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sábado, 16 de julho de 2011

Promiscuidade entre o Capital e a Política

O dinheiro fala e de que maneira e além do mais vê-se através dos sinais exteriores de riqueza, que são a sua linguagem própria e todos temos um caso na nossa rua.
A impunidade e a complacência perante a manipulação e a corrupção constata-se, por exemplo nos “casos” dos maiores bancos de Wall Street, em que nem um único líder financeiro foi preso, tal como por cá no caso BPN e em tantos outros que não têm fim…
Hoje, como ontem, as grandes empresas são multinacionais, enquanto os governos continuam a ser nacionais, sem que haja regulamentação concertada para colocar o poder político em 1º lugar, fruto do poderio dessas empresas a nível financeiro que os governos (com o apoio de políticos avençados) têm medo de as enfrentar, porque perderiam os seus quinhões.
No entanto, enquanto estas empresas continuarem a ser os principais financiadores de campanhas políticas e os políticos continuarem a ser também proprietários, ou beneficiários silenciosos dessas empresas, a corrupção não só alastrará, como se institucionalizará. A exclusividade da atividade política, resolveria(?) no papel esse problema e faria ressaltar com mais facilidade os casos de corrupção. Marinho Pinto tem razão…
Mas, se todas as medidas imagináveis não avançarem a nível de todos os governos, para impedirem a evasão fiscal, os subornos, as comissões ilegais e outras transacções ilegais que fluem através de contas nos paraísos fiscais como as Ilhas Caimão e os secretos bancos suíços, só fica o lamento, a hipocrisia e o descaramento…
Quem diz, mais ou menos isto é Jeffrey D. Sachs no artigo abaixo:
O mundo está a afogar-se numa fraude corporativa e os problemas são, provavelmente, maiores nos países ricos - os que supostamente têm uma "boa governação".
Os países mais pobres, possivelmente, aceitam mais subornos e cometem mais ofensas, mas são os países ricos que acolhem as empresas globais que cometem os maiores delitos. O dinheiro fala e está a corromper a política e os mercados em todo o mundo.
Quase todos os dias surge uma nova notícia de prevaricações. Durante a última década, todas as empresas de Wall Street pagaram multas significativas por contabilidade falsa, uso de informação privilegiada, fraude de valores, esquemas de Ponzi ou apropriação indevida por parte dos presidentes executivos. Actualmente, está a ser julgado no tribunal de Nova Iorque um enorme caso de uso de informação privilegiada que implicou figuras de destaque da indústria financeira. Este caso segue-se a uma série de multas pagas pelos maiores bancos de investimento dos Estados Unidos para resolver diversos casos de violação de valores.
A prestação de contas continua, no entanto, a ser escassa. Dois anos após a maior crise financeira da história, provocada por comportamentos sem escrúpulos por parte dos maiores bancos de Wall Street, nem um único líder financeiro foi preso. Quando as empresas são multadas por prevaricação, são os seus accionistas e não os CEO ou gestores que pagam o preço. As multas representam sempre uma percentagem muito pequena dos ganhos ilegais. Assim, para Wall Street, as práticas corruptas têm uma sólida base de retorno. Mesmo hoje, o lobby bancário trata com arrogância os reguladores e políticos.
A corrupção afecta, também, a política norte-americana. O actual governador da Florida, Rick Scott, foi presidente executivo de uma grande empresa de cuidados de saúde, conhecida por Columbia/HCA. A empresa foi acusada de enganar o governo dos Estados Unidos por sobrefacturar reembolsos. Foi considerada culpada de 14 delitos e pagou uma multa de 1,7 mil milhões de dólares.
A investigação do FBI forçou Scott a abandonar o seu cargo. Mas uma década após a empresa se ter declarado culpada, Scott regressou, desta vez como político republico, defensor do mercado livre.
Quando Barack Obama precisou de alguém para o ajudar com o resgate da indústria automóvel norte-americana, escolheu o operador de Wall Street, Steven Rattner, apesar de saber que este estava a ser investigado por oferecer subornos a funcionários do governo. Quando Rattner terminou o trabalho na Casa Branca, o caso foi resolvido com uma multa de alguns milhões de dólares.
Mas porque parar nos governadores ou nos conselheiros presidenciais? O antigo vice-presidente Dick Cheney foi para a Casa Branca após trabalhar como CEO na Halliburton. Durante esse período, a empresa subornou funcionários nigerianos para obter acesso aos poços de petróleo do país - um acesso que vale milhões e milhões de dólares. Quando o governo nigeriano acusou a Halliburton de suborno, a empresa resolveu o caso fora dos tribunais, pagando uma multa de 35 milhões de dólares. Claro que não houve qualquer tipo de consequência para Cheney. A notícia apareceu apenas nos meios de comunicação norte-americanos.
