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sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

6º de “Dez olhares sobre a Europa” - Philippe Perchoc

A UE comporta-se como uma adolescente complexada, que não sabe o que fazer do seu corpo em evolução, observa o investigador francês Philippe Perchoc. É, no entanto, na procura de novos sonhos com os países que se querem juntar a ela que crescerá e assumirá o seu papel no mundo.
Há alguns meses, conversava no Metro com um diplomata estónio e defendia que a Europa tinha sido o continente das utopias e que, hoje, já nada a faz sonhar. Uma parisiense virou-se e disse-me: “A Europa? Utopia? Qual o quê! É apenas um clube de magnatas que se alimentam à custa da arraia-miúda.” 
Pedaços de conversa nos transportes públicos ou a leitura de qualquer diário mostram que a Europa está com um problema, antes de mais em relação a si própria. Todos os meios de comunicação social trazem o psicodrama diário da Europa, a sofrer para sair da adolescência. Considerada no longo prazo, a Europa política mal saiu da infância. Sessenta anos de história não é sequer o tempo de duração do reinado de Luís XIV. E esta Europa adolescente toma de repente consciência que o seu corpo se alterou, desde a pequena Europa dos Seis, cresceu e fez dela um adulto mundial, com as responsabilidades inerentes. Esta crise de adolescência é uma das causas do divórcio entre os cidadãos e o projecto europeu.
A Europa tem dificuldade em gostar de si nas suas novas proporções. Não escolheu verdadeiramente crescer, foi empurrada pela história e pela queda do Muro. Hoje, acha-se demasiado grande, demasiado complicada. Por um lado, sente-se tentada a anular este alargamento rápido. Alguns intelectuais franceses, como Max Gallo, defendem a ideia de “um assalto ao poder franco-alemão” e de uma aliança com a Rússia por cima da cabeça dos pequenos Estados-membros. Por outro, vivem-se querelas intermináveis para saber quantos funcionários vão compor o novo Serviço Europeu de Acção Externa, em vez de se falar das missões deste novo serviço. Qualquer debate sobre o tipo de intervenção é rapidamente afogado nos meandros das dissensões sobre os meios. A União parece ter perdido confiança si e qualquer interesse no futuro, como demonstrou a cacofonia sobre a Europa 2020.
No entanto, a Europa é realmente a única a ver-se tão feia. Por todo o mundo, há intelectuais a manifestarem a sua paixão por este modelo europeu e a apontarem o lugar que este continente deveria tomar na nova governação mundial. Mas na Europa, o nosso doentio olhar para o umbigo priva-nos de qualquer progresso. Quando a China, a Índia, os Estados Unidos, o Brasil e a África demonstram confiança no seu futuro, a Europa parece paralisada pelo medo. Quase lamenta ter deixado de ser a Europa anã que vivia ao abrigo do Muro, protegida pelos Estados Unidos.
A crise gripou os dois motores da construção europeia: a solidariedade e a procura da eficácia. Por um lado, os chefes de Estado interrogam-se, em Bruxelas, se devem ajudar cada país em dificuldade. Por outro, só são capazes de montar mecanismos complicados, tentando preservar a independência de cada órgão. Ora, quando um membro é atacado, todo o corpo fica em perigo. Mas a cabeça (o Conselho Europeu) interroga-se se é avisado intervir e o coração (a Comissão Europeia) parece ter cessado de bater e emitir ideias novas, dar impulso ao corpo gordo da Europa. É necessário deixar de olhar para o umbigo e pensar outra vez na Europa como “nós”. A crise continental do “eu” é provocada pela crise de 27 pequenos “eus”.
Porque a Europa tem uma relação complicada consigo própria, vive uma relação complexada com os outros. No entanto, não tem nenhuma razão para se desculpar de ser como é. Incluindo com os que lhe batem à porta. Em vez responder com um reflexo de medo – “quem vem lá?” – devíamos ouvir: “Sim, o que deseja?”. Com efeito, os europeus, obcecados por eles mesmos, o seu funcionamento, os seus problemas monetários, esquecem que é realmente possível construir algo com alguém que não se lhe assemelha completamente. Ora, nunca se pergunta aos turcos, aos sérvios ou aos islandeses qual é o seu sonho de Europa. Quais seriam as suas prioridades quando entrassem para o clube. Como imaginam a Europa no mundo dentro de 50 anos. Nada disso, para começar.
O que falta hoje aos europeus é um grande projecto. Poder-se-ia mesmo dizer uma utopia. Os desafios não faltam: pacificar as relações internacionais como se pacificaram as relações europeias, ser um actor essencial do desenvolvimento sustentável ou construir a grande economia solidária do conhecimento do futuro. Mas para isso, é necessário reagir.
Philippe Perchoc

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