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sábado, 5 de janeiro de 2013

A legitimidade, a legalidade, a infelicidade, a realidade.

A propósito da "linguagem da justiça" e da obscuridade que deliberadamente cultivava no passado, como se fosse um atributo indispensável à afirmação de uma autoridade indiscutível, dizia aqui, na passada sexta-feira, que os "tribunais foram inventados para decidir conflitos que, de outra forma, permaneceriam para sempre irresolúveis".
Pedro Bacelar de Vasconcelos
É uma redundância que enuncia o absurdo da promessa de decisão de algo indecidível mas que exprime a natureza singular de um poder que Montesquieu, no "Espírito das Leis", definiu como sendo "de certa forma, nulo": - "(...) os juízes da nação (...) não passam de seres inanimados que não podem moderar nem a força nem o rigor (das leis)".
Porque se o "poder de julgar" não permanecer separado do poder legislativo e do poder executivo, transforma-se numa força arbitrária e opressora. É este o sentido mais perene e universal do princípio da separação dos poderes que, em nome da liberdade, garante nas democracias constitucionais do nosso tempo que o poder de julgar os conflitos legais nunca se confunda com a autoridade política de quem governa e legisla.
A polémica suscitada pela imposição de sacrifícios suplementares aos funcionários públicos e reformados, com a suspensão dos subsídios prevista nos orçamentos de 2012 e de 2013, parece contemplar um tipo de conflito adequado ao poder judicial: alega-se a violação do princípio da igualdade, garantido pela Lei Fundamental, porventura, também relevante na apreciação dos efeitos da nova graduação dos escalões do IRS. E deve ponderar-se ainda a eventual violação do princípio da segurança jurídica e da proteção da confiança, igualmente previstos na Constituição, perante a alteração unilateral, por força da lei do orçamento, da contraprestação a que o Estado ficou obrigado, desde a conclusão legal da carreira contributiva dos respetivos beneficiários, matéria que o Tribunal Constitucional nunca apreciou até hoje embora numerosos processos estejam em curso nos tribunais comuns.
Não parece portanto que haja qualquer motivo para censurar a iniciativa do Presidente da República - anunciada na mensagem de Ano Novo - de submeter a apreciação da validade constitucional daquelas normas da lei do orçamento ao poder judicial, sendo certo que o Presidente está expressamente vinculado a "cumprir e fazer cumprir" a Constituição. Porém, na mesma ocasião, o Presidente comunica que promulgou a lei do Orçamento, apesar de "fundadas dúvidas" quanto à constitucionalidade das referidas normas, "porque se tal não acontecesse, o país ficaria privado do mais importante instrumento de política económica de que dispõe" e "as consequências no plano externo seriam extremamente negativas". Os juízos de oportunidade e a antecipação das consequências de decisões próprias são considerações de índole substancialmente política e perfeitamente adequadas ao perfil das atribuições constitucionais do Presidente da República. Mas levantam-se aqui dois problemas delicados.
Em primeiro lugar, a prioridade reconhecida à conveniência da entrada em vigor do Orçamento do Estado no primeiro dia do ano - ainda que se trate do "mais importante instrumento de política económica" e sendo previsíveis consequências externas negativas - com prejuízo da obrigação de defesa da ordem democrática e dos direitos humanos que a Lei Fundamental especialmente lhe confia. Em segundo lugar, as apreensões suscitadas por esta transferência para o poder judicial de uma responsabilidade de que se abdica com fundamento em considerações de natureza exclusivamente política que o Presidente pode, de facto, invocar mas que estão vedadas aos juízes na apreciação material da constitucionalidade das normas. A "batata quente" passou assim para as mãos dos juízes do Tribunal Constitucional. Estes procedimentos criam um grave risco de perversão do sentido da responsabilidade política, da lógica da legitimação democrática e do princípio da separação dos poderes, somando a judicialização da política à omnipotência da troika e à transcendência da "vontade dos mercados" que um outro órgão de soberania, o Governo, incessantemente proclama.
A diretora-geral do FMI, Christine Lagarde lamenta as situações de desemprego, os elevados custos de financiamento das empresas e a dificuldade em reduzir as rendas excessivas em setores não transacionáveis.
“O facto de não termos previsto a inconstitucionalidade de algumas medidas propostas no ano passado foi uma infelicidade”, diz, referindo-se ao chumbo dos cortes dos subsídios de férias e de Natal que o Governo introduziu em 2012 para a função pública mas que foram rejeitados pelo Tribunal Constitucional.
No entanto, deixa também elogios: “A maior surpresa foi a determinação colectiva do país na recuperação, incluindo membros da coligação, sindicatos e a opinião pública. Nem toda a gente está contente, muitas pessoas estão frustradas, estão a fazer enormes sacrifícios e perderam os seus empregos. Mas há um sentimento colectivo de que existe uma saída e que tem de ser feita conjuntamente.”
Num artigo de opinião, Mota Amaral, deputado do PSD e antigo presidente do Parlamento diz que "a situação geral do País, em vez de melhorar, como o Governo promete e todos desejaríamos, tem vindo a degradar-se" e escreve: "Basta ter os olhos abertos para comprovar o alastramento de uma verdadeira catástrofe". O antigo presidente do parlamento conclui: "O Governo tem vindo a ficar isolado (...) perante a crítica generalizada da opinião pública e a crescente indignação dos cidadãos". O deputado do PSD garante ainda que avisou o Governo para algumas opções que considera erradas e dá um exemplo: "Parece-me ter sido um erro a voluntariosa opção por ir além da Troika". Mota Amaral diz que nunca foi ouvido.

Ecos da blogosfera – 5 jan.

Porque EUA e UE não são honestos com os eleitores?

