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sábado, 26 de outubro de 2013

Um contraditório seguro a uma incauta verdade?

Há declarações incompreensíveis, formas inúteis de fazer oposição. Mais do que todo o populismo, a que os partidos nos habituaram, o que mais custa é quando, em política, se opta pelo caminho da desinformação. E tem sido esse, infelizmente, o caminho seguido pelo PS de António José Seguro. 
Sílvia de Oliveira (Jornalista)
Mas enfim, de política saberá, ou não, Seguro. Eu proponho-me apenas contribuir para a informação geral, coisa que o secretário-geral do PS e o seu partido têm desprezado. Um programa cautelar não é a mesma coisa que um 2.º resgate. 
Na Grécia antiga a verdade era definida em função da aderência de um facto, ocorrência ou entidade à realidade; a verdade é o reconhecimento do real. A verdade é ‘tangível’, substantiva, pode ser revelada. Bem sei que desde então muitos outros discorreram sobre o conceito de verdade; mas hoje, na vida política, mais do que nunca, a verdade é necessária. A verdade é real, mas não transacionável. E o PS e o Secretário-Geral do PS não trocam a verdade pela mentira (como sugeriu Sílvia de Oliveira no “Dinheiro Vivo” e nas páginas do DN desta quinta-feira) e, ao contrário de outros, não usamos a palavra ‘verdade’ como capa de mentiras convenientes. Dirão alguns que a mentira pode ser piedosa… Será seguramente essa a abordagem que muitos adotam quando se referem ao possível programa cautelar.
Eurico Brilhante Dias (Secretário Nacional do PS)
Mas vejamos então o que é verdade ou, como diriam os gregos antigos, o que é real. A verdade é que desde Maio 2011 que o PAEF (Programa de Assistência Económica e Financeira) assumiu 3 objetivos: a consolidação orçamental (défice estrutural de 0,5% em 2014), a implementação de uma agenda de reformas estruturais, e o regresso pleno aos mercados (23 de Setembro de 2013 foi até a data anunciada como o verdadeiro momento de regresso). A verdade é que estamos longe de alcançar estes objetivos.
É verdade que dissemos que o OE12 tinha folgas – uma verdade que convenientemente foi desmentida mas que o INE e a própria UTAO não deixaram mais tarde de confirmar. Também é verdade que, entre outras propostas, propusemos – tal como a CIP agora – que parte do resgate não utilizado fosse aplicado num instrumento de capitalização das PMEs. E, também é verdade que dissemos que aumentar o IVA da restauração era uma medida economicamente pouco inteligente. É verdade que cada vez mais portugueses – e até alguns membros do Governo – dizem que sem crescimento económico e a criação de emprego não é possível consolidar as contas públicas. É verdade que no início o PS esteve praticamente sozinho defendendo esta posição, mas também é verdade que hoje são os austerófilos que estão isolados.
Também é verdade que dissemos que Portugal, aplicando-se a receita de austeridade “custe o que custar”, não resolveria a sua crise. Iria adensá-la e encaminhava-se para um 2.º programa, e esse 2.º programa não seria bom para nenhum português. E é verdade que dissemos que aquilo a que chamam programa cautelar é um 2.º programa; e é também verdade que, tal como disse a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, ninguém sabe que tipo de condicionalidade será imposta a Portugal na subscrição desse programa. É verdade que ninguém sabe se a condicionalidade será melhor ou pior do que a condicionalidade de um 2.º resgate – ou mesmo se será exatamente igual.
É por isso que é mentira que não digamos – em particular o Secretário-Geral do PS – a verdade quando afirmamos a única coisa real que hoje se pode dizer sobre o eventual programa cautelar: será um 2.º programa com condicionalidade (seja ela ao abrigo de um linha de crédito precaucionária ou de outros instrumentos do mecanismo de estabilidade). É por isso que se trata de desinformação quando se diz, como vêm dizendo os repetidores do Governo, que o programa cautelar não trará associado um programa de austeridade, ou mesmo que fará de Portugal um Estado-Membro menos dependente do exterior. E, como é óbvio, não se sabe se o programa cautelar será igual ao da Irlanda (se houver), ou mais próximo do 2.º resgate à Grécia. Porque como diriam os gregos na antiga Grécia: a verdade é o que é aderente à realidade; e na realidade só há a convicção, e não a certeza, de que teremos um 2.º programa. E isso significará – lá isso será verdade – que este programa de resgate não atingiu os seus objetivos. Quer dizer: falhou. É por isso que a verdade não nos fica só bem: assenta-nos como uma luva (branca).
Não se pode deixar de notar a linguagem política da jornalista e a linguagem técnica do político…

Ecos da blogosfera - 26 out.

