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sábado, 7 de dezembro de 2013

A inevitabilidade da política nas opções económicas…

Desculpem o lugar-comum mas é tempo de voltar a afirmar que não é a economia que manda na política mas é a política que manda na economia.
David Rodrigues
Quando se assiste a debates públicos de ideias e de estratégias, as pessoas que são mais próximas da “situação” defendem a inevitabilidade das medidas que estão a ser tomadas com a ideia de “economie oblige”.  Querem dizer que “… até gostavam que fosse de outra maneira, compartilham as indignações, os desapontamentos, os desânimos de todos os portugueses que sofrem… mas… não há outra saída: a economia, a malfadada economia, a isso nos obriga”
Longe de mim subestimar o avassalador impacto que tem a crise financeira e económica nas decisões sobre a nossa vida coletiva. A economia teve, tem e terá um papel decisivo no escrutínio e na adoção de programas políticos. Mas não devemos retirar à política o fator fundamental de regulação das finanças e da economia que sempre teve e terá.
As opções sobre onde se corta, quando se corta, como se corta, a quem se corta, etc., são opções políticas que, apesar de tornadas prementes pelas condições económicas, não deixam de ser políticas, nem deixam de ser opções. A ação dos governos tem que ser analisada, louvada ou criticada pelas escolhas políticas que fazem. Não temos dúvidas que outro qualquer governo, com a mesma situação económica e financeira, optaria por medidas, pelo menos, parcialmente diferentes. Não é pois saudável nem justo avaliar o desempenho dos governos pelas condições económicas em que atuaram; serão sempre avaliados pelas opções políticas que conseguiram pôr em prática.
No presente momento assistimos uma prevalência da razão da economia. Se a culpa não é da dívida, é da “troika”, ela que não deixa, que bloqueia até os mais ténues esforços para contrariar a austeridade sobre o estado social. Mas a questão é de que forma esta austeridade serve a agenda política do Governo? Por outras palavras será que o Governo está a aproveitar a “calçadeira” da crise para melhor fazer passar as suas opções políticas? Não vou ser categórico, mas algo me leva a crer que é possível, muito possível, que assim seja. E tomo o exemplo da Educação.
Antes de mais a privatização da Educação. Ninguém sabe explicar como é que a privatização da Educação contribui para uma melhoria da situação económica. Será que o facto de se criar uma verdadeira possibilidade de escolha para as famílias melhora ou controla os custos da Educação? Não parece razoável. Para criar a tal propalada “possibilidade (liberdade) de escolha” era preciso construir uma rede de ensino privado que se estendesse eficazmente pelo menos a todos os concelhos do país.
Talvez haja – e há – grupos económicos que queiram investir no litoral urbano mas se eles não quiserem investir na construção e montagem de escolas no interior rural, quem o vai fazer? É o Estado? Portanto das duas, uma: ou não assegura esta rede – o que torna perfeitamente demagógica a conversa sobre a “possibilidade de escolha” – ou monta esta rede e encarece despropositada e inutilmente o custo da Educação.
Por outro lado, no incentivo aos sistemas duais de ensino. Se as escolas forem cerceadas dos apoios que precisam para apoiar a educação de todos os alunos que a frequentam – o que está atualmente a acontecer – torna-se “inevitável” que, sem apoio na escola “de todos”, estes alunos tenham que ir para uma escola “de alguns”. Assim, se justificam, em nome do “interesse dos alunos e das suas famílias”,  o seu encaminhamento para vias de ensino “paralelas”. Sabemos que estas vias paralelas são vias também de menor qualidade, de menores expectativa sobre os resultados, são as vias que conforme nos mostram os relatórios educativos internacionais, têm mais dificuldade em atrair os bons professores. O alastramento exponencial dos Currículos Alternativos é disto uma prova.
Lemos estes 2 exemplos como prova do que antes apontamos: o primado da política sobre a economia. Nem num caso nem noutro existe evidência de que estas decisões são tomadas em nome da economia. A privatização do ensino e o incentivo aos sistemas duais são opções políticas, programáticas, voluntárias e conscientes por parte do Governo.
Gostaria que aparecessem mais com a sua verdadeira face e não disfarçadas de respeito pelas famílias ou respeito pelos alunos. Trata-se de opções políticas e que devem ser avaliadas enquanto isso.
É sim uma pena que à semelhança do que se passa noutras áreas da atuação do Governo, estes assuntos não tenham uma cara, uma justificação, uma fundamentação que nos leve a seriamente discutir as vantagens e os inconvenientes destas opções.
Não discutir estas opções políticas à luz do conhecimento existente e disponível nas Ciências da Educação é sim um incentivo ao “eduquês”.

Ecos da blogosfera - 7 dez.

