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terça-feira, 2 de outubro de 2012

“Os Europeus” – 11

Luta de décadas entre a Coroa britânica e os seus opositores chegava ao fim. A Declaração de Direitos levou Guilherme III de Orange ao trono inglês, fortalecendo os direitos do Parlamento.
Matthias von Hellfeld
Em 1628, o rei britânico Carlos I (1600-1649) teve que admitir o abuso constante que seus funcionários faziam do direito real de ordenar a prisão de pessoas. Sob ordem expressa da coroa, eles extorquiam dinheiro de cidadãos abastados, com a ameaça de os prender.
A situação fora precedida por conflitos sangrentos, que, por vezes, ameaçavam afundar a Inglaterra numa guerra civil. Para conter essa situação inaceitável, estabeleceu-se, na Petição de Direitos (Petition of Rights) de 7 de junho de 1628, que ninguém mais poderia ser detido arbitrariamente e que todos os prisioneiros tinham direito a um julgamento justo, num espaço razoável de tempo. Esta petição tornou-se uma das leis fundamentais de todos os sistemas legais democráticos.
Lei de Habeas Corpus
Mas a Petição de Direitos ainda teve de enfrentar duras provas. Quando boatos de que o Papa Inocêncio XI (1611-1689) estaria a planear a recatolização da Inglaterra espalharam-se pela ilha, mormente protestante, eclodiram distúrbios que levaram à dissolução do Parlamento, na sua maioria, fiel ao rei.
O rei Carlos II (1630-1685) tentou responder com mão firme. Prisões arbitrárias e encarceramentos entraram na ordem do dia. Sobretudo a extradição de detentos indesejados para prisões nas colónias acirrou os ânimos na Inglaterra.
Carlos II foi acusado de violar de forma constante a Petição de Direitos. Para acabar de vez com esse estado de coisas, o rei foi obrigado em 1679, durante uma fase fraca de sua regência, a assinar a Lei do Habeas Corpus. Através dessa prescrição – cuja denominação teve origem nas palavras iniciais da ordem medieval de prisão, feita em latim – uma detenção poderia, então, ser suspensa mediante o pagamento de fiança e, num prazo de 3 dias, um juiz examinaria em audiência os motivos da prisão.
Guilherme III de Orange
Mas a disputa pelo poder na Inglaterra não acabara após a assinatura real. Naqueles tempos de agitação política interna, nos quais os boatos dos planos de recatolização do Papa não queriam calar, alguns deputados liberais do partido dos Whigs entraram em contacto com Guilherme III de Orange (1650-1702), príncipe holandês educado rigorosamente na fé protestante.
Ele era casado com uma filha de Carlos II, também educada como protestante. Os parlamentares ofereceram-lhe o trono – sob a condição de que ele assinasse a Declaração de Direitos (Bill of Rights) e se comprometesse a defender os privilégios que o documento estabelecia para o Parlamento inglês.
Guilherme III de Orange não titubeou em aceitar a oferta. Quando desembarcou na Inglaterra, em 5 de novembro de 1688, Jaime II, que sucedera ao irmão Carlos II, fugiu para a França. O caminho estava livre para o príncipe holandês, e a Declaração de Direitos entrou em vigor.
Nela, o rei comprometia-se a convocar o Parlamento a intervalos regulares; ficava proibida a cobrança de impostos pela Coroa sem a aprovação parlamentar ou a manutenção de um Exército dentro do país em tempos de paz. Além disso, os deputados recebiam "imunidade", ou seja, poderiam exercer as suas funções sem temer prisões ou acusações por parte do rei.
Na Declaração de Direitos, a Lei de Habeas Corpus foi mais uma vez veementemente ratificada. As suas regras são até hoje um dos fundamentos do moderno sistema constitucional europeu. Baseiam-se na Lei de Habeas Corpus a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, da Revolução Francesa de 1789, a Constituição norte-americana de 1791, a Constituição belga de 1831, a Constituição alemã dos anos de 1849 e 1919, como também a Lei Fundamental alemã de 1949.
Influências mútuas
Esta tradição constitucional comum mostra como os povos da Europa se influenciaram mutuamente, não só através do intercâmbio cultural ou do intenso comércio, mas também através de ideias, de direitos políticos conquistados e dos princípios legais deles resultantes.
Os direitos estabelecidos em 1689 na Revolução Gloriosa ainda estão em vigor nas democracias europeias: eleição livre do Parlamento, direito de livre debate e imunidade para os deputados, cobrança de impostos só com a aprovação parlamentar e proibição de manter um Exército regular sem o consentimento do Parlamento.
Assim, em janeiro de 1689, foi montado o arcabouço legal da democracia parlamentar, que prevê, como base única, comum e obrigatória para todos os membros da sociedade, a exigência de obedecer às leis estabelecidas.

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