Muda a hora ou é hora de mudança? Veja o cardápio…

Quando os ponteiros dos relógios recuarem este fim-de-semana, na madrugada de domingo, ganhamos uma hora extra nas nossas vidas (mesmo que não seja verdade, mas pareça). O jornal The Guardian deu algumas sugestões de tarefas que se podem fazer em 60 minutos e que ajudam a poupar dinheiro.
10 ideias:
1. Mude de fornecedor de energia
Em janeiro de 2014, o preço da luz vai subir 2,8%, o que se reflete num aumento de 1,21 euros por mês numa conta média mensal de 46,5 euros (já com 23% de IVA). Mas o mercado livre de energia está a crescer. No mercado doméstico e das pequenas empresas, há 5 empresas concorrentes com diferentes ofertas. Se está a pagar mais do que queria, mude de fornecedor. A sua parte deste processo deve ficar pronta em menos de 1 hora.
2. Procure os depósitos bancários mais generosos
Se tem dinheiro investido, gaste 1 hora a procurar quanto rendem os vários depósitos a prazo, para perceber se está a beneficiar da melhor taxa. Não precisa de o fazer sozinho: a DECO tem no seu site um simulador para ver qual o melhor depósito, consoante o montante aplicado e o prazo do investimento.
3. Semeie alguns legumes, até na varanda
Só demora alguns segundos enterrar algumas sementes na terra, mas isto pode poupar o preço de um pacote de salada por semana (considere-se uma média de 2 euros por pacote de salada de 150 gramas) e reduzir o desperdício. Um saco de sementes de legumes custa à volta de 1,30 euros.
4. Troque o que não precisa
Se comprou recentemente algo que não tem a certeza se quer realmente, ou que nunca chegou a usar, 1 hora é o suficiente para voltar à loja, devolver o produto e receber o dinheiro de volta (isto, claro, dependendo da política de devolução de cada loja).
5. Planeie as suas refeições para a semana
Há vários planeadores online de refeições (veja, por exemplo, o Vita Lunch ou o do Continente). Planear as refeições permite utilizar comida que já tem em casa e evita que compre mais do que precisa quando for às compras.
6. Mantenha-se informado
Comece a seguir nas redes sociais a sala de cinema mais próxima, o seu restaurante ou café preferidos. Muitos anunciam os melhores descontos, promoções ou campanhas nestes meios.
7. Faça sopa
Antes que se estrague, gaste uma hora a transformar a comida que tem no frigorífico em sopa ou molhos que possa congelar.
8. Confira os débitos diretos que estão a ser-lhe cobrados
Os consumidores pagam milhares de euros por adesão a ginásios dos quais já não usufruem, seguros ou subscrições de revistas. Certifique-se de que não está a pagar o que já não quer e cancele quaisquer pagamentos desnecessários. Pode, aliás, precaver-se deste tipo de situação: ao autorizar um débito direto, pode introduzir 2 limites – um temporal e outro de montante máximo a debitar. No primeiro, o consumidor define a data limite para a autorização do débito direto. No segundo, o consumidor define um limite máximo do montante que poderá ser-lhe debitado. Estes limites podem ser definidos no momento da concessão da autorização de débito direto, ou posteriormente no seu banco, numa caixa Multibanco ou online, no site do seu banco.
9. Transforme aquilo que já não quer em algo útil
Com o inverno a chegar, por que não trocar o processador de comida que nunca usa por um par de botas? Ou oferecer uma estadia em sua casa em troca de umas férias noutro sítio? Faça uma lista de todas as coisas que tem e já não quer e, depois, procure sites de trocas. Experimente o Troca-se ou o Troca Shop. Se não quiser trocar, pode tentar vender em sites como o Custo Justo, o Olx ou o Coisas.
10. Instale dispositivos para poupar água
Em julho deste ano, a Deco concluiu que instalar dispositivos eficientes pode poupar mais de 50% face aos aparelhos convencionais. No teste que fizeram a chuveiros e limitadores de caudal para duches e torneiras, encontraram disparidades de 211 euros anuais na poupança de água entre o melhor e o pior chuveiro de mão. Veja aqui a seleção da associação de defesa dos consumidores dos melhores dispositivos para torneiras e chuveiros.

Contramaré… 26 out.

Os chefes de Estado ou líderes políticos estão equipados com sofisticados aparelhos para se comunicar ou trocar informações sensíveis, mas também usam diariamente smartphones comuns, que podem facilitar as tentativas de espionagem.
Barack Obama chegou em 2009 à Casa Branca precedido por uma reputação de grande fã do Blackberry, mas precisou de lutar para conservar o seu smartphone, antes de obter um modelo ultraprotegido aceite pela equipa jurídica da presidência e pelo Serviço Secreto, que protege os presidentes.

sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Se os Estados podem espiar, o cidadão também pode?

