz que uma lei injusta não é lei, e que este Direito Natural está inscrito no coração humano.
Em conclusão, defendemos que o direito não pode entrar em conflito com a moral, mas adaptar-se a ela, e que uma norma imoral deve ser questionada e lutar-se pela sua revogação, mas, entretanto, cumprir-se, sempre e quando não agrave princípios éticos fundamentais, como o direito à vida, à dignidade, ou à liberdade. Nestes casos, impõe-se o dever moral sobre o dever jurídico. Por exemplo, se nos obrigam a ir para o trabalho com fato e gravata, mesmo nos dias de calor sufocante, podemos pedir ou mesmo exigir, a alteração do regulamento correspondente, e entretanto, obedecer. Outra coisa acontece quando há valores transcendentes em jogo. Nas ditaduras militares ditaram-se normas que forçavam os militares subordinados a cumprir ordens totalmente imorais, como matar, sequestrar crianças, torturar. Essas normas não têm justificação alguma de obediência.
Hilda Fingermann, Advogada, Professora de Ciências Jurídicas e Sociais (Direito Romano, História, Geografia e Direitos Humanos).

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