No final de 2012, o Governo português iniciou um novo regime para a concessão e renovação de vistos 'gold', que permite aos cidadãos estrangeiros que pretendam investir no país, obter uma autorização de residência.
A atividade de investimentos deve recorrer por um período mínimo de cinco anos, prevendo-se opções como a transferência de capital num montante igual ou superior a 1.000.000 de euros, a criação de pelo menos 10 postos de trabalho ou compra de imóveis num valor mínimo de 500.000 euros.
Os vistos 'gold' atribuídos em Portugal facilitam a obtenção da nacionalidade portuguesa e permitem a livre circulação no espaço Schengen, afirmam académicos e sociólogos que consideram todo o processo “uma mercantilização da cidadania”.
“A
questão que se coloca relativamente aos vistos 'gold' é, fundamentalmente, ser
um processo de venda da cidadania”,
disse Carlos Nolasco, investigador do Centro de Estudos Sociais (CES) da
Universidade de Coimbra.
Na opinião do sociólogo, a concessão dos vistos dourados em Portugal visa “arrecadar dinheiro, no sentido de uma lógica de mercado, vender a cidadania para um espaço privilegiadíssimo, que é o espaço Schengen”, procurando “cativar pessoas endinheiradas”.
“O que me repugna um bocado é que algo tão básico, tão fundamental, como é o acesso aos direitos de cidadania, que se presume que seja feito em termos de total igualdade à partida, acaba por ter uma diferenciação sobre o rendimento (…), um recuo civilizacional muito grande”, afirmou o investigador Rui Pena Pires, do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia (CIES) do ISCTE/IUL.
De acordo com os 2 investigadores, os vistos dourados permitem um atalho para uma futura cidadania, na medida em que os requisitos solicitados para obter o visto de residência – 1.º passo para a cidadania – são menos exigentes em relação aos vistos normais concedidos aos estrangeiros.
Os requerentes dos vistos 'gold' devem ter uma permanência mínima no país de 7 dias no 1.º ano de residência e de 14 dias, seguidos ou alternados, nos subsequentes períodos de 2 anos, podendo pedir a nacionalidade ao fim de 6 anos, como exige a lei em vigor.
Para obter a nacionalidade, os estrangeiros com os vistos normais de residência devem morar efetivamente no país durante os mesmos 6 anos.
Além disso, os estrangeiros com vistos 'gold' podem também ter acesso aos espaço Schengen que, segundo Carlos Nolasco, “é um condomínio fechado” criado pelos Estados europeus para “controlar o acesso dos imigrantes, sobretudo do norte de África, do Sudeste Asiático e da América Latina”.
Vários países europeus possuem vistos 'gold', tendo diferentes exigências para a sua obtenção. Os países periféricos da Europa, atingidos pela crise financeira, começaram a utilizar estes vistos para a captação de investimentos estrangeiros, como Portugal, Espanha, Chipre, Bulgária e Malta, o que leva a uma flexibilização de critérios para a sua concessão.
Esta flexibilização na União Europeia tem suscitado alguma preocupação na Comissão Europeia.
Em Malta, que além dos vistos 'gold' tentou implementar a venda da sua cidadania por 650.000 euros, a Comissão Europeia interveio para impedir a venda da cidadania. “A comissária europeia de Justiça, Viviane Reding, criticou abertamente este processo, dizendo que a cidadania é um elemento fundamental da União Europeia, que não tem preço e não deve ser vendida”, referiu o investigador Carlos Nolasco.
Em 2013, foram concedidos em Portugal cerca de 470 vistos dourados e foram investidos ao redor de 300 milhões de euros, sobretudo no ramo imobiliário e por chineses.
Rui Pena Pires, Carlos Nolasco e Jorge Malheiros, investigador do Centro de Estudos Geográficos da Universidade de Lisboa, afirmam que os vistos 'gold' são discriminatórios e que acabam por criar imigrantes de 1.ª e 2.ª categoria, privilegiando quem tem maiores rendimentos. “Não me parece legítimo porque o princípio que funda a cidadania democrática moderna é o princípio da igualdade, não o da igualdade material, mas da igualdade no sentido em que, independentemente dos seus rendimentos, as pessoas têm os mesmos direitos”, afirmou Rui Pena Pires, questionando a moralidade do visto 'gold'.
Para Carlos Mendes Dias, professor da Academia Militar e membro do Centro Português de Geopolítica, os vistos dourados “não têm esta componente discriminatória” porque “a priori” tem uma componente de investimento, mas admite “algum desconforto” pelo facto de “permitir que o cidadão permaneça apenas 7 dias no 1.º ano e 14 nos subsequentes”.
Os investigadores concluíram que a concessão dos vistos dourados pode levar a lavagens de dinheiro e a entrada de grupos criminosos, mas existem controlos por parte dos Estados para tais situações, sendo prematuro fazer qualquer análise mais aprofundada no caso de Portugal, dado que o processo ainda está no início.
Porque já abordei o tema várias vezes, dispenso-me de mais comentários, mas fico satisfeito por ter razão, se a opinião de académicos e sociólogos é coincidente…
Ainda há quem pense com a força da razão, contra a razão da força…
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