Talvez se deva começar por estas palavras de Madeleine Abright para se compreender, ou não, a leviandade de uma pessoa que foi Secretária de Estado dos EUA, e o rosto do poderio, e ser capaz de dizer o que disse, sem qualquer problema de consciência…
E é aqui que se define a fronteira moral e ética (por enquanto) entre a cultura europeia e as outras: a liberdade de expressão e as liberdades individuais.
Os líderes da União Europeia divulgaram um comunicado nesta sexta-feira (25) dizendo que a desconfiança sobre o esquema de espionagem dos EUA poderá prejudicar os esforços mundiais no combate ao terrorismo.
No entanto, as nações europeias ressaltam no comunicado que dão valor à "relação próxima" que possuem com os EUA. O assunto acabou por dominar uma cimeira de chefes de Estado do bloco europeu em Bruxelas nesta semana, depois de as imprensas da Alemanha e da França revelaram novas denúncias de espionagem norte-americana.
A Agência Nacional de Segurança dos Estados Unidos (NSA, na sigla em inglês) teria monitorado ligações telefónicas da chanceler alemã Angela Merkel. Na França, a agência teria monitorado milhões de telefonemas de diversos cidadãos.
Agora, a França e a Alemanha estão a fazer pressão para um "entendimento" com os EUA até ao fim do ano. Na quinta-feira, surgiram novas denúncias no jornal britânico The Guardian de que a NSA teria monitorado os telefonemas de 35 líderes globais.
'Sementes da desconfiança'
No final da cimeira, Merkel disse que Europa e os EUA enfrentam "desafios comuns" e que "não pode haver espionagem entre amigos" e afirmou que "as sementes da desconfiança foram plantadas" e que isso dificulta a cooperação no setor da inteligência. "Ficou claro que algo precisa mudar para o futuro, e de forma significativa", disse a chanceler. "Vamos colocar todos os nossos esforços para forjar um entendimento mútuo até ao fim do ano para cooperação das agências de inteligência da Alemanha e dos EUA, e da França dos EUA, para criar uma estrutura de cooperação."
O comunicado dos chefes de Estado europeus disse que as revelações causaram "profundas preocupações" entre os cidadãos europeus e que "uma falta de confiança pode prejudicar a cooperação necessária no campo da recolha da inteligência".
O editor para Europa da BBC Gavin Hewitt disse que os governos alemão e francês querem um novo pacto com os EUA que estabeleça, na sua essência, a "não espionagem" entre as partes.
Para Hewitt, o entendimento poderia seguir os moldes de um acordo feito entre os EUA e Reino Unido, Nova Zelândia e Canadá após a II Guerra Mundial, uma operação de inteligência conhecida como Five Eyes (5 Olhos, em tradução livre).
O porta-voz da Casa Branca Jay Carney disse que o presidente Barack Obama deu garantias a Merkel pelo telefone de que ela não estava a ser monitorada agora e que não seria no futuro. Esta declaração, entretanto, acabou por dar crédito às alegações de que telefonemas da chanceler alemã foram monitorados no passado.
Só é pena que, só agora, os líderes europeus tenham sentido o peso e a gravidade dos abusos de um país, que se acha no direito de vasculhar a vida de cidadãos livres e chega ao cúmulo de espiar os próprios pares do seu presidente e de países aliados, sem que se tenham insurgido quando a presidente do Brasil denunciou idêntico tratamento...
O que para os norte-americanos é lícito e legítimo, por cá é considerado crime contra o direito à privacidade, apesar dos pecadilhos cometidos por alguns países europeus ao terem beneficiado do esquema, quando recorreram às fontes (inquinadas) americanas, em proveito próprio.
Quem com ferros mata, com ferros morre…
E aqui ficam registados os vários episódios de uma novela de cordel.
Denúncias pelo vazamento de Snowden:

Ecos da blogosfera - 25 out.

Há terrorismo e terrorismo, há terroristas e terroristas…

Segundo uma investigação do Spiegel Online “o Governo alemão recebeu indicações de que o telemóvel da chanceler alemã poderá ter sido escutado pelos serviços secretos norte-americanos”, escreve o Süddeutsche Zeitung.