"Os Estados Unidos tornam-se europeus", ironiza o semanário The Economist, num artigo ilustrado com uma imagem que apresenta o Presidente norte-americano, Barack Obama, e o líder republicano da Câmara dos Representantes, John Boehner, vestidos como um francês e um alemão, respetivamente. "Nos últimos 3 anos, os dirigentes dos Estados Unidos têm olhado para a gestão europeia da crise do euro com mal disfarçado desdém", observa o semanário britânico, que compara o acordo norte-americano, negociado ao longo de 11 horas, para escapar ao "precipício orçamental" com a gestão europeia da crise do euro.
Washington mostra um "padrão de disfunção [que] é perturbadoramente semelhante ao da zona euro", diz The Economist. Tanto os EUA como a UE parecem incapazes de ir além de medidas de curto prazo, em geral negociadas bem depois da meia-noite, acrescenta, que destaca a enorme influência de alguns indivíduos ou grupos na negociação dos acordos finais. Este semanário também critica os EUA e a Europa por não serem honestos com os eleitores, dizendo:
Tal como a chanceler Angela Merkel e o Presidente François Hollande têm evitado ser claros com os alemães e os franceses sobre o que é preciso para salvar a moeda única, também nem Obama nem os dirigentes republicanos tiveram a coragem suficiente para dizer aos norte-americanos o que é realmente preciso para resolver o problema do descalabro orçamental. […] Por não ter sabido lidar com a moeda única, a posição da Europa no mundo caiu. Por que haveriam os países em desenvolvimento confiar na liderança norte-americana, quando esta parece incapaz de resolver os problemas nacionais? E, enquanto a primeira democracia do Ocidente se mantém paralisada, a China vai tomando decisões e avançando.

Sem contar com as despesas (de representação)…

Dublin assumiu, em 1 de janeiro, a presidência rotativa da União Europeia. Mas esta instituição foi esvaziada de conteúdo, devido à crise e à evolução dos equilíbrios de poder no interior da UE.
De 6 em 6 meses, repete-se a cena. Um país deixa a presidência do Conselho da União Europeia e outro vem substituí-lo. Quem sai enaltece o excelente trabalho que desenvolveu e o novo "presidente" anuncia que se vai esforçar para dar um salto qualitativo em matéria de integração europeia. O final de 2012 e o início de 2013 não são exceção, nesta tradição.
O Chipre tornou público o balanço dos seus 6 meses de presidência. "A nossa aspiração era levar um pouco mais longe a integração europeia e considero que os importantes resultados da nossa presidência são a prova do nosso êxito nesse domínio", congratulou-se Andreas Mavroyannis, responsável pelos Assuntos Europeus junto do Presidente cipriota. Por seu lado, a Irlanda, que assumiu a presidência da UE em 1 de janeiro, já anunciou que tenciona "promover o crescimento e o emprego".
Capacidade de contradição limitada
Tudo isto tresanda a propaganda e a lugares-comuns, em cujo uso a Europa é exímia. A realidade é bastante diferente. Podemos começar por contestar a "importância" do balanço da presidência cipriota, quando os debates sobre o orçamento europeu dividiram os países-membros, o Reino Unido ameaça abandonar a União, houve que encontrar uma enésima solução de emergência que não resolve nada em relação à crise da zona euro e, para terminar, a união bancária permanece no limbo. Mas essa não é a verdadeira questão. O verdadeiro problema é que a presidência cipriota não foi para aí tida nem achada. O “seu” balanço, aqui resumido, não foi minimamente seu.
No entanto, Nicósia não se empenhou menos do que Copenhaga ou Varsóvia antes dela. Que iniciativas podia desenvolver o Chipre, um pequeno país de 800.000 habitantes, durante a presidência oficial de uma União em crise, enquanto negociava com a mesma UE as condições de apoio financeiro para si própria? O que podiam fazer a Polónia ou a Dinamarca, dois países não membros da zona euro, para dar "um impulso" a uma União Europeia atacada na sua zona euro? E como poderia a Irlanda, atualmente a negociar uma redução de mais de €60 mil milhões de dívida bancária para com a UE e o BCE, impor os seus pontos de vista junto do resto dos 26 países da União?
Esta série de perguntas podia multiplicar-se indefinidamente. Numa União Europeia em profundas dificuldades, todos os países se encontram bloqueados pela crise da zona euro. Uma crise que depende sobretudo do principal contribuinte da União: a Alemanha. É em Berlim que é feita grande parte da política europeia de hoje. Simplesmente porque, sem a República Federal, nada é possível. Só os grandes países e instituições como a Comissão ou o BCE podem ainda, sob certas condições, fazer de contrapeso à Alemanha.
A França e a Espanha foram capazes de impor a união bancária a Berlim, mas nas condições ditadas pela própria Alemanha, nomeadamente, o ritmo de execução e o tipo de bancos abrangidos. O Reino Unido faz frente à Alemanha, chantageando com a sua saída da União Europeia. Mas a capacidade de contradição é muito limitada: o projeto da Comissão para reforçar o orçamento da UE, com vista a combater a crise, foi abandonado, após a rejeição alemã; e as tentativas francesas de imposição de uma "agenda de crescimento" passaram ao largo.
Os dignitários bizantinos
Seria, portanto, difícil que Nicósia ou Dublin pudessem impor ao contribuinte alemão a sua visão da Europa ou sequer levar o Governo alemão a um compromisso. A política europeia decide-se hoje principalmente entre Berlim e Bruxelas. Mas podemos perguntar se a presidência rotativa não estará mais vocacionada para preparar os processos, dar impulso, favorecer compromissos, e não tanto para dirigir a União. O problema é que, mesmo neste domínio, a presidência tornou-se uma formalidade.
Desde a entrada em vigor do Tratado de Lisboa, em 2009, foi criado um cargo de presidente do Conselho Europeu, hoje ocupado pelo belga, amante de haikus, Herman van Rompuy. As suas competências são muito semelhantes às da presidência rotativa. Só que tem a vantagem de poder assegurar uma certa continuidade e coerência à elaboração das questões europeias. É ele, aliás, que dirige os serviços do Conselho que fomentam as decisões das reuniões. É, portanto, em Bruxelas que se decide a intervenção do Conselho, e só raramente nos países da presidência rotativa. Significativamente, desde 2004, as cimeiras europeias realizam-se em Bruxelas e não, como anteriormente, nos países da presidência rotativa.
Os representantes da presidência rotativa são, pois, espectadores de luxo. Têm prioridade protocolar, mas assemelham-se aos dignitários bizantinos, que tinham lugar nas cortes, mas não tinham qualquer poder. Todos os comunicados do Conselho para a imprensa tecem elogios ao trabalho e aos esforços desenvolvidos pelo país que preside à União Europeia. Mas é uma atitude obviamente formal. A presidência rotativa tornou-se uma espécie de montra que permite aos países tornarem-se mais conhecidos.
É uma oportunidade para divulgarem belos sites de Internet a evidenciar os méritos da sua nação (o da presidência irlandesa inclui um livro de receitas típicas muito completo) ou a salientar o turismo do país (como faz o do Chipre). Se isso permite atrair alguns turistas, ainda bem. Mas há outras iniciativas para esse tipo de promoção, como as "Cidades Europeias da Cultura". Não devíamos, pois, nestes tempos difíceis, acabar com uma instituição tão supérflua?
Visto da Irlanda - Jogada presidencial
Para Suzanne Lynch, especialista em Europa do Irish Times, o início do novo papel da Irlanda marca “6 meses de intensa atividade da UE em Dublin”. Esta é a 7.ª vez que a Irlanda assume a presidência, mas segundo ela, o espírito otimista que marcou anteriores períodos da história da UE contrasta com o prevalecente desânimo. E acrescenta:
Atualmente, a Europa está assolada pela dissidência e pela inquietação, enquanto tenta desesperadamente encontrar uma resposta para a crise financeira. Apesar da anunciada agenda do Governo para alcançar estabilidade, emprego e crescimento durante esta presidência, a verdade é que, muito provavelmente, será dominada pela questão do alívio da dívida, apostando especialmente na reformulação dos termos do empréstimo do Anglo Irish Bank, ao mesmo tempo que procura um regresso total ao mercado obrigacionista e a saída do programa de resgate FMI-UE.
A principal tarefa do Governo, nos próximos seis meses, será encaminhar legislação para os conselhos ministeriais, especialmente a reforma da Política Agrícola Comum. Suzanne Lynch continua:
O modo como o Estado equilibrará a sua agenda interna com a grande responsabilidade de procurar o bem da Europa através da sua atuação pode vir a ser o elemento definidor desta presidência.

