(per)Seguidores

sexta-feira, 7 de setembro de 2012

A Europa não está em declínio! Tem falhas na sua governação e nas instituições de controlo económico.

A moeda única paga, hoje, os seus defeitos de conceção. Mas não é permitindo um pouco de inflação nem prosseguindo uma política de austeridade uniforme que a Europa sairá da crise, considera o Prémio Nobel da Economia.
O seu livro End This Depression… Now! é uma tese contra a austeridade e o dogma da luta contra o défice. Em seu entender, a Europa travou a batalha errada?
No começo, era a Grécia. Ninguém pode negar que Atenas tinha um problema de disciplina orçamental e tem grandes responsabilidades nas suas dificuldades. Mas, devido ao pânico, fez-se desse país a explicação por defeito da crise europeia. Essa explicação correspondia à tendência natural dos bancos centrais para fixar limites e acusar o laxismo social e orçamental de estar na origem dos problemas da zona euro. E também refletia o dogmatismo dos alemães, sempre prontos a criticar os outros por não igualarem a sua virtude. Isso é esquecer até que ponto a Grécia é única e isolada. Acontece que a interpretação da sua grave desventura contribuiu para fazer uma amálgama que justificou o dogma geral da austeridade. Por conformismo, qualquer outro ponto de vista foi rapidamente excluído do debate.
Portanto, incrimina os alemães?
Historicamente, a atitude dos alemães explica-se pela fobia da inflação, que consideram ter estado na origem da sua tragédia do passado. Mas os alemães parecem ter varrido da memória coletiva os sofrimentos causados pelas terríveis políticas deflacionistas dos anos 1930. A sua influência no BCE explica-se, evidentemente, pelo seu estatuto dominante na Europa e, também, pela ambição original de fazer desta instituição uma barreira contra a indisciplina e a inflação. […] A Alemanha é o credor de uma Europa que viveu efetivamente um período de exuberância. Gostaria, contudo, de ver que remédios teriam sido propostos se, por exemplo, os fluxos de capitais tivessem vindo de Espanha para o imobiliário alemão e não o inverso.
Foi, logo à partida, um eurocético?
Sim. Penso que o euro era uma ideia romântica, um belo símbolo de unidade política. Mas, quando se abandona a moeda nacional, perde-se muita flexibilidade. Não é evidente qual a forma de atenuar essa falta de margem de manobra. Em caso de crise localizada, existem dois meios: a mobilidade da mão de obra, para compensar a perda de atividade, e sobretudo a integração orçamental, para contrabalançar as perdas de receitas. Deste ponto de vista, a Europa estava muito menos habilitada para a moeda única do que os Estados Unidos. Comparemos a Florida e a Espanha: a mesma bolha imobiliária, o mesmo crash. Mas, nos Estados Unidos, as pessoas podem ir procurar trabalho noutro Estado, menos atingido. Em todos os Estados, a ajuda social, os seguros de doença, as despesas federais e as garantias bancárias nacionais são mantidos por Washington. Isso não acontece na Europa.
O que pensa da resposta europeia à crise?
A minha posição contra as políticas de austeridade refere-se aos países que ainda têm escolha. Nem a Espanha nem a Grécia podiam libertar-se das exigências alemãs e correr o risco de lhes serem cortadas as provisões. Mas, do meu ponto de vista, a França não está numa situação orçamental crítica e não tem tanta necessidade de uma política de austeridade.
No entanto, é preciso manter a confiança dos mercados. Como conseguir isso?
A resposta é de ordem monetária. Passa pelo Banco Central Europeu. Vejo, por um lado, compras massivas de obrigações espanholas e italianas, para conter a subida em flecha das taxas de juro. Do outro, o sinal de uma política mais flexível do BCE, a promessa de não aumentar as taxas ao mínimo indício de inflação e o estabelecimento de objetivos realistas, 2% ou 3% de inflação a médio prazo, em vez de 0% ou 1% como hoje.
E a Grécia?
Não vejo como pode a Grécia continuar no euro. É praticamente impossível. Mas a sua saída provocaria uma retirada massiva dos depósitos dos bancos espanhóis e italianos, à qual o BCE teria absolutamente que responder através de contribuições de liquidez ilimitadas. Caso contrário, em duas semanas, o Bundesbank atiraria a toalha ao chão e seria o fim do euro.
Quais seriam as consequências do desaparecimento da moeda única?
Imagine dívidas denominadas numa moeda que deixou de existir… Penso que a zona [euro] cairia numa recessão severa durante um ano, até os países encontrarem um meio de prosseguir as suas trocas [comerciais] e, como no caso da Espanha e da Itália, de recuperarem alguma competitividade. Isso seria grave, do ponto de vista político: o fracasso do maior projeto da História e o descrédito lançado sobre os dirigentes envolvidos na manutenção do antigo sistema dariam origem a insurreições populistas e nacionalistas.
Que solução preconiza para os países do Sul?
Num quadro clássico, seria a desvalorização interna. Em princípio, a descida dos salários permitiria recuperar a competitividade. Mas nenhum país, nem mesmo a Irlanda e a Letónia, conseguiu realmente chegar a uma descida real dos salários do setor privado. Por outro lado, a deflação aumenta o peso da dívida privada em euros. Acrescente-se a isso o risco de fuga de capitais e a instabilidade dos governos encarregados dessas medidas e chegaremos a um impasse. Os salários espanhóis são hoje 30% mais elevados, se comparados com os alemães. Em vez de os baixar à força – politicamente impossível –, por que não deixar os salários aumentar para lá do Reno, para salvar a competitividade da Espanha? Isso implicaria um relaxamento da política monetária e, sem dúvida, mais inflação na Alemanha.
Que futuro antevê para a zona euro?
Se o BCE tomar as medidas adequadas, é possível imaginar uma melhoria dentro de 3 a 5 anos. Mas a Europa continuaria frágil. A sua moeda é uma construção pouco sólida e continuará a sê-lo até ser criada uma garantia bancária europeia. Até lá, o sistema poderá sobreviver confortavelmente, admitindo, como lubrificante, uma dose maior de inflação. Mas convém recordar que, fundamentalmente, a Europa não está em declínio. É um continente produtivo e inovador. Só tem falhas na sua governação e nas suas instituições de controlo económico. Isso pode de facto ser corrigido.
Paul Krugman - Prémio Nobel e divulgador
Paul Krugman é economista, norte-americano e nasceu em 1953. Pertence, desde 1999, aos editorialistas de ponta do New York Times. Em 2008, recebeu o Prémio Nobel da Economia pelas suas obras sobre globalização. Professor de Economia e de Relações Internacionais na Universidade de Princeton, é autor de uma vintena de livros sobre comércio e finança internacional. Colabora também com a Foreign Affairs, Harvard Business Review e Scientific American.
Em 1990, Paul Krugman obteve o reconhecimento internacional pelos seus ensaios para o grande público que fazem dele um dos economistas mais influentes da sua época.

Sem comentários:

Enviar um comentário