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domingo, 3 de outubro de 2010

Uma Igreja que fala do inferno na Terra, “de jure”

Hieronymus Bosch: “O Juízo Final” (1504)
Desde tempos imemoriais que há ricos e pobres, mas só a injustiça acrescenta ou diminui o seu número.
Portugal atravessa uma crise de valores assustadora, mas também económica, que é geradora das mais graves injustiças sociais e que está a atingir sobretudo os mais débeis. O Orçamento de Estado que está para ser aprovado na Assembleia da República contém linhas de acção que penalizam sobretudo os agregados familiares de menores recursos, para além de acertar também na classe média baixa. Impostos mais elevados, cortes sociais, baixa de salários, tudo isto somado ao desemprego existente e à falta de uma linha de rumo económica para o país, vão debilitar alguns milhões de portugueses.
É nestes tempos de crise que se renovam apelos à solidariedade, mas é nestas condições que os mais ricos conseguem aumentar o seu poder económico. Não somos contra os ricos, mas sim contra a injustiça que permite que estes fiquem ainda mais ricos e os pobres desçam ao patamar da miséria social e humana. Os governantes são eleitos pelo povo na perspectiva de que estes façam uma gestão dos recursos do país de uma forma séria e igualitária. E o que vemos? Exactamente o contrário. Dizem-nos que o país poderá estar à beira da bancarrota, infelizmente parece que caminha a passos largos para algo parecido, cujos efeitos ainda desconhecemos, mas o seu equilíbrio não pode ser feito à custa daqueles que não têm voz.
A quem governa exige-se competência e seriedade, mas a maior parte de reputados economistas tem demonstrado que as medidas que serão tomadas neste orçamento não são correctas, suficientes e muito menos justas. Há décadas que a despesa de funcionamento do Estado não pára de aumentar, é um peso cada vez maior sobre o cidadão, mas isso parece não afectar quem nos governa. Quando pretendem cobrar mais impostos dizem-nos que o Estado somos todos nós, que devemos pagar, mas a verdade é que quem beneficia do Estado são apenas – na sua maioria - uma classe de eleitos.
Como curiosidade recordamos que em Julho passado Carlos Azevedo, presidente da Comissão Episcopal da Pastoral Social, desafiou os políticos a contribuírem com uma pequena parte do seu ordenado para um fundo social, mas as respostas a esse apelo raiaram o ridículo, apesar de muito comentado na comunicação social. Mais tarde, em Setembro passado, na abertura da Semana Pastoral, em Fátima, o bispo classificou como “indecente” o actual modelo económico que “agrava a pobreza e a exclusão social”. "Não são as pessoas que estão ao serviço da economia mas a economia que está ao serviço das pessoas e dos povos, ao serviço do bem comum, sem deixar de lado os vulneráveis", acrescentou.
"As consequências sociais da crise vão continuar a afectar os mais pobres durante vários anos, de forma mais intensa", disse Carlos Azevedo. Apesar da contundência das palavras do bispo, os meios de comunicação social pouco difundiram sobre o alerta e dos políticos nada ouvimos em apoio responsável, como seria justo esperar. Silêncio foi a resposta, o que é lamentável sobre todos os aspectos, e revela a insensibilidade daqueles que têm obrigação de trabalhar em prol do povo português.
Pela riqueza ou pobreza de um país se pode julgar os seus governantes.
Imagem - Hieronymus Bosch (1450-1516), parte central do tríptico: “O Juízo Final” (1504)

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