A 23 de outubro, horas depois destas revelações, Angela Merkel telefonou ao Presidente norte-americano Barack Obama para lhe pedir “explicações imediatas e completas” sobre essas acusações, escreve o diário, para o qual um ataque contra o seu telefone seria um ataque contra o coração político de Angela Merkel. É difícil imaginar que uma maior afronta possa ser cometida por um Estado amigo. Se os serviços secretos americanos a espiaram mesmo, o caso da NSA assume uma nova dimensão.
A cimeira dos líderes da União Europeia começou nesta quinta-feira à tarde, em Bruxelas, num contexto de tensão com as revelações da rede de espionagem dos Estados Unidos que abalaram a confiança dos seus parceiros europeus.
Um dos pontos a serem discutidos na cimeira é a proteção dos dados pessoais. A Comissão Europeia promove uma reforma da legislação que rege a questão, elaborada quando a internet ainda não alcançava todos os âmbitos da vida privada. Bruxelas quer que os grandes grupos da internet obtenham o consentimento prévio das pessoas para o uso dos seus dados pessoais, sob pena de multas.
O Parlamento Europeu pediu à Comissão Europeia para suspender o acordo UE-EUA sobre a transferência de dados bancários, assinado no âmbito da luta contra o financiamento do terrorismo.
A colocação sob escuta do telemóvel de Angela Merkel prova sobretudo uma coisa: o descontrolo dos serviços secretos dos Estados Unidos, após os ataques de 11 de setembro, ganhou claramente proporções alarmantes.
É provável que Vladimir Putin tenha ido para a cama, na noite passada, com um sorriso de orelha a orelha. De facto, as revelações de que os serviços secretos norte-americanos terão escutado conversas telefónicas privadas da chanceler alemã começam por parecer uma brincadeira.
Um chefe de Estado europeu que nunca manifestou atitudes antiamericanas ao longo da sua carreira política, que defendeu fortemente o eixo transatlântico, é colocado sob escuta pelos norte-americanos? No Kremlin, devem ter-se rebolado a rir.
No entanto, na presente situação, esta notícia clamorosa não parece desprovida de fundamento. As reações da Chancelaria Federal e da Casa Branca sugerem que, pelo menos, a história revelada pelo Spiegel não é uma efabulação. Embora seja ainda muito cedo para avaliar a extensão do escândalo, temos já uma ideia de algumas questões que levanta.
Atitude paranoica
Que crédito dá o BND [os serviços secretos alemães] a essas escutas? Para começar, era bom saber a razão pela qual esta incrível “quebra de confiança” não foi descoberta pelas autoridades alemãs, mas por jornalistas. Considerará o BND que a colocação sob escuta do mais poderoso dirigente político da Europa é um caso de somenos importância?
Depois, há que perceber quem controla os serviços secretos dos Estados Unidos. Angela Merkel não é a primeira chefe de Estado a quem isto acontece. A Presidente do Brasil, Dilma Rousseff, está manifestamente na mira da NSA [os serviços de informação dos EUA] – e cancelou mesmo, em setembro, uma visita oficial aos Estados Unidos.
Passados poucos dias, o embaixador dos Estados Unidos em França foi convocado pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros em Paris, porque havia suspeitas de espionagem industrial dos EUA, a coberto da luta contra o terrorismo.
A questão foi levantada por Peer Steinbrück, candidato às eleições alemãs, durante a recente campanha eleitoral. Muitos consideraram, então, uma atitude paranoica. Hoje, parece que era uma desconfiança mais do que legítima.
Coesão política ameaçada
O facto de a República Federal da Alemanha ser tributária da proteção dos Estados Unidos, isso de forma alguma autoriza a potência protetora a colocar-se acima da lei e das regras diplomáticas. Nos Estados Unidos, o descontrolo dos serviços secretos a partir dos ataques de 11 de setembro ganha claramente proporções alarmantes. Este tipo de práticas mina os valores e a coesão política do Ocidente.
É muito cedo para avaliar as implicações políticas deste escândalo. Será ainda possível acreditar nos protestos de Washington, que alega não passar tudo de um mal-entendido? Provavelmente não. Quando os chefes de Estado são transformados em alvos, não se trata de um acaso, mas de uma estratégia cuidadosamente amadurecida. O caso das escutas da NSA pode ter repercussões políticas consideráveis e levar a um espetacular encontro de placas tectónicas dos dois lados do Atlântico.

