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quinta-feira, 7 de agosto de 2014

Uma solução nova com dinheiro da velha almofada dos tansos?

Sem uma nova política jamais teria sido possível um Novo Banco – e isso deve ser sublinhado.
Seria muito fácil estar aqui a fazer a lista de todas as coisas que podem correr mal, ou que simplesmente não estão bem explicadas, na solução encontrada pelo Banco de Portugal e pelo Governo para o descalabro do BES. Também não seria difícil apontar contradições nos discursos de Carlos Costa e Passos Coelho. Mas, muito de vez em quando, convém pôr em suspensão o modo-trauliteiro com que habitualmente nos dirigimos a quem manda em nós, olhar bem para o contexto, e reconhecer o esforço feito para encontrar uma saída justa e decente para a injusta e indecente gestão do Banco Espírito Santo.
Isto não é, de todo, habitual. A política e a economia não são actividades de meninos de coro, e num país tão pequeno e informal como o nosso os interesses corporativos têm uma força desmesurada. E é precisamente por ser tão pouco habitual que deve ser celebrado – este fim-de-semana houve muita gente, do Banco de Portugal ao Governo, passando pela própria Presidência da República, que esteve empenhada em defender o interesse nacional, e que quando foi obrigada a escolher entre contribuintes e accionistas, optou por proteger os contribuintes e deixar cair os accionistas. Parece evidente, não é? Só que ninguém antes o tinha feito. Há 1 ou 2 anos, o BES teria sido considerado too big to fail.
Perante isto, reagir à solução encontrada por Carlos Costa, Vítor Bento e governo com o velho encolher de ombros é apenas uma forma cínica de igualar tudo, como se entre BPN e BES não existissem diferenças radicais. Convém tirar a rezinga do piloto-automático. A solução encontrada para o caso BES foi o anti-BPN – antes, o que era bom (a SLN) permaneceu escandalosamente nas mãos dos accionistas, enquanto o que era mau (o BPN) ficou nas mãos dos contribuintes; agora, o que é bom fica nas mãos dos contribuintes (o Novo Banco), enquanto o que é mau (o lixo do BES) fica nas mãos dos accionistas. Esta solução, para os pequenos accionistas e para alguns credores, poderá até ser injusta – mas, por uma vez, ninguém poderá acusar o Estado de estar a manobrar para proteger os “poderosos”. Mesmo que a venda do Novo Banco fique aquém dos 4.900 milhões agora injectados, é o sistema financeiro português que terá de assumir a diferença. O Zé Povinho fica de fora.
Claro que ainda falta um 2.º momento em todo este processo – aquele em que os administradores do BES serão punidos pela justiça. As acusações de Carlos Costa foram de tal forma explícitas que ninguém pode acreditar que um buraco de 5.000 milhões de euros se cavou sozinho. O povo precisa desesperadamente de ver certos frequentadores da Comporta atrás das grades: nós não podemos continuar a viver num país em que o Sr. Santos vai preso porque roubou 100.000 euros com uma pistola, enquanto o Dr. Espírito Santo é convidado a demitir-se porque fez desaparecer 100.000.000 de euros com uma caneta.
Mas se há muito por fazer, muito por julgar, e muita coisa para correr mal, a verdade é que nos últimos dias as instituições portuguesas e europeias enfrentaram competentemente uma situação dificílima. Quando até o PS reconhece isso, é porque estamos perante o óbvio ululante. Mais: se o governo vier a conseguir vender o Novo Banco até ao fim do ano, chutando-o para fora das contas do défice, então este será, após o “irrevogável”, o segundo coelho consecutivo que Passos tira da cartola. O Verão faz-lhe bem.
Não será cedo para dar a “vitória” no fim da 1.ª parte?
Afinal os 4.400 milhões de euros não veem da almofada para os bancos, em consequência do empréstimo da troika que o BPN acelerou? E não estamos já a pagar todas as penas de ganso dessa almofada com todos os cortes em salários, pensões e direitos sociais?
"O Governo está a enganar os portugueses" quando diz que a operação de resgate do BES não terá custos para os contribuintes, acusa Paul De Grauwe, professor de Economia na Universidade de Leuven, na Bélgica, e ex-conselheiro da Comissão Europeia.
A dura crítica é extensível ao governador do Banco de Portugal, que anteontem garantiu que a medida "não terá qualquer custo para o erário público, nem para os contribuintes".
As autoridades têm repetido que o salvamento do BES não vai ser feito pelo Estado, nem com o dinheiro dos contribuintes e por isso não há risco. Os recursos a usar na capitalização do Novo Banco (parte boa do BES) são dos bancos e "não incluem fundos públicos".
Na verdade, o Fundo de Resolução, que é dos bancos, será o acionista único do Novo Banco. Problema: o fundo, criado em 2012, tem apenas 500 milhões de euros disponíveis. Serão os contribuintes a emprestar aos bancos, por um prazo de até 2 anos, o que falta para chegar ao capital necessário: 4.400 milhões de euros. É o valor de uma reforma do Estado.
De Grauwe, uma autoridade mundial em economia monetária, arrasa a ideia de que o contribuinte português está isolado dos riscos. O empréstimo pode não ter risco, mas o Tesouro está a emprestar dinheiro e, no limite até terá de ir ao mercado. Corre riscos. Considera mesmo que isto até pode significar um reforço do empréstimo da troika. "Sei que o Governo está a recapitalizar a parte boa do BES num montante de 4.900 milhões de euros. Isto significa que o Governo português está a assumir uma dívida, seja ela depois compensada mais à frente, com um empréstimo do FMI e da UE, ou não, é indiferente".
O professor belga tem a certeza que, "ao fazer isto, o Governo põe os contribuintes em risco, como acontece sempre que emite mais dívida". O Tesouro ficará mais exposto a problemas futuros. A almofada que estava reservada à banca vai agora mirrar dos 6.400 milhões de euros para 2.000 milhões.
Paul De Grauwe diz ainda que "pode acontecer que quando o Governo vender o BES, faça lucro". "Isso serão boas notícias para os contribuintes. Mas isso é o futuro. Hoje, ninguém sabe se isso irá acontecer. Também pode acontecer o contrário, isto é, o Governo pode incorrer em perdas." Assim, "a conclusão é que está a colocar em risco os futuros contribuintes. Se o Governo diz que isto não é verdade, está a enganar os portugueses".
Se acontecer mais algum problema em algum banco, com as verbas existentes, a decisão tomada no domingo, "pode limitar a eficácia" da almofada reservada à banca, avisou também a agência Fitch, e "poderá ocorrer um impacto orçamental se outros bancos precisarem do apoio".
Para o ex-consultor da Comissão Barroso, isto é tanto mais grave porque "falhou o 1.º teste às novas regras de ‘bail in’". "A recapitalização do BES pelo governo português implica o envolvimento dos contribuintes. Já se esperava", escreveu no Twitter.

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