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quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Os riscos a (ar)riscar: o TC, a capacidade do Governo, a estabilidade política e a conflitualidade social...

As afirmações de Rui Machete sobre necessidade de a taxa de juro da dívida pública portuguesa cair para os 4,5% para garantir o regresso aos mercados dominou as discussões políticas dos últimos dias, mas o relatório do FMI veio lembrar-nos que há outras coisas bem mais importantes, há as causas que determinam o comportamento dos juros.
António Costa
E essas, no mínimo, estão condicionadas por um conjunto de incertezas que não está nas mãos de Pedro Passos Coelho.
Infelizmente, os nossos problemas ultrapassam, em muito, o desastroso sentido político do ministro dos Negócios Estrangeiros. Em 88 páginas de relatório, o FMI faz 25 referências ao Tribunal Constitucional, leia-se aos riscos associados a uma decisão negativa dos juízes do Palácio Ratton a medidas do Orçamento do Estado. E neste documento sobre a 8.ª e 9.ª avaliações - falta conhecer o da Comissão Europeia - o Fundo abre uma nova possibilidade. As incertezas são de tal ordem que, mesmo cumprindo o programa, os mercados poderão não estar disponíveis para emprestar a Portugal em condições razoáveis. Sim, claramente abaixo dos 4,5% como apontou o ministro dos Estrangeiros.
Os recados, esses, são muitos, e preocupantes, porque o tempo escasseia. Ninguém quer ver Portugal a recorrer a um 2.º resgate, até porque isso colocaria em cima da mesa a reestruturação da dívida pública e, nesse caso, não seriam apenas os privados a perder dinheiro. Até a troika perderia. Mas é também à luz desta análise que deve ser lido este relatório, talvez o mais duro de todos os que o FMI redigiu. O Constitucional é um risco, a capacidade do Governo de executar o seu próprio programa é outro, a estabilidade política é outro, a conflitualidade social não é um risco menor. Falta algum?
O regresso aos mercados, mesmo assistido, está assim posto em causa. Há, no meio disto tudo, uma meia-boa notícia. Portugal está financiado até meados do próximo ano, mas, segundo o Fundo, poderá recorrer a operações de troca de dívida para assegurar o financiamento do Estado durante todo o ano de 2014. Menos mal. O pior é mesmo o nível de dúvidas que o Fundo aponta à evolução da dívida pública portuguesa. Já deveria estar em ritmo descendente, mas não está. O risco de contágio a outros países do euro justifica o apoio do FMI, mas não diminui as exigências de austeridade. Depois do pacote de 4.000 milhões, há um novo pacote, de 3.400 milhões de cortes para 2015 e 2016 se Portugal quiser cumprir o que prometeu aos credores oficiais.
Nem tudo ficou por fazer nestes 2 anos e meio, mas o caderno de encargos do Governo para os próximos meses é este, não é impossível, mas é, no mínimo, muito difícil.
Reagindo ao relatório do FMI sobre a situação de Portugal, o ex-presidente do Tribunal Constitucional (TC), Cardoso da Costa, não considera os Juízes do TC pressionáveis e avança que o FMI devia estar preocupado com a eventual não adopção de certas medidas.
Para José Cardoso da Costa, os juízes do Palácio Ratton não são pressionáveis. Embora admita que existe legitimidade por parte do FMI para opinar sobre os efeitos das decisões deste tribunal, o ex-presidente não vê um tom ameaçador no novo relatório.
O professor disse à TSF que “é legítimo o FMI preocupar-se com o risco de medidas consideradas necessárias para realizar o memorando de entendimento não serem adoptadas”, contudo, segundo Cardoso da Costa, “não é a observação do que vai ter influência sobre o modo como o Tribunal vai decidir” e, concluiu o antigo presidente do Palácio Ratton: "Não me pareceu muito carregada no sentido de ameaça".
Há muitas questões a preocupar o FMI, que pretende discuti-las e aprofundá-las na 10.ª avaliação ao programa de ajustamento.
