Poesia e economia são palavras que, habitualmente, não aparecem na mesma frase.
Jaime Rocha, João Luís Barreto Guimarães, Margarida Vale do Gato, Manuel Rui e Manuel António Pina muitas vezes se referiram a estas duas palavras, aos seus significados e às suas atualidades.
Afinal, o tema proposto pela organização à Mesa de poetas era “A Poesia é o resultado de uma perfeita economia das palavras”.
Jaime Rocha começou por confessar a sua afinidade com a Póvoa de Varzim, com o mar, com as suas pessoas: “É uma outra casa minha”. À primeira vista, disse, “a frase lembra-me uma expressão dos nossos avós, quando falavam das suas economias referindo-se às suas poupanças”. Mas, “a história contamina as palavras e, hoje, a palavra economia remete-nos para uma leitura perversa desse tema. Pensa-se mais numa entidade superior que não temos acesso, nem entendemos devido à sua complexidade. E é verdade. Quando ouço os especialistas, tenho a sensação de estar a entrar num território lamacento onde me enterro a cada passo e de onde só sairei quando me lançarem uma corda. Mas, os que se oferecem para lançar a corda não são gente fiável, nem de bem”. O autor de Necrophilia recordou as declarações do economista Miguel Beleza, feitas na última semana, que faziam referência ao facto dos economistas em geral não saberem o que se está a passar no mundo atual e que, então, constroem um discurso impercetível para as pessoas, que têm vergonha de perguntar para não passarem por estúpidas. “Ele, economista. Foi a primeira vez que ouvi um economista falar verdade. Como vêm por aqui, a palavra perfeição está arredada. Apenas se sente e se chega ao logro da mentira, à arrogância de uma classe que quer comandar a vida das pessoas. O resultado está à vista na Grécia e em Portugal, que hoje é comandado por dois economistas”.
João Luís Barreto Guimarães disse entender muito pouco de economia, ainda mais neste tempo de escassez pelo qual passamos. “Tanto quanto me consegui aperceber, a palavra perfeita e a palavra economia não costumam avançar juntas, tal casal de namorados que, a cada passo, pisam o dedo grande do pé um do outro. Com a diferença que, à economia, ninguém ouvirá pedir desculpa”. Para o poeta, “a poesia que me parece maior é a mais pequena, em tamanho e em tom, essa é a poesia que me interessa. Que não fale muito. Que diga o que tem a dizer e depois se cale, sobretudo de forma concentrada, alusiva, sintética e sincopada”. Afinal, “nunca a quantidade se tornou qualidade”.
Para Margarida Vale do Gato foi “extraordinário ver este Auditório cheio de gente a querer ouvir o que temos a dizer”. A repetente no Correntes d’Escritas contou que, na sua primeira vez no Encontro, o ano passado, lhe disseram que os temas das Mesas costumam ser provocadores “e eu resolvi responder com uma provocação, relacionando com o meu percurso recente. Devido às medidas economicistas e de esgotamento deste estado de crise, cheguei à conclusão que se não queremos mudar temos que mudar na mesma, nem que seja para pior. Então, associei-me aos movimentos de ativismo social”. A escritora não concordou com João Luís: “se precisarmos de escrever muito, devemos escrever muito. Temos é que escrever, essencialmente”.
Manuel Rui leu um poema da sua autoria, onde se ouvia que como seria interessante num parlamento os deputados pouparem palavras e que, mesmo em tempos de austeridade, não tenho a pretensão de dizer que se deve poupar nas palavras. “O poema deve ser feito com as palavras que o consigam realizar, nunca se confundindo poemas longos com palavras que estão a mais”, sublinhou, “porque afinal, poesia é como fazer amor na posição e da forma que mais se gosta, para que a poesia possa ser gostada pelos outros”.
Manuel António Pina considera “não haver nada perfeito, muito menos a economia”. O poeta afirmou que a problemática de encontrar a palavra certa e não usar palavras que estejam a mais também se coloca na prosa. A questão é a palavra que não funciona, que não tem nenhuma função, “que foi ver a bola”.
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