Há leituras que me fazem melhor do que outras. Foi assim com a entrevista da escritora Lídia Jorge ao Jornal de Negócios. O título - "Continuamos a não pronunciar em voz alta o que pensamos" - é a mais pura das verdades e é, assustadoramente, cada vez mais verdade. Este medo é uma verdade que me incomoda, é um dos piores defeitos que encontro no homem.
Sílvia de Oliveira
Acrescenta Lídia Jorge: "Há uma indolência que, possivelmente, é fruto do medo mas também de uma crença numa justiça poética que, por si mesma, se arranja. É um estádio infantil, de certa forma, aquele que nos leva a aceitar. E essa aceitação, no meu ver, é uma aceitação que promove a prepotência das elites (...). Há aqui uma espécie de diálogo perfeito entre a indolência popular e a prepotência da elite. Nesse balanço chegamos a este ponto de obediência".
Já não bastava o medo, acumulamos a submissão. E começa a fazer mossa, acrescento eu, a tal prepotência das elites, uma sobranceria intelectual dos líderes, dos que mandam, nem que seja na mais insignificante chafarica.
Poder-se-á dizer que a tentativa de impor um pensamento único é um dos mais antigos vícios da civilização, mas noto-lhe, nestes dias, uns tiques diferentes. As ideias são impostas com arrogância intelectual. Quem não concorda passa a ser, nos dias que correm, o maior inconsciente e irresponsável de todo o sempre.
São tão doidos os que defendem a reestruturação da dívida portuguesa, como os que apontam o dedo a Vítor Constâncio no caso BPN, como são absolutamente loucos os que criticam a prosaica decisão do chefe de cortar o café no escritório.
A crise, a necessidade, a urgência dividiram-nos, sem espaço para cinzentos. Criticar, dizer mal - atividade cada vez mais preciosa, atendendo à batelada de profissionais contratados para elogiar - continua a ser arriscado, mas o risco agora é também o de ser rotulado de extravagante. O que não é mais do que uma técnica - mais uma -, aparentemente sofisticada, de calar as pessoas. É que há uma enorme diferença entre ser-se revolucionário, destemido, diferente ou corajoso e passar a ser-se conhecido como o maior atrasado mental da história. Por isso, este silêncio pouco livre é cada vez menos de ouro.
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