1. Despedir custa mais do que poupa
O Executivo vai gastar mais com indemnizações do que o que vai poupar com as rescisões voluntárias na função pública em 2014, e só com as poupanças da mobilidade especial é que consegue compensar os custos da saída de trabalhadores. As indemnizações vão custar o equivalente a 0,1% do PIB.
Se o negócio dá prejuízo imediato, então o “negócio” é outro…
2. Despedimentos fora dos tribunais
O Governo comprometeu-se a analisar formas de desincentivar os trabalhadores a recorrer aos tribunais nos casos de despedimento sem justa causa, devendo discutir este assunto até à 10.ª avaliação da troika. O relatório não refere como será feito, apenas que o FMI considera ser uma medida importante.
Se o governo teme o recurso aos tribunais, ou teme pela injustiça ou por não ter feito as “reformas” apropriadas ao “negócio”…
3. Perdão fiscal não agrada ao FMI
O perdão fiscal deste ano criado para cumprir a meta do défice de 5,5%  foi alvo de críticas. O FMI assume que não gosta de medidas temporárias e alerta para o efeito sobre contribuintes cumpridores. Pede também prudência a estimar benefícios da reforma do IRC e diz que há pouca margem para mexer no IRS.
Se o FMI não gosta de medidas temporárias, não está a querer resolver o problema de hoje, mas a querer impor uma matriz ideológica por muito tempo…
4. Sanções para hospitais gastadores
A “falta de controlo” sobre as dívidas dos hospitais, que continuam a crescer a um ritmo acelerado (300 milhões ao ano), preocupa a troika. O FMI assume que quer sanções para os funcionários que não cumpram a lei dos compromissos nos hospitais. A lei proíbe gastos que não possam ser pagos a 90 dias.
Se a sociedade portuguesa está a envelhecer, precisando de mais cuidados de saúde e lhe vão cortando nos proventos, só o Estado tem a obrigação de compensar os cortes com o direito à saúde, aumentando os gastos, matematicamente, às circunstâncias…
5. Reposição de subsídios criticada
Reposição dos subsídios de férias e de Natal merece críticas. O FMI diz que o sector empresarial do Estado esteve “próximo” do equilíbrio no 1.º semestre e que teria registado um “excedente” se não tivessem sido repostos os subsídios aos funcionários públicos e trabalhadores das empresas do Estado.
Se não tivesse havido mais dinheiro a circular, por via do acórdão do TC, a procura interna teria sido menor, com mais falências, mais desemprego, mais subsídios e menos receitas dos impostos…
Portugal concluiu com sucesso a 8.ª e a 9.ª avaliação ao programa de ajustamento, mas um dos membros da troika, o FMI, avisa, no seu relatório, que ainda existem vários riscos que devem ser tidos em conta.
1. Redução de salários
Para aumentar a competitividade externa de forma mais rápida, porque o aumento de produtividade é um processo moroso, a redução de custos de produção é essencial.
Outro ponto essencial, é a redução de salários, defende o Fundo que sublinha que uma maior “flexibilização de ordenados” também iria aumentar a criação de postos de trabalho, particularmente nos empregos com rendimentos mais baixos.
O Fundo também aconselha a "identificação de políticas adicionais para travar a rigidez do mercado laboral".
Todas estas medidas já foram implementadas, relegando os salários dos trabalhadores portugueses para os mais baixos da Europa, sem que se tenha verificado o aumento de investimento, o que quer dizer que as intenções são outras, que nada tem a ver com a competitividade, a não ser com os países asiáticos…
2. Tribunal Constitucional
A organização liderada por Christine Lagarde avisa que o Governo vai precisar de reformular o Orçamento do Estado caso os juízes do Palácio Ratton chumbem algumas medidas contidas no Orçamento do Estado.
No entanto, dado o “limitado espaço de manobra” a substituição destas medidas vai ser “extremamente difícil e pode implicar de novo a adopção de medidas de pior qualidade”. Os possíveis chumbos “aumentam os riscos de recuperação do crescimento e do emprego, por levarem a uma quebra no investimento e confiança, mas também por levarem à renovação da instabilidade política”, escreve o FMI.
