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sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Se os Estados podem espiar, o cidadão também pode?

Talvez se deva começar por estas palavras de Madeleine Abright para se compreender, ou não, a leviandade de uma pessoa que foi Secretária de Estado dos EUA, e o rosto do poderio, e ser capaz de dizer o que disse, sem qualquer problema de consciência…
E é aqui que se define a fronteira moral e ética (por enquanto) entre a cultura europeia e as outras: a liberdade de expressão e as liberdades individuais.
Os líderes da União Europeia divulgaram um comunicado nesta sexta-feira (25) dizendo que a desconfiança sobre o esquema de espionagem dos EUA poderá prejudicar os esforços mundiais no combate ao terrorismo.
No entanto, as nações europeias ressaltam no comunicado que dão valor à "relação próxima" que possuem com os EUA. O assunto acabou por dominar uma cimeira de chefes de Estado do bloco europeu em Bruxelas nesta semana, depois de as imprensas da Alemanha e da França revelaram novas denúncias de espionagem norte-americana.
A Agência Nacional de Segurança dos Estados Unidos (NSA, na sigla em inglês) teria monitorado ligações telefónicas da chanceler alemã Angela Merkel. Na França, a agência teria monitorado milhões de telefonemas de diversos cidadãos.
Agora, a França e a Alemanha estão a fazer pressão para um "entendimento" com os EUA até ao fim do ano. Na quinta-feira, surgiram novas denúncias no jornal britânico The Guardian de que a NSA teria monitorado os telefonemas de 35 líderes globais.
'Sementes da desconfiança'
No final da cimeira, Merkel disse que Europa e os EUA enfrentam "desafios comuns" e que "não pode haver espionagem entre amigos" e afirmou que "as sementes da desconfiança foram plantadas" e que isso dificulta a cooperação no setor da inteligência. "Ficou claro que algo precisa mudar para o futuro, e de forma significativa", disse a chanceler. "Vamos colocar todos os nossos esforços para forjar um entendimento mútuo até ao fim do ano para cooperação das agências de inteligência da Alemanha e dos EUA, e da França dos EUA, para criar uma estrutura de cooperação."
O comunicado dos chefes de Estado europeus disse que as revelações causaram "profundas preocupações" entre os cidadãos europeus e que "uma falta de confiança pode prejudicar a cooperação necessária no campo da recolha da inteligência".
O editor para Europa da BBC Gavin Hewitt disse que os governos alemão e francês querem um novo pacto com os EUA que estabeleça, na sua essência, a "não espionagem" entre as partes.
Para Hewitt, o entendimento poderia seguir os moldes de um acordo feito entre os EUA e Reino Unido, Nova Zelândia e Canadá após a II Guerra Mundial, uma operação de inteligência conhecida como Five Eyes (5 Olhos, em tradução livre).
O porta-voz da Casa Branca Jay Carney disse que o presidente Barack Obama deu garantias a Merkel pelo telefone de que ela não estava a ser monitorada agora e que não seria no futuro. Esta declaração, entretanto, acabou por dar crédito às alegações de que telefonemas da chanceler alemã foram monitorados no passado.
Só é pena que, só agora, os líderes europeus tenham sentido o peso e a gravidade dos abusos de um país, que se acha no direito de vasculhar a vida de cidadãos livres e chega ao cúmulo de espiar os próprios pares do seu presidente e de países aliados, sem que se tenham insurgido quando a presidente do Brasil denunciou idêntico tratamento...
O que para os norte-americanos é lícito e legítimo, por cá é considerado crime contra o direito à privacidade, apesar dos pecadilhos cometidos por alguns países europeus ao terem beneficiado do esquema, quando recorreram às fontes (inquinadas) americanas, em proveito próprio.
Quem com ferros mata, com ferros morre…
E aqui ficam registados os vários episódios de uma novela de cordel.
Denúncias pelo vazamento de Snowden:

4 comentários:

  1. Caro Miguel,

    A pergunta é excelente apesar de se saber à partida qual é a resposta correspondente. E todavia, por ser assim, por que será que muitos continuam a sustentar que "o estado somos todos nós"?

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    1. Caro Eduardo,
      O paradigma: O Estado somos todos nós!
      Os conceitos: Estado, todos e nós.
      Alterando-se o conceito de "Estado", que está a acontecer, altera-se o paradigma.
      Restringindo-se o quantidade de "todos" a vários grupos, que está a acontecer, altera-se o paradigma.
      Limitando-se a abrangência do "nós" a um governo, que se escuda nas eleição democrática, altera-se o paradigma.
      Só falta saber quem diz, o conceito que tem de Estado, a limitação grupal e a abrangência da detenção do poder...
      Tudo ligado, há várias combinações possíveis, com várias interpretações, e vários paradigmas.
      Quando o Governo diz, o Estado somos todos nós, entende-se que se refere à legitimidade...
      Quando um partido ou coligação, no governo ou na oposição diz, o Estado somos todos nós, entende-se que se refere a uma legitimidade alargada aos representantes do povo.
      Quando o povo diz, o Estado somos todos nós, entende-se que se refere à legitimidade direta.
      E para além de tudo isto, o Estado somos todos nós, os cidadãos, que delegam competências, democraticamente nos candidatos dos partidos, que como homens que são, para além dos conceitos, deturpam o poder delegado, usurpando e alterando o paradigma, em seu proveito...
      E é o que se passa, com a desconstrução do conceito básicos da democracia, representativa ou direta, sem que o paradigma deixe de valer o que vale, com o rigor dos conceitos da sociologia política, gerando-se uma fraude, por falta de moral e ética, entrando o banditismo, que é o que estamos a presenciar...

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    2. Caro Miguel,

      Era evidentemente uma pergunta "provocatória", a minha, pois discordo frontalmente do "paradigma" que subjaz àquela formulação. E não se trata de qualquer situacionismo tacticista nem, sequer, de nenhum desconstrutivismo. De facto, "o estado não somos todos nós" (e uso minúscula propositadamente) pelo que ao indivíduo nunca será (nem foi) permitido fazer o que o estado faz. Se o tentar fizer, será perseguido por se tratar de um criminoso. Espiar, nomeadamente.

      P.S. - E que diferença existe entre o aprendiz Nixon e o real feiticeiro Obama! O Watergate ao pé do que já se sabe da NSA é, retrospectivamente, uma brincadeira de crianças.

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    3. Caro Eduardo
      O Estado somos todos nós, digo eu. Só que o Estado, quando representado por um governo, também não pode fazer tudo, a não ser com o assentimento dos cidadãos. Também os Estados cometem crimes quando ultrapassam o direito internacional e os seus executantes são julgados e condenados, se não forem os donos da bola... E não são só as ditaduras, como se vê.
      E depois veio a pós-democracia, que vai acabar com todos estes conceitos e então poderemos dizer, com letra muito pequenina, que: o estado fomos nós...
      Bfs

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