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sábado, 5 de outubro de 2013

Que tamanho deverá ter o cemitério desta ilha?

O último naufrágio ao largo da ilha italiana, em 3 de outubro, de um barco que transportava migrantes africanos – dos quais pelo menos 127 morreram e quase 300 estão desaparecidos – suscitou uma vaga de comoção na Europa e relançou o debate sobre a política de imigração da UE e dos seus Estados-membros, sublinha a imprensa europeia.
“Massacre de imigrantes, a Itália está de luto”, diz a manchete do Corriere della Sera. No artigo principal deste diário de Milão, Gian Antonio Stella recorda o grande número de pessoas que se afogaram, desde 1988, a tentar atravessar o Mediterrâneo: pelo menos 19.142, segundo o blogue Fortress Europe. Stella salienta ainda que, pouco antes desta tragédia, o Conselho da Europa acusara a Itália de ser um polo de atração para a imigração, por os seus sistemas de dissuasão serem inadequados, apesar de outras instituições europeias criticarem frequentemente as políticas “de dissuasão”.
A mesma Europa, que, todos os dias, quer imiscuir-se nas nossas decisões porque estas dizem respeito a toda a gente, não se mostra ansiosa por partilhar connosco o fardo das fronteiras do Sul. […] As exigências xenófobas da Itália não têm fundamento. Em cada 1.000 migrantes, 9 refugiam-se na Suécia, 7 na Alemanha, 4,5 na Holanda e apenas 1 em Itália. Contudo, estas vagas humanas não podem ser só um problema italiano. São um problema de todos. […] Bruxelas devia vir a Lampedusa e contar os mortos. Também são os seus mortos.
Para o *Spiegel Online, o naufrágio de Lampedusa é “o fracasso da Europa”:
Houve sem dúvida cenas atrozes: 500 pessoas a cair de um barco em chamas e muitas delas não sabiam nadar. O que aconteceu em 4 de outubro, ao largo da ilha mediterrânica de Lampedusa faz tremer toda a Europa. […] A pequena ilha sente-se só e não é esta a primeira vez. Foi ali que, desde 1999, desembarcaram mais de 200.000 pessoas provenientes de África e da Ásia, que fugiam à guerra, à fome e à miséria. Calcula-se que entre 10.000 e 20.000 tenham morrido durante a travessia. Desde janeiro de 2013, chegaram a Lampedusa 22.000 refugiados. Esta ilha é um símbolo. Um símbolo da política de imigração europeia.
O diário espanhol El País refere que a maioria dos passageiros do barco afundado era oriunda da Somália e da Eritreia e tinha fugido por causa da fome e da guerra. Alguns sobreviventes afirmam que, apesar dos pedidos de socorro, viram passar 3 embarcações que não alteraram a rota para os ajudar. Para El País, “a crise das pessoas deslocadas abala a Europa”:
Mas só quando se verifica um grande naufrágio – e este é um dos maiores de que temos notícia – os olhos se voltam para uma ilha que tem apenas 5.000 habitantes e cuja presidente da Câmara [Giusi Nicolini], farta da surdez das autoridades italianas e europeias, enviou em fevereiro uma carta à União Europeia, na qual perguntava: “Que tamanho deverá ter o cemitério da minha ilha?”
Sob o título “Lampedusa afunda-se”, o Gazeta Wyborcza salienta que o “estreito da Sicília se tornou o túmulo de africanos que sonhavam com o paraíso europeu”. Este diário polaco propõe uma solução para aliviar a pressão sobre a Itália e a Grécia, também inundada por imigrantes: encaminhá-los rapidamente para centros de outros países da UE, onde os seus pedidos poderiam ser analisados. Contudo, quando uma proposta desse tipo foi recentemente apresentada em Bruxelas, os países não mediterrânicos, entre os quais a Polónia, “não quiseram sequer ouvir falar no assunto”. O Gazeta conclui que
nós, europeus, não fazemos o suficiente para impedir estas tragédias. […] Nem os italianos, nem os outros europeus querem imigrantes ilegais, sem educação e pobres. Tornar mais eficiente o sistema de vigilância do Mediterrâneo, supervisionado por Bruxelas, para evitar que se afoguem pessoas é uma tarefa árdua.
No Volkskrant, a cronista Sheila Sitalsing mostra-se indignada com a hipocrisia que reina na Europa. Sheila Sitalsing lamenta que a política de imigração da UE se limite a
discutir, desculpabilizar e olhar para o outro lado. Há anos que os países do Sul da Europa se esforçam arduamente para que os seus enormes problemas de imigração sejam incluídos na agenda de Bruxelas, advertindo: “Não podemos continuar a acolhê-los, mas também não podemos deixá-los morrer, nem podemos devolvê-los. Portanto, ajudem-nos”. E os países do Norte respondem: “É preciso repeli-los, seja de que forma for”. Sem dúvida que consideramos abominável a guerra na Síria, que achamos desagradáveis alguns dos acontecimentos que se verificam no continente africano e que apoiamos a primavera árabe. Mas, sobretudo, não queremos que isso seja interpretado como um convite a que as pessoas venham instalar-se em massa em Amesterdão, Paris ou Berlim.
Mais de 100 mortos em tragédia naval ‘às portas da Europa’”, diz a manchete do Guardian. Condenando o facto de, “nos tempos que correm, ser preciso uma tragédia espetacular para os barcos de imigrantes chegarem às primeiras páginas dos jornais”, o jornalista Jack Shenker afirma que existem fortes divisões entre aqueles que pensam que a principal prioridade da Europa deveria ser salvar as vidas dos candidatos à imigração e aqueles que consideram que a prioridade deveria ser o reforço dos controlos de fronteiras.
Falta ainda a vontade política, quando se trata de garantir que os imigrantes vulneráveis não caiam entre as fissuras de um conjunto intrincado de políticas de fronteiras e de salvamento e entre jurisdições legais de regiões que se sobrepõem.
No seu editorial, o diário português Público tem por título “Lampedusa e a vergonha da Europa”. E prossegue:
O Mediterrâneo, mar de civilizações e encontros desde a Antiguidade, tornou-se igual a um campo de extermínio. Nas suas margens, como também em tempos disse o Papa, passou a haver apenas indiferença. Indiferença perante a morte e perante as tragédias que se sucedem. “Não há solução milagrosa”, dizia a ministra dos Estrangeiros italiana, Emma Bonino. Não há milagre. Mas a Europa em crise e com medo que se fecha ao outro deixará de ser a Europa se não entender que a morte no Mediterrâneo é a sua própria morte.

