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domingo, 28 de outubro de 2012

IMPOSTOS a mais, (direito a) DIVIDENDOS a menos…

Há dias o ministro Vítor Gaspar deixou uma espécie de bomba-relógio no Parlamento ao dizer: "Existe aparentemente um enorme desvio entre o que os portugueses acham que devem ter como funções do Estado e os impostos que estão dispostos a pagar". Ou seja, Gaspar traçou a sua linha Maginot: com o dinheiro que existe não pode haver nem mais Estado, nem este que existe. Faltou, é claro, acrescentar uma coisa: talvez seja possível, com a barbaridade de impostos que os portugueses já pagam e se preparam para pagar em 2013, melhor Estado.
Fernando  Sobral
Gaspar tem razão numa coisa: estamos a chegar ao fim de um ciclo fomentado pelo crescimento económico pós-II Guerra Mundial e que solidificou o Estado social que o liberalismo cristão de Bismarck tinha posto em funcionamento no século XIX para obstar aos protestos da então pujante classe operária.
A crise que a falência do Lehman Brothers consolidou o fim dessa época em que o crescimento económico pagava todos os desejos. O fim do pleno emprego que a crise petrolífera de 1973 incentivou, demoliu o sonho social-democrata. Em Portugal o Estado social teve uma vida efémera. Até porque até à década de 1970 eram muitas vezes as grandes empresas, como a CUF, que forneciam sistemas sociais de segurança aos trabalhadores e Fundações, como a Gulbenkian, faziam as vezes de ministério da Cultura. O próprio Estado sempre foi entendido como a coutada de uma elite, distribuindo favores e criando fortunas por via das concessões e monopólios. O próprio sistema de impostos viveu sobretudo das alfândegas até muito tarde.
O Estado português não cresceu após o 25 de Abril: apenas engordou mais, criando mais clientelas partidárias que o tornaram monstruoso. É por isso que as palavras de Vítor Gaspar sabem a pouco: aquilo que era urgente, a reforma do Estado, utilizando os recursos nas áreas cruciais (educação, saúde, segurança e protecção social), não foi feito pelo Governo de Passos Coelho. E aí Gaspar não tem razão e actua dentro dos seus princípios ideológicos (contorna o direito dos cidadãos e afirma o mérito e a necessidade num conceito ultra-liberal): os portugueses pagam impostos a mais para aquilo que o Estado lhes retribui. Porque está gordo com uma clientela partidária que, numa década, colocou no perímetro público o dobro de funcionários. E porque é que o Governo não reforma o Estado? Porque é este que, a partir das autarquias e dos "funcionários públicos" que trabalham para o partido, permite que se ganhem eleições.
E isto tanto vale para o PSD como para os outros partidos. Já Eça de Queiroz o dizia no tempo da monarquia constitucional.
O que é dramático é que são os contribuintes portugueses que estão a pagar o clientelismo partidário no Estado e um Orçamento que tem quase sempre as mesmas pessoas à mesa. Vítor Gaspar sabe tanto como os portugueses sensatos: não há dinheiro para pagar tantas actividades do Estado, especialmente num país como este que não cria riqueza e onde a administração esbulha os rendimentos. Mas enquanto não se reformar o Estado e se afastar as famílias políticas de todos os tipos que absorvem grande parte do que os portugueses pagam em impostos, não haverá igualdade. Nem mesmo em termos liberais de escolha entre público e privado. Com estes impostos ninguém pode optar pelas reformas privadas ou pela saúde ou educação privada, porque o Estado já o esbulhou de tudo o que tem. E aí o liberalismo anti-estatista de Gaspar cai por terra. O mais dramático é que Governo e oposição não discutam seriamente a anemia do Estado social em Portugal, nem a partidocracia do Estado, nem o nosso futuro dentro ou fora da UE. E Gaspar deveria pensar um bocadinho: os portugueses pagam mais do que efectivamente vão começar a receber.

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