Contramaré… 25 out.

A dívida pública portuguesa aumentou para 131,3% do PIB no 2.º trimestre deste ano, depois de no trimestre anterior ter sido de 127,5% do PIB.
De acordo com os dados trimestrais da dívida pública do Eurostat, só a Grécia (169,1%) e a Itália (133,3%) registaram rácios de dívida pública, em percentagem do PIB, superiores ao de Portugal, no mesmo período.

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Sugestão de UM “Plano B”, que devia ser O “Plano A”

A sugestão partiu do presidente do Banco Espírito Santo de Investimento (BESI): os encargos do Estado com as parcerias público-privado (os juros pelos negócios das estradas, basicamente) deviam beneficiar de um período de “carência” no seu pagamento em 2014.
Os contribuintes serão chamados a pagar, em termos líquidos, 1.166 milhões de euros pelas PPP rodoviárias. Se houvesse renegociação nos termos do serviço da dívida, “por 1 ou 2 anos”, como disse José Maria Ricciardi em entrevista ao Dinheiro Vivo, o alívio no défice poderia ir desse valor até a um mínimo de quase 600 milhões.
O presidente do BESI defendeu que “a obrigação do governo é arranjar medidas alternativas” aos possíveis chumbos de medidas do Tribunal Constitucional. “Por exemplo, em 2014 vamos passar a pagar 1.600 milhões de euros nas PPP, nomeadamente com a entrada do serviço da dívida das rodovias. Não sei se não era possível renegociar mais 1 ano ou 2 desse serviço da dívida. Não é deixar de pagar, mas se houvesse uma maior carência nesse serviço da dívida isso poderia ser uma compensação”, indicou o banqueiro.
Ora, se a fatura devida em 2014 com as parcerias ruinosas no sector rodoviário fosse diluída em 2 anos, a preços constantes desse ano significava que os juros podiam ser reduzidos em 583 milhões de euros (0,3% do produto interno bruto); se a negociação fosse feita para pagar em 3 tranches (3 anos), os encargos anuais desceriam para 777 milhões de euros (0,5%).
Se a carência fosse total, como parece sugerir o banqueiro, Portugal livrava-se desse fardo de 1.166 milhões de euros (0,7% do PIB) em 2014, ano decisivo para tentar regressar aos mercados e evitar um 2.º resgate ou condições mais duras num programa cautelar. Mas, claro, iria sobrecarregar os anos a seguir e seria expectável que um adiamento das responsabilidades originasse uma pressão crescente muito grande ao nível das taxas de juro dos contratos. A meta para o défice do próximo ano é 4%.
As PPP rodoviárias, negócios em que o grupo Espírito Santo até nem está muito exposto financeiramente, formam a fatia de leão (71%) dos encargos totais líquidos, que ascendem a 1.645 milhões de euros só em 2014, diz o relatório do Orçamento do Estado.
Para além dos 1.166 milhões das estradas, os contribuintes terão de pagar mais 418 milhões nas PPP da saúde (em que o grupo Melo, mas também o BES estão envolvidos, por exemplo).
Ricciardi alertou que “não podemos correr o risco de ter um 2.º resgate. Portanto, se alguma destas medidas for reprovada, temos de conseguir arranjar alternativas”.
Quando o governo diz, mais uma vez, que não tem “Plano B” para os chumbos previstos do TC, eis que surge uma sugestão defendida por toda a gente há muito tempo e que se traduz em ir buscar dinheiro onde o há, ou reduzir os compromissos contratualizados e excessivos, concretamente às PPP.
Vindo a sugestão de um banqueiro, só agora, desconfia-se que a incorporação da banca no grupo dos pagadores das suas próprias responsabilidades fez despoletar esta ideia de justiça para todos os “grandes”. Mesmo assim, não deixa de ser justa…
O problema das PPP, que tanta tinta tem feito correr, quer pela responsabilização dos governos contratantes, quer pelos enormes montantes, quer pelas exageradas garantias para os contratados, quer pela inépcia deste governo na renegociação ou denúncia dos respetivos contratos, de modo a repor-se o equilíbrio entre os investidores e os pagadores, surge agora, “inocentemente”, porque o proponente, como muita gente, sabe que o governo “tem uma pedra no sapato”, ou mais bem dito, tem um membro no governo, responsável por estas negociações, que antes de ser governo foi o negociador, do outro lado, com o governo anterior, o que pode traduzir-se num handicap para o seu subconsciente e poder funcionar como travão…
Estranho é que sobre as swaps, um dos intervenientes nas negociatas e proposto para o governo tenha dado origem a uma repulsa moralista e sobre este caso nunca se tenha levantado qualquer óbice…
Sem por em causa a honestidade profissional do Secretário das Obras Públicas, seria de todo aconselhável que o assunto mudasse de mãos, para ninguém pensar que há incompatibilidades, que o próprio Código do Procedimento Administrativo prevê.
Já é chavão, mas “em política é preciso parecer-se sério”…
Mas o fulcro da questão é só, os “ricos que paguem a crise”, não por qualquer razão político-ideológica, mas porque foram eles que a geraram e lhes pertence…
Esperemos que o governo tenha lido a sugestão e entendido o que nós entendemos…
Sérgio Monteiro, que tem a pasta das Obras Públicas, trabalhou com o consórcio Elos na coordenação do financiamento ao contrato de construção do troço de alta velocidade (TGV) Poceirão/Caia. Agora, enquanto governante, vai ter um papel-chave no processo de reavaliação deste investimento e na eventual renegociação do contrato adjudicado ao consórcio para o qual já trabalhou.
A Caixa BI, em conjunto com o BESI, são as duas entidades coordenadoras do financiamento do consórcio Elos, que ganhou esta obra, avaliada em 1.500 milhões de euros. Nessa qualidade são ainda accionistas do agrupamento constituído para este projecto.
Sérgio Monteiro foi nomeado administrador da Caixa BI em Maio deste ano (2011) , tendo até então sido responsável pela área de project finance. Nesta qualidade passaram pelas suas mãos quase todos as parcerias público-privadas (PPP) contratualizadas em Portugal nos últimos anos, já que o banco de investimento da Caixa tem sido a instituição nacional mais activa no financiamento às PPP.
Sobretudo desde que, a partir de 2008, os bancos internacionais começaram a fechar a porta aos projectos nacionais, a Caixa BI participou no financiamento dos consórcios privados em pelo menos 7 concessões rodoviárias que foram adjudicadas pelo anterior governo.
Numa biografia de Sérgio Monteiro, no quadro de uma conferência sobre PPP realizada em 2008, é referida a sua coordenação dos projectos da Auto-Estradas Douro Litoral e Auto-Estradas do Marão. A CaixaBI é igualmente financiadora das concessões rodoviárias Baixo Tejo, Baixo Alentejo, Algarve Litoral Douro Interior e Litoral Oeste.
No início de 2010, pouco depois de o Tribunal de Contas ter recusado dar visto a estas concessões já depois de adjudicadas, Sérgio Monteiro disse num seminário sobre PPP da revista "Project Finance" que o chumbo era "uma nuvem" que tem de desaparecer para o sol voltar.
A experiência do novo secretário de Estado nestas matérias valeu-lhe a indicação para participar no grupo de trabalho para reavaliação das PPP, criadas pelo PS e pelo PSD, mas que não chegou contudo a apresentar conclusões. Curiosamente, o nome de Sérgio Monteiro, que hoje faz parte de um governo PSD/CDS, foi proposto pelo governo de José Sócrates.
Com este currículo, o secretário de Estado das Obras Públicas estará especialmente à vontade, pelo menos do ponto de vista técnico, para reavaliar todos os contratos de PPP e eventuais pedidos de indemnização do consórcio. Só que agora está do outro lado. Até Agosto, o governo tem de concluir uma primeira avaliação às 20 maiores PPP, entre as quais se incluem a Estradas de Portugal, o TGV e todas as concessões rodoviárias.
Só em construção e em concurso estão 12 PPP que representam um investimento global de 6.500 milhões de euros. Neste bolo, o maior peso pertence às 9 concessões rodoviárias que mobilizam um investimento de mais de 4.000 milhões de euros. Em valor seguem-se o troço Poceirão/Caia do TGV e 3 hospitais em concurso.

Ecos da blogosfera - 24 out.

Há chinesização no ‘custo/trabalho/hora’ na Europa?

