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sábado, 20 de abril de 2013

Como arranja dinheiro um pobre para ajudar os ricos?

As más-línguas dirão que o Império contra-ataca. Ainda mal se fechou o dossiê da crise cipriota, durante o qual a Alemanha uma vez mais, foi acusada de querer impor a sua vontade aos países do Sul da Europa com planos de resgate com condições draconianas, um estudo publicado pelo Banco Central Europeu relança o debate alemão sobre a incúria dos países do Sul.
Eric Maurice
Segundo esse estudo, os alemães são “os mais pobres da Europa”, com uma riqueza média inferior à dos espanhóis, dos italianos e até mesmo dos gregos e dos cipriotas.
Não foi preciso mais para que o Spiegel titulasse sobre “A mentira da pobreza. Como os países europeus em crise escondem a sua fortuna”, acompanhado por uma imagem de um velho montado num burro, atirando notas ao vento. “O resgate do euro é equitativo quando as pessoas do país que recebe são mais ricas do que do país que dá?”, pergunta o semanário, acrescentando que “já tarda um debate sobre uma nova partilha do fardo”.
Para além desta guerra de lugares comuns alegremente mantida entre o Norte e o Sul da Europa, o Spiegel levanta uma questão crucial: a Alemanha vai pôr em causa os mecanismos de resgate usados na zona euro? Mas esta questão baseia-se numa perceção errónea. É certo que a Alemanha paga mais do que os outros para salvar os países em crise, mas não é a única nem o faz de maneira desproporcionada. Os planos de resgate em curso e o Mecanismo Europeu de Estabilidade são financiados pelos Estados em função das respetivas populações e riqueza nacional. Acontece que a Alemanha é o país mais populoso e mais rico da UE por isso, é normal que contribua mais, mas de maneira proporcional, à solidariedade criada a partir de 2010.
Mas essa solidariedade – mais friamente chamada união de transferências – não se aplica na Alemanha, em nome dos tratados europeus (atualmente já muito ultrapassados) e do argumento segundo o qual os rendimentos do trabalho daqueles que fazem esforços e respeitam as regras não devem servir para compensar as insuficiências dos que (no Sul) gerem mal as suas finanças e o seu Estado. A conclusão mais simples é a que é fornecida pelo Alternativa para a Alemanha, o novíssimo partido que defende a saída do euro e vai pesar muito na campanha para as eleições legislativas do próximo mês de setembro.
O estudo do BCE vem reforçar este argumento, ao afirmar que os alemães, os mais rigorosos e os mais solicitados, são também os mais pobres. Mas a metodologia utilizada é contestada, porque valoriza mais o património do que o rendimento. Ora – e isso não é surpresa – o estudo também revela que o rendimento médio dos alemães é mais elevado do que o da maioria dos europeus. O que fica demonstrado é que os alemães gerem de maneira diferente a sua riqueza, especialmente, porque quase nunca são proprietários da casa onde moram.
O quadro que se nos apresenta é, portanto, o de uma Europa dividida entre países mais ou menos prósperos e países em grande dificuldade; entre países com grande desemprego e países onde o desemprego está controlado; entre países de onde os jovens saem e países para onde os jovens vão tentar a sua sorte; entre países onde os habitantes têm património mas pouco rendimento e países onde os bens e serviços são acessíveis à maioria das pessoas.
É preciso acrescentar a divisão entre países virtuosos e pecadores? Sob um ponto de vista moral, que alguns no Norte querem impor, não. Mas sob um ponto de vista de repartição da riqueza, da luta contra a corrupção e da ineficácia do Estado, a questão merece ser debatida. Tanto no Norte como no Sul.
Este estudo é recorrente, é a terceira vez que o exponho, mas de tão distorcido com análises limitadas, que merece a insistência, só para termos consciência do que é, realmente, manipulação…
Mas por outro lado... 
“Está em curso um verdadeiro ataque contra o coração da União Europeia”, escreve Christian Rocca, o diretor de IL, o suplemento cultural do jornal Sole 24 Ore:
Um ataque lançado do interior do continente; uma reação endógena à crise económica. A Europa tornou-se o nosso próprio inimigo, a responsável por todos os males nacionais, o alvo de todas as queixas corporativas. Nem sempre foi assim. Até há 20 anos, a Europa era o sonho, a esperança, o desafio de um novo começo: a libertação pacífica dos países de Leste, a reunificação alemã, a abolição das fronteiras, a livre circulação das ideias e das pessoas, Erasmus. Atualmente, temos apenas a Liga dos Campeões para nos lembrarmos de que ainda somos uma União. Quanto ao resto, bem-vindos à Eurolândia, a árida terra do euro, uma união monetária em que as palavras mais aterradoras que um europeu pode ouvir são: “Olá, sou da UE e estou aqui para te ajudar”.
Para ilustrar “os evidentes rasgões” que, nos últimos anos, apareceram na bandeira da União, o IL pediu a 4 intelectuais europeus – o historiador Niall Ferguson, o antigo comissário Peter Mandelson, o eurodeputado Daniel Cohn-Bendit e o chefe de Die Zeit Josef Joffe – que expliquem porquê, segundo Rocca, atualmente, a maior ameaça que pesa sobre o projeto europeu, é a perda de legitimidade do espírito europeu, a sua fraca credibilidade […]. Desta vez, e ao contrário do que é habitual, não bastará “mais Europa, é preciso mais Europa” para sobrevivermos.

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