Contramaré… 5 jan.

O requerimento do PS que suscita junto do Tribunal Constitucional a fiscalização sucessiva do Orçamento sustenta que estão em causa os princípios da proteção da confiança, da proporcionalidade e da igualdade na repartição de encargos públicos.
Estes foram os 3 fundamentos base invocados pelo deputado socialista Alberto Costa, após ter entregue no TC o requerimento do PS a pedir a fiscalização sucessiva do Orçamento do Estado para 2013, ladeado pelos deputados Isabel Moreira e Vitalino Canas.

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

E o prémio do “entroikado” vai… para… Vítor Gaspar!

No último Conselho de Ministros aconteceu isto. Vítor Gaspar disse que a lei que fixa as indemnizações laborais deve ser revista já, imediatamente e a correr (reduzida de 20 para 12 dias por cada ano de trabalho), porque foi isso que o País acordou com a troika. Ele, que é ministro das Finanças, fez o que já se espera dele: está cá como fiscal e, portanto, fiscaliza, zela, obriga, dobra, insiste, força, cumpre, não pensa, executa. Cegamente.
O ministro das Finanças foi longe demais. Não é ministro, é uma ravina política, é um abismo fiscal.
Já estamos habituados (mas resistindo) à prepotência do PODER sobre os cidadãos e contribuintes nos últimos 7 anos, que se tem centrado no caráter, na personalidade e na ideologia oculta ou desvirtuada dos Primeiros-ministros, alvos de fácil imputação. De há 17 meses para cá, o alvo dessa prepotência tem-se desviado do PM atual para o seu Ministro das Finanças, Vítor Gaspar, que por muito “sentido de humor” que lhe queiram colar, transborda de “amor-próprio” e muito pouco “sentido do amor”…
A notícia acima é o retrato “a la minute” da atitude comportamental do “homem”, que sem ter sido escrutinado, se impõe sobre quem lhe está acima, seja o PM, o PR ou o Tribunal Constitucional, ou quem lhe esteja ao lado, como o Conselho de Concertação Social, apenas porque lhe deram a chave do cofre...
Ao encontrar no “Dinheiro Vivo” o slideshow - O ano em 50 imagens, encontrei duas fotos sobre o visado (ótimas como as restantes), que aqui reproduzo, e que equivalendo a 2.000 palavras ou mais, me dispensam de gastar mais para avaliar ou classificar a sua atuação…
Só falta colocar uma legenda nesta última foto, que dentro do tal “sentido de humor”, poderá ser: “Em terra de cegos, quem tem um olho é rei?”.
A presença do ministro das Finanças na AR foi uma constante ao longo de um ano marcado pelo anúncio de fortes medidas de austeridade. Aqui, no dia seguinte ao 25 de Abril.
Mas não o será para sempre! Até porque nem nós somos cegos, nem ele é rei, a não ser das falsas (para nós, não para ele) previsões…
E é por isso que "não somos amigos do Gaspar"!

Ecos da blogosfera – 4 jan.

“Serviço Público” por privados não dá lucro? Fecha!