Ecos da blogosfera - 5 out.

“A esta crise seguir-se-á um Renascimento europeu”

Na segunda parte do seu discurso numa recente conferência organizada pelo “Trouw”, o escritor holandês Geert Mak diz que a crise política e institucional na Europa irá criar um novo balanço nas relações entre as próprias instituições europeias, a UE e os seus cidadãos. Excertos.
Há mais de 130 anos, a 11 de março de 1882, o filósofo e polemista francês Ernest Renan fez um discurso na Sorbonne, que viria a ser uma referência durante muito tempo. Tinha por título “Qu’est-ce qu’une nation?”, “O que é uma nação?”. “Uma nação é […] uma grande solidariedade constituída pelo sentimento de sacrifícios realizados e daqueles que ainda estamos dispostos a fazer.”
Continua a haver, em especial em Bruxelas, filósofos e políticos europeus que gostariam de pôr de lado o Estado-nação como sendo um mito obsoleto e até perigoso do século XIX. Consideram a crise como um meio para, finalmente, dar um grande salto em frente; ainda sonham com uma federação europeia. Contudo, se aplicarmos a descrição clara de Renan ao nosso continente, conclui-se que – mesmo meio século depois de estabelecidas as fundações da UE – pouco há afinal para ver dessa nação europeia. Aquilo que a crise e as subsequentes medidas de austeridade extrema mais afetaram foi precisamente a solidariedade e a disposição de continuar uma vida em comum, sublinhadas por Renan.
Regulamentos bem-intencionados de Bruxelas
Mas isso não é tudo. O problema de todos esses grandes sonhos europeus é que, ao rejeitarem o Estado-nação, ignoram também, de um modo geral, a importância do fator “lugar”. Dos queijos não pasteurizados semi-ilegais que se vendem no mercado de Dieppe, ao café cheio de fumo da aldeia húngara de Vasarosbec que não tem casa de banho, ao chocolate de Bruges, aos painéis solares de Neukirch, à construção do metro em Amesterdão – o que é que não foi abafado pela chuva de regulamentos bem intencionados de Bruxelas?
Todos os exemplos apontados constituem sintomas de uma federação europeia, que ficou completamente desequilibrada nas últimas décadas. Demasiadas questões que uma ligação federativa normal, como os Estados Unidos da América, deixa a cargo dos Estados-membros – o queijo e o chocolate, por exemplo – são regulados a partir de Bruxelas. Por outro lado, na Europa, muitas das áreas políticas, que são geridas de forma mais ou menos centralizada em todas as federações – como o setor financeiro, a política externa e a defesa –, continuam a ser geridas pelas capitais nacionais. Os cidadãos europeus sentem vivamente isso. E, para além da falta de democracia, é essa situação que enfraquece o apoio à União Europeia.
Criação de um senado europeu
Deveremos ressuscitar o Estado-nação em toda a sua glória, como defendem alguns? Teremos então, como europeus, de gerir em comum, sem a UE, mil e um assuntos, que vão das quotas de pesca aos acordos financeiros e à política energética? Para já não falar dos problemas climáticos, que se abateram velozmente sobre nós, no século XXI. Não terá o próprio mundo ultrapassado há muito os laços nacionais?
Gostemos ou não, teremos de encontrar formas específicas, democraticamente controladas, desse “espaço” europeu omnipresente. Será difícil e os problemas abundarão, mas não há maneira de voltarmos a 1956.
O Estado-nação pode entretanto conquistar um novo lugar no interior da democracia europeia. Por conseguinte, podemos justificadamente defender a criação de um senado europeu, que, à semelhança do que acontece nos EUA, reforce o elemento nacional no interior do Parlamento Europeu e da democracia europeia. Pelo menos igualmente importante é transformar o ideal nacional do século XIX de “sangue, língua e território” num ideal mais político, como fizeram os norte-americanos. Esse processo encontra-se agora em pleno andamento na Europa.
Renascimento europeu
À crise seguir-se-á um Renascimento europeu. De uma espécie ou de outra. Da duramente posta à prova União Europeia, teremos de recuperar um espaço europeu, no qual todos os europeus se sintam, de certa forma, em casa. Receio bem que menos impulsionado por sonhos e pelo idealismo, e mais instigado pela amarga necessidade. Não exultante, mas realista e modesto.
Em primeiro lugar e acima de tudo, que tenha muito mais em conta os valores associados ao conceito de “lugar”, nos regulamentos europeus e nas instituições europeias. Que respeite, promova e, sempre que possível, proteja da já generalizada agressão europeia e mundial tudo o que seja conforme com esses valores.
Esse espaço tem também de ser criado no debate político, nem que seja apenas não rejeitando simplesmente aqueles que deixaram de se sentir em casa no seu próprio lugar no mundo, rotulando-os de populistas e nacionalistas. Trata-se, é certo, de sentimentos que são sempre explorados pela ultradireita. Mas isso tem tudo a ver com o facto de os movimentos progressistas e liberais-conservadores terem sistematicamente prestado pouca ou nenhuma atenção à necessidade humana de ter uma casa, um lugar e tudo o que lhes está associado.
Economias paralelas de redes locais
Em segundo lugar, esse equilíbrio pode ser restabelecido, dedicando muito mais atenção aos elementos locais que possam ser um contributo para a Europa. Por toda a parte, mas em especial no Sul, assiste-se ao despontar, induzido pela necessidade, de economias paralelas, baseadas no conhecimento e nos produtos locais, de redes locais – ou seja, sem comércio intermediário – de concessão local de crédito, de confiança local.
Por último, o equilíbrio pode ser restabelecido através da extensão do conceito de “lugar” que tem vindo a verificar-se sobretudo ao longo das últimas décadas. Cada vez mais se vê que o conceito de “lugar” está a ultrapassar os contextos nacionais; nalguns casos é a região – que frequentemente atravessa fronteiras – por vezes a aldeia e cada vez mais a cidade.
Por exemplo: presentemente isso acontece acima de tudo nas cidades, onde, a despeito de todo o pessimismo, a criatividade e a inovação estão a florescer, onde os migrantes vão e vêm, onde os conselhos municipais estão a desmantelar as barreiras nacionais e a estabelecer laços uns com os outros, em todo o mundo. Estamos a viver um processo longo e difícil, desde antes da crise e desde que esta eclodiu. Por tentativa e erro, caminhamos para uma Europa constituída por pessoas, em vez de uma Europa constituída por Estados.

