"Se compreendeu o que eu disse é porque me exprimi mal." O gracejo de Alan Greenspan, ex-presidente da Reserva Federal dos EUA, teve piada no seu tempo, em que havia um espetacular crescimento dos mercados financeiros. Mas neste momento de crise da dívida, agradecia-se um pouco mais de clareza por parte dos responsáveis da Zona Euro.
A sua conferência de imprensa ainda não tinha terminado e já as bolsas europeias caíam drasticamente e as taxas de juro sobre os títulos de Espanha e Itália atingiam níveis recordes. Na semana anterior, passara-se o inverso. Em 3 de agosto, as bolsas regressavam à alta.
Economistas e dirigentes políticos têm o hábito de explicar que a crise não pode ser resolvida rapidamente e que devemos agir e falar com prudência. O menor passo em falso pode custar milhares de milhões de euros a um Estado, se os mercados reagirem mal. E eis que esses mesmos mercados parecem não saber como entender as decisões dos mais altos responsáveis da economia europeia.
A irracionalidade dos mercados é um fenómeno bem conhecido, que aliás se explica muitas vezes racionalmente, por interesses de curto prazo dos investidores. Mas apesar de Mario Draghi implicitamente apelar a que a Espanha e a Itália peçam o apoio do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (FEEF) antes de contar com a ajuda do BCE, o que Roma e Madrid se recusam a considerar, os chefes de governo dos dois países congratularam-se com as suas declarações.
Vá lá compreender-se isto. A não ser que entendamos que faz tudo parte de uma partida de xadrez de longo prazo, entre Draghi, os dirigentes europeus e o incontornável interveniente que é o Bundesbank, o banco central alemão. Uma partida ininteligível para o comum dos cidadãos europeus.
É importante o que está em jogo, pois trata-se de definir a política económica e monetária da Zona Euro para os próximos anos. E é normal que haja um debate entre responsáveis económicos e políticos a nível europeu. Seguindo o caminho estreito da sua escolha, Mario Draghi parece aproximar-se do seu objetivo: ajudar os países em dificuldade para assegurar o futuro do euro, ao mesmo tempo que acalma os mercados e limita a influência do Bundesbank.
Nos dias que antecederam a reunião do BCE, os jornalistas e bloguistas tentaram interpretar as informações emitidas pelas diversas instituições europeias. Quem diz o quê? O que quer dizer? Porquê agora? Quem manipula quem? O debate e a sua exegese parecem reservados a escassos especialistas. Na época da Guerra Fria, quando se tentava decifrar o que estava a acontecer em Moscovo, chamava-se a isso "kremlinologia". A comparação não é tranquilizadora.
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