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sábado, 3 de março de 2012

O resumo dos resumos, com um rumo: Até para o ano!

A frase “amo a língua portuguesa” foi das mais marcantes da 13ª edição do Correntes d’Escritas.
O seu autor, Rubem Fonseca, marcou presença no Encontro de Escritores depois de “ter esgotado todas as desculpas. Há tantos anos que queríamos que o Rubem viesse”, disse Luís Diamantino, Vereador do Pelouro da Cultura. O escritor brasileiro venceu o Prémio Literário Casino da Póvoa, disse Camões, recebeu a Medalha de Mérito Cultural, falou sobre as características essenciais de um escritor, deu autógrafos, falou com o público e com os seus colegas – que durante os 3 dias do evento estiveram tão, ou mais, entusiasmados com a sua presença do que o público.
Duas outras figuras, desta feita portuguesas, chamaram ao Auditório centenas de pessoas: D. Manuel Clemente e Eduardo Lourenço.
O Bispo do Porto proferiu a Conferência de Abertura e falou sobre “Portugal e os Portugueses em 2008 e depois”. Para o clérigo, “desenrascanço, dentro e fora da pátria, é a mais nova palavra do campo lexical português sem ter tradução possível tamanha característica portuguesa, juntando-se à nossa célebre saudade”.
Eduardo Lourenço foi o homenageado pela Revista Correntes d’Escritas 11 e, na sua apresentação, referiu-se àquele momento como sendo “de grande estímulo, numa fase descendente da vida em que me encontro. O General De Gaulle dizia que a velhice é um naufrágio. Mas, já que naufragamos, que seja um naufrágio à Titanic, uma coisa gloriosa, com honras nas páginas dos jornais”. Para o ensaísta, “de algum modo, um escritor – e eu não sou um escritor nesse sentido, nem, talvez, em nenhum – arrisca. A pretensão da escrita é de ser mágica, um concentrado do sentido da experiência humana”.
Sobre esta 13ª edição, Luís Diamantino afirmou que “esta foi a edição número 13 e penso que foi uma sorte – e a sorte dá muito trabalho, como se sabe – termos aqui, hoje, tanta gente. Pensámos que num ano de crise iríamos ter menos público e, afinal, tivemos mais pessoas. Como se viu aqui, o dinheiro não é tudo e os portugueses precisam de elevar o espírito, abrir portas e ter esperança através dos livros. É importante continuarmos neste caminho e não podemos parar um ano, sob pena de quebrarmos esta corrente. Este evento abre o ano literário no país e, se não fosse este, outro apareceria para ocupar o lugar. Quando dizem que a Póvoa de Varzim não tem atrativos turísticos, eu dou sempre a mesma resposta: o Correntes d’Escritas traz pessoas de todo o país para a nossa cidade, desde Abrantes, Lisboa, Guarda e Algarve. Todas as Mesas de Debate lotaram sempre o Auditório Municipal, com pessoas a ouvir até do lado de fora da sala”. Sobre o orçamento deste ano, o autarca disse, “penso que é praticamente impossível fazer um evento deste género em Portugal com o nosso orçamento. Gastamos um terço do dinheiro e isso é quase um milagre”.
O Auditório Municipal, o Hotel Axis Vermar, a Casa da Juventude e a Biblioteca, os locais anfitriões do Correntes d’Escritas, estiveram sempre  completamente lotados, quer fossem Mesas de Debate, lançamentos de livros, encontros com alunos, performances teatrais ou sessões de poesia.
Os escritores, com textos preparados com antecedência ou falando de improviso, emocionaram o público por diferentes razões. Luis Sepúlveda desabafou: “a profissão de escritor nem sempre é compreendida”. Inês Pedrosa lembrou que: “Rui Zink ainda não ganhou nenhum prémio literário porque já fez televisão”. valter hugo mãe confessou querer dormir com Rubem Fonseca, muito quietinho para não o incomodar. “Às vezes, confundimos os escritores com os seus livros e começamos a nutrir carinho por eles” (já se adivinhava que, depois desta declaração, uma senhora da plateia, na altura das perguntas do público, dissesse ao Prémio Saramago que também ela, muitas vezes, adormecia junto a ele, o que deixou o escritor, assumidamente tímido, ruborizado). Sandro William Junqueira declarou: “não acredito muito na crise da escrita. As crises às quais não podemos escapar são as da vesícula e as do fígado”. Salgado Maranhão revelou que a: “verdadeira crise de quem escreve é não poder fazer aquilo de que se gosta porque o que se gosta já está feito, já está escrito”. Rosa Montero partilhou que: “a nossa memória é um conto que contamos a nós mesmo. É um romance, um livro que está em constante construção e onde a personagem principal somos nós”. Fernando Pinto do Amaral sublinhou que: “o efeito catártico da literatura e da poesia tem uma função terapêutica, levando a pessoa comum a ser herói por um dia ao encarnar personagens”.
Mas, muitas outras histórias marcaram esta edição que, segundo Rui Zink, foi mais curta, mas a melhor. Alguns escritores arrancaram gargalhadas, como Afonso Cruz: “Há algum tempo, um amigo disse-me que estava impressionado com o meu filho de quatro anos, que era muito erudito. Fiquei admirado e perguntei-lhe porquê. Disse-me que gostava muito de Tolstoi, respondeu-me. Será que o meu filho lê Tolstoi às escondidas? Até que me apercebi que o que o meu filho tinha dito é que gostava muito do Toy Story, tinha era dificuldade, e tem até hoje, em dizer os ‘erres’”. Outros, marcaram pela emoção transmitida, como Ana Luísa Amaral e o seu poema Visitação ou Poema que se diz manso. No entanto, um dos momentos mais emocionantes foi a entrega dos Prémios Literários e, mais especificamente, o do 2º lugar do Prémio Conto Infantil Ilustrado Correntes d’Escritas/Porto Editora. O trabalho escolhido pertence à turma E da Escola Básica Bairro Duarte Pacheco, de S. Victor, Braga. Os alunos desta turma têm problemas auditivos e, quando subiram ao palco para receberem o Prémio, foram acolhidos com um enorme aplauso. Mas, neste aplauso, as mãos não se tocaram e o único som que se ouviu foi a respiração emocionada da plateia. Escritores, público e equipa comunicaram com aqueles alunos na sua língua, a gestual, e através de acenos de mãos mostraram que a literatura, os livros, as palavras escritas e as imagens, são linguagens completamente universais.
Até para o ano!

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