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segunda-feira, 12 de setembro de 2011

“Dar de si antes de pensar em si”

Já se deu conta da responsabilidade na sua vida? Melhor dizendo: Acha-se responsável? Repare bem. Há algum rastro de responsabilidade na sua existência? Não seja tão rápido a responder. Pense bem, ou espere até ler este texto. Você vai ver que não é tão responsável quanto pensava ser.
A responsabilidade é uma expressão muito usual, demasiadamente corrente e recorrente nas nossas vidas, talvez por essa razão estejamos a dar pouca importância ao que ela realmente é, ou dizem dela ser o que é. Da antiguidade ao existencialismo, o homem vem-se debruçando sobre esta problemática ética, e por mais que queira, não conseguiu de todo afastar-se de uma exigência tão cara à voz e ao coração do outro. Pois, contrariamente ao que achamos, a responsabilidade não nasce de mim, mas do outro. “A responsabilidade não nasce de uma boa vontade, de um sujeito autónomo, que quer livremente comprometer-se com o outro ser. Ela nasce como resposta a um chamamento” (KUIAVA, Evaldo Antônio. A responsabilidade como princípio ético em H. Jonas e E. Lévinas: Uma aproximação. Porto Alegre, RS. Veritas, v. 51, nº 2, junho, 2006, p. 55-60). Não vem de mim, mas do outro. Não é uma exigência da liberdade, mas uma exigência do outro. É por isso que muitas vezes, sem explicação alguma, contrariando toda a lógica, liberamos o bem a quem não nos quer bem, agimos em direção ao outro contra a nossa própria vontade. A responsabilidade, segundo E. Lévinas, filósofo lituano de nacionalidade francesa, é anterior à minha consciência, aos meus interesses e às minhas mesquinhas intenções.
Quem não se contrariou a si próprio por causa de um chamamento, de um clamor, de uma voz, de uma necessidade sem voz, não experimentou o sabor da responsabilidade. Quem não renunciou a si mesmo, às suas intenções e à sua consciência, para atender a um chamamento, ainda não é digno de responsabilidade. Os que cumprem horários rigorosamente pensando que, só por isso, estão a agir de modo responsável, precisam abrir-se a algo muito maior, descoberto por Lévinas. Aqueles que se esmeram em cumprir as suas responsabilidades, cheios de boas intenções, ainda não imaginam que há uma responsabilidade que ultrapassa os limites da liberdade de decidir, ou não, por uma outra pessoa. E aqui encontra-se a guinada da Filosofia de Lévinas que põe a RESPONSABILIDADE acima da sua e da minha liberdade, porque só somos livres, se formos de facto responsáveis. Não é aquela responsabilidade das empresas, nem tampouco a do quotidiano como varrer uma casa, fazer compras, ir à escola, não faltar ao trabalho, ir à igreja a que se refere Lévinas, mas uma responsabilidade impregnada de desprendimento pelo outro em que o sujeito não se afasta do olhar do outro. Uma responsabilidade ilimitada que se oponha a uma outra que se mede pelos compromissos livres de uma consciência egoísta e gananciosa.
A responsabilidade como “ética da ética”, conforme apontam alguns estudiosos na Filosofia de Lévinas, vem compreendida a partir de uma frase conhecidíssima de Dostoievsky: “Somos todos culpados de tudo e de todos perante todos, e eu mais do que os outros” (EI 105). A responsabilidade do eu é infinita. Ele é responsável, não só pelos atos ilícitos que comete, mas também por aqueles que não são da sua autoria, e até mesmo pelas perseguições que sofre. Como justificar tal conceção utópica? Não seria ela inumana? Eis a resposta de Levinas: “Ser humano significa: viver como se não se fosse um ser entre os seres. Como se, pela espiritualidade humana, se invertessem as categorias do ser, em um ‘de outro modo que ser’” (EI 107). O humano emerge, quando o eu, ao invés de procurar satisfazer os seus interesses, estende a mão a outrem, carregando o peso do mundo nos seus próprios ombros (Cf.KUIAVA, Evaldo Antônio. A responsabilidade como princípio ético em H. Jonas e E. Lévinas: Uma aproximação. Porto Alegre, RS. Veritas, v. 51, nº 2, junho, 2006, p. 55-60).
Após esse breve estranhamento acerca da responsabilidade, que é o ponto de discussão sobre as respostas éticas de Lévinas, observamos não ser tão simples ser responsável neste contexto, uma vez que o humano está cercado de pretensões que o impedem de viver saindo de si em direção a outrem, numa espécie de obediência acolhedora da face do outro. Que possamos responder a essa RESPONSABILIDADE!
Prof. Jackislandy Meira de M. Silva - Especialista em Filosofia, Bacharel em Teologia e Licenciado em Filosofia

2 comentários:

  1. Um conceito diferente de responsabilidade... e muito mais exigente.

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  2. mfc
    Mas pensando, é isso mesmo. O conceito que temos não é mais do que cumprimento das obrigações e este é mais devoção.

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