Contramaré… 5 out.

O primeiro-ministro sustentou que não há retroactividade na medida de convergência das pensões dos funcionários públicos porque não haverá devoluções de pensões já recebidas.

sexta-feira, 4 de outubro de 2013

Apesar das “evidências”, a inflação das notas dá ISTO!

A troika deu nota positiva a Portugal ao fim da 8.ª e 9.ª avaliações regulares ao programa de assistência, informou o governo. "Passámos estas avaliações, o que credibiliza Portugal e permite ao país aproximar-se decisivamente do fim do processo de ajustamento", afirmou Paulo Portas.
No entanto, as metas do défice vão permanecer inalteradas nos  5,5% este ano e nos 4% em 2014, mas a TSU não avança. Ao mesmo tempo, o governo e as entidades internacionais reviram em alta a previsão de crescimento para o próximo ano de 0,6% para 0,8% do PIB.
O executivo prepara-se para avançar com uma taxa sobre os produtores de energia, manter a sobretaxa de IRS em 2014 e retomar os leilões de dívida no próximo ano.
As reacções não se fizeram esperar:
PSD diz que o aval positivo da troika permite manter a expectativa de que o mesmo termine "como sempre esteve previsto" em Junho de 2014.
O CDS-PP enalteceu o abandono da chamada TSU dos pensionistas nas medidas a adotar pelo governo, destacando que tal decisão permitirá "preservar uma paz social e uma solidariedade geracional" tidas pelo partido como "muito importantes".
PS considerou que a conclusão das 8.ª e 9.ª avaliações a Portugal pela troika indicia que em 2014 os portugueses irão sofrer mais austeridade, dado que a "propaganda" do Governo não conseguirá "disfarçar".
O deputado do PCP, Paulo Sá, afirmou que "ficou claro" que a prioridade do governo PSD/CDS-PP continuará a ser o "financiamento aos bancos" e que "irá manter" todas as medidas de austeridade no próximo Orçamento do Estado.
O líder parlamentar do BE, Pedro Filipe Soares, assinalou que o Governo falhou na revisão da meta do défice e advertiu que medidas de austeridade anunciadas como "pontuais" passaram a "permanentes" e destacou que "as malfeitorias do Governo continuarão em vigor no próximo ano", nomeadamente a contribuição extraordinária de solidariedade, a sobretaxa do IRS, e "isso mostra que não há qualquer redução da austeridade".
UGT manifestou-se preocupada com a “intransigência” da troika perante a manutenção do défice em Portugal. Perante este facto, a UGT garantiu que “não aceitará a continuação das políticas de austeridade”.
O secretário-geral da CGTP, Arménio Carlos, considerou que “quando se fala que a ‘troika’ não cedeu relativamente ao défice, mesmo que o Governo consiga atingir os 5,5% do PIB este ano, para alcançar os 4% em 2014 terá de cortar cerca de 2,5 mil milhões de euros”. “Isto é a reforma do Estado”, sublinhou e acusou o Governo de “manipulação e ocultação” ao escusar-se a responder às questões colocadas pelos jornalistas.
Já foi tempo em que o descaramento da troika ia ao ponto de dar “Excelente” ao desempenho do governo, no tempo em que o Gaspar fazia parte da equipa (da troika). Agora já se ficam pela “positiva”, sem valor (acrescentado), que quer dizer algo parecido com o “passou à rasquinha”…
E qual seria a nota que você daria ao trabalho prático (sem relatório) destes 6 meses de (in)atividade governamental, com a ameaça de divórcio pelo meio e a reconciliação imposta pelo patrono?
O povo já avaliou e deu nota muito negativa, o que quer dizer que os parâmetros e os objetivos de um e outros não são coincidentes…
Com Passos ou Portas, com Gaspar ou Luís, sempre foi o que a troika quis…
Só falta a avaliação do Tribunal Constitucional, que afinal é o que vale!

Ecos da blogosfera - 4 out.

