O conceituado diretor de cinema e teatro Andres Veiel realizou uma série de entrevistas com altos executivos de bancos e montou, a partir delas, a peça "O Reino das Framboesas".
Andrea Horakh
Em entrevista, Veiel fala das razões que o levaram a tratar deste assunto, da sua ira e da sua própria perplexidade.
Deutsche Welle: Por que se envolveu tanto com o tema dos banqueiros?
Andres Veiel: Fico indignado com o facto de a opinião pública e o círculo das artes não falarem sobre o assunto, de ninguém colocar as questões reais. Por que as pessoas não se levantam e dizem: os nossos interesses estão a ser pisoteados profundamente? Muito antes da crise tive uma conversa com um banqueiro que me disse: "Corremos contra a parede. O dinheiro só se prolifera a partir de si mesmo. Quando esta bolha estourar, vai haver um grande crash". À minha pergunta sobre o que isso significaria, ele respondeu: "Estamos a ordenhar a vaca enquanto há leite".
Nenhuma outra profissão teve a sua imagem denegrida nos últimos anos como a dos banqueiros. A fama deles está arruinada. Mas há, de facto, banqueiros?
O género de banqueiro, como tal, não existe. Olhamos de fora para uma fachada de vidro e presumimos que eles estejam todos submetidos a uma mesma ordem. Mas conversei com altos-executivos de bancos que estavam muito irritados, embora também sejam responsáveis por aquilo que está a acontecer. Nas suas críticas, alguns deles vão além daquilo que é pensado e dito nas barracas do movimento Occupy.
O que é que esses altos executivos arriscaram ao conversar consigo?
São pessoas que arriscam muito quando conversam. Se forem identificados, podem perder as suas reformas ou serem obrigados a pagar multas de indemnização.
Por que falam mesmo assim?
Estas pessoas querem ver-se livres do que pensam. A sua ira não tem destinatário. Não podem falar, encontram-se automatizadas e isoladas. E aí chego eu, ouço e asseguro-lhes o anonimato. Sou para eles, neste momento, um padre no confessionário, psicólogo e interlocutor de debate. Nas conversas, havia sempre momentos nos quais eu visualizava abismos.
Por que tão poucos banqueiros abandonam a profissão, apesar da postura crítica?
É um vício, como o delírio da droga, movimentar esses volumes gigantescos de dinheiro no mundo e ainda por cima gerir altos lucros para os bancos e para si mesmo. Mas não se trata de celebrar aqui a cobiça, mas sim de uma espécie de reconhecimento e da questão: o que recebe o outro? Recebo 2.000.000 ao ano e ele, 3.000.000. Ele é melhor do que eu? Não se trata, em primeira linha, de cobiça, mas do desejo de poder. Os banqueiros não são uma casta isolada, mas o seu pensamento está profundamente enraizado na sociedade. É o pensamento do lucro, com o qual todos nós nos deparamos.
Alfred Herrhausen, presidente do Deutsche Bank, assassinado, já ocupou no seu filme Black Box BRD um papel central. Por que lhe é dedicado um grande espaço, também em “O Reino das Framboesas”?
Herrhausen é, para mim, uma pessoa trágica, que no seu curto tempo de atuação tentou empenhar-se pela moratória das dívidas do Terceiro Mundo. Defendia a sustentabilidade e a responsabilidade ética e acabou, por fim, fracassando. Mas para mim ele coloca uma questão central: como posso eu, na condição de indivíduo, posicionar-me frente ao sistema, que por sua vez quer uma coisa totalmente diferente, ou seja, o lucro a qualquer preço? Mas o indivíduo pode mudar alguma coisa nesse sistema tão lubrificado e fluido?
Qual é a responsabilidade dos políticos?
Durante muitos anos, a política foi o elemento incendiário disso tudo. Em 2002 e 2003, foram aprovadas leis que permitiam negócios arriscados. O ministério alemão das Finanças tinha incitado os bancos durante anos a arriscarem. Dizia-se: "Vocês precisam participar, caso contrário ficaremos dependentes de Nova York e de Londres".
São buracos bilionários no orçamento, que nos vão chegar. Recursos que faltam na educação, na investigação, nos novos investimentos. Ou caminhamos para uma enorme recessão, porque o Estado não tem mais dinheiro. Aqueles que agora tentam apagar o fogo estão entre os seus causadores.
Andres Veiel tornou-se conhecido devido ao seu envolvimento na arte com o terrorismo de esquerda na Alemanha. O seu filme Se não nós, quem (2011) narra os primórdios da Fração do Exército Vermelho (RAF). Os seus bons contactos com o universo dos banqueiros vem do seu premiado documentário Caixa Preta Alemanha (2001), no qual retrata intensamente a personagem de Alfred Herrhausen, presidente do Deutsche Bank, morto num atentado.
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