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domingo, 5 de fevereiro de 2012

A crise é mesmo uma oportunidade de abrir janelas…

Foto de Yanneck
Há uma coisa pior que ter bancos com lucros excessivos: é ter bancos com prejuízos excessivos. Ei-los agora. Mas estes prejuízos, tendo sido contabilizados em 2011, não são de 2011, são de muitos anos. A boa notícia é que agora é sempre a subir: em 2012 os bancos voltam aos lucros. Assim seja.
Nestes tempos de enormes ironias, é preciso acrescentar esta: estes prejuízos não são maus, são bons. Senhores depositantes, deixem-se estar depositados, este mal vem por bem. Claro que os accionistas ficam fulos por não receberem dividendos, o Estado perde impostos, a gestão está a ser posta em causa e as acções desvalorizam. Mas os prejuízos são bons porque os problemas já existiam, agora são incinerados. Segue-se a cobertura do desfalque com capital, como tinha de ser. Mas o passado está limpo. Só falta resolver o futuro.
O discurso dos banqueiros está articulado: 1) são resultados não recorrentes, só acontecem este ano; 2) resultam de provisões, da 3) transferência do fundo de pensões e da 4) contabilização das dívidas soberanas. Tudo isto é verdade. Mas, sendo verdade, não são anomalias fictícias a que "somos totalmente alheios". Eram problemas já alojados naqueles balanços.
O caso mais inesperado é o da dívida grega, que caminha para um perdão ("hair cut") monumental, pelos 70%. É uma perda para quem emprestou. No caso português, foi sobretudo o BPI e o BCP. Sendo inesperado, não foi azar. Foi uma estratégia de investimento reforçada numa altura em que a Grécia já estava a pagar taxas de juro muito elevadas, precisamente pela percepção de risco elevado. Alguns bancos, como o BES, valorizaram o risco e despacharam o que tinham; outros, como o BPI, deslumbraram-se com o juro e compraram.
As outras duas razões são diferentes. Se a transferência do fundo de pensões para o Estado deixou um prejuízo nos bancos foi porque os bancos tinham os seus fundos mal capitalizados. Isso aconteceu seguindo as regras do Banco de Portugal, que foi menos prudente do que agora o Ministério das Finanças. Os bancos assumiram já a perda que provavelmente teriam de dispersar em vários anos.
Finalmente, as provisões. São milhares de milhões de euros em provisões nos últimos anos. Mais uma vez, não é azar, é para cobrir perdas com investimentos ruinosos em acções e políticas de risco de crédito erradas.
É por isso que estas perdas de 2011 são o reverso de anos e anos de excesso de risco, que plastificaram lustrosos lucros. Esses lucros foram excessivos, pois assentaram em créditos que afinal não seriam pagos. Agora chegam os prejuízos. Completando o efeito boomerang, podemos mesmo perguntar se os bancos, nos dividendos passados, andaram não a distribuir lucros mas sim capital.
Agora chegam os aumentos de capital. O BCP está angolano, vai recorrer a Cocos do Estado (haveremos de falar nisso) e procura companheiro asiático ou brasileiro; o BPI também terá dinheiro do Estado e conta com o seu accionista espanhol; o BES, que agora se tornou o melhor amigo dos chineses (assessorou a Three Gorges na EDP e a State Grid na REN), terá aí a livrança para não recorrer ao Estado; e a Caixa conta connosco, como sempre.
E assim os bancos voltarão aos lucros em 2012. (Com asterisco: se houver reestruturação da dívida portuguesa, a história corre mal, mas aí corre mal para todos). Pela frente fica agora apenas uma cordilheira: o mal parado potencial do crédito imobiliário, turístico, das construtoras, do crédito à habitação e o financiamento das empresas do Estado. A prosperidade vem lá longe mas o equilíbrio começa aqui, neste prejuízo. Que venha agora o que faltou, o juízo.
Pedro Santos Guerreiro – Diretor do Jornal de Negócios

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