“Estamos a assistir a um confronto fundamental”

Segundo o escritor holandês Geert Mak, na primeira parte do discurso que proferiu numa conferência organizada pelo jornal “Trouw”, o maior desafio da UE é reconhecer a necessidade que os europeus têm de se sentirem “em casa” e de resolverem os seus próprios assuntos ao mesmo tempo que partilham os seus recursos para resolver os problemas transnacionais. Excertos.
Todos nós estamos familiarizados com o sentimento que me inspira Jorwerd, a pequena aldeia onde vivo – embora esse sentimento possa variar de língua para língua: do acolhedor “Home” ao orgulhoso “Lieu” ou ao “Heimat”, com todo o seu peso histórico [devido às associações a Hitler e ao III Reich]. No entanto, referimo-nos todos ao mesmo: o “lugar” onde nos sentimos em casa. Por seu turno, “espaço” representa oportunidades dinâmicas e, também, os riscos e o caos associados ao facto de nos aventurarmos por caminhos novos e inexplorados.
Lugar e espaço, “place et espace” foi um tema importante para o erudito francês Michel de Certeau, que mais tarde viria a ser aprofundado pelo pensador europeu – e também presidente do Conselho Europeu – Herman Van Rompuy. A Europa incorporou há muito, e continua a incorporar, o conceito de espaço, através da sua pretensão a alcançar a livre circulação de mercadorias, pessoas, serviços e capitais, a abolição de fronteiras, a criação de novas oportunidades – mas essas ambições envolvem igualmente o risco de causar agitação.
Fraqueza diabólica e maldita
Há séculos que a Europa conhece a tensão entre lugar e espaço. Um dia de viagem de carro pela Europa pode facilmente levar-nos a atravessar, pelo menos, 4 regiões, completamente diferentes em termos de língua e de cultura. Apesar de essa enorme diversidade ser há muito a nossa força, a rivalidade que dela resulta revelou-se como sendo a nossa fraqueza eterna, diabólica e maldita.
A história é conhecida: para escapar a tal destino, foi criada, em 1951, a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço – uma experiencia histórica com um governo supranacional. E, de facto, durante pelo menos 5 décadas, o projeto europeu foi muito bem sucedido. Ainda o é, em muitos aspetos. Não devemos nunca esquecer isso. Pergunte-se aos polacos, aos estónios e a outros antigos europeus de Leste qual é a sua opinião. Mas, desde 2010, diferentes países têm sido dilacerados por tempestades e incêndios, cujo fim não está à vista e, se sobreviver a esta investida, a União sairá dela muito enfraquecida.
A Europa de hoje está tão estreita e profundamente interligada que, os Estados-membros são obrigados e preocupar-se, em vários aspetos, com as políticas internas e as atitudes uns dos outros. Não podemos ignorar o facto de que, ocasionalmente, as fragilidades internas de alguns Estados-membros colocaram a União à beira do abismo. Mas, como pode o conceito de “espaço” influenciar a interpretação do “lugar”?
Nepotismo e clientelismo
Será possível, por exemplo, fazer desaparecer do dia para a noite, como que por magia, a relação totalmente distorcida entre o Estado e os seus cidadãos existente nos antigos países europeus de Leste? E o mesmo princípio não se aplicará ainda com mais força às tradições profundamente enraizadas de nepotismo e clientelismo existentes na maioria dos países do Sul da Europa? Por outras palavras: será que a mistura de advertências, subsídios, deduções e sanções raramente impostas controla de alguma forma o fenómeno do “lugar”? Em especial, quando, como no caso da Grécia, se pensa ser possível modernizar uma economia, fundamentalmente através da imposição da austeridade e dos cortes, que tem como resultado as vítimas tornarem-se mais uma vez completamente dependentes do apoio dos amigos e da família.
E como devemos encarar a nossa autoaclamada moralidade da dívida, a moralidade do castigo e dos cortes que, nos últimos anos, tem determinado a disposição da opinião pública na Alemanha e na Holanda, a moralidade a que os partidos da maioria governamental continuam a apegar-se com uma ignorância complacente, mas que é encarada com incredulidade pelo resto do mundo – incluindo pelo FMI –, uma vez que atrasa, ou bloqueia mesmo por completo, a recuperação da zona euro.
O preço que teremos de pagar por isto é elevado, em especial no Sul. Sabemos isso, também aqui no Norte, apesar de raramente ouvirmos um político holandês admiti-lo. Para já não falar do enorme preço moral para a geração dos mais novos, que perderam totalmente a confiança.
Integração, pelo menos em Bruxelas
Assim, que influência tem tudo isto sobre o nosso “espaço” europeu? E sobre a relação entre “espaço” e “lugar” no interior de uma Europa duramente atingida, a relação entre [a minha aldeia] Jorwerd e Bruxelas?
Nos últimos 5 anos, vivemos 2 grandes crises de confiança: uma crise bancária em 2008 e 2009, a que se seguiu, desde começos de 2010, uma crise monetária, que, embora venha a acalmar ligeiramente desde o ano passado, está longe de ter terminado.
Se analisarmos as consequências na perspetiva de Bruxelas, vemos que as instituições da União sobreviveram espantosamente bem a todas estas adversidades, respondendo-lhes com medidas e com a criação de estruturas que, até há pouco tempo, eram consideradas inatingíveis. É verdade que a “pièce de résistance” final, a união bancária europeia ainda não está em vigor, mas, de uma forma geral, a crise conduziu a uma maior integração. Pelo menos em Bruxelas.
As coisas são muito diferentes no mundo exterior, onde está em curso um processo inverso, um processo de desintegração. Por exemplo, na economia do euro, na qual as taxas de juro pagas por um empresário italiano são atualmente o dobro das cobradas a um empresário alemão. Estamos a assistir ao surgimento de uma Europa a 2, a 3 ou a talvez mais velocidades.
Equilíbrio de forças instável
Essa desintegração é também claramente evidente no debate político europeu: as divergências de opinião sobre a forma de combater a crise refletem a essência de culturas políticas e económicas diferentes. Os franceses e os italianos, que sempre dependeram da desvalorização para reduzirem as respetivas dívidas, não conseguem entender o medo primário que os alemães têm da inflação.
Esta dissonância está a perturbar o equilíbrio de forças na Europa. O motor da unificação europeia, o eixo Paris-Berlim, está a desagregar-se. A França pode vir a ser o próximo foco de problemas, depois da Espanha e da Itália. A Alemanha tem de liderar, uma tarefa que aquele país não pode nem ousa assumir. O fardo do seu passado é demasiado pesado.
Entretanto, os cidadãos estão a perder rapidamente a confiança na experiência europeia. Os resultados das próximas eleições europeias irão refletir essa desconfiança: as sondagens indicam que o já difícil de gerir Parlamento Europeu será cada vez mais povoado por representantes de partidos antieuropeus de extrema-direita.
Em resumo, estamos a presenciar um choque fundamental não apenas entre forças políticas, mas também entre tradições europeias profundamente enraizadas. Foram raras as vezes em que a Europa – nas suas muitas configurações – testemunhou uma instabilidade como a que agora se verifica no equilíbrio entre “espaço” e “lugar”. Iria um regresso ao sistema dos Estados-nação, do século XIX, restabelecer esse equilíbrio?