Um retrato simples de um simples homem…

Os media tratam Mandela como um semideus, o que ele obviamente não foi. Mas os elogios são merecidos diante das conquistas alcançadas pelo líder sul-africano.
Claus Stäcker
Nelson Mandela certamente não foi um santo, embora este seja o tom dos media: cada manchete torna-o um pouco mais sobre-humano, a admiração assume traços de idolatria. E algumas testemunhas juram que, na presença dele, eram invadidas pelo especial carma de Mandela. Sempre que a África do Sul precisava de um milagre, falava-se em "Madiba Magic".
Para ele, o culto à personalidade era antes algo embaraçoso. Só com relutância aceitava emprestar o seu nome a ruas, escolas e institutos ou ver a construção de estátuas de bronze e museus Mandela uma tendência que agora só tende a aumentar.
Em várias ocasiões, Mandela referiu-se à resistência como um poder coletivo, a pioneiros históricos e companheiros de luta como Mahatma Ghandi, Albert Luthuli ou o seu amigo e companheiro Oliver Tambo, cujo nome se encontra injustamente à sombra de Mandela.
Foi Tambo o primeiro a trabalhar para que a luta de resistência do Congresso Nacional Africano (CNA) fosse aceite mundialmente. E foi Tambo o primeiro a encenar o conto de fadas mundial de Mandela, no qual toda a pessoa justa poderia reconhecer-se em Spitzbergen ou na antiga Berlim Oriental, em São Francisco ou em Pequim.
Quando o prisioneiro número 46664 foi libertado, depois de 27 anos no cárcere, era uma marca, um ídolo mundial, um mito associado a projeções, desejos; abarrotado de expectativas, que uma pessoa só não poderia cumprir.
Mas quem iria arranhar a sua imagem? Enumerar os seus pecados juvenis, os seus filhos bastardos? A sua fraqueza pelas mulheres, sobretudo por mulheres bonitas: modelos, estrelinhas pop e jornalistas, com quem flirtava da forma mais politicamente incorreta até como antigo estadista? Quem iria atrever-se a condenar os seus planos de ataque quando era líder da tropa de combate do CNA Umkhonto we Sizwe (lança da nação)? E a criticar o seu jeito exaltado e arrogante, do qual os companheiros de cela e ex-funcionários hoje sorriem?
Mesmo o seu balanço como chefe de governo, entre 1994 e 1999, não é de forma alguma celestial. O seu mandato foi marcado pelo pragmatismo e pela indulgência política. As decisões necessárias eram procrastinadas, as tarefas do dia-a-dia eram deixadas nas mãos de outras pessoas. Ele também tomou decisões erradas quanto à escolha de algumas amizades políticas, o comandante líbio Muammar Khadafi, por exemplo, que até deu o nome a um neto de Mandela. Em retrospetiva, nem tudo se encaixa na imagem de visionário e génio.
Tudo isso é perdoado, porque, apesar de tudo, Mandela realizou algo praticamente inumano. Nesse contexto, o longo cativeiro desempenha um papel importante. A prisão não o dobrou, marcou-o. Mandela disse uma vez que, para ele, a prisão na ilha de Robben foi uma "universidade da vida". Lá, aprendeu a ter disciplina, e no diálogo com os guardas, aprendeu humildade, paciência e tolerância.
A sua ira juvenil desapareceu, dando lugar à suavidade e à sabedoria da idade. Finalmente livre, Mandela não era mais um cidadão irado, nem mesmo um revolucionário. Essa é a crítica, mesmo que velada, de alguns dos seus companheiros. Eles queriam um golpe de Estado, uma revolução nacional. Ele desejava a reconciliação, a quase qualquer preço.
E a sua própria metamorfose mostrou ser o seu ponto mais forte: saber libertar-se de padrões de pensamento ideológicos, reconhecer o todo a partir do próprio movimento. Não encarar quem pensa diferente como um inimigo. Ser capaz de ouvir. Espalhar mensagens de reconciliação até quase ao limite da abnegação. Só assim ele pôde servir como exemplo a negros e brancos, a comunistas e empresários, a calvinistas e muçulmanos.
Ele foi um missionário, um pregador do amor ao próximo. "Perto dele todos eram iguais", exaltou o músico sul-africano Sipho Hotstix Mabuse após uma receção a Mandela em Londres. Mandela deu-lhe a sensação de não ser menos importante que Bono, o príncipe Charles e Bill Clinton na mesa ao lado. Ele respeitava músicos e presidentes, rainhas e faxineiras. Ele memorizava nomes e perguntava pelos familiares. Indagava educadamente, levava todas as questões a sério. Com um sorriso, uma brincadeira, algumas saudações direcionadas, ele ganhava qualquer público. A sua aura conquistava todos, mesmo inimigos políticos.
Certamente isso não o qualifica como semideus, mas é endeusado com razão. Ele tem de ser mencionado no mesmo patamar que Mahatma Gandhi, Dalai Lama ou Martin Luther King. Mandela fez história no melhor sentido da palavra e nem mesmo Barack Obama seria presidente dos EUA, segundo as suas próprias palavras, sem tê-lo tido como exemplo.
Por tudo isto é secundário que Mandela seja agora tratado como um deus. Que ele não tenha podido realizar tudo na política equivale apenas a uma nota de rodapé na sua biografia. O seu mérito está em ter apresentado um exemplo credível de humanismo, tolerância e não-violência.
Mandela não foi nenhum santo, mas um ser humano com pontos fortes e fracos, marcado pela sua época e lugar. Ainda assim será difícil encontrar alguém maior. E um pouco mais de Mandela todos os dias movimentaria muita coisa. Na África, mas também em Berlim, Jerusalém ou Moscovo.

Contramaré… 7 dez.