Grandes jornais eram vistos tradicionalmente como garantia para o jornalismo de qualidade. Mas a concorrência da internet já deixa marcas: alguns jornais já pararam as máquinas e muitos diminuíram o número de tiragens.
Richard A. Fuchs
A nova geração já definiu onde quer buscar informação e escolheu pela forma instantânea e gratuita: a internet. Como consequência, a circulação dos jornais impressos apresentou uma queda acentuada nos últimos tempos e alguns meios de comunicação impressos já declararam falência, como o jornal Frankfurter Rundschau e o jornal de economia Financial Times Deutschland.
Já o renomado Süddeutsche Zeitung prepara um corte de gastos. Na redação dos jornais regionais a situação segue a tendência e são tomadas medidas de sobrevivência como fusões e cortes de funcionários.
Velocidade e precisão
Há uma década a informação impressa e digital conviviam lado a lado e ampliaram a diversidade dos meios de comunicação na Alemanha. No entanto, de acordo com o analista Sven Gabor Janszky, a triagem começou e o impresso já perdeu grande espaço: "O setor de informação em massa no futuro vai funcionar quase completamente de forma eletrónica", prevê o chefe da empresa de pesquisa de tendências 2b Ahead. "Quem ganha dinheiro com os meios de comunicação impresso terá dificuldade para continuar a lucrar."
Para Janszky o jornal impresso tornou-se obsoleto porque é muito lento. "Queremos ter a informação a todo momento e onde quer que estejamos." Com os smartphones, laptops e redes sociais, não há mais espaço para produtos impressos, diz Janszky. Os programas eletrónicos que analisam automaticamente e de forma muito precisa o tipo de busca de cada usuário tornam-se cada vez mais importantes.
Na área de comunicação de massa, a ferramenta de filtro absorveria cada vez mais a tarefa dos jornalistas. Isso permitiria que a informação fosse adaptada precisamente de acordo com as preferências de um usuário, prevê o analista: "O jornal no meu visor apareceria diferente do seu."
Mudança de conteúdo
O fim do jornal impresso, no entanto, não significa necessariamente o fim da informação em papel, acalma Janszky os fãs dos media impressos. Porém, no futuro será um item de luxo. "As informações impressas serão direcionadas para um segmento privilegiado que busca informação num contexto editorial."
Não haverá mais notícias factuais impressas, haverá apenas publicações direcionadas para uma elite que circulam uma vez por semana, uma vez por mês ou até trimestralmente, explicou.
As análises e material de background seriam apenas um complemento da informação já obtida diariamente na rede. Um exemplo positivo é o semanário Die Zeit que, ao contrário da tendência dos meios impressos, regista em cada semana novos recordes de vendas.
Para o resto do setor impresso, fechar as portas é algo que está por vir, prevê o analista de tendências. Para ele, a qualidade da cobertura jornalística será prejudicada. “Vamos ver que o jornalismo de qualidade vai reduzir-se a um nicho que é muito caro, mas que possui um público-alvo. Teremos que nos despedir dos produtos de massa que ainda são de qualidade”, afirma Janszky, provocando pessoas como Frank Schirrmacher.
Schirrmacher é editor de um dos jornais alemães mais respeitados, o Frankfurter Allgemeine Zeitung(FAZ), e luta fortemente contra a completa digitalização do setor de informação. "O que aconteceu com a democratização da informação?", questionou Schirrmacher de forma retórica seus leitores numa das edições do seu jornal. A resposta dele, contudo, é pouco favorável aos meios digitais: A "nova e bela economia da informação" resultou no surgimento de grandes empresas como Amazon, Google, Facebook e Apple.
Solução em conteúdo digital pago
A crise do impresso entrou na agenda do governo alemão, influenciado também por acontecimentos na imprensa dos EUA e Reino Unido. Recentemente, a revista norte-americana Newsweek encerrou a edição impressa após 80 anos de circulação. A partir de 2013, o conteúdo será apenas disponibilizado online. No vídeo semanal gravado pela chanceler federal Angela Merkel e veiculado pela internet, ela comentou estar preocupada com essa tendência e desejou um bom futuro para os jornais e revistas tradicionais.
Já o professor de jornalismo Klaus Meier ainda demonstra otimismo frente aos media impressos alemães. "Eu não acho que num futuro próximo novos jornais serão completamente fechados na Alemanha", diz o especialista em Crossmedia da Universidade Católica de Eichstätt-Ingolstadt.
Os jornais impressos já percorreram um longo caminho, diz Meier, "Se comparar o jornal de hoje com o de há 20 anos atrás, é possível notar a diferença gráfica e como são mais avançados."
Para Meier, apesar do declínio nas vendas, o jornal impresso ainda é forte e prevê que a longo prazo os media online conviverão com os media impressos reduzidos. "Os jornais que eram diários vão aparecer ainda uma ou duas vezes por semana com uma edição impressa, ao contrário da edição online, então com publicações atuais e interativas."
Modelo de gestão
Se essa mudança vai afetar a qualidade do jornalismo, a decisão dependerá de qual será o modelo de gestão que os donos dos meios de comunicação irão impor. É cada vez mais frequente o sistema "Paywall", no qual o usuário paga pelo conteúdo digital do site, diz o professor. "Por outro lado, vamos perceber cada vez mais que o jornalismo não é 100% comercializável, e que precisamos pensar em modelos de instituição, talvez através de investimentos do Estado."
Como exemplo, comenta a criação de organizações não governamentais, como a Pro Publica, nos Estados Unidos, que apoia os jornalistas ou editores através de bolsas de estudos para pesquisas. No entanto, nem mesmo o especialista pode afirmar se isso seria suficiente para garantir o espaço dos media impressos.
Entretanto, continua-se a ministrar em todo o mundo, cursos de jornalismo tradicional, levando no engodo muita gente, que nunca exercerá a profissão, muito menos verá o retorno do investimento feito pelas suas famílias (não pelo seu país)…
E como todos já sabemos, que os privados só prestam “Serviço Público”, se tiverem lucros dessa atividade, ou fecham ou agarram-se ao Estado, que entretanto (perceba-se!) quer privatizar esse mesmo “Serviço Público”…
Fica-se ainda pendente de um défice enorme sobre o direito à informação e à livre expressão, quer por omissão, quer por manipulação…
É um presente do futuro…

Mas quem do povo vai comprar a estes “mercados”?