A Amazon vai abrir 3 grandes centros de logística na Polónia. Uma boa notícia? Na verdade não, porque os empregos serão precários e mal pagos. E o país está errado se pensa que vai tornar-se competitivo por esta via.
Para uma maioria de dirigentes de grandes empresas internacionais, a Polónia é, antes de mais, um país com mão-de-obra barata, e não um modelo de inovação. Esta é a perceção da maioria dos responsáveis das multinacionais que responderam a um estudo recente sobre o que a Polónia oferece aos investidores estrangeiros.
O milionário americano e fundador da Amazon, Jeff Bezos, numa visita recente à Polónia partilha desta opinião. Para o gigante de vendas na Internet, a Polónia não passa de uma reserva de mais de 2.000.000 de desempregados, prontos a trabalhar, não apenas pelo salário mínimo mas à tarefa, à hora, algumas semanas por ano.
A Amazon vai abrir 3 centros logísticos na Polónia, com 2.000 postos de trabalho permanentes e 3.000 temporários em cada local. “Estamos muito contentes com a entrada da Amazon na Polónia. A criação de milhares de empregos é um elemento essencial para o nosso crescimento económico”, assegurou o vice-primeiro-ministro e ministro da Economia Janusz Piechociński.
Uma falsa alegria
Vários peritos duvidam que a empresa americana mereça tantos aplausos da Polónia. Segundo os assessores fiscais, a Amazon pagará poucos impostos, porque os centros logísticos geram, sobretudo, custos. A parte mais rentável da empresa, ou seja, a venda de produtos, fica fora da Polónia. Quanto aos tais preciosos empregos, não passam de pura ficção. É sabido que a Amazon só tem um punhado de pessoas a tempo inteiro, e paga a todos os outros o mínimo possível.
Em Bad Hersfeld, o maior centro de distribuição da Amazon na Europa, que emprega vários polacos, a média é de 9 euros brutos por hora, enquanto o salário mínimo oficial é ligeiramente superior a 8 euros. Mesmo os alemães não qualificados recusam-se a trabalhar por tão pouco, explica Jerzy Fulara, dirigente da empresa de trabalho temporário Pracomania.pl, a trabalhar há alguns anos no mercado alemão que faz muitas vezes recrutamento para a Amazon.
Questionado sobre os salários polacos, a Amazon respondeu ao Wprostque serão “competitivos” relativamente aos salários do setor da logística. Jerzy Fulara explica que uma tarifa atrativa significa 10-12 zlotis por hora (menos de 3 euros), ou seja um salário mensal próximo do mínimo.
“Tenho dúvidas de que, nos arredores de Poznan ou de Wroclaw, consigam encontrar milhares de pessoas dispostas a trabalhar por esse preço. Esta falta será provavelmente colmatada com trabalhadores oriundos de outras regiões polacas bastante afetadas pelo desemprego. Estas pessoas vão, claramente, ficar a perder, porque se têm de partir para arranjar trabalho, seria mais rentável optar pelo trabalho temporário em Bad Hersfeld”, assegura Jerzy Fulara.
Polacos, os miseráveis
Merecemos a nossa reputação de europeus imbecis: “temos a taxa de desemprego mais elevada e os salários mais baixos. Por causa disso podemos oferecer aos investidores enormes recursos de mão-de-obra barata”, pode ler-se no folheto oficial de Vármia-Masúria ‘Investir na Polónia 2014’. O Hackett Group, uma empresa especialista em redução de custos de produção é da mesma opinião. “A seguir à China e à Índia, a Polónia é o melhor local do mundo para os investidores reduzirem os custos de produção. Isto deve-se ao facto de os custos de mão-de-obra local serem metade dos da Europa Ocidental ou dos Estados Unidos”, pode ler-se num relatório recente que dificilmente se pode considerar um elogio.
Mais de 100.000 polacos trabalham nas BPO (Business Process Outsourcing), centros externos que prestam serviços a outras empresas como plataformas de atendimento telefónico, contabilidade de bancos estrangeiros ou gabinetes informáticos. Esta atividade é uma verdadeira especialidade polaca, como testemunham as 600 pessoas empregadas em Cracóvia pela empresa americana de serviços financeiros State Street. O nosso sucesso deve-se ao facto de que num posto de trabalho equivalente, um polaco no cargo de especialista júnior ganha cerca de 100 euros menos do que um húngaro e menos 75 do que um checo.
Quem fica a ganhar?
“A competitividade que assenta unicamente nos custos de mão-de-obra, em vez da inovação, é uma das razões pelas quais aparecemos sempre na categoria dos cidadãos europeus mais mal pagos”, resume Ryszard Florek, proprietário da empresa Fakro, fabricante de janelas de sótão e um dos raros empresários polacos que opera a uma escala mundial.
“Os empregos de baixo custo são indispensáveis, mas não contribuem para o enriquecimento da sociedade polaca. Os principais lucros são gerados pelas empresas capazes de desenvolver produtos inovadores e vendê-los nos mercados estrangeiros.”

Contramaré… 24 out.

Por acórdão de 10 de outubro, o STJ confirma a decisão das 2 instâncias inferiores, declarando a resolução do contrato 'swap' celebrado em agosto de 2008 entre um empresário de Barcelos e um banco, condenando o banco a restituir ao empresário os 44.709 euros que pagara, acrescidos de juros.
O tribunal lembra que a descida das taxas de juro resultou de uma situação “excecional e completamente anormal” do sistema financeiro, que provocou “um grande e profundo desequilíbrio” no contrato 'swap', passando o empresário de Barcelos a suportar “um assinalável encargo e um enorme prejuízo”.

