Por unanimidade, o Tribunal Constitucional (TC) recusou "aclarar" o acórdão que chumbou 3 normas do OE 2014, pedido que lhe foi feito pelo Governo, através do Parlamento.
"O acórdão n.º 413/2014 [...] não enferma de qualquer obscuridade ou ambiguidade", lê-se no acórdão, publicado no site do TC.
Acrescentando que "os esclarecimentos que o requerente pretende obter não derivam de qualquer vício ou deficiência que seja imputável ao acórdão, mas resultam de dúvidas de ordem prática que respeitam ao cumprimento do julgado". Pelo que "não cabe ao Tribunal Constitucional esclarecer outros órgãos de soberania sobre os termos em que estes devem exercer as suas competências no plano administrativo ou legislativo".
Isto quer dizer que a iliteracia político-administrativa do governo anda por baixo ou que queria dar gozo com este “clarão” que resultou num “apagão”…
O TC não gostou de ouvir o ministro Miguel Poiares Maduro culpar os juízes pela não devolução dos cortes dos subsídios de férias dos funcionários públicos pagos até 31 de Maio, bem como os 2 partidos da maioria e emitiu um comunicado em resposta direta às “afirmações públicas” que foram proferidas durante a tarde.
Isto quer dizer que a formação académica do jovem ministro deve ter sido obtida ao abrigo do processo de Bolonha, enquanto a dos juízes do Constitucional foi no tempo em que se aprendia muito, inclusive em Português, quer na escrita, na leitura e na interpretação…
O português é uma língua muito traiçoeira. A piada de Herman José é o melhor resumo da troca de argumentos entre o Governo e o Tribunal Constitucional. Os juízes falam e o Executivo diz que não percebe. Pedro Passos Coelho pede esclarecimentos, o Tribunal diz que não há nada para explicar e o ministro Poiares Maduro vem dizer que agora percebeu tudo. Isto parece uma boa anedota mas é um assunto sério.
Passos Coelho quer usar o Constitucional como alibi para as medidas de austeridade que ainda tem de aplicar. A guerra continuará quente nos próximos tempos, até porque falta a decisão do Tribunal sobre a CES. Veremos até onde Passos Coelho esticará a corda.
Questionado pela decisão do TC sobre o pedido de aclaração do Governo, o ministro-Adjunto e do Desenvolvimento Regional afirmou aos jornalistas que "o tribunal torna claro que [o acórdão] só se aplica realmente a partir de 31 de maio e quanto àqueles que receberam já subsídios de férias com cortes, não há qualquer alteração a fazer".
Isto quer dizer que Poiares Maduro andou a ler o “Borda d’Água”, para saber que o mês de maio é antes do mês de junho ou que o mês junho vem logo a seguir ao mês de maio (como diria Vítor Gaspar), percebendo, sem qualquer explicação, o que já todo o governo tinha percebido e nós também…
Mas a tática não tem nada a ver com os subsídios de férias, mas com os roubos aos reformados com a CES que sendo extraordinária, já está fora de prazo…
O Tribunal Constitucional (TC) mandou, ontem, o Governo trabalhar. Assim mesmo: sem misturar papas no argumentário, os juízes disseram ao Executivo liderado por Pedro Passos Coelho que não lhes cumpre dizer para que lado deve apontar a agulha da "bússola" que o primeiro-ministro pediu, quando se viu confrontado com novo chumbo do TC - essa tarefa pertence, num país normal, ao poder Executivo. "Não cabe ao TC esclarecer outros órgãos de soberania sobre os termos em que estes devem exercer as suas competências no plano administrativo ou legislativo", dizem os juízes. A César o que é de César.
Paulo Ferreira
Antecipando este previsível desfecho, Passos Coelho foi a Belém pedir ao presidente da República que "obrigasse" o TC a proceder à fiscalização preventiva, ou sucessiva, dos diplomas que podem mexer nas contas do défice. Percebe-se o alcance da "jogada" de Passos Coelho: uma vez que não é possível convencer os juízes da bondade das medidas que cortam direitos e emagrecem bolsos, é preciso colar Cavaco Silva a esta equação, de forma a pressionar os chatos dos juízes.
Sucede que a "jogada" tem um risco incomportável para o chefe de Estado. Sabendo-se que correr riscos não é propriamente o desporto preferido de Cavaco Silva, por que razão haveria ele de se meter nesta embrulhada? Mais: supondo que o presidente da República pode muito bem não encontrar qualquer inconstitucionalidade nos diplomas do Governo, que sentido teria enviá-los para o TC, apenas na expetativa de que os juízes, enfim, se dispusessem a mostrar a luz a Passos Coelho?
No discurso do último 10 de junho, Cavaco tratou de recuperar o terreno político que perdera, ao sufragar, uma e outra vez, o caminho trilhado pelo Governo. Ao forçar novamente um entendimento ao centro, o presidente da República balizou com rigor aquilo que deseja: o país não pode chegar à decisiva elaboração do Orçamento do Estado para 2015 com os partidos do arco da governação tão distantes como hoje se encontram. Vale o mesmo dizer: é preciso encontrar modo de desfazer o nó górdio feito pelos partidos do centro. Ora, isso é absolutamente contraditório com o que Passos foi pedir a Cavaco. Se o chefe de Estado aceitasse fazer de mensageiro, morria a mensagem e o portador da dita.
Tudo visto e revisto, resta dizer duas coisas.
Uma: podemos aplaudir ou criticar as decisões tomadas pelo TC; o que não podemos é aceitar que os juízes sejam pressionados por interposta pessoa, sobretudo quando essa pessoa é o chefe de Estado. Por isso, convinha que Passos Coelho e os seus conselheiros ponderassem um pouquinho melhor a geografia dos estragos antes de proclamarem a "guerra".
Duas: esta discussão sobre o TC, que se arrasta ad nauseaum , contém em si uma profunda hipocrisia. Convém talvez lembrar que 10 dos 13 juízes são propostos pelos partidos e sufragados pelo Parlamento. Com jeitinho é até possível identificar quem indicou quem e quem é amigo de quem.
De modo que, no final do dia, a culpa não é dos indicados. É de quem os indicou. Por ter partido do princípio de que bastava indicar para garantir que, chegado o mau tempo, haveria no TC guarda-chuvas para amparar o dilúvio...
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