O Governo de Cavaco Silva tinha em 1987 João de Deus Pinheiro à frente do Ministério dos Negócios Estrangeiros. Foi então confrontado com uma resolução proposta à Assembleia Geral das Nações Unidas, que incluía uma exigência de libertação de Nelson Mandela. Votou contra e esteve na minoria derrotada pelos 129 votos favoráveis. O isolamento internacional do apartheid reflectia-se na votação: só os Estados Unidos de Reagan, o Reino Unido de Thatcher e o Portugal de Cavaco tinham votado contra a resolução.
Sobre a consistência da política norte-americana em defesa do apartheid e contra a libertação de Mandela, não restam dúvidas, sobretudo depois de o ex-vice-presidente Dick Chenney ter reafirmado ontem a correcção do voto norte-americano de 1987. Motivo: Mandela continua a ser, na opinião de Chenney, “um terrorista”.

sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

Banqueiros ameaçam invadir as escadas dos clientes…

Para que os bancos possam começar a cobrar comissões pelo levantamento de numerário na rede Multibanco terá que haver uma alteração legislativa, já que neste momento tal não é permitido.
A Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED) contesta a introdução de taxas nos levantamentos em caixas Multibanco, a propósito da legislação europeia que vai limitar as taxas cobradas nos pagamentos com cartões de débito e de crédito, que representa uma perda de receitas anuais estimada em 140 milhões de euros. Em alternativa, Faria de Oliveira, presidente da Associação Portuguesa de Bancos (APB) admitiu a introdução de taxas nos levantamentos em caixas Multibanco.
Os bancos poderão começar a cobrar pelos levantamentos na rede Multibanco, encarecer os cartões de débito ou adotar qualquer outra modalidade que lhes garanta mais receita se forem impostos limites às taxas cobradas aos comerciantes por pagamentos com cartões. Quem "avisa" é o presidente da APB, Faria de Oliveira: "Tudo o que agrava, em termos de custos, a atividade bancária, para melhorar a rentabilidade, tem que ter uma contrapartida de obtenção de receitas de uma outra qualquer via". E realçou: "Certo é que, nesta fase pela qual nós passamos, a rentabilidade dos bancos é negativa... e podemos estimar que 2014 ainda será um ano com resultados globais negativos. Talvez, menos maus do que nos anos anteriores".
Para que os bancos possam começar a cobrar comissões pelo levantamento de numerário na rede Multibanco terá que haver uma alteração legislativa, já que neste momento tal não é permitido.
Para Faria de Oliveira "o país precisa de uma banca forte. E uma banca forte é incompatível com uma banca com prejuízos repetidos durante vários anos. Isso não pode acontecer".
O banqueiro acrescentou ainda que "a banca é coração da economia. As empresas dependem no seu financiamento em mais de 75% de crédito bancário. Portanto a banca tem de estar sólida, forte, moderna, para poder satisfazer as necessidades da economia e apoiar o crescimento económico que o nosso país precisa".
Segundo dados do Banco de Portugal os maiores prejuízos da banca devem-se aos pagamentos em numerário. Os pagamentos automáticos são os que geram maior lucro.
Faria de Oliveira afirma que não será criada uma taxa sobre a utilização do multibanco por causa dos limites às taxas cobradas pelos bancos aos comerciantes nos pagamentos electrónicos, ao contrário do que tinha afirmado ontem.
Embora sejam gatos do mesmo saco, distribuidores e banqueiros, vivendo uns apoiados pelos outros, no caso os segundos levam vantagem na cobrança de “serviços” que a informática lhes permite, mas é de salientar a “solidariedade” da APED com os “caixeiros Multibanco”…
Completamente absurda, usurpadora e provocatória perante a lei e o governo, é a criatividade de Faria de Oliveira (que não é gago, mas gagueja por falta de argumentos), que se quer vingar no Zé Povinho, cobrando taxas que a lei proíbe, para não baixar os “lucros” que até agora sacavam aos comerciantes.
Agora que Shaüble veio confessar que os bancos é que criaram a crise e conseguiram, com o comprometimento dos governos, que os contribuintes pagassem as suas fraudes, ainda não desistiram de continuar com investidas, descaradas, de mostrarem que ELES é que mandam… Se tivessem sido julgados teriam sido condenados a pagar e não bufar e talvez estivessem na cadeia e caladinhos. Mas como continuam os mesmos a fazer o mesmo, a tática é a mesma, acintosamente…
E o governo nem chju nem miu...
Faria de Oliveira, que representa a Banca nacional, corajoso, mas gaguejando, veio falar de rentabilidade dos bancos (mas o que é isso?), que a banca é o coração da economia (no momento não são as Finanças?), que as empresas dependem de crédito bancário (que há 3 anos as deixou de financiar?), que a banca tem que ter dinheiro (por quaisquer vias) para apoiar o crescimento económico que o nosso país precisa (e eles tem impedido). Logo, ladrão que rouba roubados também tem perdão…
Vamos por de parte a ilegalidade da “hipótese de trabalho” (eufemismo), a mentira sobre os prejuízos dos cartões de pagamento (areia para os olhos) e as ameaças (anti marketing) aos clientes e ainda a afronta (antidemocrática) ao governo. Lembremo-nos apenas das máquinas Multibanco.
Quando introduzidas, foram a maior poupança que os bancos conseguiram com a eliminação de postos de trabalho, ganhando balúrdios só por isso, sem benefício para os clientes (mas ganharam os acionistas) sem contar com as consequências sociais com os despedimentos que originaram (sem qualquer consciência social das empresas). Comparando, é como sermos nós a “encher o depósito”, depois de despedidos os funcionários que o faziam, sem que o preço dos combustíveis baixassem por isso. Ou ainda, como nas portagens das autoestradas, em que eliminados os portageiros, nos aumentam os valores de utilização e acrescentaram o pagamento das SCUT…
Era bem feito que os clientes destes “comerciantes de notas e moedas” invadissem as agências bancárias para levantar dinheiro em vez de o fazer no Multibanco! Assim já precisariam de mais mão-de-obra, embora nos castigassem com bichas maiores do que nas caixas…
E depois de todas as baboseiras, Vem o Faria dar o dito por não dito, depois de o Banco de Portugal ter derrubado a falácia dos prejuízos…
Estes banqueiros, nem se dão ao trabalho de fazer manifestações (à proletário), mas manifestam-se, publicamente, nas tais empresas (de comunicação), que precisam deles para o crescimento “económico” de falam…
É o mundo ao contrário, sustentado por gente espertalhona e (des)regulado por governos fracos ou comprometidos, coadjuvados por parlamentares implicados…
Por onde anda a moral?

