Nos países mais afetados pela crise, serão precisas várias dezenas de anos para voltar ao nível de vida anterior. E o fosso com os que melhor se saem não para de aumentar, colocando em risco a unidade e estabilidade da União.
Na manif contra a austeridade, Lisboa, 4 de outubro de 2012
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Já em 2009, Angela Merkel alertou: não esperemos por milagres, pois nenhuma decisão política, por muito corajosa que seja, poderá evitar o colapso da economia europeia. Na altura já se encontrava muito isolada na sua forma de encarar o futuro. Hoje, vemos que esta tinha razão, comenta Nicolas Veron, especialista do instituto belga Bruegel. 5 anos após o início da crise, a situação económica da União continua lamentável: dos 27 Estados-membros, 17 estão em recessão.
Nos países mais afetados pela crise, como a Espanha ou Portugal, será necessária mais do que uma geração para compensar a queda do nível de vida. Um espaço de tempo que poderá tornar-se insuportável para a UE. Pela primeira vez desde a sua criação, a União Europeia, contrariamente à zona euro, corre o risco de se desmoronar. Com o passar dos meses, este cenário torna-se mais claro, sem que possamos claramente dizer que processo será privilegiado: o da criação de uma Eurolândia reforçada à volta da Alemanha ou o da desintegração do bloco dos países eurocéticos, com o Reino Unido na liderança.
Pedra angular da integração
Uma coisa é certa, esta evolução não é desejada por Angela Merkel, que fez tudo para a impedir. Esta pretende sobretudo que a nova União mais integrada garanta um lugar sólido à Polónia e aos outros países da Europa central. Países esses que não só constituem uma base industrial para a República Federal (para onde as empresas alemãs deslocalizaram uma grande parte da sua produção), mas que também servem de aliados valiosos no seio do Conselho da UE, quando, tal como Berlim, defendem reformas estruturais e uma política orçamental responsável.
No entanto, o projeto para esta União já fracassou. Pressionados pelos mercados, os dirigentes da zona euro criaram finalmente as bases de um sistema institucional para a zona euro distinto das instituições dos 27, com uma supervisão bancária, uma governação orçamental e um orçamento específico. Estas medidas deveriam ser consideradas essenciais para assegurar o bom funcionamento da zona euro, sem comprometer os fundamentos da União Europeia. Hoje em dia, constatamos que esta hipótese é irrealista, admite Cinzia Alcidi do CEPS (Center for European Policy Studies).
A situação particularmente perigosa afeta a pedra angular da integração, o mercado único. Nos países em que o estado da economia inspira confiança aos investidores, como a Alemanha ou a Holanda, o custo dos empréstimos realizados pelos empresários são muito mais baixos do que nos países periféricos. Já não se pode falar em concorrência leal, algo para que Bruxelas tem trabalhado ao longo das últimas 5 décadas.
O fim do modelo social europeu
A derrota do modelo europeu que pretendia estabelecer um certo equilíbrio entre os níveis de vida na União é vista como mais um fracasso. Graças aos fundos estruturais, assim como ao livre acesso ao mercado da UE para todas as entidades económicas, conseguimos efetivamente reduzir os desequilíbrios do nível de vida entre os países europeus. A Grécia, por exemplo, podia gabar-se, ainda em 2009, de um rendimento por habitante correspondente a 94% da média da União Europeia. Não se afastava muito da realidade alemã (115%). Mas hoje, o fosso entre esses dois países aumentou consideravelmente: o nível de vida na Grécia caiu para 75%, atingindo o mesmo nível do que Polónia, enquanto o da Alemanha disparou para 125%.
Segundo as estimativas dos economistas, estes desequilíbrios vão acentuar-se cada vez mais nos próximos anos. Esta evolução significa que os interesses dos Estados-membros serão cada vez mais diferentes. Enquanto os romenos, os búlgaros, os gregos ou os portugueses tentarão garantir a sobrevivência das suas populações, realçando o que está em jogo perante Bruxelas, a Alemanha e a Suécia darão maior importância à ecologia e às fontes alternativas de energia. Segundo Veron assistiremos a um diálogo de surdos.
A crise varre igualmente um outro grande feito da integração: o modelo social europeu, invejado pelo mundo inteiro. Os sucessivos cortes orçamentais não só na Espanha e na Grécia, como também em França e no Reino Unido, provocam uma redução drástica da proteção social, em matéria de direito de trabalho, de reformas ou de desemprego, criando assim uma geração de jovens sem perspetivas de emprego estável e desprovidos de condições materiais para construir uma família.
O fracasso da política estrangeira comum
Até mesmo o pró-europeu Der Spiegel admite que o centro de decisão da UE passou de Bruxelas para Berlim. Uma mudança que se fez sem qualquer pressão particular por parte dos alemães, mas por exclusão de partes. Dos 6 principais países da UE, 2, sendo estes a Itália e a Espanha, foram imediatamente excluídos devido aos seus graves problemas económicos. O Reino Unido afastou-se de livre vontade. Quanto à Polónia, tendo em conta o seu potencial económico ainda muito fraco e o facto de não pertencer à zona euro, não pode pretender desempenhar um papel decisivo.
Durante algum tempo, a Europa parecia ser dominada por um duo franco-alemão, o famoso “Merkozy”. Mas desde a eleição do novo Presidente francês, François Hollande, tornou-se evidente que Paris, confrontado com grandes problemas económicos, deixou de ter as condições necessárias para desafiar a Alemanha. Berlim acaba portanto por ficar só no campo de batalha.
Focada nos seus próprios problemas a Europa não consegue cuidar do resto do mundo. Assim sendo, o colapso da política estrangeira comum é mais uma profecia sombria que surge perante os nossos olhos. A evolução autoritária da Ucrânia, o drama da Síria, o abandono da luta pelos direito humanos na China, são alguns exemplos da impotência da UE.
Os projetos que envolviam futuros alargamentos da UE foram colocados de parte: a adesão à UE passou agora a ser apenas possível para os países dos Balcãs, situados no interior do espaço da Europa Unida. Uma oferta mais ambiciosa, nomeadamente para os países da antiga União Soviética e a Turquia, deixou de estar na ordem do dia.
5 anos após o início da crise a Europa sobrevive, pelo menos por agora. Mas as perdas são colossais e a União Europeia interrompeu o seu processo de integração para se deparar com problemas que pareciam ter sido resolvidos há 30 ou 40 anos. Agora, até os otimistas dizem: esperemos que não piore.
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