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terça-feira, 16 de abril de 2013

Reformar o Estado tentando confiscar nas reformas…

O presidente do Governo Regional da Madeira, Alberto João Jardim, disse que “Não há saídas possíveis sem revisão constitucional, é uma fraude falar de reforma do Estado sem haver revisão constitucional”, referindo-se ao projeto de revisão constitucional do PSD-Madeira.
Jardim salientou que o PSD-M vai dar “um contributo a essa revisão, porque, quando o país está nesta situação, não é momento de ficar de braços caídos”, tendo propostas a nível nacional, mas, sobretudo, de âmbito regional.
Ao ser confrontado com a ideia expressada pelo primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, no congresso do PSD-M, em novembro de 2012, de que a Revisão Constitucional não era “uma questão importante” no quadro de dificuldades do país, Alberto João Jardim respondeu: “Por acaso não me lembro do discurso dele.”
Até ao final da semana passada tudo corria bem. A execução orçamental seguia virtuosa, o desemprego galopava ma non troppo e a generalidade dos indicadores económicos demonstravam que em Portugal a recessão batia à porta, entrava, mas estava logo de saída. Afinal, a recessão vinha só fazer uma visita de médico.
Pedro Almeida Cabral
De repente, um conjunto de pessoas que reúne num palácio de obscuro e afrancesado nome, resolveu lançar o país nos braços do desastre. Torcendo conceitos e torturando normas constitucionais, esse conjunto de pessoas conseguiu extrair raciocínios nunca vistos e ousou tomar uma decisão completamente surpreendente e completamente inesperada: declarou inconstitucionais algumas das normas do Orçamento de Estado para 2013 e abriu um rombo de proporções gigantescas nas contas do Estado. Reinou a desorientação com esta catástrofe de proporções homéricas. E tinham que ser as contas deste Ministro das Finanças a sofrer tamanha afronta! Logo ele, que não falha uma previsão, não recorre a receitas extraordinárias e reduz despesa como quem troca de camisa.
Perante este estado de coisas, resvés Campo de Ourique excepcional, só havia uma solução: obter umas palavras de conforto e ânimo em amena cavaqueira junto do Presidente da República, que os amigos são para as ocasiões, e comunicar solenemente ao país que a conspiração constitucional não passaria. Vamos é ter que fazer uns cortes em áreas essenciais que já tínhamos previsto que não queríamos mesmo fazer mas somos obrigados, etc. e tal.
Agora que o termo, narrativa, passou a ser esconjurado como uma palavra de mau tom, é bom utilizá-lo com propriedade: esta é a narrativa desconjuntada com que o Governo nos brindou no fim-de-semana, com direito a dramatismo e caras contristadas.
A decisão do Tribunal Constitucional deixa algumas dúvidas. Com efeito, e como toda a gente sabe, não é a mesma coisa trabalhar no Estado e trabalhar no sector privado. Há significativas diferenças no que diz respeito ao risco de desemprego e à inalterabilidade da retribuição. Passar por cima dessas diferenças é fechar os olhos à realidade. Mas as dúvidas que deixa são as mesmas que deixou a decisão do ano passado, pois o princípio era o mesmo: não pode haver diferenças nos cortes salariais no Estado e no sector privado.
Ou seja, já se adivinhava há meses que o Tribunal Constitucional decidiria, mal ou bem, algo semelhante ao que veio a decidir. Daí que Passos tenha lançado o rumor da sua eventual demissão nas últimas semanas, o que não era mais do que uma derradeira tentativa de condicionar a decisão.
Fingir-se agora muito surpreendido quando se sabia à partida que, com toda a probabilidade, o Orçamento conteria normas inconstitucionais, é apenas uma desastrada forma de procurar novamente ganhar legitimidade política, demonstrando um certo desrespeito pelo Tribunal Constitucional. É que, a acreditar nas informações divulgadas, nem se pode sustentar que o Tribunal decidiu politizadamente, pois houve vários juízes a decidirem de forma contrária ao partido que os nomeou.
Pior. A decisão do Tribunal Constitucional apenas implica uma derrapagem que corresponde a 0,8% do PIB. Muito longe dos cálculos furados de Gaspar para o défice de 2012, em cerca de 1,9% do PIB. E muito longe também do buraco sem fundo que nos quiseram vender.
A verdade é que apesar do seu ar determinado e convicto, Passos não sabe bem o que há-de fazer. Não podendo aumentar os impostos, sob pena de o seu parceiro na coligação, o partido do contribuinte, passar a ser o partido anti-contribuinte, resta-lhe ensaiar uma nova tentativa de cortes na despesa nas áreas onde sempre sonhou cortar: Segurança Social, Saúde e Educação. O facto de estes cortes tornarem ainda mais desigual um dos mais desiguais países da Europa e piorarem ainda mais o nosso baixo nível educativo é um pormenor.
O problema de fundo é que estes cortes andam a ser ensaiados desde a sua famosa proposta de revisão constitucional de 2010 e acabam sempre por ser descartados. Relembro apenas o mais recente, que passava pelo pagamento de taxas para a frequência do ensino secundário nas escolas públicas.
Preso na sua própria armadilha de ter apresentado um orçamento que sabia ser inconstitucional e na sua estratégia de troikar com mais intensidade que a exigida, Passos já não tem grandes soluções. Veremos se repetirá uma estratégia passada, em que defendeu que um resgate era a solução de todos os problemas.
PS: Este PS é mesmo sobre o PS. Parece que os irmãos Seguro andaram à solta no fim-de-semana, defendendo posições opostas. Enquanto um pedia ao Governo que resolvesse o problema criado pelo Tribunal Constitucional, outro pedia eleições imediatas, o que implicava não resolver problema nenhum. Esta oposição self-service para todos os gostos é genial e não tenho dúvidas de que vai dar os seus frutos.
Muitas vezes tenho sublinhado aqui a conspirativa “Revisão Constitucional” que o governo está a fazer, por via do “facto consumado”, reduzindo verbas para as obrigações sociais do Estado, ao mesmo tempo que reduz o poder de compra dos contribuintes, que por o serem, tem direitos. E por isso, estou de acordo com o que diz o articulista Pedro Almeida Cabral
Mas, já não concordo, obviamente, quando diz que toda a gente sabe (eu e muitos mais não sabem nem acreditam), que não é a mesma coisa trabalhar no Estado e trabalhar no sector privado porque há significativas diferenças no que diz respeito ao risco de desemprego e à inalterabilidade da retribuição. E é fácil desconstruir o juízo, talvez, crença, tendo em conta os milhares de Funcionários Públicos que já foram despedidos e mais os milhares de que se fala, os cortes (só na Função Pública) nas tabelas salariais, subsídios de férias e de Natal, horas extraordinárias, para não falar do congelamento de salários e progressão na carreira, que já leva anos… E nada disto aconteceu no Privado, a não ser, em menor grau, este ano…
E desta vez até Jardim tem razão, não pela proposta que venha a fazer, mas por ser, realmente, uma fraude, falar de reforma do Estado sem haver revisão constitucional… Se estivesse atento aos discursos do seu chefe, já teria adivinhado (nas entrelinhas) para onde nos quis sempre levar…
E fomos todos levados, cantando e rindo...
Não sei é se terá a força para nos empurrar…

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