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sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Há terrorismo e terrorismo, há terroristas e terroristas…

Segundo uma investigação do Spiegel Online “o Governo alemão recebeu indicações de que o telemóvel da chanceler alemã poderá ter sido escutado pelos serviços secretos norte-americanos”, escreve o Süddeutsche Zeitung.
A 23 de outubro, horas depois destas revelações, Angela Merkel telefonou ao Presidente norte-americano Barack Obama para lhe pedir “explicações imediatas e completas” sobre essas acusações, escreve o diário, para o qual um ataque contra o seu telefone seria um ataque contra o coração político de Angela Merkel. É difícil imaginar que uma maior afronta possa ser cometida por um Estado amigo. Se os serviços secretos americanos a espiaram mesmo, o caso da NSA assume uma nova dimensão.
A cimeira dos líderes da União Europeia começou nesta quinta-feira à tarde, em Bruxelas, num contexto de tensão com as revelações da rede de espionagem dos Estados Unidos que abalaram a confiança dos seus parceiros europeus.
Um dos pontos a serem discutidos na cimeira é a proteção dos dados pessoais. A Comissão Europeia promove uma reforma da legislação que rege a questão, elaborada quando a internet ainda não alcançava todos os âmbitos da vida privada. Bruxelas quer que os grandes grupos da internet obtenham o consentimento prévio das pessoas para o uso dos seus dados pessoais, sob pena de multas.
O Parlamento Europeu pediu à Comissão Europeia para suspender o acordo UE-EUA sobre a transferência de dados bancários, assinado no âmbito da luta contra o financiamento do terrorismo.
A colocação sob escuta do telemóvel de Angela Merkel prova sobretudo uma coisa: o descontrolo dos serviços secretos dos Estados Unidos, após os ataques de 11 de setembro, ganhou claramente proporções alarmantes.
É provável que Vladimir Putin tenha ido para a cama, na noite passada, com um sorriso de orelha a orelha. De facto, as revelações de que os serviços secretos norte-americanos terão escutado conversas telefónicas privadas da chanceler alemã começam por parecer uma brincadeira.
Um chefe de Estado europeu que nunca manifestou atitudes antiamericanas ao longo da sua carreira política, que defendeu fortemente o eixo transatlântico, é colocado sob escuta pelos norte-americanos? No Kremlin, devem ter-se rebolado a rir.
No entanto, na presente situação, esta notícia clamorosa não parece desprovida de fundamento. As reações da Chancelaria Federal e da Casa Branca sugerem que, pelo menos, a história revelada pelo Spiegel não é uma efabulação. Embora seja ainda muito cedo para avaliar a extensão do escândalo, temos já uma ideia de algumas questões que levanta.
Atitude paranoica
Que crédito dá o BND [os serviços secretos alemães] a essas escutas? Para começar, era bom saber a razão pela qual esta incrível “quebra de confiança” não foi descoberta pelas autoridades alemãs, mas por jornalistas. Considerará o BND que a colocação sob escuta do mais poderoso dirigente político da Europa é um caso de somenos importância?
Depois, há que perceber quem controla os serviços secretos dos Estados Unidos. Angela Merkel não é a primeira chefe de Estado a quem isto acontece. A Presidente do Brasil, Dilma Rousseff, está manifestamente na mira da NSA [os serviços de informação dos EUA] – e cancelou mesmo, em setembro, uma visita oficial aos Estados Unidos.
Passados poucos dias, o embaixador dos Estados Unidos em França foi convocado pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros em Paris, porque havia suspeitas de espionagem industrial dos EUA, a coberto da luta contra o terrorismo.
A questão foi levantada por Peer Steinbrück, candidato às eleições alemãs, durante a recente campanha eleitoral. Muitos consideraram, então, uma atitude paranoica. Hoje, parece que era uma desconfiança mais do que legítima.
Coesão política ameaçada
O facto de a República Federal da Alemanha ser tributária da proteção dos Estados Unidos, isso de forma alguma autoriza a potência protetora a colocar-se acima da lei e das regras diplomáticas. Nos Estados Unidos, o descontrolo dos serviços secretos a partir dos ataques de 11 de setembro ganha claramente proporções alarmantes. Este tipo de práticas mina os valores e a coesão política do Ocidente.
É muito cedo para avaliar as implicações políticas deste escândalo. Será ainda possível acreditar nos protestos de Washington, que alega não passar tudo de um mal-entendido? Provavelmente não. Quando os chefes de Estado são transformados em alvos, não se trata de um acaso, mas de uma estratégia cuidadosamente amadurecida. O caso das escutas da NSA pode ter repercussões políticas consideráveis e levar a um espetacular encontro de placas tectónicas dos dois lados do Atlântico.

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