As recentes conclusões sobre a execução orçamental da unidade independente de análise não deixam margem para dúvidas. Em Setembro, o défice público estava nos 6% do PIB e as receitas fiscais continuaram a deslizar significativamente face ao objectivo.
Carlos Bastardo, Economista
O PIB só vai cair 1% quando a generalidade das casas nacionais e internacionais apontam para valores de 2,5% em média? O défice público face ao PIB em 2013 conseguirá ser 4,5% quando, muito provavelmente, as dificuldades na colecta de impostos vão continuar, dada a recessão económica? O desemprego que terminou acima dos 16% em 2012 (quando um ano antes se previa que ficasse nos 14,5%) ficará nos 16.5% previstos ou irá para 18% ou mais, ou seja, 1.000.000 de pessoas? Os nossos parceiros comerciais irão recuperar o suficiente para que as exportações portuguesas continuem a crescer e aumentar o seu peso no PIB para os tão desejados 50% do mesmo? Com um OE que reduz fortemente o rendimento disponível face ao OE de 2012, o que vai acontecer ao consumo privado, só cairá os 3% previstos quando em 2012 caiu 6%? O investimento que em 4 anos caiu mais de 40%, continuará a evidenciar o mesmo caminho ou vão surgir medidas e incentivos concretos para travar esta tendência?
Portugal vai ou não seguir o caminho da Grécia? Christine Lagarde disse que não. Mas política é política e os dados concretos são o que são. E estes apontam para um crescimento significativo da dívida pública (capital e juros), aumentando as dificuldades no seu pagamento. No final de 2013, a dívida pública será de 124% do PIB como previsto ou será superior? E nos anos seguintes, será possível reduzi-la? Mas como é possível reduzir a dívida sem crescimento económico e sem criação de riqueza sustentada?
Nem tudo é negativo. O crescimento das exportações e a grande queda das importações praticamente levaram ao equilíbrio da balança comercial e da balança de transacções correntes mas este facto, por si só, não chega.
Enquanto o Estado e as empresas pagarem os juros actuais, bastante acima dos praticados noutros países europeus, como vai ser possível reduzir a dívida e ganhar competitividade. Ok, nos últimos meses, a rendibilidade até à maturidade das obrigações de dívida pública a 10 anos baixaram de 16% para 6,5% mas mesmo 6,5% é um valor elevado quando comparado com os 1.5% pagos pela Alemanha. É lógico que cada país tem o seu risco: o problema é que com as taxas de juro actuais é muito difícil fomentar-se o crescimento dos negócios e das empresas (o handicap é significativo).
Portanto, o ano de 2013 vai ser "complitroikado". Nesta altura, com o ajustamento de 2011 e sobretudo de 2012, já deveríamos estar mais avançados na consolidação orçamental para podermos pensar na segunda fase que é o relançamento económico. O problema é que o cenário internacional é negativo. Os EUA estão com um problema orçamental que só está no início (parece que os políticos americanos já foram contagiados pelos políticos europeus ao empurrarem os problemas para a frente, como foi o caso do acordo alcançado às duas da manhã do dia 1/1/2013). A Europa ainda não resolveu a crise e as decisões mais importantes com vista a um maior federalismo têm sido sucessivamente adiadas (se formos a ver o BCE acabou por fazer mais pela resolução da crise do que o Eurogrupo, quando deveria ser o contrário). E a China apesar de estar a querer recuperar, depende muito do que aconteça nos EUA e na Europa, assim como os restantes países emergentes.
Mas os investidores começaram alegremente o ano, com as bolsas a subirem e após um 2012 que poucos esperavam que tivesse sido tão bom (o índice MSCI World subiu 13% e houve bolsas como a alemã a subirem mais de 25%). Contudo, nestes primeiros meses do ano, as incertezas macroeconómicas são muitas e quando tal acontece, existe normalmente volatilidade nos activos financeiros com risco.
Estou a ser pessimista? Não, apenas realista!
Pelos vistos o “sucesso” da volta aos Mercados não tem nada a ver com a realidade do nosso quotidiano e apenas resolve os problemas dos homens da massa, enquanto a massa de homens e mulheres continua a pagar-lhes as fraudes e as dívidas…
O mesmo é dizer, que a austeridade vai continuar, sustentada pela contínua passividade dos confiscados, que na opinião de muitos analistas se pode alterar, como sociologicamente é previsível…
Fica mais um alerta, de quem sabe, não só das causas e efeitos, mas sobretudo dos Direitos Humanos, reforçados não só na Constituição como nos tratados da União Europeia e que a legislação europeia nos confere e podem ser ativados…
O juiz jubilado Cunha Rodrigues, antigo procurador-geral da República, considerou que a austeridade pode levar a mais manifestações de protesto na rua e sustentou que "não pode ser excluída a hipótese de quebra da paz social".
Cunha Rodrigues recusou a ideia de se chamar "indignados" aos manifestantes que protestam em ações de rua, sublinhando que "são pessoas com direitos".
"As pessoas não são apenas indignados, são titulares de direitos. Não só a Constituição como os tratados da União Europeia e a legislação europeia conferem-lhes direitos que podem ser ativados", referiu Cunha Rodrigues, no debate conjunto com Teresa Pizarro Beleza, subordinado ao tema "Abundância de Direitos em Tempo de Crise".
O juiz jubilado referiu ainda que um período de crise económico-financeira pode ainda afetar a Justiça. "É evidente que, com a austeridade, todos os bens, mesmo aqueles que são bens essenciais como a Justiça, sofrem uma compressão e esse fenómeno não deixa de existir em relação à Justiça", disse, defendendo que deve existir "o primado do Direito e não dos jogos de poder ou das relações económicas e sociais".
Cunha Rodrigues concluiu afirmando que é necessário que "se coloque com primazia a questão da Europa jurídica de comunidade e de Direito".
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