As negociações de última hora em Washington, para evitar um défice orçamental, evidenciam que a visão de curto prazo está bem alicerçada na política dos Estados Unidos. Revelam também que, apesar da sua controversa gestão da crise do euro, a chanceler alemã é bastante sábia ao forçar a adoção de soluções de longo prazo.
Citando uma frase que ficou famosa na boca do historiador norte-americano Robert Kagan, "Os americanos são de Marte e os europeus de Vénus" também quando se trata de lidar com questões de saúde fiscal de longo prazo.
O facto de os melhores políticos de Washington conseguirem apresentar, à beira do chamado "abismo fiscal", um acordo despojado e minimalista patenteia a inexistência de um interesse genuíno em resolver o problema do défice orçamental norte-americano de longo prazo.
Não tem a ver com as diferenças partidárias nos EUA (embora isso seja muitas vezes invocado como um facto). Os nossos políticos, independentemente da cor política, não são sérios no que diz respeito à saúde fiscal da nação a longo prazo.
De que outra forma interpretar o facto de a única forma de os políticos de Washington terem sido persuadidos a aceitar uma muito modesta fatia de austeridade fiscal, com vista a garantir a situação a longo prazo, ter sido convencê-los – com artimanhas como o "abismo fiscal" – de que haveria muito mais medidas de austeridade se não estivessem dispostos a aceitar pelo menos uma dose mínima de intervenção orçamental neste momento?
Saltar por cima do abismo fiscal
Se o Presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, e o Congresso realmente quisessem consertar o problema do défice orçamental do país, teriam entusiasticamente saltado por cima do "abismo fiscal", com cortes de gastos e aumentos de impostos obrigatórios, em vez de andarem eternamente a contorná-los.
É exatamente o oposto do que está a acontecer na Europa, onde a chanceler alemã, Angela Merkel, está a orientar uma dolorosa carga fiscal de curto prazo, tendo em vista resultados fiscais a longo prazo. Tanto os keynesianos como os desenvolvimentistas discordam, mas Merkel defende inflexivelmente que a Europa não pode voltar ao crescimento sustentável e prosperidade sem antes arrumar a sua casa fiscal – e utiliza criativamente o peso económico alemão para impor as regras alemãs que pretende para a Europa.
Essa – para além do facto de ter sido simultaneamente sábia e corajosa para abraçar o programa de Mario Draghi de compra de títulos, para estabilizar os mercados financeiros, enfrentando a oposição determinada do Bundesbank – é a razão pela qual considero que ela merece ser a personalidade europeia do ano.
Nota para os investidores: 2013 parece ser o ano em que os mercados começarão a perceber que é a "gente de Vénus" que está no caminho certo e os "marcianos" no caminho errado. São os norte-americanos que estão a arrastar a reforma fiscal pela ladeira abaixo e não os europeus.
Uma onda virtual de turbulência
Isso vai colocar a Europa em perigo, a par dos Estados Unidos. A incapacidade de Washington resolver a saúde fiscal dos EUA a longo prazo pode desencadear uma onda virtual de turbulência que atingirá toda a economia global. Vivemos num mundo interligado, em que a "gente de Vénus" pode sofrer graves consequências se a "gente de Marte" não cuidar dos seus negócios.
Um golpe no mercado acionista dos EUA poderia causar danos sérios tanto aos europeus como aos norte-americanos (sem falar dos asiáticos).
Parte da responsabilidade pelos problemas de saúde fiscal dos EUA repousa inequivocamente nos ombros da Reserva Federal dos Estados Unidos, cujas políticas de flexibilização quantitativa – intencionalmente ou não – tornaram mais fácil aos políticos norte-americanos colocar em risco a saúde fiscal da nação a longo prazo.
Para quê fazer reformas fiscais dolorosas para proteger a dívida soberana, quando a compra incondicional do banco central de títulos dos Estados Unidos faz esse papel tão bem? (O BCE está a exigir reformas, antes de gastar um euro que seja na compra de títulos de dívida).
O diretor da Reserva Federal, Ben Bernanke, terá, sem dúvida, relutância em admiti-lo mas as iniciativas de flexibilização quantitativa do seu departamento têm ajudado a deixar o balão da reforma fiscal dos Estados Unidos sem oxigénio.

Contramaré… 4 jan.

Admitindo que em Portugal, à semelhança de outros Estados-membros da União Europeia, se vive uma situação de "verdadeira emergência social", Durão Barroso sublinhou que se torna "fundamental gerir os custos da contração económica" e ter em conta o seu impacto nas pessoas.
Daí que tenha afirmado que "a Comissão Europeia está naturalmente disposta a analisar as trajetórias de cumprimento dos programas e a fazer os ajustamentos e calibragens que se revelem necessários de forma a minimizar os custos sociais".

quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

“Quer-se ter um país ou uma constituição?” Ih! Ih! Ih!