Contramaré… 4 out.

Assim, os cortes de 4.000 milhões de euros são para levar a cabo em 2014, a meta do défice a cumprir mantém-se nos 4%, os chumbos do Palácio Ratton terão de ser contornados com outras alternativas e a descida do IVA da restauração deverá ficar paralisada. O Estado está ainda obrigado a amealhar 20.000 milhões de euros até Junho do próximo ano. Caso o País não consiga um saldo primário positivo de 670 milhões de euros em 2014, não haverá programa cautelar que auxilie o regresso do País ao financiamento nos mercados, o que poderá empurrar Portugal para um 2.º resgate.

quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Sem “golden share” ELES ganham e nós perdemos…

Activos portugueses vão ser integrados na operadora cuja sede será no Rio de Janeiro. GES e CGD com menos de 4% da nova empresa.
Depois de mudar o nome ao Pavilhão Atlântico e a uma estação de Metro em Lisboa, a PT mudou de nacionalidade e passou a ser brasileira.
A maioria dos accionistas portugueses da empresa foram lestos em aplaudir a integração dos activos da PT na operadora brasileira Oi - mais não seja porque viram as acções da PT valorizar quase 7%. Mas, do ponto de vista do retorno para a economia portuguesa - retenção de lucros, receita fiscal ou investimento no país - e do potencial a médio prazo para estes mesmos accionistas, está longe de ser certo que a aposta corra bem.
Accionistas da Oi ficam com 62%
O avanço da operação vai fazer com que o peso dos accionistas portugueses da PT fique muito diluído na nova empresa - por ora baptizada CorpCo. O bloco constituído por Grupo Espírito Santo (GES), Ongoing, Caixa Geral de Depósitos, Visabeira e Controlinveste, que hoje detém 31,39% da PT, deverão ver-se reduzido a uma fatia de 11,9% dos votos da nova empresa. O peso dos accionistas portugueses na tomada de decisões vai, assim, diminuir.
Dívidas comem dividendos
O grupo de investidores portugueses da PT, porém, já se habituou nos últimos anos a abdicar de ganhos em prol da aposta no Brasil - que levou a PT a pagar 3,6 mil milhões de euros por 25,6% da Oi. É que mesmo depois da injecção de 2,7 mil milhões de euros em dinheiro, prevista na fusão, a operadora terá uma dívida de 14 mil milhões de euros, culpa de um endividamento que já tem vindo a sair caro aos investidores da PT.
A Oi, para conseguir gerir a sua dívida, cortou a direito nos dividendos prometidos nos últimos anos, o que obrigou a PT a fazer o mesmo: em Agosto deste ano anunciou um corte de 77% nos lucros que iria distribuir pelos accionistas. Só o bloco de investidores portugueses, que contava receber 246 milhões de euros, teve que se contentar com 56 milhões.
Mas o cenário vai piorar. Zeinal Bava revelou ontem que a nova operadora irá pagar nos próximos anos 500 milhões de reais [166 milhões de euros] em dividendos. Este valor, dividido pela nova participação dos accionistas portugueses, vai diminuir ainda mais a fatia a que têm direito. Irão receber 19,7 milhões - valor que compara com os 56,2 milhões anunciados para este ano. Ora, se os accionistas portugueses recebem menos dividendos também a economia portuguesa sofre directa e indirectamente - menos dividendo resulta num menor encaixe fiscal para o Estado, mas também em menos liquidez disponível para GES, Ongoing, Visabeira, CGD ou Controlinveste tornarem as suas próprias contas mais saudáveis.
A criação de uma nova empresa na sequência da fusão da Portugal Telecom com a Oi e a fixação da sua sede no Brasil, não significa que a PT deixe de pagar impostos em Portugal. O IRS dos seus trabalhadores e o IRC que for apurado pela sua atividade continuará a ser receita fiscal das autoridades portuguesas. Já ao nível da tributação de dividendos poderá verificar-se alguma redução da base de incidência na medida em que esta passa, à partida, a ser feita no Brasil.
Luís Nazaré, ex-presidente da ANACOM: "Boa noticia, pelo menos no curto prazo, para os acionistas da PT e da Oi. Uma notícia muito agradável para a Zon Otimus. Uma má noticia para a economia portuguesa. Uma incógnita para os consumidores nacionais de telecomunicações".
Paulo Bernardo, ministro das Comunicações do Brasil: "Eu não vejo grandes problemas [para que os órgãos de defesa da concorrência no Brasil aprovem a fusão], eu acho que a empresa vai continuar do mesmo tamanho. Mas é melhor a gente dar uma olhada primeiro".
Direção do Sindicato dos trabalhadores do Grupo Portugal Telecom: "Deixa-nos ainda algumas reticências que o centro de decisão fique no Brasil como tudo indica. Acresce aos nossos receios as situações muito diferentes das condições sócio laborais da OI e da PT que poderão vir a prejudicar os direitos contratuais dos trabalhadores do Grupo PT em Portugal. Lamentamos ter tido conhecimento de decisão tão importante através da Comunicação Social, sem ter sido ainda convocados pela Administração para melhor esclarecimento".
Octávio Azevedo, presidente da Andrade Gutierrez, um dos maiores acionistas da Oi. "A aliança industrial que celebramos em 2010 permitiu-nos um conhecimento profundo da realidade das 2 companhias, da excelente qualidade e profissionalismo das suas equipes que nos permite hoje dar este passo de forma segura e confiante".
Pedro Jereissati, do grupo La Fonte, grande acionista da Oi: "A criação desta nova empresa é mais um passo na direção de se criar uma grande empresa multinacional de telecomunicações com ambição global".
Ângelo Correia considera que a fusão da portuguesa PT com a brasileira Oi é um negócio vantajoso para as duas telecoms permitindo, desta forma, criar um "operador transatlântico", mas considera, por outro lado, que também revela a "perda de poder de Portugal e das suas empresas".
Pois! Depois de um negócio destes, em que ganham as empresas e ganham os acionistas e os países que se lixem, ficamos cientes e conscientes dos objetivos da guerra fria e certeira de Bruxelas à “golden share” que conferia direitos especiais ao Estado, como vetar decisões estratégicas, pelas 500 ações, e cerca de 7% do capital, que detinha da operadora.
Sem esquecer que em 1995, o Estado português detinha 54,2 % do capital social, composto por cerca de 1.000 milhões de ações ordinárias e as tais 500 ações privilegiadas (golden shares), que em 2000 concluiu por privatizar, quase na totalidade (o grupo Estado, representado pela CGD e pelo Instituto de Participações Financeiras do Estado, ficou apenas 7,02 % do capital).Estão a ver como privatizar (o que é nosso) é bom (para os trutas privados)?
Estão a ver como um menor Estado, resulta num melhor estado económico-financeiro (para os trutas privados)?
Estão a ver? Estão mesmo a ver?
A mal da nação…
Só nos fica a alternativa de recuperar as perdas para termos um "melhor Estado", se mudarmos para a concorrência, que fique por cá, e pague impostos…
A bem da nação!

