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segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

E quem é que viveu acima das suas possibilidades?

Mais de metade do nosso défice público vai para pagar juros? Sim. A Polónia não paga cerca de metade do que nós pagamos em juros em percentagem do PIB? Sim. Se pagássemos menos juros, podíamos cancelar todos os aumentos de impostos dos últimos dois anos? Provavelmente. Logo, a taxa de juro que os "amigos" da troika nos cobram é abusiva e um fardo pesado sobre o nosso orçamento? Nem pensar.
Ricardo Reis, Professor de Economia na Universidade de Columbia, Nova Iorque
Os juros que pagamos são o produto da taxa de juro vezes a dívida que temos. A Polónia vai pagar aproximadamente a mesma taxa de juro do que nós em 2012, cerca de 4,1%. Só que a dívida deles é metade da nossa.
O nosso problema não é a taxa, que até está abaixo da média em democracia antes de entrarmos no euro. O problema está na dívida que é enorme. O grande obstáculo orçamental não está nos termos do acordo com a troika, está antes nos défices que acumulámos durante anos a fio. Se o dinheiro vai hoje para pagar juros e não sobra para pagar pensões e salários, não é por causa da taxa de juro, mas das pensões e salários a mais que pagámos no passado.
Para além disso, a taxa de juro que pagamos à troika são só cerca de 3,2%. Os credores privados é que cobram muito mais, resultando numa média de 4,1%. A troika é o nosso credor mais generoso.
O ataque aos juros não para aqui. Então, se a França está a pedir emprestado a uma taxa de 2,1%, e a Alemanha a 1,4%, não estão a lucrar à nossa custa? Porque é que os alemães não pedem dinheiro emprestado a 1,4% e o emprestam aos portugueses a uns 2%, ficando todos mais ricos? Não, não, não.
A Alemanha já faz isto, todos os meses. Criou-se uma agência, o EFSF, que pede emprestado para poder emprestar aos portugueses. Crucialmente, ela faz isto em nome dos alemães, franceses e outros europeus, e com o seu explícito aval e garantia. Qual é a taxa de juro que os mercados cobram ao EFSF? 3,2%, precisamente o mesmo que o EFSF nos cobra a nós. Ninguém na Europa está a lucrar à custa do empréstimo a Portugal.
Então, porque é que a taxa cobrada ao EFSF é maior do que a cobrada à Alemanha? Essencialmente por duas razões. Primeiro, porque o EFSF pede emprestado não só em nome da Alemanha, mas também da Bélgica, de Itália ou de Espanha. Espanha neste momento paga 5,3% de taxa de juro pelos seus empréstimos e Itália 4,6%. A taxa de juro de 3,2% é a taxa europeia e é a Europa, não a Alemanha, quem nos empresta fundos através da troika. Segundo, porque quando eu empresto dinheiro à Alemanha, sei com o que conto. Já a política europeia tem sido tão inconstante que o que é hoje verdade sobre o EFSF pode mudar amanhã.
Se nem a troika nem os países são os agiotas, os culpados devem ser os bancos. Então o BCE não empresta a 0,75% aos bancos? Porque é que eles não emprestam a Portugal a essa taxa? Se tivéssemos um banco central que pudesse imprimir escudos, como Inglaterra tem hoje, não teríamos juros mais baixos? Não, disparate outra vez. Mas a explicação fica para a próxima semana.
Pois! Tudo entendido, se explicado pela rama. Mas se a troika não é agiota, quem será? E como se pode emprestar durante 30 anos e querer reaver em 3 ou 4 anos? E quem é que fez a maior fatia da dívida, não foi a Banca e as empresas privadas?
Pois! Se nem a troika nem os países são os agiotas, os culpados só podem ser os bancos. Então o BCE não empresta a 0,75% aos bancos? Porque é que eles não emprestam a Portugal a essa taxa? E se emprestassem ao Estado português a 0,75% seria preciso implementar esta austeridade brutal e injusta, porque não é dívida dos contribuintes?
Pois! Então porque são os contribuintes a pagar a dívida de outros? 
A dívida do nosso país pode ter muitas causas. Endógenas e exógenas, micro e macroeconómicas, conjunturais ou estruturais.  Há todavia um traço comum que, a meu ver, é a principal causa do estado a que chegámos, independentemente das dificuldades que todos os países enfrentam, da crise internacional e de tudo o resto que gostam de nos vender.
Tiago Mesquita 
A causa de que falo é simples e nada tem de rebuscada: o nosso país tem sido governado por um grupo de pacóvios com tiques de parolo. Os novo-riquismo da política portuguesa é sem duvida o maior cancro da democracia partidária.
O dinheiro público, quando gasto de forma racional, não é contabilizável. A boa utilização destes recursos traduz-se em melhorias que, direta ou indiretamente, permitem à sociedade manter níveis de desenvolvimento elevado. E só com desenvolvimento o crescimento pode ser sustentável. E o pior é que isto nunca aconteceu neste país.
De que serve construir dezenas e dezenas de autoestradas se não temos dinheiro para nelas circular, nem tão pouco para as pagar ou sustentar? O maior centro comercial da europa? A maior ponte da europa? E ter alguma coisa à nossa medida, não pode ser? É coisa de pobre? De que serve gastarmos milhões em formação se não temos empregos? E aeroportos sem aviões? E dezenas de estádios de futebol às moscas? E escolas sem alunos? Submarinos ou cortes na saúde? Tanques ou reformas? E parcerias feitas para o Estado ser prejudicado? Privatizações em cima do joelho? E os dinheiro que jorrou da UE durante décadas, em que foi investido? Snack bares atrás do sol-posto? Jipes para passear nos montes alentejanos? Não querem gastar a próxima tranche da Troika em plasticina e paus de giz? Quem gastou o que não devia? Quem gastou o que não tinha? Quem gasta o que não tem? Que futuro pensavam estas alminhas iluminadas que iriamos ter? Imbecis.
A forma abusiva, parola, irresponsável, impune, pacóvia, descontrolada, despesista, acéfala e em muitos casos socialmente 'criminosa' como sucessivas gerações de governantes têm vindo a desbaratar o património de todos, os bens e o dinheiro que deveria ser alvo de uma gestão cuidada e rigorosa, é a principal causa do estado de falência em que estamos. O novo-riquismo, a falta de visão, a falta de formação, qualidade e competência dos políticos portugueses é a principal causa desta crise. A génese desta crise é política. Mas infelizmente a irresponsabilidade destas pessoas é directamente proporcional às responsabilidades exigidas pelos mesmos aos portugueses, com as quais são permanentemente confrontados, sem terem culpa alguma. Comemos e calamos.
Gastassem menos, parolos. 

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