Ecos da blogosfera - 6 dez.

Na Banca não há só vigaristas, também há gente fina…

Na opinião do ministro das Finanças alemão, Wolfgang Schäuble, não foram os Estados que desencadearam a crise mas sim o setor financeiro. “É por isso que a regulamentação não pode parar. [...] Os bancos continuam a dar provas de grande criatividade para contornar a legislação. A política deve manter-se alerta.”
A Comissão Europeia “desferiu um enorme golpe” em 6 bancos europeus, escreve El País.
A 4 de dezembro, o comissário para a Concorrência, Joaquín Almunia, anunciou a aplicação de uma multa de 1.710 milhões de euros aos bancos Royal Bank of Scotland, Société Générale, Deutsche Bank, JP Morgan, Citigroup e da corretora RP Martin, por manipulação das taxas de juro “em proveito próprio”, precisa o diário. Estas taxas de juro eram aplicadas “a milhares de mutuários, aforradores e empresas” através de produtos financeiros derivados e indexados a índices como o Euribor.
Trata-se de uma “punição dissuasora”, considera El País no seu editorial, congratulando-se por Bruxelas agir “finalmente” contra a fraude:
A mensagem implícita é que a máquina comunitária está disposta a agir perante qualquer perversão dos mercados e que o fará com especial determinação e sem ter em conta o nome dos sancionados.
A Comissão Europeia aplicou multas que chegaram a 1,7 mil milhões de euros a 6 bancos internacionais que manipularam os índices Euribor e Yen-Libor. Só o Deutsche Bank terá de pagar, sozinho, 725 milhões de euros, noticia o jornal Handelsblatt.
“Sei que os bancos pensam que isto é suficiente. Mas, no entanto, os pecados do setor financeiro não serão esquecidos”, reagiu o ministro das Finanças alemão, Wolfgang Schäuble, numa entrevista ao diário económico.
O ministro, que poderá manter o cargo no próximo Governo alemão, “quer continuar a ofensiva de regulamentação”, explica o Handelsblatt. Na opinião do ministro, não foram os Estados que desencadearam a crise mas sim o setor financeiro. “É por isso que a regulamentação não pode parar. [...] Os bancos continuam a dar provas de grande criatividade para contornar a legislação. A política deve manter-se alerta.”
Tudo se pode resumir a duas verdades que Schäuble (de quem não gostava) disse, finalmente, sobre a crise, apesar de já ter sido dito e redito por tanta gente: não foram os Estados que geraram a crise, foi a Banca e que é preciso que os políticos lhes cortem as iniciativas continuadas para as fraudes inovadoras…
Agora ninguém poderá negar o que disse o “dono da bola”.
Pelo que se percebe, na eminência de o ministro das Finanças alemão ser substituído (parece que já não vai ser) fica-lhe bem dizer estas verdades, quanto mais não seja para não ficar rotulado como o algoz da austeridade sobre os inocentes, mas queremos acreditar (até ter provas) de que virará as suas preocupações para os verdadeiros criminosos, mesmo quando são alemães…
Do que não há dúvidas é de que é-lhe(s) mais fácil combater os poucos vigaristas que vagueiam no mercado do que os milhões de pilha-galinhas de contribuintes que sacam uns biscoitos nos supermercados…
Se estas e outras reviravoltas políticas que se estão a operar na Alemanha, são em resultado da coligação com um partido Social-democrata, esperemos que a “verdadeira” social-democracia se estenda pela Europa e se redima das malfeitorias que espalhou pela incursão no neoliberalismo…
Os bancos que paguem a suas dívidas!
E os banqueiros que sejam julgados!

Contramaré… 6 dez.

Foi apresentado na manhã de quarta-feira no Porto um movimento de reflexão chamado “Uma agenda para Portugal”. Trata-se de uma plataforma de debate político, com figuras de direita sobretudo ligadas ao PSD, e que está já a ser interpretada como um possível movimento de apoio a Rui Rio, para sucessor de Passos Coelho.

quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

Pela boa (in)formação e pela liberdade de expressão

Daqui a 3 semanas, o Presseurop deverá acabar. O nosso contrato com a Comissão Europeia, que financia o nosso sítio, acaba a 22 de dezembro e a direção-geral de Comunicação, que depende da vice-presidente Viviane Reding, fez-nos saber que não dará continuidade ao projeto. Invoca razões orçamentais.
O Parlamento Europeu, no entanto, votou um aumento do orçamento da UE para 2014 para atribuir recursos financeiros suplementares à Comissão para os projetos de “media”, dos quais faz parte o Presseurop. A Comissão parece preferir consagrá-los a outras iniciativas. Privados desse financiamento, seremos obrigados a cessar o nosso trabalho.
Desde o seu lançamento, em 2009, por iniciativa da Comissão, o Presseurop impôs-se como um dos principais sítios de informação independentes sobre a União Europeia. Todos os dias, os seus leitores podem ler o melhor da imprensa europeia e internacional, traduzido em 10 línguas, partilhar e comentar os seus conteúdos. Criou-se assim uma comunidade, verdadeiro embrião de cidadania europeia, que tornou vivo o debate de opiniões sobre a Europa graças à sua plataforma de discussão multilíngue única. Para os títulos da imprensa, jornalistas, intelectuais e especialistas – mais de 1.700 até hoje – cujos artigos publicámos, o Presseurop representou um meio de alargar a sua audiência para além das fronteiras linguísticas.
Lamentamos que a Comissão Europeia, a escassos meses das próximas eleições europeias, que se anunciam cruciais para o futuro da UE, queira acabar com esta experiência, apesar de ser muito apreciada tanto pelos leitores como pelos especialistas em assuntos europeus e os jornalistas. Além do mais, uma avaliação independente encorajou a Comissão a dar-lhe continuidade. Mas aquela preferiu outro caminho, privando os cidadãos europeus de um precioso instrumento de participação na vida democrática da União.
Este espaço comum não pode desaparecer. Vocês, sem os quais não teríamos conseguido fazer o nosso trabalho, podem apoiar-nos divulgando este apelo, para que a Comissão Europeia continue a apoiar o Presseurop em 2014.
Siga #SavePE no Twitter
Já há uns anos que me sirvo do Presseurop, não só para estar por dentro das melhores notícias/opiniões dos melhores jornais e jornalistas da União Europeia, mas também para divulgar, aqui no blogue, o que considero de mais (in)formativo, dentro da linha editorial que adotei.
Perante este cenário previsível, ficarei eu prejudicado na qualidade da informação, bem como na quantidade de tempo para encontrar os temas que dizem respeito a nós, cidadãos europeus.
Tendo em conta as próximas eleições europeias em 2014 e as eventuais alterações para uma democracia mais direta, ficaremos cerceados de esclarecimentos e atualização e mais sujeitos ao que os media nacionais quiserem impingir aos seus concidadãos.
E por tudo isto, assinar a petição para a continuidade do Presseurop é um gesto de cidadania e uma exigência da continuidade de um jornal online, que garante a liberdade de expressão.
Assinemos! Já só faltam menos de 200…

Ecos da blogosfera - 5 dez.

Ora bolas! Lá se foram as nossas referências…

O último relatório PISA, publicado no dia 3 de dezembro, indica uma diminuição do desempenho dos alunos europeus e uma progressão dos seus homólogos do Extremo Oriente.
O estudo, que testa os conhecimentos dos alunos de 15 e 16 anos na leitura, matemática e ciências, é particularmente duro com os países nórdicos e a França. A Finlândia deixa de estar na primeira posição, cedendo o seu lugar à Coreia do Sul e descendo para a 6.ª posição. Já não é “o país das maravilhas da educação”, deplora o Helsingin Sanomat. Para o diário finlandês, apesar de o resultado
não ter sido nenhuma surpresa, ainda ninguém foi capaz de fornecer uma explicação plausível para o que aconteceu. […] Os finlandeses estão habituados a acreditar na excelência da formação dos professores na Finlândia e, sobretudo, na força do sistema de ensino básico de 9 anos.
Na Dinamarca, o Jyllands-Posten também manifesta o seu desagrado: “Não é suficiente”, considera o diário:
Temos o ensino público mais caro do mundo, mas não existem provas de que a nossa população é a mais estúpida do mundo. Por consequência, não há qualquer motivo para duvidar de que o ensino mais caro não fornece a melhor formação e, por conseguinte, a população com a melhor educação.
O jornal Berlingske estima, por sua vez, que “está na hora de nós, os Estados-Providência ocidentais, revermos em profundidade o nosso sistema educativo”.
O estudo PISA abalou a França, que desce 2 lugares e ocupa apenas a 25.ª posição em 65 países. Le Figaro realça que o ensino francês é “injusto e ineficaz”:
O fosso entre os bons e os maus alunos é cada vez maior […]. Continuamos a formar futuros Prémios Nobel da física e da medicina, mas produzimos ainda mais idiotas.
O diário conservador dá o exemplo da Alemanha, que em 2001 foi identificada como preocupante pelo PISA, mas soube “reagir imediatamente” registando desde então progressos evidentes.
O sistema educativo alemão tornou-se “mais justo e os alunos conseguem melhores resultados”, regozija-se Der Spiegel:
O choque psicológico costuma ser acompanhado de um momento de paralisia, seguido por um sentimento de desorientação. […] Depois chega a assimilação e, em seguida, a recuperação – o sistema educativo alemão está nesta última fase. […] Está mais do que na hora de substituir a expressão “choque do PISA” por “progresso do PISA”.
Ora bolas! Lá se foram as nossas referências… Ainda bem que não seguimos os “melhores”!
Mas, cá para nós, quem e como se justificam estas reviravoltas, que pioraram(?) a Educação em tão curto lapso de tempo?
Ou foi a crise europeia com as crescentes desigualdades entre os seus cidadãos, com mais alunos mais pobres a obter resultados muito mais fracos do que os de estatuto socioeconómico mais elevado?

Contramaré… 5 dez.