Um eventual 2º chumbo consecutivo pelo Tribunal Constitucional a normas do Orçamento do Estado (OE) colocará na agenda parlamentar um debate sobre a Constituição da República, avisa fonte centrista.
Mais do que a política do Governo, ou a legitimidade deste para governar, se os juízes do Palácio Ratton insistirem em considerar como inconstitucionais as normas relativas à suspensão do subsídio de férias aos pensionistas e funcionários públicos e a taxa adicional às reformas mais altas (para além de outras que a oposição possa vir a pedir), "o debate terá de ser mais profundo", sublinhou uma fonte do CDS: "Quer-se ter um país ou uma constituição?", polemiza.
O tema é caro aos centristas, que muitas vezes referem o facto de terem sido o único partido a votar contra a atual Constituição, em 1976. Mas também Passos Coelho, ainda antes de ser eleito, defendeu pelo PSD uma profunda revisão constitucional, projeto que acabou por meter na gaveta por não encontrar disponibilidade junto do PS para essa revisão.
Por agora, a disponibilidade dos socialistas é para avançar, também eles, com o pedido de fiscalização sucessiva do OE, como confirmou Isabel Moreira. "O requerimento está quase terminado", disse a deputada independente eleita nas listas do PS, que antecipa que os artigos que suscitaram dúvidas a Cavaco Silva poderão ser objeto de igual pedido pelos deputados da oposição. "A fundamentação de cada requerente, mesmo em normas coincidentes, pode ser diferente", aponta Isabel Moreira.
O tempo agora é do Parlamento. Deputados do PCP e do Bloco de Esquerda estão a trabalhar num texto comum, também para enviar ao Tribunal Constitucional, o que deverá acontecer para a semana.
Do lado comunista, as cautelas são muitas: o dirigente Jorge Pires defendeu ontem que "as inconstitucionalidades serão bastantes", mas limitou-se a dizer, que "na altura própria" serão anunciadas "as normas que [o partido] considera inconstitucionais".
Do Bloco de Esquerda, o deputado Luís Fazenda diz que "há vários" outros aspetos em causa, "desde a progressividade fiscal de várias das medidas de impostos, sejam assumidos como tal, ou mais ou menos ocultos, como é o caso da sobretaxa de IRS" ou a "violação de vários princípios sedimentados na Constituição", como o "da confiança, da proporcionalidade, da igualdade, de direitos da segurança social". E nota, que irão mais além do que Cavaco: "Juntaremos alguns outros [artigos], designadamente os que têm a ver com questões fiscais, os escalões de IRS, a sobretaxa, entre outras matérias."
Alertas das agências de rating
A estabilidade do Governo de coligação PSD/CDS é questionada pela agência de rating Fitch na leitura que faz da decisão do Presidente em termos de riscos para a implementação do OE, remetendo para o relatório sobre o rating da República de novembro.
Fonte oficial da Fitch recorda que "se algumas medidas do OE forem declaradas inconstitucionais, a adoção de um 4.º pacote de medidas orçamentais [este ano] poderá ser politicamente difícil". "A coesão da coligação seria severamente testada e o risco de desvio face ao que está no programa [de ajuda] seria elevado." Já no debate do OE foi testada a coesão do Governo, lembra a Fitch, por o CDS se ter oposto "fortemente às medidas fiscais em favor de cortes mais agressivos na despesa".
Defende-se que apesar das tensões na coligação, o essencial foi mantido entre PSD e CDS. A fonte centrista contactada recorda aliás que, na linha da intervenção do partido no debate do OE, Cavaco disse na sua mensagem que era preferível ter orçamento do que não ter, abrindo uma crise.
A agência canadiana DBRS aponta para o "aumento significativo dos riscos" subjacentes ao OE. Mais: se houver inconstitucionalidades no OE, "como aconteceu em julho de 2012, a qualidade da resposta de políticas será crucial".
Bruxelas também reage, com reservas. Fonte oficial diz que "a Comissão Europeia toma nota da decisão do Presidente português", recordando os alertas recentes para os "riscos elevados" deste OE.
Considerando a hipótese de haver inconstitucionalidades no OE2013, não deixa de ser curiosa a questão que o CDS coloca, "Quer-se ter um país ou uma constituição?", como se houvesse um país sem Constituição ou uma Constituição sem país… E dizem que querem um debate profundo, acrescentando que foram os únicos, em 1976, a votar contra esta Constituição, que entretanto já sofreu variadíssimas alterações…
Claro que Passos Coelho também quis apresentar uma proposta de alteração da Constituição, desenhada por um jovem e bem pago reformado, para poder, legalmente, inscrever a letra e a careta do neoliberalismo, que vai tentando impor, paulatinamente, com medidas e mais medidas, até… Mas o PS percebeu a jogada e deu-lhe com os pés, logicamente, mas PPC/Gaspar insistem.
E contra esta insistência persistente, e apesar de o Presidente da República ter enviado o OE2013 para o Tribunal Constitucional, pedindo a sua fiscalização sucessiva, toda a oposição irá requerer a fiscalização sucessiva do OE, para que todas as inconstitucionalidades sejam depuradas e se faça cumprir o que a Lei fundamental do País obriga e garante, democraticamente.
Só faltava agora as agências de rating e a Comissão Europeia virem chantagear os órgãos de soberania de um país, sobretudo o Tribunal Constitucional português, como se tratasse de gente da mesma massa má e mole dos nossos governantes…
Vale a pena ler ou ouvir os argumentos dos resistentes e renitentes atores desta última esperança de se cumprir a legalidade que a democracia impõe e que não custa dinheiro, embora haja quem a contabilize…
Para a deputada eleita pelo PS Isabel Moreira, o Presidente da República promulgou o Orçamento do Estado para 2013 “com a convicção que tem normas inconstitucionais”. “Mais uma vez, foi um Presidente inconsequente e contraditório. Não adiantou nada ao processo, porque para a fiscalização sucessiva estamos cá nós, ele é inútil”, afirmou.
Já António Filipe (PCP) disse que, se Cavaco tem dúvidas, deveria ter usado a fiscalização preventiva. “Se não está a ser cúmplice de uma inconstitucionalidade. E se está mesmo preocupado com a espiral recessiva, tinha o dever político de vetar o OE”, acrescentou.
Nuno Melo (CDS) sublinhou que o Presidente “não tem certezas” sobre as normas inconstitucionais e que, “independentemente de todas as dificuldades, é melhor ter um orçamento do que não ter”.
Também Teresa Leal Coelho (PSD) referiu que “era absolutamente essencial que o OE pudesse entrar em vigor a 1 de janeiro”. “Fizemos um enorme esforço de redistribuição do esforço que é pedido aos portugueses pudesse ser o mais equitativa possível e estamos tranquilos com as soluções que encontrámos”, afirmou.

Ecos da blogosfera – 3 jan.

E neste estado tem tudo para ser ministro (adjunto)…

Um homem aparece nos media a falar de economia. O cartão de visita diz "lá fora", o que cá dentro, na paroleira, é chave que abre qualquer porta. Faz-se passar por economista com tese e tudo. E ninguém, dos que têm como função escrutinar, escrutinou. Foi apresentado como vindo do topo do mundo, da ONU, e logo escoltado, com deferências e sorrisos, aos holofotes das principais marcas de referência do jornalismo português. E ninguém, dos que têm como função confirmar, confirmou. 
Pedro Bidarra
Acontece. São erros que se fazem e ninguém está livre de fazer. Sobretudo quando o burlão é bom e diz o que todos queremos ouvir. Já mais complicado é que os "especialistas" em economia e gestão deixem passar erros de palmatória no discurso do burlão quanto às funções do BCE e outras minudências. 
Mas vá lá... pode ter sido por pudor de o embaraçar. Ou talvez por ofuscação perante o ethos do cargo que dizia ocupar. Afinal era um homem da ONU. 
Já passou. Foi apenas um fait divers, a última gargalhada antes das mensagens de Natal do Passos Coelho. Nada de muito grave.
Grave, grave seria se a comunidade jornalística não investigasse ou escrutinasse políticos, deputados e candidatos à governação e deixasse burlões chegar lá acima. Isso, sim, era grave. Se não fizessem o trabalho que deles esperamos... 
Se, por suposição, deixassem chegar a ministro tipos que, à frente de toda a gente, tivessem obtido graus académicos aldrabados com equivalências manhosas. Ou se – absurdo dos absurdos – por falta de escrutínio, conseguissem chegar a primeiro-ministro tipos que não tiveram nem disciplina suficiente nem cabeça para acabar os seus cursos; por exemplo de matemática, ou de gestão, ou de engenharia. Maus alunos, portanto. Maus alunos que, depois, fizeram cursos à pressa em universidades manhosas passando exames de favor. 
Se isso acontecesse, por falta de escrutínio jornalístico, se tivéssemos como primeiros-ministros burlões em poses de Estado, isso, sim, seria grave. 
Mas isso é impensável, pois com certeza todos os deputados e candidatos a cargos são escrutinados; e a mentira, a dissimulação e o desprezo pelas normas que se aplicam aos outros, a sociopatia, enfim, não passa no crivo da investigação jornalística. É da higiene do jornalismo. É da higiene da democracia.
Estou em crer, eu, que sou assíduo consumidor dos media e admirador da profissão de jornalista, que o caso do Artur Batista da Silva foi uma excepção a confirmar o imaculado profissionalismo da classe.

