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terça-feira, 13 de maio de 2014

Sublinhando a denúncia da prática conspirativa na crise (I)

As denúncias de Philippe Legrain, ex-conselheiro de Durão Barroso, que vêm confirmar tudo de que se desconfiavam e sobre o que “tanto latim se gastou” são de tal importância, que não podemos apenas registá-las, mas sublinhar, palavra por palavra, ideia por ideia, tática por tática e responsável por responsável.
Vamos reler, devagarinho, em 4 dias, as 4 perguntas e as 4 respostas, para recuperar a verdade e desconstruir as mentiras, a confirmar-se que tudo que é dito na entrevista é verdadeiro…
É incorrecta a narrativa que os alemães contaram a si próprios de que a crise do euro teve a ver com o Sul a querer levar o dinheiro deles, diz Philippe Legrain, ex-conselheiro de Durão Barroso.
Isabel Arriaga e Cunha: A tese do seu livro “European Spring: Why our Economies and Politics are in a mess” (Primavera Europeia: Por que as nossas Economias e Políticas estão numa confusão) é que a gestão da crise da dívida, ou crise do euro, foi totalmente inepta, errada e irresponsável, e que todas as consequências económicas e sociais poderiam ter sido evitadas.
Por que é que as coisas se passaram assim?
O que é que aconteceu?
Philippe Legrain: Uma grande parte da explicação é que o sector bancário dominou os governos de todos os países e as instituições da zona euro. Foi por isso que, quando a crise financeira rebentou, foram todos a correr salvar os bancos, com consequências muito severas para as finanças públicas e sem resolver os problemas do sector bancário.
O problema tornou-se europeu quando surgiram os problemas da dívida pública da Grécia. O que teria sido sensato fazer na altura – e que era dito em privado por muita gente no FMI e que este acabou por dizer publicamente no ano passado – era uma reestruturação da dívida grega.
Como o Tratado da União Europeia (UE) tem uma regra de “no bailout” [proibição de assunção da dívida dos países do euro pelos parceiros] – que é a base sobre a qual o euro foi criado e que deveria ter sido respeitada – o problema da Grécia deveria ter sido resolvido pelo FMI, que teria colocado o país em incumprimento, (default), reestruturado a dívida e emprestado dinheiro para poder entrar nos carris. É o que se faz com qualquer país em qualquer sítio. Mas não foi o que foi feito, em parte em resultado de arrogância – e um discurso do tipo “somos a Europa, somos diferentes, não queremos o FMI a interferir nos nossos assuntos” – mas sobretudo por causa do poder político dos bancos franceses e alemães. É preciso lembrar que na altura havia 3 franceses na liderança do BCE – Jean-Claude Trichet – do FMI – Dominique Strauss-Kahn – e de França – Nicolas Sarkozy. Estes 3 franceses quiseram limitar as perdas dos bancos franceses. E Angela Merkel, que estava inicialmente muito relutante em quebrar a regra do “no bailout”, acabou por se deixar convencer por causa do lobby dos bancos alemães e da persuasão dos 3 franceses. Foi isto que provocou a crise do euro.
Como assim?
Porque a decisão de emprestar dinheiro a uma Grécia insolvente transformou de repente os maus empréstimos privados dos bancos em obrigações entre Governos. Ou seja, o que começou por ser uma crise bancária, que deveria ter unido a Europa nos esforços para limitar os bancos, acabou por se transformar numa crise da dívida, que dividiu a Europa entre países credores e países devedores e em que as instituições europeias funcionaram como instrumentos para os credores imporem a sua vontade aos devedores. Podemos vê-lo claramente em Portugal: a troika, que desempenhou um papel quase colonial, imperial, e sem qualquer controlo democrático, não agiu no interesse europeu mas, de facto, no interesse dos credores de Portugal. E pior que tudo, impondo as políticas erradas. Já é mau demais ter-se um patrão imperial porque não tem base democrática, mas é pior ainda quando este patrão lhe impõe o caminho errado. Isso tornou-se claro quando em vez de enfrentarem os problemas do sector bancário, a Europa entrou numa corrida à austeridade colectiva que provocou recessões desnecessariamente longas e tão severas que agravaram a situação das finanças públicas. Foi claramente o que aconteceu em Portugal. As pessoas elogiam muito o sucesso do programa português, mas basta olhar para as previsões iniciais para a dívida pública e ver a situação da dívida agora para se perceber que não é, de modo algum, um programa bem-sucedido.
Portugal está mais endividado que antes, por causa do programa, e a dívida privada não caiu.
Portugal está mesmo em pior estado do que estava no início do programa.

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