Ana Gomes levantou suspeitas sobre negócios do escritório de advogados do ministro Aguiar-Branco com a Martifer, grupo que ganhou a subconcessão dos Estaleiros de Viana. “É preciso ver que negócios é que tem o escritório dele de advogados com a Martifer”, afirmou Ana Gomes. O ministro da Defesa vai apresentar queixa-crime contra a eurodeputada.

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Vejamos o que estará por baixo do PISA-papéis…

Depois dos maus resultados no 1.º PISA (um megaestudo internacional que avalia a literacia Matemática, Científica e de Leitura dos alunos de 15 anos), muito mudou em Portugal, mas o estatuto socioeconómico continua a pesar muito no sucesso das crianças;
a)     Os alunos de 15 anos que frequentaram o pré-escolar saem-se melhor nos testes de literacia. E Portugal aumentou o nível de pré-escolarização na última década;
b)     As habilitações das famílias estão fortemente ligadas aos resultados dos jovens. E, em Portugal, a percentagem da população adulta com o ensino secundário subiu;
c)     E qual terá sido o papel da reforma curricular introduzida no país — uma reforma que "melhora a atitude dos alunos" em relação "à escola, em geral, e à Matemática, em particular"?
d)     Ou de medidas como a introdução de áreas não disciplinares como o Estudo Acompanhado, que entretanto deixou de existir?
Certo é que os resultados dos alunos portugueses melhoraram.
A OCDE passa em revista um conjunto de medidas de política educativa, adoptadas por Portugal nos últimos 10, 12 anos, nos diferentes relatórios divulgados com os resultados do PISA 2012.
A OCDE destaca as melhorias alcançadas pelos alunos portugueses, que colocaram o país no 23.º lugar do ranking, com uma média de 487 pontos. A média da OCDE é 494 pontos.
O país faz parte do grupo dos que registam progressos a Matemática superiores desde 2003. E as coisas também não correm mal noutras áreas. "O que mostra que mesmo num curto lapso de tempo é possível melhorar de forma abrangente", diz a OCDE.
Já a Comissão Europeia, numa análise aos resultados do PISA, diz que persistem "profundas desigualdades" em alguns países, entre os quais Portugal, com os alunos mais pobres a obter resultados muito mais fracos do que os de estatuto socioeconómico mais elevado.
Os receios dos professores
A Associação de Professores de Matemática saúda as melhorias dos resultados, mas teme que o novo programa de Matemática venha a inverter essa tendência, receio que não é partilhado pela Sociedade Portuguesa de Matemática, que tem esperança que o país melhore, graças, precisamente, aos novos programas.
A OCDE não estabelece relações de causa-efeito, mas analisa o que se passou na última década. Portugal começou a reflectir sobre os resultados dos seus alunos depois de em 2000, primeiro ano do PISA, ficar no fim da tabela da literacia. Desde então, muita coisa aconteceu:
a)     Aumentou a preocupação de identificar os alunos que potencialmente teriam insucesso ou corriam o risco de abandonar a escola para os envolver em projectos de apoio individualizado;
b)     Os quadros electrónicos e a banda larga chegaram aos estabelecimentos de ensino e nasceram áreas não disciplinares (que entretanto foram eliminadas) como a Área Projecto, o Estudo Acompanhado e a Educação para a Cidadania;
c)     Foi alargada a acção social escolar – entre 2005 e 2009 o número de beneficiários destas medidas triplicou;
d)     O problema do absentismo dos professores foi atacado com a criação das famosas aulas de substituição – que entretanto desapareceram na maioria das escolas;
e)     Foi feito um investimento forte na formação dos docentes de Matemática, Língua Portuguesa e Tecnologias de Informação e Comunicação.
O papel dos exames
Recordado é ainda o contestado modelo de avaliação dos professores – mas, o que é certo, é que a avaliação passou a fazer parte do léxico das escolas. Por isso, e não só:
a)     As provas de aferição introduzidas nos 4.º e 6.º anos e os exames nacionais no final do 9.º ano habituaram os alunos a responderem sob pressão – em 2013;
b)     As provas de aferição foram substituídas por exames –, e isso pode ter contribuído para o facto de os alunos que responderam ao PISA em 2012 estarem mais autoconfiantes e terem mais certezas do que os seus colegas de 2003.
A partir de 2006 os resultados do PISA, que é feito de 3 em 3 anos, começaram a melhorar a diferentes níveis. Portugal é um dos países que conseguiram, simultaneamente, duas coisas:
a)     Reduzir o universo dos alunos que se saem muito mal neste tipo de testes de literacia e
b)     Aumentar o número dos jovens que se destacam muito pela positiva (os chamados "top performers"). Isto aconteceu tanto na Matemática, como nas Ciências, nota a OCDE.
Em 2003, 30% dos alunos portugueses estavam nos patamares mais baixos de literacia matemática (nível 2 ou menos numa escala que vai até 6); em 2012, a percentagem foi de 24,9%. Ao mesmo tempo, 10,6% dos alunos conseguiram ficar no nível 5 ou mais, contra apenas 5,4% em 2003. Esta evolução teve lugar, sobretudo, no período compreendido entre 2006 e 2009, sublinha o relatório.
Chumbar não ajuda
Mas também há más notícias. Um relatório da Comissão Europeia, divulgado horas depois do PISA, faz uma interpretação dos resultados destes testes. Segundo a Comissão, a avaliação demonstra que na União Europeia o estatuto socioeconómico dos alunos tem uma incidência significativa sobre os níveis de desempenho dos jovens.