A impunidade está generalizada - de facto, a maioria dos crimes empresariais nem são conhecidos. Os poucos que são acabam, normalmente, com uma leve reprimenda, com a empresa - ou seja, os seus accionistas - a pagar uma multa modesta. Os verdadeiros culpados, que estão no topo destas empresas, raramente precisam de se preocupar. Mesmo quando as empresas pagam enormes multas, os seus CEO permanecem. Os accionistas estão tão dispersos e têm tão pouco poder, que têm pouco controlo sobre a gestão.
A explosão da corrupção - nos Estados Unidos, Europa, China, Índia, África, Brasil e em outros países - levanta uma série de difíceis questões sobre as suas causas e sobre a forma de a controlar, agora que ganhou proporções epidémicas.
A corrupção empresarial está fora de controlo por duas razões. Em primeiro lugar, as grandes empresas são, actualmente, multinacionais, enquanto os governos continuam a ser nacionais. As grandes empresas são tão poderosas a nível financeiro que os governos têm medo de as enfrentar.
Em segundo lugar, as empresas são os principais financiadores de campanhas políticas em países como os Estados Unidos, enquanto os políticos são, muitas vezes, também proprietários ou, pelo menos, os beneficiários silenciosos dos lucros das empresas. Cerca de metade dos congressistas norte-americanos são milionários, e muitos têm relações próximas com empresas mesmo antes de terem chegado ao Congresso.
Assim, os políticos ignoram o comportamento das empresas quando estas cruzam o limite. Mesmo que os governos tentem que lei seja cumprida, as empresas têm exércitos de advogados para as proteger. O resultado é uma cultura de impunidade, baseada em expectativas de que o crime empresarial compensa.
Dadas as estreitas relações entre a riqueza e o poder com a lei, limitar o crime corporativo será uma enorme luta. Felizmente, o fluxo rápido e generalizado da informação nos dias de hoje poderá agir como uma espécie de elemento dissuasor ou desinfectante. A corrupção floresce na obscuridade mas, hoje mais do que nunca, a informação surge através de email e blogues, Facebook, Twitter e outras redes sociais. 
Vamos precisar também de um novo tipo de políticos para lidar um novo tipo de campanha política, baseada em meios de comunicação online gratuitos. Quando os políticos se puderem emancipar das doações empresariais, irão recuperar a capacidade de controlar os abusos das empresas.
Além disso, vamos precisar de iluminar os cantos escuros das finanças internacionais, em especial os paraísos fiscais como as Ilhas Caimão e os secretos bancos suíços. A evasão fiscal, os subornos, as comissões ilegais e outras transacções ilegais fluem através destas contas. A riqueza, o poder e a ilegalidade permitidas por este sistema oculto são, actualmente, tão vastas que ameaçam a legitimidade da economia mundial, especialmente em momentos em que existe uma desigualdade de rendimentos sem precedentes e enormes défices orçamentais, devido à incapacidade política - e muitas vezes mesmo operacional - dos governos de impor impostos sobre a riqueza.
Assim, da próxima vez que ouvirmos falar de um escândalo de corrupção em África ou noutras zonas pobres, perguntem onde começou e quem está a corromper. Nem os Estados Unidos, nem outro qualquer país "avançado" devem apontar o dedo aos países mais pobres, já que muitas vezes são as empresas mundiais mais poderosas que criaram o problema.
Jeffrey D. Sachs é professor de Economia e director do Instituto da Terra na Universidade de Columbia University. Sachs é também conselheiro especial do secretário--geral das Nações Unidas para os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio.
Cartoon via mail

2 comentários:

  1. É nítido que estamos a atravessar um daqueles momentos charneira não sabendo muito bem o que encontraremos para além do túnel.
    Temo pelo futuro de nós todos.
    Beijinho, Miguel!

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  2. Anabela
    O Jeffrey D. Sachs é um economista conselheiro da ONU, que faz análises muito corretas e numa linguagem simples, denunciando os podres da economia e do sistema. Foi ele que "inventou" um imposto "Robin dos Bosques", de pequeníssimo valor, que acabava de imediato coma fome a pobreza e está nessa luta, à anos, como o Bono dos Y2. Mas nada...
    Eu temo pelo nosso futuro, mas mais pelos dos filhos e netos, mas antes disso, há de haver porrada, com prevê outro economista, Stiglitz, de quem postarei amanhã umas opiniões.
    Bfs

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