A dívida e as dúvidas - Helena Cristina Coelho
A economia mundial está a tornar-se numa espécie de jogo global de estratégia e espionagem – com a diferença de que, ao contrário de um normal jogo, tem tido pouco de diversão e muito de sustos.
Há países que espreitam as movimentações dos vizinhos à espera que cometam um passo em falso para lhes ganharem a dianteira. Há os que negoceiam alianças e acordos para conseguirem manter-se em jogo. E depois há países que estão a ser constantemente insuflados com informações e alertas perigosos, que lançam a instabilidade e o caos, como se o objectivo fosse dividir para reinar.
A Europa, não é novidade, tornou-se no centro das atenções deste jogo, sobretudo países como Portugal. E os Estados Unidos são se limitam a ser atentos observadores - estão a influenciar (e muito) o jogo. O aviso deixado esta semana pela agência internacional Standard & Poors, de que tem Portugal sob vigilância e que poderá até cortar o ‘rating', deixou os mercados ainda mais nervosos do que o habitual. E levou os investidores a exigirem ainda mais juros pela compra da dívida portuguesa.
Também esta semana, a administração Obama decidiu enviar um alto quadro do Tesouro à Europa para avaliar as implicações da crise de dívida soberana. Uma missão com pouco de secreto e que o próprio porta-voz da Casa Branca fez questão de explicar: o presidente norte-americano está a receber informações diárias sobre a situação que, admite, é fonte de preocupação para o país e para a economia mundial. O guardião e amigo de (quase) todas as nações está até disponível para apoiar um aumento da capacidade do fundo de estabilidade europeu, através do papel do FMI em futuros resgates.
No meio de tanto ruído, com informações negativas a inundarem mercados tão sensíveis ao mínimo rumor, é difícil que países como Portugal consigam manter o controlo da situação. Se alguém decide segredar que os portugueses são os próximos a pedir ajuda internacional, é fácil pensar que é o que vai acontecer a seguir. Ontem o Governo português decidiu alinhar no jogo: o secretário de Estado do Tesouro, Carlos Costa Pina, subiu ao palco dos jogos e disse aos mercados que não será fácil tombar Portugal. E que se, a União Europeia fosse mais eficaz a estancar a crise da dívida soberana, o cenário europeu talvez não fosse tão problemático.
Mas a mensagem-chave no meio do discurso é quando Costa Pina diz que Portugal não precisa de resgate, "não precisa de nenhum ‘bailout'" e que espera que os rumores sobre pressões da União Europeia para o país aceitar ajuda "acabem depressa". Refere ainda que "os desafios da Europa não estão nos países pequenos, periféricos e do sul. Os desafios estão no centro. Qualquer discussão lateral é errar o alvo". Num jogo onde a informação, nesta fase, é a moeda mais valiosa, é importante que Portugal aprenda rapidamente estas regras. Pelos vistos, começa a aprender. Resta saber se ainda vai a tempo de matar as dúvidas e recuperar o tempo (e dinheiro) perdido.
Helena Cristina Coelho, Subdirectora do jornal Económico
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