A Comissão foi ver como se saem os alunos que estão no grupo mais desfavorecido (nos 25% mais desfavorecidos segundo o índice socioeconómico construído pelos peritos do PISA) e os que pertencem a famílias com mais recursos (os 25% mais favorecidos). E a diferença nas pontuações obtidas a Matemática é particularmente significativa (100 pontos ou mais) em 8 países da União, entre os quais Portugal, França, República Checa e Alemanha. Isto mostra, diz a Comissão, "as profundas desigualdades que subsistem nos sistemas educativos".
Os dados recolhidos pelo PISA 2012 também demonstram que chumbar não faz ninguém melhorar. E que, apesar de entre 2004 e 2009 a taxa de retenção no final do ensino básico ter descido de 21,5% para 12,8%, continua acima da média da OCDE.
Números do PISA:
a)     Num percurso normal escolar, os alunos de 15 anos devem andar no 10.º ano de escolaridade;
b)     Da amostra dos mais de 5.700 portugueses que fizeram os testes PISA, os que de facto estão no 10.º conseguem uma média de 536 pontos nos testes de literacia matemática;
c)     Já os alunos que ainda estão no 7.º ano, porque chumbaram, não ultrapassam os 358 pontos, quando sujeitos aos mesmos testes. Os resultados destes alunos (os que acumulam insucesso) são ainda piores do que em 2009.
Aproveitando esta sinopse dos resultados do PISA 2012 feita pela Andreia Sanches e Bárbara Wong, que resumi e reformatei, posso dizer que alguns comentários que fiz ontem sobre a realidade da nossa Educação, sobre Rankings, liberdade de escolha e a “banha de cobra”…, sem que tivesse conhecimento deste estudo, batem certo com os números e as interpretações, mesmo que a OCDE não tenha querido estabelecer qualquer relação entre as causas e os efeitos (o que não abona a favor do rigor da análise).
Uma das conclusões mais importantes e com 2 vetores é que muito mudou em Portugal, mas o estatuto socioeconómico continua a pesar muito no sucesso das crianças, o que quer dizer que com a pobreza crescente no próximo PISA teremos piores resultados, também porque se constata que as habilitações das famílias estão fortemente ligadas aos resultados dos jovens (o que é empiricamente evidente). E por isso, a análise da Comissão Europeia aos resultados do PISA, conclui que persistem profundas desigualdades em alguns países, entre os quais Portugal, com os alunos mais pobres a obterem resultados muito mais fracos do que os alunos mais ricos, que é mais elevado…
E são estas variantes, as “tais”, que são omissas no confronto entre o ensino Público e Privado, que distorcem os famigerados rankings…
No entanto, a OCDE pensa (bem numas coisa e mal noutras) que os alunos que frequentam o pré-escolar tem mais sucesso, que o apoio individualizado (que foi chão que já deu uvas) é importante, que as TIC ajudam a melhorar as aprendizagens, que as aulas de substituição (para proletarizar os docentes) contribuíram para a melhoria e que a ação social escolar (para colmatar a pobreza e matar a fome) ajuda a equilibrar as desigualdades…
Dito isto, não posso deixar de contestar estes lóbis da Matemática (que até discordam entre si), que reduz a Educação de uma pessoa ao treino de apenas uma parte do cérebro, investindo-se forte na formação dos respetivos docentes, em detrimento de outras áreas da educação, concretamente a artística, o que retrata a tacanhez dos conceitos de EDUCAÇÃO e das necessidades humanas, relegando assim um ensino humanista…
A despropósito, o estudo faz referência ao contestado e grotesco modelo de avaliação dos professores, sem o relacionar com os resultados nem saber da inflação das notas, por ter sido um fait divers ou um “cavalo de Troia”, para incursões reformistas, substituído por estes exames a la minute para o “burro mirandês ver”…
E por falar em exames, o PISA conclui que a introdução dos exames para os alunos entretanto implementados, serviu como treino para retirar o stresse para as provas de avaliação da literacia Matemática, Científica e de Leitura… Só não diz se os alunos ficaram a saber mais do que antes dos exames.
Já a Comissão Europeia chega à conclusão, defendida por tanta gente há tanto tempo, de que chumbar não faz ninguém melhorar, como se fosse preciso constatar com todos estes testes, que os alunos retidos no 7.º ano, por exemplo, passados 3 anos, pioraram os seus resultados… É a parábola da sopa: “Dar mais sopa a comer a quem não gosta dela, fá-lo-á gostar?”…
Finalmente diz a OCDE que num curto lapso de tempo é possível melhorar a Educação de forma abrangente, mas por razões contrárias às enunciadas, num curto lapso de tempo é possível piorá-la e não nos falta nada, por razões Privadas…
PISA e papéis…
Cultura matemática. Trata-se, de acordo com a OCDE, de "formular, usar e interpretar a matemática em contextos diferentes".
Compreensão de texto. Trata-se de compreender e utilizar textos escritos, mas este conceito implica também, de acordo com a OCDE, "faculdades de interpretação, de reflexão e a capacidade de utilizar a leitura para atingir objetivos pessoais".
Cultura científica. Este domínio inclui conhecimentos em física, tecnologia, biologia, química e também noções de funcionamento e explicações científicas.

Ecos da blogosfera - 4 dez.

Só Barroso, Ashton, Van Rompuy é que não servem?

