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terça-feira, 5 de agosto de 2014

Com as velhas contas do vigário nasce o novo “Novo Banco”…

O governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, explicou no domingo à noite que "O Grupo Espírito Santo, através das entidades não financeiras não sujeitas a supervisão do Banco de Portugal, desenvolveu um esquema de financiamento fraudulento entre as empresas do grupo".
O supervisor bancário referiu que "a ponta do problema" foi identificada em setembro de 2013, tendo o Banco de Portugal iniciado "uma política de isolamento dos riscos" relativamente às restantes empresas do GES. "Esta política foi progressivamente reforçada ao longo do último ano e foi no quadro de aperto do cerco que as empresas do GES começaram a entrar em incumprimento", reforçou Carlos Costa.
O governador salientou que o agravamento de resultados da instituição "face ao que era previsível cerca de 2 semanas antes é resultado da prática de um conjunto de atos de gestão - anteriores à nomeação dos novos membros da Comissão Executiva - gravemente prejudiciais ao interesse do BES e em clara violação das determinações emitidas pelo banco de Portugal" e destacou que estes atos de gestão tiveram um impacto negativo de cerca de 1.500 milhões de euros nos resultados do 1.º semestre.
E por isso:
Portugal assistiu ontem a um evento raro. O Banco de Portugal tentou convencer o país, — e o mundo financeiro —, da suficiência de um programa de resolução para o Banco Espírito Santo. Uso a expressão “tentar convencer” sem segundas intenções: sendo a confiança o elemento essencial na relação entre os clientes e o sistema bancário, o trabalho de um banqueiro central é sempre um trabalho de persuasão.
Como tal, só o tempo poderá dizer se o esforço de persuasão de hoje funcionou ou não. Se nos próximos dias os depositantes do antigo Banco Espírito Santo, agora crismado de Novo Banco, não forem alarmados por novos esqueletos no armário, pode ser que o banco central consiga superar a primeira prova deste exercício de alto risco. O resto é bem mais complicado e compete ao governo; cá estaremos para ver se poderá cumprir-se a promessa de o caso BES não contaminar a dívida pública e não prejudicar os contribuintes portugueses. A divisão do BES entre “banco mau” e “banco bom”, com todas as complexidades e incertezas que ela oculta, torna tudo isto muito duvidoso.
O governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, foi forçado a admitir que a gestão do Banco Espírito Santo foi muito pouco católica: nos últimos tempos, e provavelmente bem antes disso, a administração do banco, e do grupo familiar em que ele se inseria, incorreram numa série de fraudes e ocultações. Depreende-se claramente do que disse Carlos Costa que haverá responsabilidades criminais a apurar.
Apesar do nome do “banco bom”, Novo Banco, ser uma ingénua tentativa propagandística para fazer crer às pessoas de que estamos a entrar num tempo de fazer tábua rasa, as fraudes do Banco Espírito Santo não têm nada de novo.
E é aí que houve algo de ainda mais extraordinário naquele momento extraordinário. Carlos Costa confessou a inoperância das entidades reguladores perante o capitalismo financeiro conforme ele funciona hoje. As fraudes do Banco Espírito Santo não têm nada de novo: basicamente, dependem da utilização de jurisdições ocultas, empresas-veículo em paraísos fiscais, e um carrossel de operações entre todas elas. O sistema continua tão opaco quanto sempre. Nada mudou. E o governador do banco central confirmou que só quando o banco estoura é que se consegue levantar a ponta do véu. A podridão do império BES ainda está por descobrir.
Posto desta forma, Carlos Costa não disse mais do que dizem todos os grandes críticos do capitalismo atual. Só o disse de forma menos clara. Os velhos vícios continuam intactos por debaixo dos “novos bancos”.
Há maneira de acabar finalmente com isto. Separar bancos de investimento de bancos tradicionais. Obrigar os bancos europeus a revelarem tudo o que fazem as suas subsidiárias. Legislar, ao nível da União Europeia, no mesmo sentido dos EUA com a sua lei FATCA, que obriga todas entidades fiscais, coletivas ou individuais, a declararem os ativos que detêm fora da sua jurisdição de origem. E, finalmente, criar uma unidade especial de investigação ao crime financeiro e económico, sediada no Banco Central Europeu ou na Europol.
Tudo isto pode ser conseguido, mas não pelos governos que temos hoje.

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