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terça-feira, 29 de outubro de 2013

Há alternativas à austeridade… Votemos nos mesmos!

Os europeus ficaram estupefactos e consternados com o impasse que quase levou o Governo dos EUA ao incumprimento da dívida. Mas se os partidos anti-UE tiverem bons resultados nas próximas eleições europeias, a União poderá deparar-se com uma situação semelhante, alerta um politólogo alemão.
Os europeus ficaram estupefactos e consternados perante o shutdown [paralisação parcial do Governo federal] e pela possibilidade de incumprimento dos Estados Unidos. Talvez tenham até sentido algum schadenfreude [prazer com o mal dos outros]. Afinal, nos últimos anos, os dirigentes europeus têm sido ridicularizados e menosprezados pelos seus malabarismos políticos globais relacionados com a disfuncional zona euro – nalguns casos empurrando as suas economias para o abismo, para depois recuarem no último minuto antes de os mercados abrirem.
No entanto, a Europa poderá vir a viver a sua própria versão de um shutdown – menos dramático do que o do Governo dos EUA, sem dúvida, mas com causas semelhantes. Tal como o Tea Party fez do Congresso uma instituição paralisada e a odiar-se a si própria, uma aliança de partidos que se opõem à União Europeia poderia conduzir a Europa para a sua própria versão de "bloqueio", se esses partidos obtivessem o apoio popular suficiente nas eleições europeias do próximo ano. É melhor que as elites europeias – e todos os cidadãos que se preocupam com o destino da UE – comecem a pensar nesse cenário.
Os Estados Unidos e a UE têm uma característica comum: são, na gíria da ciência política, "regimes mistos", nos quais existe uma forte separação de poderes e inúmeros equilíbrios e controlos. Esse facto tem efeitos positivos, para aqueles que querem que as leis se baseiem num consenso amplo e que, de um modo geral, pretendem evitar aquilo a que James Madison chamou "instabilidade pública". Ao contrário do modelo de Westminster [Parlamento britânico], os regimes mistos tornam mais fácil que um número relativamente pequeno de atores políticos vete a mudança. São também menos transparentes; uma vez que é mais complicado responsabilizar claramente alguém, as culpas pelas politiquices podem sempre ser transferidas de uns para outros.
Parlamento legisla mais do que se julga
Embora nunca tenha sido exatamente uma instituição benquista, o Parlamento Europeu era, até há pouco tempo, mais capaz de estar à altura do ideal partilhado, pela simples razão de que a maioria dos seus membros tinha pelo menos 2 coisas em comum: eram de um modo geral pró-UE e estavam desejosos de preservar os poderes duramente conquistados do Parlamento e, se possível, de alargar esses poderes.
Na verdade, o Parlamento tornou-se mais influente do que a maioria dos europeus se deu conta, e não apenas no que se refere a questões importantes como a proteção de dados. Conforme sublinhou Simon Hix, professor da LSE London School of Economics, cerca de 25% das alterações à legislação propostas pelo Parlamento Europeu acabam por vir a ter força de lei – mais do que em qualquer parlamento nacional.
Os planos destinados a tornar a UE mais democrática têm-se centrado quase sempre em conceder mais poderes aos deputados europeus – partindo do pressuposto ingénuo de que o Parlamento seria sempre automaticamente pró-europeu. Mas o que aconteceria se este fosse tomado de assalto por uma versão europeia do Tea Party, um grupo que faz campanha em nome do princípio de que o problema é o próprio Governo? Numa entrevista concedida esta semana a The New York Times, o primeiro-ministro italiano, Enrico Letta, advertiu que, para não se chegar a uma "legislatura de pesadelo", os grandes partidos pró-europeus teriam de conquistar pelo menos 70% dos assentos.
O aviso de Letta parece uma confirmação, pelo establishment da UE, das razões pelas quais os populistas a condenam: os eleitores podem contar com mais democracia, desde que continue a tratar-se de uma democracia sem possibilidades de escolha reais – ou, pelo menos, é isso que os populistas dizem. Portanto, é importante ser-se claro quanto a onde residem exatamente os perigos. Nem todos os partidos que criticam o euro são anti-UE (pense-se no partido Alternativa para a Alemanha). Contudo, é significativo o número dos partidos verdadeiramente anti-UE, que são simplesmente destrutivos e que enfermam de contradições fundamentais. Esses partidos reivindicam a legitimidade democrática, baseando-se nos votos que obtiveram nas eleições para o Parlamento Europeu e, ao mesmo tempo, negam que este último seja democrático. Desejam apenas acabar de vez com tudo (mas, idealmente, ficar com o dinheiro e com o prestígio associados ao cargo).
Antieuropeus pouco fazem
Uma análise esclarecedora de Marley Morris [do grupo de consultoria e investigação Counterpoint] mostrou que os antieuropeus pouco fazem realmente na legislatura, preferindo o protagonismo nas sessões plenárias; o UKIP [Partido da Independência do Reino Unido] é um dos adeptos desta abordagem. Muitos desses partidos – concentrados no grupo Europa da Liberdade e da Democracia (EDF), uma espécie de Internacional dos nacionalistas – não propõem uma plataforma política coerente.
A Frente Nacional de Marine Le Pen (à frente nas sondagens, em França, sobre as eleições europeias de maio de 2014) e o partido anti-imigração e anti-Islão de Geert Wilders, da Holanda, estão a tentar forjar uma aliança pan-europeia contra a UE. Fazer campanha em conjunto poderá ser mais eficaz para as duas formações, mas também é provável que essa junção torne as coisas ainda mais caóticas: alguns partidos populistas não querem ver-se associados ao racismo. A um nível, esta incoerência poderá será positiva, tal como o facto de mesmo entre a extrema-direita, as alianças serem frequentemente quebradas.
Assim, a menos que desejem uma UE de facto disfuncional, os cidadãos europeus devem pensar duas vezes antes de votarem nesses partidos. Não irão conseguir políticas diferentes e, sim, paralisia. Há alternativas reais – inclusive à austeridade – e, no Parlamento, existem opções genuínas dentro do espectro esquerda-direita: mais do que em muitos parlamentos nacionais. Querer protestar é legítimo, em termos democráticos – mas também é importante que nos encaremos a sério a nós mesmos e ao nosso voto. Paralisar as instituições é coisa para adolescentes políticos, não para adultos.

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