Ecos da blogosfera - 3 out.

E mais um caso de um “intelectual” de um rico país…

Deputado social-democrata Frank-Walter Steinmeier está no centro do mais recente caso de político suspeito de copiar trabalho académico. Acusações similares já levaram à renúncia de 2 ministros de Angela Merkel.
MD
O ex-ministro dos Negócios Estrangeiros e atual líder da bancada do Partido Social-Democrata (SPD) no Parlamento, Frank-Walter Steinmeier, é o protagonista do mais recente caso de acusação de plágio académico contra um político alemão. Antes dele, 2 ministros da chanceler federal Angela Merkel renunciaram após ter sido descoberto que partes das suas teses de doutorado eram copiadas.
A Universidade Justus Liebig, da cidade de Giessen, anunciou que fará uma análise científica da dissertação de doutorado de Steinmeier. "O processo durará apenas poucas semanas", garantiu o reitor da instituição, Joybrato Mukherjee.
Steinmeier, que foi vice-chanceler entre 2007 e 2009, concluiu o seu doutorado em direito pela Universidade Justus Liebig em 1991, escrevendo sobre pessoas sem-abrigo. Ele mesmo tinha pedido à universidade "uma avaliação formal das acusações", divulgadas no fim-de-semana.
A revista alemã Focus publicou no domingo uma reportagem citando o professor universitário Uwe Kamenz, que disse haver "evidências claras" de plágio na dissertação de doutorado de Steinmeier. O político, que será um dos líderes social-democratas a negociar com os conservadores de Merkel a formação de uma coligação para governar a Alemanha nos próximos 4 anos, rechaçou a acusação como "absurda".
Projeto analisa dissertações de políticos
Kamenz participa de um projeto que analisa dissertações de políticos à procura de possíveis plágios. Para isso, usa um programa de computador que compara as teses e doutorado com textos de uma centena de fontes.
O relatório que trata da tese de Steinmeier, composto por 279 páginas, aponta 500 trechos com "similaridades" suspeitas. Nele, a "probabilidade total de plágio" é avaliada em 63%. Kamenz havia enfatizado várias vezes no passado que a análise de computador pode proporcionar apenas indícios e que a avaliação final deve ser executada por pessoas.
"A evidência circunstancial é semelhante ao caso da ex-ministra da Educação Annette Schavan", comparou Kamenz, em entrevista à Focus. Schavan teve o seu título de doutorado revogado em fevereiro passado pela Universidade de Düsseldorf, que considerou que ela tinha copiado "sistematicamente e intencionalmente" partes da sua tese, escrita 30 anos atrás.
4 dias após o anúncio da medida, ela renunciou como ministra, tendo, entretanto, iniciado um processo contra a universidade em busca da impugnação da decisão.
Revista patrocinou investigação
Segundo reportagem do jornal Süddeutsche Zeitung, a Focus seria patrocinadora das análises realizadas por Kamenz. Um porta-voz da editora Burda, que publica o semanário, afirmou que a revista forneceu 2 vezes a Kamenz uma quantia de algumas centenas de euros como ajuda de custo para a digitalização de livros. "Isso ocorreu independentemente da investigação sobre determinadas dissertações", afirmou o porta-voz.
O professor de direito Gerhard Dannemann avaliou as possíveis violações cometidas por Steinmeier como menos graves do que as presentes no caso Schavan. Ele considerou grande parte das evidências citadas por Kamenz como "pouco problemáticas".
Nos últimos anos, vários políticos proeminentes tiveram os seus títulos de doutor revogados por terem copiado ilicitamente outras obras nas suas dissertações. Antes de Schavan, o caso que mais chamou a atenção foi, em 2011, o do então ministro da Defesa Karl-Theodor zu Guttenberg, que renunciou. Outros políticos que tiveram os seus títulos cassados por motivo similar foram os integrantes do Partido Liberal (FDP) Silvana Koch-Mehrin, Jorgo Chatzimarkakis e Margarita Mathiopoulos.