quarta-feira, 23 de outubro de 2013

A verdade não é preta nem branca, nem sequer a cores

Gosto desta ministra das Finanças! Não a conheço pessoalmente, mas hoje apetecia-me seguir Nicolau Santos e escrever-lhe um verso. Só que não há poesia neste Orçamento do Estado.
Sérgio Figueiredo
Mesmo que as metáforas de Fernando Sobral descubram na sua autora um sorriso à Gioconda, falta arte num País que ficou incapaz de desenhar seu próprio destino.
É verdade que podia refugiar-me na prosa impressiva de Pedro, o nosso guerreiro - mas como escapar aos números?! Que são implacáveis e estão-nos a deixar sem palavras.
Também gostava de acreditar nas conversas que se ouvem sobre este ciclo - só que isto é para a vida. Cortar salários e pensões não é toda a verdade. Muito menos parte da solução.
Esta Nação foi sempre feita a partir do Estado. É essa a fatura que estamos agora a pagar. É essa mudança inédita e radical que estamos a viver.
A perplexidade não começou agora com o Orçamento de 2014, mas o Estado a esvair-se, sim, isso é inédito, isso é doravante indisfarçável, porque a carga fiscal já não aguenta mais.
O Estado desfaz-se, mas a Nação não está a ser preparada. Tal como não foi na década de 80, era primeiro-ministro o atual inquilino do palácio cor-de-rosa em Belém, quando o País abraçava de corpo e alma o liberalismo do laisser faire europeu e a sociedade portuguesa não foi preparada para enrijecer.
Os cortes magoam, mas o que revolta é a omissão. Ninguém avisa que este violento ataque à despesa não é suficiente para que, no fim do próximo ano, o Estado gaste finalmente menos do que arrecada.
É um feito da ministra Albuquerque. Não faz é história. Porque Portugal precisa de 20 anos de saldos orçamentais primários consecutivos e crescentes, que estas medidas evidentemente não garantem, mas que se tornam indispensáveis para não cairmos na situação de país insolvente.
Também é evidente que, com economia e emprego, a coisa fica menos dolorosa. Até ao fim desta década, precisamos de um PIB a crescer entre 2% e 3%, o mínimo para inverter a tendência da espiral de endividamento.
O “crescimento natural” da economia português é negativo desde 2010 (algo inédito desde a década de 60) e recuperar uma taxa potencial de crescimento económico de 3% implica reconstruir aquilo que há mais de 15 anos se perdeu.
Martin Wolf não escreve poemas e a sua prosa é concisa e clara: “Portugal não tem qualquer grau de liberdade”, veio cá dizer-nos em julho.
Paulo Portas não ouviu porque estava então a preparar o “harakiri” do Governo. Confundiu “não ter liberdade” com “ficar preso” e, na vez da irrevogável reforma do Estado com que se comprometeu, preferiu declarar o fim da austeridade.
Declarar o fim da austeridade não é fuga para a frente. Nem é descaramento e despudor.
É a confirmação de que o absurdo não acabou nos chifres simulados em 2 dedos espetados na testa de um ministro que, também ele, já antes anunciara o fim da crise.
Qual crise? Qual fim? E que princípios? Terá de ser assim? Sempre que começa a verdade acabam os ministros?
Este Orçamento prepara o fim do Programa de Ajustamento, mas quem explica que o ajustamento mal começou?!
Estamos ao nível do gesto que tramou Pinho e do “minuto José Gomes Ferreira”, que pode perfeitamente proclamar que “o povo anda a ser encornado por estes senhores”.
O Governo ensaia a celebração da saída da troika e as oposições ignoram que nos mantemos barricados. Quem não pode pedir emprestado tem de ter a austeridade. Quem tem um constrangimento orçamental tem de viver com ele.
Esta é a nossa trincheira, a que Maria Albuquerque chama o seu Orçamento. A sustentabilidade da dívida, as medidas para regressar aos mercados, os cortes ficam e o FMI sai. A fraca agenda que nos fica, desta troika que passa.
Este Orçamento é o último do resgate, se for este o último dos orçamentos - afinal, o Tribunal Constitucional é o único tribunal que funciona em Portugal.
E haverá sempre um Camilo Lourenço, órfão de Gaspar e descendente de Júlio César, que arruma definitivamente a questão: “Há nos confins da Ibéria um povo que não se governa nem se deixa governar.”
Para quem ler devagar a opinião deste articulista verá que o que parece à primeira vista, não o é, antes pelo contrário e veremos uma defesa da austeridade, em cima de quem a tem suportado, injustamente, enquanto a banca e as grandes empresas (como a EDP) tem gozado com o pagode…
E o que é simuladamente abordado na notícia acima é desmontado descaradamente no artigo abaixo, denunciando o “erro” dos alvos escolhidos, numa perspetiva quase apolíica e apenas contabilística…
Devia ser o contrário, para quem conhecer ambos os opinadores, mas como nos dias de hoje anda quase tudo invertido…
Leiam ambos e tirem conclusões…
Com consumidores depauperados e empresas descapitalizadas, o crescimento é impossível.
Paulo Morais
Sem qualquer ponta de sensibilidade, a ministra das finanças apresentou um orçamento do estado para 2014 (OE) cruel, injusto e até anti-económico.
É cruel. Prevendo cortes salariais a quem ganhe pouco mais de 600 euros por mês, condena as pessoas à fome e agrava a sua situação de miséria. É iníquo, pois reduz os recursos aos idosos, a portugueses com mais de 80 ou até 90 anos, revelando uma absoluta ingratidão face às gerações que nos precederam na construção do país.
A Lei do OE é, além do mais, injusta: fustiga os trabalhadores com mais impostos, reduz salários e pensões, ao mesmo tempo que garante um acréscimo colossal em pagamentos aos concessionários das parcerias público-privadas. É ainda através deste documento que o estado premeia o setor financeiro, priorizando o pagamento de juros da dívida pública, que orçam em muitos milhares de milhões. Acresce ainda que este OE manterá as escandalosas isenções fiscais a detentores de fundos de investimento imobiliário fechados. Ou seja, o OE apela ao pagamento da crise a todos, exceto àqueles que mais para ela contribuíram: banca e especuladores imobiliários.
Por último, o OE é recessivo. Em primeiro lugar, porque transmite o sinal de que tudo é alterável, à exceção da intocável dívida pública. Incentiva a Banca a especular com títulos da dívida, como vem acontecendo, em detrimento do financiamento da atividade económica. Até os empréstimos internacionais destinados à recapitalização da Banca estão a ser desviados para a especulação. Mas também a redução salarial generalizada tem efeitos perversos. Uma poupança forçada de caráter geral é negativa, porquanto implica menor consumo, consequente escassez de recursos nas empresas, maior desemprego. Com consumidores depauperados e empresas descapitalizadas, o crescimento económico é impossível.
A ministra Maria Luís Albuquerque fez um longo discurso aquando da apresentação do OE. Mas poderia ter resumido assim: "Portugueses, temos de gastar mais dinheiro em juros e parcerias público-privadas em 2014. Por isso, temos de baixar os salários da função pública, reduzir pensões e reformas, limitar o crédito à atividade económica e aumentar os impostos a todos. Aguentem!".
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Ecos da blogosfera - 23 out.