Passados 5 anos, a crise económica e financeira deixou uma profunda marca na União, aumentando a desconfiança entre os seus Estados-membros, mas também a certeza de um destino comum. É chegado o momento de iniciar uma nova liderança política e executar medidas concretas, afirma “El País”.
O furação financeiro deixou marcas na alma europeia. Uma feia cicatriz percorre o continente de Norte a Sul. Abundam os velhos e os novos estereótipos: as mentiras gregas, a delirante exuberância espanhola, a temeridade irlandesa, a liderança egoísta da Alemanha. Perante este diálogo de surdos entre credores e devedores, a descoberta é que todos os países do euro partilham o mesmo destino. Pelo caminho, esfumaram-se certezas e violaram-se tabus, ultrapassaram-se linhas vermelhas e reescreveram-se regras de ouro numa série de atropeladas decisões. Essa inundação de medidas permitiu evitar o pior, embora deixem um longo rasto de estagnação com consequências imprevisíveis. Assim se passaram 5 anos de crise: com a suspeita de que nunca houve um plano mestre para a combater, a próxima etapa é essa 2.ª refundação (depois do período constituinte dos anos de 1950 e da primeira transição, que começou com a queda do Muro, incluiu a criação do euro e culminou com a entrada do bloco Leste na UE).
As cimeiras dos últimos anos decretaram austeridade urbi et orbi: ninguém discute a receita, apesar de se admitirem erros de diagnóstico em alguns países e uma excessiva reação geral, atribuída à gravidade da crise da dívida em 2010. Bruxelas corrigiu o tiro, mas a dura realidade é que só a Alemanha recuperou o nível de PIB que tinha antes da crise. Por tudo isto, a Europa foi perdendo os europeus: a 6 meses das eleições europeias, Bruxelas está atenta perante o auge do euroceticismo. Atualmente, segundo dados do último Eurobarómetro, 60% dos europeus não confia na UE, contra 31% antes da crise.
Nebulosa Bruxelas
A União foi e é uma espécie de expedição no horizonte: nunca houve mapa para decifrar os labirintos dessa nebulosa chamada Bruxelas. Nessa eterna luta entre o possível e o desejável, a UE precisa de encontrar um caminho intermédio entre aqueles que acreditam que as turbulências obrigam a dar um salto federal (para os improváveis Estados Unidos da Europa) e aqueles que apostam na versão euro do Apocalypse Now de Coppola com música de Wagner.
“Provavelmente, não haverá nem salto federal nem desmembramento. E que se ative essa 2.ª transição, com as inevitáveis deceções, como a promessa desse hipotético regresso à Grande Política”, diz Luuk Van Middelaar, uma das vozes mais interessantes de Bruxelas. Van Middelaar — autor do inestimável livro Passagem para a Europa e dos discursos de Van Rompuy — define a União como “um estado de transição permanente”. “O que é urgente”, dispara, “é voltar a conquistar as pessoas: isso não é possível sem um plano geral e sem liderança”.
O analista Moisés Naím sustenta essa perspetiva. “Hoje, nem as instituições europeias nem os líderes políticos nacionais têm poder suficiente. […] A Europa foi forte sempre que teve lideranças fortes. A atual equipa de Bruxelas — Barroso, Ashton, Van Rompuy — já não serve.”
O mundo não está em crise, mas a Europa está. Não é económica, ou não é só económica: é uma crise política, institucional e, sobretudo, de governação. E, ao mesmo tempo, é uma espécie de vingança da história, da demografia e da geografia: inscreve-se no seio de um movimento telúrico que está a mudar o centro do mundo para o Pacífico.
O futuro é difuso
Para lá da política, ou precisamente porque prima pela sua ausência, o futuro é difuso. André Sapir, de Bruges, afirma que o cenário central da zona euro, nos próximos 5 anos, continuará a consistir em sair da crise: “O que é preocupante é que continua sem haver consenso sobre a natureza e as causas da crise: isso explica que só podemos aspirar a sair da situação”.
Daren Acemoglu, autor de um dos livros fundamentais dos últimos tempos – Porque Falham as Nações (Ed. Temas & Debates, 2013 —, faz parte do grupo dos que afirmam que a 2.ª refundação da União “está aí”. Numa entrevista a este mesmo jornal, Acemoglu via 2 revoluções entre as últimas novidades europeias: a união bancária e os exames prévios aos orçamentos nacionais. A união bancária, em especial, pode ser uma mudança de pele, uma mudança na natureza da Europa. O clube do euro esteve sempre obcecado com os vícios públicos e com a inflação, uma espécie de herança da história alemã. O euro dotou-se de mecanismos de controlo do setor público (de credibilidade duvidosa, como já se tinha visto em Maastricht); supunha-se que os mercados se autorregulavam e que os vícios privados se corrigiam sozinhos: não era preciso dar-lhes atenção. Mas a crise mudou essa abordagem: “Se, no final, a união bancária não lhe diminuir a ambição, a Europa experimentará uma mudança substancial que pode ajudá-la a corrigir os seus desequilíbrios”, vaticina Acemoglu.
Finalmente, se nada correr mal, a Europa está a caminho de acordar. Para isso, o papel do BCE, como supervisor bancário, é essencial. “Há que continuar a recuperar as finanças públicas e a fazer reformas, mas com a união bancária a Europa também dá atenção a outras fontes de vulnerabilidade. Para o BCE, isso vai ser um mergulho na realidade, uma queda do Olimpo”, conclui uma fonte comunitária.