Contramaré… 3 out.

O número de desempregados em Espanha subiu 0,54%, ou 25.572 pessoas, em Setembro, para um total de 4.724.355 inscritos nos centros de emprego. O aumento do desemprego interrompe um período de 6 meses consecutivos em que o desemprego em Espanha caiu.
Setembro é, habitualmente, um mês onde o desemprego sobe e desde o arranque destes registos, em 1996, só se registaram três quedas: em 2005, 2006, e 2007, sendo que neste mês no ano passado o desemprego aumentou em quase 80.000 pessoas.

quarta-feira, 2 de outubro de 2013

Deixem de pescar petinga e vão à caça dos tubarões!

O Governo está a preparar um novo plano de regulação de dívidas que permitirá a empresas e famílias pagarem em prestações responsabilidades atrasadas perante a Segurança Social e o Fisco.
Um dos objectivos centrais deste novo plano é aumentar a receita do Estado ainda este ano, com o objectivo de cumprir a meta de 5,5% do PIB acordada com a troika.
Pedro Passos Coelho admitiu ontem à noite, no Conselho Nacional do PSD,  a possibilidade de não cumprir a meta.  
A entrada em plano de regularização de dívidas poderá também facilitar a candidatura de empresas a financiamento comunitário, visto que estes estão vedados a empresas em incumprimento.
Tendo em conta a lógica de ser mais fácil e rentável “sacar” muito a poucos em vez de sacar pouco a muitos, parece que o governo vê tudo ao contrário, não por miopia política, mas por ilegítima opção.
Ora vejam:
As multinacionais portuguesas deslocaram mais de 2.000 milhões de euros de lucros para a Holanda entre 2009 e 2011. A conclusão é de um estudo da Somo, um centro de pesquisa holandês sobre multinacionais.
Segundo as contas da UE, a perda anual de receitas fiscais através da fraude fiscal e evasão fiscal ilegal ascende a 1 bilião de euros por ano na UE. Este valor corresponde a 2.000 euros anuais por cidadão da União Europeia e é superior à despesa total com os cuidados de saúde dos 27 países. Pelo menos 150.000 milhões deste buraco fiscal é gerado através de evasão fiscal, valor equivalente aos gastos totais anuais da União Europeia.
A Holanda foi o principal destino do investimento direto de Portugal no estrangeiro com  19,8 milhões investidos em 2011. Este dinheiro regressa depois a Portugal levando a que a Holanda tenha sido o maior investidor estrangeiro em Portugal em 2011, com 20 milhões de euros.
A Holanda já serve de paraíso fiscal para as grandes empresas portuguesas há vários anos, e das 20 maiores companhias nacionais, 19 estão presentes no país como a Galp, EDP, Jerónimo Martins, Portugal Telecom, Sonae, BCP, Mota-Engil, Cimpor, Semapa, Portucel ou a Sonaecom.
Para o bastonário dos Técnicos Oficiais de Contas, a extração deste dinheiro para outros países acaba por não dinamizar a economia nacional em detrimento de outras. "Isto acaba por gerar exatamente, primeiro, uma sonegação da rentabilidade fiscal a Portugal em preterição dos países que dão melhores condições no tratamento destes capitais e acabam por sonegar à  nossa economia 2.600 milhões de euros provenientes deste tipo de transferências."
Para João Paulo Martins da ONG Miqueias/OBECEF a transferência deste dinheiro para a Holanda é "A maior burla legal em território português que lesa seriamente os cofres públicos e que obriga os contribuintes honestos a pagarem a sua quota-parte e a quota-parte daqueles que não pagam."
A exposição de casos individuais, por mais aliciantes que sejam, não deve desviar a atenção da questão de fundo: os paraísos fiscais são uma ameaça para a democracia. Minam o Estado de Direito, apostando na ocultação. São um maná para os defraudadores de todos os quadrantes. Promovem o desvio de recursos públicos, em Estados onde imperam o suborno e a corrupção. Neste mundo de uma criatividade jurídica que parece ilimitada, escondem-se valores colossais por trás de empresas de fachada. Personalidades endinheiradas mantêm aí o equivalente ao PIB conjunto dos Estados Unidos e do Japão.
Empresários e investidores portugueses colocaram 73% das suas aplicações em paraísos fiscais. Investimento de estrangeiros em Portugal caiu 41,4%.
Transferências para “offshores” dispararam no 1.º semestre, depois de ter havido uma fuga dos paraísos fiscais em 2009.
300 contribuintes com milhões de euros depositados em offshores vão ter de apresentar novas declarações de rendimentos que incluam estes montantes e explicar ao Fisco como e quem os ajudou a estabelecer estas contas. Caso contrário, podem incorrer em penas de prisão até aos 8 anos.
Tendo em conta que, por causa das fugas de uns tantos, cada cidadão da União Europeia paga 2.000 euros anuais por cidadão (a mais), por causa dos que pagam a menos ou nada e que o montante das fugas é superior à despesa total com os cuidados de saúde dos 27 países, como podemos ouvir uns lacaios, políticos ou comentadores, dizerem ao povo que é preciso aumentar os impostos ou cortar no Serviço Nacional de Saúde?
Deixem de pescar petinga e dediquem-se à pesca do tubarão!
Imagem 1 e 2

Ecos da blogosfera - 2 out.

