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domingo, 14 de abril de 2013

Quem ganha com a deterioração da educação pública?

“Viemos ao mundo para dar nome às coisas: dessa forma nos tornamos senhores delas ou servos de quem as batizar antes de nós”. Lya Luft
Nei Alberto Pies
Qualidade é um substantivo inerente ao ser humano e aos seus afazeres. O ofício de educar, como outros, pressupõe a qualidade, gerada na satisfação e na conquista de aprendizagens protagonizadas por educadores e educandos. O prazer maior nas relações de ensino-aprendizagem está na construção do conhecimento como algo útil, agradável e capaz de desencadear alegria e realização. O educador é um dos maiores interessados na qualidade na educação, pois esta sempre carrega potenciais para a sua satisfação (o fracasso dos educandos também representa o seu fracasso).
Quem ganha com a desqualificação da educação pública? Quem ganha quando os professores/as não são tratados com a dignidade que merecem? Quem goza de alguma vantagem quando os alunos das nossas escolas saem delas sem as mínimas condições de ler e interpretar o mundo, para melhor se inserir nele?
É incrível: quando a sociedade se mostra disposta a debater a qualidade na educação, os professores/as são atacados e apontados responsáveis pelo insucesso escolar. E o que é mais grave: as peculiaridades do seu ofício começam a ser entendidas como privilégios e não como direitos. E os professores que lutam para ampliar ou manter os seus direitos são duramente penalizados.
Por acaso, professores e alunos estão a ser consultados para a avaliação dos processos educativos nos quais são os principais sujeitos? Para avaliarmos a educação, precisamos de legitimidade nos processos avaliativos, a partir de acordos e convencimentos capazes de promover o envolvimento dos sujeitos nas realidades avaliadas. Os seres humanos não são passivos como os produtos e as suas ações e atitudes remetem sempre para a sua liberdade.
Rubem Alves, quando discute “Qualidade em educação”, lembra que “a educação, na medida em que lida com a vida das pessoas e a vida do país, deve ser a área mais rigorosamente testada e é preciso que seja excelente. Entretanto, é aquela em que os testes são mais difíceis e as avaliações, vestibulares e ‘provões’ quase nada significam: nada garante que a qualidade, medida por critérios académicos numéricos, consiga passar os testes que a vida impõe”.
Alves afirma que as avaliações escolares são sempre anunciadas com a intenção de “consertar a máquina” (a estrutura dos sistemas de ensino). E logo responde: “eu, ao contrário, acho que não há nada de errado com a máquina. Não há o que consertar. Acontece que os alunos, mais precisamente os corpos dos alunos – tem também os seus mecanismos de ‘controlo de qualidade’. Se eles não aprendem é porque os seus corpos reprovam a máquina. Os seus corpos vomitam o que a máquina lhes enfia pela goela abaixo. O resultado do ‘examão’ seria a prova disso”. E pondera ainda que o nosso corpo só aprende 2 tipos de conteúdos: os que dão prazer e os que levam ao objeto de prazer (aqueles com razões para serem aprendidos). “A máquina funciona como deve. O problema é que a comida que ela serve é imprópria para a inteligência”.
Há muito tempo que os educadores/as reclamam qualidade. Há tempos que apontam imprópria a “comida” que os governos lhes servem (precarização das condições de trabalho, retirada de direitos e penalizações para quem luta). E isto fere as suas inteligências. Por isso pedem um favor: não chamem de inteligência o que se faz na gestão da educação pública. É muito indigesto e está longe de gerar prazer. E já seria ousadia demais!

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