Só Deus sabe o que será? Não acredito…

Nota do Autor - Como todos os portugueses, vejo com algum receio o ano que se aproxima. As previsões do ministro das Finanças e a leitura de um fígado de um salmão não são inteiramente fiáveis. Por isso, nada melhor que esquecer as previsões e passar, de imediato, para o balanço de 2013, com a ajuda da Mão Que Tudo Embala.
João Quadros
Fiquem com uma entrevista exclusiva com Deus, e o nosso agradecimento ao Professor João César das Neves, que nos deu o contacto.
Negócios: Olá, Deus. Antes de mais, obrigado por ter aceitado o nosso convite para fazer um balanço do ano de 2013.
Deus: O prazer é todo meu. Como criador de todo o Universo, e coordenador do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, sinto que é também uma obrigação.
Negócios: Como deve saber, os portugueses, que restam, estão muito preocupados com o ano de 2013. Acha que têm razões para isso?
Deus: O que eu posso afirmar é: a certeza de que Portugal é capaz de reformar o Estado e as suas instituições; a certeza de que querem uma sociedade mais justa do que foi até hoje; a certeza de que a vossa economia será competitiva no mundo globalizado; a certeza de que os dias mais prósperos e mais felizes do vosso País estão à vossa frente. Quando este Governo tomou posse…
Negócios: Como?! Desculpe interromper, mas isso é o discurso que o primeiro-ministro fez no Natal.
Deus: Não é nada.
Negócios: É, sim senhor. Ele tem um estilo único - moralista e castigador - que o Senhor nunca conseguiria imitar.
Deus: Raios! Fui apanhado. Pensava que só Eu é que tinha visto. Continuem a ouvir o que ele diz e depois queixem-se. Raio de azar.
Negócios: Mas, afinal o que é que se passa?!
Deus: Eu confesso. A realidade é que, nos últimos tempos, não tenho prestado grande atenção a Portugal. Tem havido uma certa falta de supervisão da minha parte, mas tem uma explicação. Eu sou monárquico e, desde que mataram Dom Carlos, fiquei chateado e deixei de me preocupar com o vosso destino.
Negócios: Quer dizer que, desde 1 de fevereiro de 1908, nunca mais quis saber de nós?!
Deus: Exactamente.
Negócios: Mas… então, porque é que ouviu o discurso do PM?
Deus: Eu explico. Eu nunca mais pensei em vocês, até que, há coisa de um mês, enviaram-me um "e-mail" com um vídeo do Marcelo Rebelo de Sousa sobre Portugal e fiquei assustado. Estive para fazer o Marcelo subir ao Céu, para me explicar melhor aquilo (que eu só vi a versão do youtube), mas, como ele está sempre ocupado e há quem sinta a sua falta, achei que era mais simples Deus descer à Terra. Por isso, na passada quarta-feira, usei a minha autoridade e estive na RTP e pedi para ver os brutos do discurso do PM.
Negócios: E o que é que achou?
Deus: Pareceu-me que ele usa tinta no cabelo. E achei mal ele ter tirado o burro e a vaca do presépio. Ele acata demasiado depressa as ordens que vêm de alemães.
Negócios: Mas, se se interessou por Portugal, suponho que, entretanto, já saiba alguma coisa sobre o nosso futuro.
Deus: Sabe que a Humanidade é uma equipa e eu, como treinador principal, não gosto de personalizar.
Negócios: Está a fugir à questão…
Deus: Isso é impossível. Eu não posso fugir a uma questão, porque sou omnipresente.
Negócios: Isto era suposto ser um balanço sobre 2013 e até agora não nos disse nada.
Deus: A culpa é sua que não me sabe espremer. Experimente pôr esta cabeleira gigante, igual à da Felícia Cabrita, a ver se eu não lhe respondo tudo o que lhe der jeito.
Negócios: Vou pôr… Está ao contrário. Assim pareço o irmão do Pinto da Costa… Já está.
Deus: Fica-lhe bem. Agora, experimente pôr esta mini-saia que eu aqui trago…
Negócios: Chega! Diga-nos, por favor, alguma coisa sobre o nosso futuro!
Deus: Está bem, dona Felícia. Ora, Deus pode afirmar que vocês, no dia 23 de Setembro de 2013, vão regressar…
Negócios: aos mercados?!
Deus: Não. Posso afirmar que vocês, no dia 23 de Setembro de 2013, vão regressar ao dracma. Pimba! Que me diz a isto?
Negócios: Ao dracma?! Isso não faz sentido! O dracma é a antiga moeda da Grécia.
Deus: Ui! Espera lá… Enganei-me. Portugal não é a Grécia. Eu faço sempre confusão. Nunca me lembro disso. Que chatice. Trouxe o dossier do futuro dos gregos para 2013 e deixei o vosso no carro.
Negócios: Então e agora?! Ficamos sem saber nada sobre o futuro do nosso país?
Deus: Pois. Quer dizer, sabendo isto dos gregos, já podem ficar com uma ideia do que vos vai acontecer. É fazer as contas… Se calhar até é melhor assim.
Negócios: É duro pensar que 2013 vai ser apenas outra vez mais do mesmo. O 2013 não traz nada positivo? Não há nada bom no mundo que aí vem?!
Deus: Pelo contrário. Vêm lá grandes tempos! De fortuna, de progresso, de… sabe ler mandarim?

