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quinta-feira, 24 de março de 2011

Com palavras e bolos, se enganam os tolos!

A novilíngua portuguesa
Desde que os americanos se lembraram de começar a chamar aos pretos: “afro-americanos”, com vista a adocicar o racismo por via gramatical, isto tem sido um fartote pegado!
As criadas dos anos 70 passaram a “empregadas domésticas” e preparam-se agora para receber a menção de “auxiliares de apoio doméstico”.
As donas de casa passaram a designar-se “empresárias do lar”.
De igual modo, extinguiram-se nas escolas os contínuos que passaram todos a “auxiliares da acção educativa” e ultimamente “agentes operativos”.
Os vendedores de medicamentos, com alguma prosápia, tratam-se por “delegados de informação médica”.
E pelo mesmo processo transmudaram-se os caixeiros-viajantes em “técnicos de vendas”.
aborto eufemizou-se em “interrupção voluntária da gravidez”.
Os gangs étnicos são “grupos de jovens”.
Os operários fizeram-se de repente “colaboradores”.
As fábricas, essas, vistas de dentro são “unidades produtivas” e vistas da estranja são “centros de decisão nacionais”.
analfabetismo desapareceu da crosta portuguesa, cedendo o passo à “iliteracia” galopante.
Desapareceram dos comboios as 1.ª e 2.ª classes, para não ferir a susceptibilidade social das massas hierarquizadas, mas por imperscrutáveis necessidades de tesouraria continuam a cobrar-se preços distintos nas classes “Conforto” e “Turística”.
A Ágata, rainha do pimba, cantava chorosa: “Sou mãe solteira...”; agora, se quiser acompanhar os novos tempos, deve alterar a letra da pungente melodia: “Tenho uma família monoparental...” - eis o novo verso da cançoneta, se quiser fazer jus à modernidade impante.
Aquietadas pela televisão, já se não vêem por aí aos pinotes crianças irrequietas e ‘terroristas’; diz-se modernamente que têm um “comportamento disfuncional hiperactivo”.
Do mesmo modo, e para felicidade dos 'encarregados de educação', os brilhantes programas escolares extinguiram os alunos cábulas; tais estudantes serão, quando muito, “crianças de desenvolvimento instável”.
Ainda há cegos, infelizmente, mas como a palavra podia ser considerada desagradável e até aviltante, quem não vê é considerado “invisual”. (O termo é gramaticalmente impróprio, como impróprio seria chamar inauditivos aos surdos - mas o 'politicamente correcto' marimba-se para as regras gramaticais...)
As prostitutas passaram a ser “senhoras de alterne”.
Para compor o ramalhete e se darem ares, as gentes cultas da praça desbocam-se em “implementações”, “posturas pró-activas”, “políticas fracturantes” e outros barbarismos da linguagem.
E assim linguajamos o Português, vagueando perdidos entre a “correcção política” e o novo-riquismo linguístico.
Estamos lixados com este 'novo português'! Não admira que o pessoal tenha cada vez mais esgotamentos e stress. Já não se diz o que se pensa, tem de se pensar o que se diz de forma 'politicamente correcta'.
E falta ainda esclarecer que os tradicionais anões estão em vias de passar a "cidadãos verticalmente desfavorecidos"...
Os idiotas e imbecis passam a designar-se por "indivíduos com atitude não vinculativa".
O mongolismo passou a designar-se “síndroma do cromossoma 21”.
Os gordos e os magros passaram a ser “pessoas com disfunção alimentar”.
Os mentirosos passam a ser "pessoas com muita imaginação".
Os que fazem desfalques nas empresas e são descobertos são "pessoas com grande visão empresarial mas que estão rodeados de invejosos".
Para autarcas e políticos, afirmar que eu tenho impunidade judicial, foi substituído por "estar de consciência tranquila".
O conceito de corrupção organizada foi substituído pela palavra "sistema".
Difícil, dramático, desastroso, congestionado, problemático, etc., passou a ser sinónimo de complicado.
Mas complicado mesmo, é irmos todos(?) na onda, para não perdermos o barco da modernidade e ingressarmos no número de responsáveis pela crescente “iliteracia” em Portugal…
Apesar do sabor anedótico do texto e da lista de exemplos ser diminuta, na verdade estes novos termos, que não os conceitos, estão na base de todas as sub-novilínguas específicas, que passam pelo “eduquês”, “jurisduquês”, “economês”, “futebolês”, etc., que contribuem para um corporativismo linguístico, originando um crescente desentendimento inter corporações.
Politicamente falando, tudo tem a ver com a desconstrução de conceitos, numa primeira fase, para a posteriori se desligar esse conceito dos direitos/deveres inerentes e finalmente se alterar/eliminar os direitos correspondentes.
Texto recebido por mail

4 comentários:

  1. Infelizmente não é só no Português, Miguel. No Inglês também se caiu nessa onda.

    Quantas mais terão ido na questão do politicamente correcto? Com isto se tentam evitar que as pessoas reparem que, apesar da igualdade de discurso, não há igualdade real.

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  2. Elenáro
    Isto tem a ver com o neoliberalismo, que inventou esta neolinguagem, para a qual Pierre Bourdieu chama a atenção e a justifica, sociológica e politicamente, num dos livros Contrafogos.

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  3. Caro Miguel
    E nessa tal novilíngua, que expressão se usa para POLÍTICOS LADRÔES? Deixa-me ver....talvez "mãozinhas leves"?

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  4. maria
    bom dia!
    E à corrupção "crime económico"!

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