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quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Só Barroso, Ashton, Van Rompuy é que não servem?

Passados 5 anos, a crise económica e financeira deixou uma profunda marca na União, aumentando a desconfiança entre os seus Estados-membros, mas também a certeza de um destino comum. É chegado o momento de iniciar uma nova liderança política e executar medidas concretas, afirma “El País”.
O furação financeiro deixou marcas na alma europeia. Uma feia cicatriz percorre o continente de Norte a Sul. Abundam os velhos e os novos estereótipos: as mentiras gregas, a delirante exuberância espanhola, a temeridade irlandesa, a liderança egoísta da Alemanha. Perante este diálogo de surdos entre credores e devedores, a descoberta é que todos os países do euro partilham o mesmo destino. Pelo caminho, esfumaram-se certezas e violaram-se tabus, ultrapassaram-se linhas vermelhas e reescreveram-se regras de ouro numa série de atropeladas decisões. Essa inundação de medidas permitiu evitar o pior, embora deixem um longo rasto de estagnação com consequências imprevisíveis. Assim se passaram 5 anos de crise: com a suspeita de que nunca houve um plano mestre para a combater, a próxima etapa é essa 2.ª refundação (depois do período constituinte dos anos de 1950 e da primeira transição, que começou com a queda do Muro, incluiu a criação do euro e culminou com a entrada do bloco Leste na UE).
As cimeiras dos últimos anos decretaram austeridade urbi et orbi: ninguém discute a receita, apesar de se admitirem erros de diagnóstico em alguns países e uma excessiva reação geral, atribuída à gravidade da crise da dívida em 2010. Bruxelas corrigiu o tiro, mas a dura realidade é que só a Alemanha recuperou o nível de PIB que tinha antes da crise. Por tudo isto, a Europa foi perdendo os europeus: a 6 meses das eleições europeias, Bruxelas está atenta perante o auge do euroceticismo. Atualmente, segundo dados do último Eurobarómetro, 60% dos europeus não confia na UE, contra 31% antes da crise.
Nebulosa Bruxelas
A União foi e é uma espécie de expedição no horizonte: nunca houve mapa para decifrar os labirintos dessa nebulosa chamada Bruxelas. Nessa eterna luta entre o possível e o desejável, a UE precisa de encontrar um caminho intermédio entre aqueles que acreditam que as turbulências obrigam a dar um salto federal (para os improváveis Estados Unidos da Europa) e aqueles que apostam na versão euro do Apocalypse Now de Coppola com música de Wagner.
“Provavelmente, não haverá nem salto federal nem desmembramento. E que se ative essa 2.ª transição, com as inevitáveis deceções, como a promessa desse hipotético regresso à Grande Política”, diz Luuk Van Middelaar, uma das vozes mais interessantes de Bruxelas. Van Middelaar — autor do inestimável livro Passagem para a Europa e dos discursos de Van Rompuy — define a União como “um estado de transição permanente”. “O que é urgente”, dispara, “é voltar a conquistar as pessoas: isso não é possível sem um plano geral e sem liderança”.
O analista Moisés Naím sustenta essa perspetiva. “Hoje, nem as instituições europeias nem os líderes políticos nacionais têm poder suficiente. […] A Europa foi forte sempre que teve lideranças fortes. A atual equipa de Bruxelas — Barroso, Ashton, Van Rompuy — já não serve.”
O mundo não está em crise, mas a Europa está. Não é económica, ou não é só económica: é uma crise política, institucional e, sobretudo, de governação. E, ao mesmo tempo, é uma espécie de vingança da história, da demografia e da geografia: inscreve-se no seio de um movimento telúrico que está a mudar o centro do mundo para o Pacífico.
O futuro é difuso
Para lá da política, ou precisamente porque prima pela sua ausência, o futuro é difuso. André Sapir, de Bruges, afirma que o cenário central da zona euro, nos próximos 5 anos, continuará a consistir em sair da crise: “O que é preocupante é que continua sem haver consenso sobre a natureza e as causas da crise: isso explica que só podemos aspirar a sair da situação”.
Daren Acemoglu, autor de um dos livros fundamentais dos últimos tempos – Porque Falham as Nações (Ed. Temas & Debates, 2013 —, faz parte do grupo dos que afirmam que a 2.ª refundação da União “está aí”. Numa entrevista a este mesmo jornal, Acemoglu via 2 revoluções entre as últimas novidades europeias: a união bancária e os exames prévios aos orçamentos nacionais. A união bancária, em especial, pode ser uma mudança de pele, uma mudança na natureza da Europa. O clube do euro esteve sempre obcecado com os vícios públicos e com a inflação, uma espécie de herança da história alemã. O euro dotou-se de mecanismos de controlo do setor público (de credibilidade duvidosa, como já se tinha visto em Maastricht); supunha-se que os mercados se autorregulavam e que os vícios privados se corrigiam sozinhos: não era preciso dar-lhes atenção. Mas a crise mudou essa abordagem: “Se, no final, a união bancária não lhe diminuir a ambição, a Europa experimentará uma mudança substancial que pode ajudá-la a corrigir os seus desequilíbrios”, vaticina Acemoglu.
Finalmente, se nada correr mal, a Europa está a caminho de acordar. Para isso, o papel do BCE, como supervisor bancário, é essencial. “Há que continuar a recuperar as finanças públicas e a fazer reformas, mas com a união bancária a Europa também dá atenção a outras fontes de vulnerabilidade. Para o BCE, isso vai ser um mergulho na realidade, uma queda do Olimpo”, conclui uma fonte comunitária.

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