“Para palhaços, palhaço e meio”…

Morto-vivo da política italiana, Berlusconi lançou o país no caos ao retirar os seus ministros do governo. Agora, a solução duradoura depende de Beppe Grillo, profeta da negação e do protesto.
Bernd Riegert
Bas van der Schot
A coligação de governo da Itália, formada por social-democratas e conservadores, mal durou 5 meses. No disputa de fevereiro deste ano, os eleitores não concederam maioria a nenhum dos partidos, forçando uma funesta associação entre a esquerda e o partido do ex-primeiro-ministro Silvio Berlusconi. Assim, em abril, o chefe de governo Enrico Letta embarcou num projeto quase impossível: reger a Itália de forma estável e conduzi-la para fora da dramática crise económica.
Agora esse governo fracassa ostensivamente, devido ao comportamento irresponsável e egocêntrico de Silvio Berlusconi. O sonegador condenado pela Justiça agarra-se ao seu posto no Senado, chantageia o governo, utilizando-se, para tal, do seu submisso partido, o Povo da Liberdade (PdL), que administra como se fosse uma empresa privada.
Berlusconi – que no dia 29/09 completou 77 anos – retirou os seus 5 ministros de Roma devido à intenção explícita do Senado de aplicar contra ele a sentença legalmente válida de afastamento.
Com toda a frieza, sem considerar os danos que podem resultar para a Itália e talvez a toda Europa, Berlusconi mexe os seus pauzinhos. Ou será que ficou maluco, como supõem o primeiro-ministro Letta e o presidente da Confindustria, Giorgio Squinzi, entre outros?
Coligação sem base
Enquanto Berlusconi faz estardalhaço no grande palco da política italiana, nos bastidores já estava claro, praticamente desde o início da grande coligação, que as conceções da esquerda e da direita na política económica e tributária não batem.
Até hoje, Roma não foi capaz de implementar qualquer resolução mais incisiva. Seguem adiados tanto o planeado aumento do IVA como a nova regulamentação dos impostos imobiliários. A Itália vem mancando, lá atrás, no que diz respeito aos projetos de reforma mais relevantes. Iniciativas contra o desemprego são quase inexistentes.
Em maio, a União Europeia suspendeu o processo relativo ao défice público da Itália. Agora, tudo indica que o país terá novamente que se endividar mais do que esperava. Em outubro chega a hora da verdade: o comissário de Finanças da UE, Olli Rehn, vai colocar os números na mesa e examinar o orçamento público italiano para o próximo ano – se é que haverá uma proposta de orçamento, sem um governo operante em Roma.
Em Bruxelas ainda reina o silêncio, mas nas instituições europeias, e sobretudo nos demais países-membros da zona do euro, o clima em relação ao caos na Itália varia da incompreensão ao pavor. Os números básicos da economia nacional acabavam de manifestar uma modesta melhoria. Será que os partidos não tinham nada melhor a fazer, do que provocar mais outros meses de estagnação política?
Pressão dos mercados
Há um ano, os mercados financeiros vêm dando aos italianos um pouco de espaço para respirar. O Banco Central Europeu comprou títulos públicos do país e garante que continuará a intervir. No entanto, a partir da última sexta-feira voltou a subir o preço que Roma tem de pagar pelas suas dívidas excessivas.
A taxa adicional de risco – ou il spread, difamado como invenção alemã por Berlusconi, na sua campanha eleitoral – é a dura realidade. Dentro do curto prazo, os juros poderão esmagar a Itália. A crise está apenas adormecida, não superada, de modo algum.
Se a situação voltar a piorar na Itália, também o restante do sul da Europa vai sofrer. No fim de contas, a crise pode novamente alastrar-se por toda a zona do euro, e aí os países do norte teriam que disponibilizar mais verbas e garantias para estabilizar a Itália.
Eleições antecipadas
Em novembro de 2011, os chefes de Estado e de governo da UE conseguiram expulsar do cargo o então primeiro-ministro Silvio Berlusconi, num momento em que o seu país se dirigia vertiginosamente para o abismo político-financeiro. Porém, mesmo essa intervenção maciça pouco adiantou: Berlusconi prossegue manipulando os fios. A situação na Itália só melhorou ligeiramente. Em Bruxelas, o clima é de perplexidade.
Por isso, nos últimos dias, políticos europeus tentaram por todos os meios demover os protagonistas na Itália de se afundarem numa nova crise de governo. Tarde demais: a crise é um facto, e terminará em eleições antecipadas, dentro de alguns meses.
Até lá, o ancião presidente Giorgio Napolitano deve voltar a instaurar um governo de tecnocratas, como último recurso capaz de conter o alastramento do desastre italiano pelos outros Estados da união monetária. A experiência também mostra, porém, que um governo tecnocrata não costuma durar mais de um ano.
"Cavaliere" volta a atacar
Na Itália, 3 partidos inconciliáveis atualmente confrontam-se: os socialistas, os apóstolos de Berlusconi e os apoiantes do negativista radical Beppe Grillo. Está totalmente em aberto de que forma se comportarão agora os grillini, os frustrados eleitores dos votos de protesto. Grillo predissera repetidamente que o sistema italiano iria sufocar-se em si mesmo, antes que nascesse algo de novo. Talvez ele tenha razão.
Entretanto, a facão em torno de Berlusconi é mais forte do que se pensa, fora da Itália. Apesar de todos os escândalos e gafes do "Cavaliere", quase 1/3 dos eleitores optou pelo PdL. E o morto-vivo político pretende voltar a fundar o seu antigo partido, o Força Itália, para, no próximo pleito, voltar a ser chefe de governo.
Em nome dos interesses da Itália e da Europa, só se pode torcer para que o plano de Berlusconi não vingue. No entanto, o país só estará apto a ser governado se o eurocético Beppe Grillo se movimentar, ou se a ala real-política dos grillini desertar para a esquerda.