Contramaré… 3 jan.

O Governo enviou para o Parlamento no último dia de 2012 a proposta de lei que reduz ainda mais as indemnizações por despedimento, de 20 para 12 dias por ano de trabalho, ignorando as reivindicações da UGT que sempre se manifestou contra esta redução que apelidou de "fraude"A proposta relativa ao fundo dos despedimentos, que terá de acompanhar este diploma (deve entrara em vigor ao mesmo tempo, algures em meados deste ano), não foi enviada ao Parlamento.

quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

OE: Inconstitucionalidades? PR: Obviamente admito-o!

"Por minha iniciativa, o TC irá ser chamado a pronunciar-se sobre a conformidade do Orçamento do Estado para 2013 com a Constituição da República", afirmou o Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva, na mensagem de Ano Novo, dizendo que "todos serão afetados, mas alguns mais do que outros" pelas medidas inscritas no Orçamento, "o que suscita fundadas dúvidas sobre a justiça na repartição dos sacrifícios".
“Devemos ter presente que o programa de assistência financeira foi apoiado por partidos que representam 90% dos deputados à Assembleia da República, deputados eleitos num sufrágio que teve lugar há pouco mais de um ano e meio”.
É preciso “urgentemente pôr cobro” à “espiral recessiva” que Portugal vive e “concentrar esforços” no crescimento económico, senão “de pouco valerá o sacrifício” dos portugueses.
Para começo de conversa, digamos que do mal, o menos…
Muita gente já falou, outra tanta vai falar, mas o que interessa são os factos e os números, contra os quais não há argumentos…
Há 2 afirmações no discurso do PR, que considero essenciais e o resto serão banalidades, ditas e reditas oportunamente, por especialistas e pré videntes.A primeira é esta “falsa” base de apoio e consentimento dos portugueses ao Memorando, traduzido nos resultados eleitorais, muito aproveitada (demagogicamente) por Gaspar e retomada por Cavaco Silva, quando o primeiro diz que há 80% do Parlamento a avalizar o que lhe apetece fazer e que o PR “inventa” 90%.
Se tivermos em conta que nas Eleições Legislativas de 2011 o PPD/PSD teve 38,65% dos votos, o PS (de Sócrates), 28,06% e o CDS.PP, 11,70%, somando tudo, os partidos “a favor” do Memorando, “representariam” 78,41%...
Pelo que se constata 17 meses depois, apenas o governo de coligação está de acordo com as medidas implementadas e impostas, embora os partidos que o compõem, no Parlamento não estejam de acordo em tudo, com o PPD/PSD de acordo, mas com uma declaração de voto que contradiz a aprovação do OE2013 e o CDS.PP que não concordando com muitas medidas, votou, também contraditoriamente a favor, com esperanças de o alterar na especialidade.
Assim sendo, o OE2013 teve 50,35% a “favor” e 49,65% contra, somando os votos do PS, do PCP-PEV e do BE.
Se considerarmos a posição do Presidente da República agora expressa e a interpretarmos como rejeição do OE2013 e se somarmos os 52,95% de votos obtidos por Cavaco Silva nas Presidenciais de 2011 aos 49,65% dos parlamentares que o recusaram, teremos que concluir que há 94,09% de portugueses que estão em desacordo com o documento (com uns pozinhos de demagogia), sobretudo com as piores medidas que dele constam (sem entrar com uma cota parte do CDS-PP)…
E assim sendo, Cavaco Silva tem razão ao referir os 90%, mas ao contrário do que pretendeu para tentar aliciar o PS a entrar no grupo dos austeros…
A segunda afirmação, tem a ver com a urgência de se por cobro a esta espiral recessiva em que Portugal entrou e a mesma urgência em se encontrar medidas para o crescimento económico, caso contrário de pouco valerá o sacrifício dos portugueses que, convém acrescentar, não tiveram nada a ver com as fraudes de muita gente “boa” e que andam por aí...
Há quanto tempo estas coisas andam a ser ditas e reditas, por especialistas e pré videntes? Afinal a razão vem mesmo, e sempre, ao de cima, se não formos facciosos…
Esta afirmação vem reforçar a interpretação de que o PR também rejeita o OE2013!
Assim sendo, só me vem à lembrança a análise e conclusões do “burlão” Artur Baptista da Silva (que ninguém quis discutir), que não andou muito longe da essência da decisão de Aníbal Cavaco Silva, que se distanciou do outro Silva no que à renegociação da dívida diz respeito, embora insista que temos argumentos, e devemos usá-los com firmeza, para exigir o apoio dos nossos parceiros europeus, de modo a conseguir um equilíbrio mais harmonioso entre o programa de consolidação orçamental e o crescimento económico…
Só mais uma coisinha. Não se teria evitado tudo ou parte disto, se o PR tivesse chamado o Ministro das Finanças quando este disse (puro gozo e desafio) que não tinha tido tempo para estudar as afirmações do Presidente da República? Alguém tem que puxar as orelhas a quem as tem a arder e só pode fazê-lo quem está no topo do poder…
Ainda bem que os portugueses tinham (sem contar e ao contrário do governo) um Plano C(avaco)!
Ainda há algum tempo para a esperança e alguma esperança para melhores tempos…
Cavaco Silva é o terceiro presidente da República a suscitar a fiscalização sucessiva de normas de um Orçamento do Estado, o que só ocorreu mais 2 vezes.
Jorge Sampaio requereu a fiscalização sucessiva das normas do Orçamento do Estado de 2003 que alteravam o cálculo das pensões e o regime de aposentação antecipada na Função Pública, menos favorável para os trabalhadores com carreira contributiva completa. 6 meses depois, o Tribunal Constitucional deu razão ao presidente da República e as normas foram declaradas inconstitucionais, com força obrigatória geral.
Só mais uma vez um Presidente da República pediu a fiscalização sucessiva de um Orçamento do Estado, Mário Soares, em 1992, com dúvidas sobre a alteração do regime de cálculo e distribuição do fundo de equilíbrio financeiro das autarquias locais. Neste caso, o Tribunal Constitucional não deu razão às dúvidas de Mário Soares.