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quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Digamos que… andam a dar-nos baile!

Quer seja através do orçamento, da política ou da solidariedade financeira, a ideia de uma maior integração da UE está na moda. Mas qual seria a forma definitiva desta União mais federal? Ninguém sabe ao certo e é este o problema.
No passado mês de janeiro, no Fórum Económico de Davos, Angela Merkel ousou falar timidamente do federalismo. Nessa altura o seu discurso não suscitou grandes reações. Seis meses depois, são muitas as propostas relativas a uma União Europeia Federal. José Manuel Durão Barroso, o presidente da Comissão Europeia, assim como alguns ministros europeus dos Negócios Estrangeiros passaram desde então a apelar a uma federação de Estados-nações.
Se a lista dos “federalistas” aumenta (uma evolução saudada pelo Respekt), não significa que todos concordam sobre o que é uma federação. Um facto alarmante, o que sobressai dos debates atuais sobre o futuro da Europa é que muitos responsáveis políticos ignoram por completo o significado dos conceitos institucionais. Por consequência, existe hoje um verdadeiro caos verbal.
Surgem constantemente novos conceitos, cujo sentido só aparece mais tarde: união bancária, união de transferência, união política, união orçamental, etc. Uns falam de centralismo reforçado, outros de integração, alguns de uniformização das regras, enquanto outros alertam para os perigos de um super-Estado. No entanto, teríamos dificuldades em encontrar num dicionário essas palavras e expressões, para as quais só começamos agora a procurar uma definição.
No Canadá, nos Estados Unidos e na Alemanha, as pessoas sabem perfeitamente o que é uma federação e o federalismo, porque vivem numa federação. Daí poder parecer muito paradoxal o facto de os alemães não conseguirem imaginar completamente um nível [federal] europeu e não aderirem à ideia de serem uma federação numa federação (o princípio das matrioscas).
É característico dos franceses não poderem, salvo raras exceções, de forma alguma considerar o federalismo, que associam ao centralismo. E por fim, para os britânicos, o federalismo é o símbolo de uma descentralização assimétrica (existe um parlamento na Escócia e no País de Gales, mas nenhum na Inglaterra).
O que seria impensável nos Estados Unidos
O orçamento comum da União Europeia representa apenas 1% do PIB europeu. E precisava de ser reduzido ainda mais (para 0,8%), mas a UE já se comprometeu tanto em algumas das suas orientações centralizadoras, que tal evolução seria impensável na Federação bem real que são os Estados Unidos da América. Caso um dia uma decisão emitida por um órgão central viesse a obrigar os Estados americanos a aprovar, através de um simples corta e cola, uma constituição financeira e criação de um comité orçamental (por outras palavras, alterar a sua própria constituição), a submeter a Washington o seu orçamento para ser aprovado – antes mesmo de estes o adotarem – e apresentá-lo novamente para ser controlado (um dos princípios do pacto orçamental europeu), assistiríamos a contestações violentas e à implosão da federação americana.
Por outro lado, a criação de uma federação é um longo processo que, segundo os especialistas, só foi verdadeiramente alcançado nos Estados Unidos a partir dos anos 1930 (do século passado), quando foi instituído um sistema de garantia federal dos depósitos bancários. Convém salientar que a zona euro está cada vez mais próxima de uma garantia comum dos depósitos bancários (um dos elementos que define uma federação) e faz também grandes progressos noutros dossiês relacionados com a união bancária. De qualquer forma uma coisa é certa, a zona euro só poderá resolver a crise com um orçamento e impostos comuns. Seria prudente da nossa parte, enquanto checos, compreender perfeitamente que isso significaria para nós ficar fora de uma federação europeia, caso se decida realmente criá-la.
O que marcou a história
Os detratores do federalismo defendem que a própria ideia de federalismo é ingénua, até mesmo perigosa, pois não existe uma nação política europeia. O americano é antes de mais americano e somente depois do Minnesota. O alemão é antes de mais alemão e somente depois é europeu.
Mas podemos, de forma “artificial”, favorecer ou acelerar a emergência de uma identidade europeia. Muitas coisas podem ajudar neste sentido: uma eleição do presidente europeu por sufrágio universal direto, um instituto da cidadania europeia, um imposto europeu comum mínimo, etc.
É também de realçar que a nação política americana se constituiu por etapas (embora por outros motivos e de forma diferente, em comparação ao caminho que a Europa provavelmente seguirá). O direito de voto foi primeiramente concedido aos proprietários, seguidos pelos que pagavam um imposto, 100 anos mais tarde às mulheres e por fim, apenas recentemente, aos afro-americanos. Os americanos iniciaram o processo de construção com um Ministério das Finanças, os europeus com um Banco Central.
Os críticos defendem que todos os projetos políticos, os processos de integração/desintegração devem ser espontâneos e autênticos, nunca elitistas e artificiais. Mas a maioria das evoluções importantes que marcaram a história da Humanidade são resultado da ação de uns que souberam guiar outros.
E o que o amanhã trará à Europa continua a ser incerto. Esta tanto se pode tornar uma federação, como se pode desmoronar. Aconteça o que acontecer, é necessária pelo menos uma coisa antes de se poder considerar a criação de uma federação: que as elites europeias comecem a deliberar sobre a questão do que é ou não uma federação. As noções fundamentais desta lição poderiam basear-se no facto do federalismo não ser uma construção puramente decorativa, mas uma realidade sólida que assenta num conjunto de valores que são nomeadamente a limitação e o controlo do poder, o equilíbrio das forças, as garantias e a proteção reforçada – assimétrica – dos mais pequenos e mais fracos.

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