Repetindo o que todos confirmam, os chumbos do TC tiveram efeitos positivos na economia, o que não agradou ao FMI, que vem agora repetir o que Durão Barroso disse: “mais chumbos podem implicar a adoção de mais austeridade”, mesmo sabendo que as medidas aplicadas originaram recessão e desemprego, sem qualquer aumento do investimento e da confiança…
3. Riscos políticos
O FMI alerta que as divergências dentro da coligação governamental devido à fadiga das medidas de austeridade são uma “preocupação relevante”. Assim, “novas tensões devem ser evitadas porque vão atrasar a recuperação e aumentar os riscos para o programa”, diz o Fundo.
Esta é para os (ir)responsáveis!
4. Bancos portugueses
Os bancos devem aumentar os seus esforços de reestruturação, recomenda o FMI. Outro alerta para o setor, é que as empresas portuguesas altamente endividadas “constituem um risco significativo ao sistema bancário doméstico”. Desta forma, a organização recomenda que o Banco de Portugal continue os seus esforços para garantir que o sistema bancário resolva situações de crédito malparado “antes que a sua viabilidade fique em risco”.
A "vigilância contínua dos bancos é necessária", diz a instituição. "As condições de capital e liquidez do sistema bancário permanecem adequadas, mas os bancos estão a operar num ambiente desafiante, que prejudica os seus lucros".
Já quanto aos bancos, que podem ser prejudicados nos seus lucros, é realmente preciso uma vigilância contínua…
5. Reformas estruturais
O Fundo avisa que as reformas estruturais são para continuar, como no caso do controlo de custos no setor da saúde; reestruturação do setor empresarial do Estado; redução de custos nas Parcerias Público Privadas (PPP); implementação da lei no controlo de custos. Desta forma, devem ser “renovados esforços para garantir que uma orçamentação adequada, uma implementação efetiva das medidas de redução de custos e num controlo da despesa mais apertado”.
E o FMI não se desfoca dos cortes na Saúde, nos despedimentos na Função Pública, mas também fala das PPP (mas o governo não sabe o que isso é) e no controlo de custos, provavelmente de serviços privados, que são mais elevados do que na UE…
6. Setor elétrico
As autoridades nacionais devem fazer mais “para melhorar a sustentabilidade do sistema elétrico nacional, prevenindo, ao mesmo tempo, aumentos excessivos de preços” que colocariam em risco a competitividade do país.
O FMI aconselha o Governo a convidar os principais atores do setor para renegociarem contratos, de forma a reduzir rendas para aliviar o défice tarifário. Sobre a introdução da taxa, em 2014, sobre os produtores elétricos para reduzir o défice tarifário, o FMI considera que o seu efeito vai depender de como esta receita for usada.
Sobre um dos pontos mais impeditivos para a competitividade das empresas, o preço da eletricidade, o FMI pede que o governo converse com as empresas do setor para não aumentarem excessivamente (aumentar mas não demais…) os respetivos preços. Renegociar…
7. Ser bom aluno só não chega
Mesmo que “uma forte implementação do programa de ajustamento permaneça uma condição sine qua non para ganhar pleno acesso aos mercados, as reformas institucionais e fortes políticas institucionais, ao nível da zona euro, são também essenciais para ajudar Portugal a aguentar possíveis choques”, avisa o FMI.
O compromisso dos líderes europeus para ajudar Portugal no período pós-troika é essencial para Portugal, em particular no acesso ao programa de transações monetárias definitivas (TMD ou OMT), ou seja, a compra de dívida pública portuguesa de forma ilimitada pelo Banco Central Europeu (BCE).
Finalmente, diz o FMI, é preciso continuar e até aumentar a austeridade, mas que se houver sucesso (que sabe que não haverá) só se for com a alteração das políticas da União e perdão da dívida ou mais “ajuda”…
Pronto! O governo já tem desculpas…

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