Por que os cidadãos da UE deixaram de ser europeus?

Ao renunciar ao que a Europa tem de melhor, o seu humanismo e profundo altruísmo, os europeus viraram as costas ao que os caracterizava. Para não desaparecer aos olhos do mundo, é essencial levar uma sacudidela, considera um economista francês.
Uma Europa mais pequena num mundo globalizado? Trata-se de uma evidência histórica. Sim, a Europa, e com ela o Ocidente, tornou-se mais pequena num mundo globalizado. E no entanto... é enorme! Supondo que os dados que se seguem não são estatísticas propagandísticas, a Europa, em 2013, tem: 500.000.000 de pessoas, 4.500.000 de quilómetros quadrados; um PIB de 18 biliões de dólares [13 biliões de euros], maior do que o dos Estados Unidos e 3 vezes maior do que o da China. E há 12 biliões de euros de meios financeiros disponíveis na zona euro!
Estaremos perante uma Europa-Gulliver acorrentada por liliputianos medíocres, a saber os próprios Estados, os seus egoísmos e a concorrência de interesses nacionais que impedem o surgimento de uma Europa grande e unida? Ou perante o somatório de interesses particulares, industriais e financeiros, que manobram a Europa como entendem, enredando-a nas malhas de lóbis bem organizados?
É longa a lista dos liliputianos deste Gulliver acorrentado que seria a Europa. Podíamos aumentá-la ainda com os “bodes-expiatórios” que a Europa sempre soube criar ao longo da sua história, para se eximir dos seus próprios fracassos e impotências. E se a atrofia, impotência e fracasso da Europa não fossem obra de uma grande conspiração contra a Europa?
Europa-Gulliver
“Somos responsáveis por tudo e todos, e eu mais que quaisquer outros”, dizia Ivan Karamazov. O inferno europeu, os liliputianos da Europa-Gulliver seriam esses outros! Ótima maneira de ilibar os cidadãos, as opiniões e os povos europeus de qualquer responsabilidade na atrofia da Europa.
Defendo a ideia radicalmente oposta: se a Europa, apesar – ou por causa – da sua imensa riqueza financeira, da abundância de bens, tanto materiais como imateriais, está a desaparecer do cenário mundial, é devido aos próprios europeus e, em especial, às gerações hoje no poder, esses miúdos mimados do pós-guerra, que só conheceram a paz, a prosperidade e a busca egoísta da sua felicidade individual.
Não dedicando o mínimo vital para garantir a sua integridade e soberania em domínios estratégicos, preferem financiar o seu conforto pequeno-burguês e mandar às urtigas aquilo que define o espírito europeu e o que a Europa tem de melhor: o seu humanismo autêntico, o seu profundo altruísmo.
Se a Europa está mal, se está tão atrofiada hoje num mundo em aparente expansão, é exatamente porque os europeus deixaram de ser europeus.
“Roma já não está em Roma”, da mesma forma que a ideia de Europa abandonou os europeus.
Cornucópia de abundância
Podíamos ficar por esta constatação: uma Europa sem projeto, sem identidade, resumida ao que os outros esperam dela – um mercado, um espaço a preencher, uma cornucópia de abundância e bem-estar, a visitar ou pilhar.
Este cenário é uma possibilidade a encarar, quando pomos a hipótese da sua própria morte. Talvez seja essa a vocação da Europa: dar lugar ao Novo Mundo, na esperança de que trate de aproveitar o melhor da herança europeia.
Não partilho dessa ideia. Primeiro, porque a história nos ensinou que a Europa, em momentos de regressão, representa um perigo mortal para si mesma e para os outros.
Depois, para aqueles que acreditam que “o crescimento económico redime todos os pecados”, não se percebe como, por exemplo, a China se comportaria se a União Europeia desaparecesse ou voltasse a entrar em recessão. Por último, como é possível imaginar que essa gigantesca destruição de capital humano que representa a inatividade de 1 em cada 3 jovens na Europa possa dar-se sem contestação nem violência?
Revolução europeia
Dito de outro modo: o renascimento europeu não será uma opção agradável, mas é uma necessidade para os próprios europeus e para o resto do mundo. Trata-se não apenas de uma necessidade, mas de algo que é possível. Será o trabalho de pelo menos uma geração, mas, da mesma maneira que as velhas nações nunca morrem, não seria razoável antecipar o desaparecimento da Europa. “O milagre é estar vivo num mundo de mortos.”
Como identificar e enveredar pelas vias possíveis para tal renascimento? Será necessária uma vigorosa iniciativa franco-alemã? Uma nova CECA, isto é, um grande projeto, por exemplo ecológico, a partilhar e defender pelas diferentes gerações e países europeus?
Ou teremos de passar para vias mais radicais, uma “revolução europeia”, como a revolução norte-americana, alicerçada na afirmação de um “We, the People”?