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terça-feira, 18 de dezembro de 2012

O médico nem é bom nem é cirurgião, mas amputa!

"Na história do Fundo Monetário Internacional (FMI), há mais insucessos do que sucessos", afirma João Ferreira do Amaral, professor catedrático do ISEG. "O FMI falhou na sua missão de apoiar a economia mundial e alguns países em particular, caso de Portugal e da Grécia", disse também Sargon Nissan, especialista em políticas do FMI no Bretton Woods Project, um think tank norte-americano.
Pedro Araújo
Portugal é simultaneamente apontado como bom e mau exemplo das políticas do FMI. "Nos anos 80 fomos um sucesso para o FMI", refere Ferreira do Amaral. O esforço feito passou sobretudo pela política de rendimentos, com uma forte quebra dos salários em termos reais a partir do primeiro acordo com o FMI, em 1977 (apenas interrompida nos anos 1980 e 1981), e pela política cambial, isto é, forte desvalorização real da moeda portuguesa que mais do que compensou o crescimento dos preços e custos acima do exterior. Estas medidas deram, portanto, competitividade aos produtos nacionais. Hoje, o país não tem moeda própria nem política monetária autónoma, dois instrumentos que eram fundamentais para o FMI.
Segundo Ricardo Reis, professor de Economia na Universidade de Columbia, em Nova Iorque, a receita típica do FMI para um país com um enorme fardo de dívida passa pela consolidação fiscal, pondo as contas públicas em ordem, e corrigindo o défice externo, para que o país deixe de depender de financiamento exterior. É também necessária uma expansão monetária imediata, seguida de estabilidade, mas de forma a desvalorizar a taxa de câmbio, para ajudar as exportações e ao mesmo tempo reduzir o fardo da dívida externa, estimulando assim a economia.
"Sem a expansão monetária, porque não temos moeda própria, o ajustamento do défice externo é mais difícil. A dívida permanece alta pelo que são precisos mais sacrifícios [aumento de impostos, por exemplo] para a pagar, e por fim a economia, sem o estímulo monetário, cai numa contração maior, pondo em risco todo o processo de consolidação orçamental. Estes 3 riscos estão agora à vista em Portugal", explica Ricardo Reis.
Joseph Stiglitz, Nobel da Economia, lembra que a figura inspiradora do FMI foi Keynes. Daí que inicialmente a instituição, criada em 1944, fosse favorável a políticas expansionistas, com forte intervenção de dinheiros públicos. O objetivo era proporcionar liquidez através de empréstimos para aumentar a procura interna.
No entanto, o perfil das intervenções externas do FMI cedo mudou. A viragem pode ser localizada nos chamados Planos de Ajustamento Estrutural, muito aplicados a partir de 1982 nos países da América Latina, então a braços com uma crise da dívida, tal como acontece agora com os países do euro, salvo as devidas diferenças. Durante a década de 70, o crédito barato e abundante tinha estimulado o endividamento dos países latino-americanos, como aconteceu com Portugal e outros países após a criação do euro (1999). O objetivo da correção era restabelecer os equilíbrios da balança de pagamentos e permitir, desse modo, que estes pagassem a dívida. Agora, o objetivo já era reduzir a procura interna para cortar nas importações, com redução do défice orçamental, congelamento de salários, corte na despesa pública e, por exemplo, aumento de impostos. As semelhanças com a Europa atual param por aqui, à parte da liberalização de alguns sectores e incentivo às exportações. A grande diferença é que se recorreu, naquela altura, à desvalorização da moeda.
"O FMI é hoje muito diferente do que era defendido pelas instituições de Bretton Woods. O objetivo inicial era estabilizar e impulsionar o crescimento das economias. Penso mesmo que a participação do FMI - organização onde os EUA têm óbvia influência e poder de veto - no resgate a países da zona euro não faz sentido. Note-se a dificuldade que a instituição tem em lidar com políticas de ajustamento em países sem moeda própria. Sobretudo nos casos grego e português, as intervenções estão a ser um desastre", alerta João Ferreira do Amaral.
Mas quais são afinal os grandes insucessos do FMI?
Na opinião de Ricardo Reis, nos últimos 20 anos, Argentina (1994-2001), Rússia (1992-98) e Tailândia (1997-2000) terão sido os grandes fracassos.
A Argentina, inicialmente porque apoiou a paridade do peso com o dólar até demasiado tarde, e posteriormente porque se deixou enganar pelos Kirchner [Cristina Kirchner é a atual presidente, antes foi o marido, Néstor].
A Rússia porque não é claro que a intervenção do FMI tenha melhorado qualquer coisa em todo o processo.
A Tailândia é representativa da crise asiática, onde o FMI demorou tempo de mais a perceber que o fulcro da crise estava no sector financeiro e porque não permitiu medidas mais agressivas de controlo das contas externas, ao mesmo tempo que focava demasiada atenção em reformas estruturais com ligação ténue à crise.
Já todos constatamos que as receitas não ajudam à cura da maleita, mas também já testemunhamos que se insiste nos mesmos médicos, que não sendo especialistas da área e à falta de melhor e mais barato remédio amputam, naco aqui, naco acolá, até o doente não poder viver por si e condená-lo a usar próteses (importadas)…
E são economistas a falar de economistas… Eles que se entendam!

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