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sábado, 24 de agosto de 2013

Uma Europa dos POVOS, não a Europa dos governos!

O projeto europeu não consegue diminuir o fosso que ainda existe entre os países da Europa Ocidental e os da Europa Central e Oriental. Por isso, é preciso que a União e os 28 façam um enorme esforço de comunicação sobre o que os une, defende um escritor romeno.
O recente relatório do eurodeputado Rui Tavares sobre a situação dos Direitos do Homem na Hungria, bem como a maneira como o documento foi recebido pelo governo húngaro, levanta novamente a questão da viabilidade do projeto europeu depois do desaparecimento da cortina de ferro. A Hungria, e as suas evoluções recentes, já não correspondem às expectativas de Bruxelas.
Pode dizer-se o mesmo da Roménia ou da Bulgária; da Eslováquia quanto ao tratamento que dá aos ciganos; da França no que concerne à mesma questão ou do Reino Unido pela maneira como aborda o direito ao trabalho de romenos e búlgaros… E poderíamos continuar.
Não se trata de recensear aqui as irregularidades e as imperfeições. Mas sim observar que aquilo que parecia ser a encarnação do sonho de um grande número de líderes europeus se transforma, periodicamente, em nevroses governamentais no seio dos países-membros. Tal como em Bruxelas.
Os textos dos tratados fundadores [da UE] são cada vez mais confrontados com realidades incompatíveis com a filosofia de uma Europa unida. Porque o processo de elaboração das leis à escala comunitária é demasiado lento ou demasiado generalista, contrariamente à realidade que engendra rapidamente novos contextos de (sobre)vivência. Garantir o respeito por esses vastos pacotes legislativos comunitários é stressante e revela-se dessincronizado do jogo político interno dos Estados-membros.
Esta inadequação sublinha igualmente a incapacidade de Bruxelas em transmitir os valores do grande projeto europeu: as frequentes sondagens realizadas nos diferentes países-membros revelam uma (demasiadamente) fraca perceção dos valores defendidos pela UE. As estratégias de comunicação do Parlamento e do Conselho Europeu também não são assim tão eficazes como seria de pensar. Os Estados que entraram para a UE entre 2004 e 2007 falam uma linguagem diferente da empregue pelos outros quando mencionam a democracia, o mercado, os Direitos do Homem ou a transparência; enquanto noções ainda marcadas pela imagem das “barricadas” atrás das quais o que resta de efetivos da barbárie comunista se defende dos ataques de um mundo ocidental imperfeito.
Alfabeto estrangeiro
O que parece ser, e que foi, para muitos a perfeição compacta das sociedades fechadas do Leste, é de repente substituído por um novo mundo inexplicável, um alfabeto estrangeiro que devia, e ainda deve, ser aprendido com o coração. O esforço era enorme, comparável ao que foi necessário, após a queda do Muro, para levar a RDA [Alemanha de Leste] para o “nível” da RFA [Alemanha Ocidental]. Após uma década e despesas colossais, os resultados não são nada encorajadores. Atualmente, sente-se por vezes a mesma coisa perante as “novas democracias” da Europa de Leste.
Mais ainda, Bruxelas parece não compreender que a razão de Estado funciona de maneira diferente nessas democracias; hoje, exige-se delas não apenas que ponham de pé e que tornem funcional um Estado que possa refletir-se no espelho de Bruxelas, mas também que se reconheçam nesse reflexo. O modelo da razão de Estado estudado por Michel Foucault para os séculos XVII e XVIII, era baseado na limitação dos “excessos do governo”, de que o instrumento operacional será, até ao fim do século XVIII, a economia política. Uma economia política que recentraria as filosofias dos Estados em torno da ideia de prosperidade, de Estado-providência: um termo desconhecido na Europa de Leste após 1945.
Essa grande lacuna, posta em prática com um controlo diabólico, resultou sob o socialismo-comunismo num tipo de governação que atrofiou consideravelmente os instintos dos membros dessas sociedades em matéria de afirmação individual, espírito de competição e responsabilidade dos seus próprios atos.
Diferenças entre antigos e novos membros
As políticas comunitárias têm, assim, de fazer face não apenas às célebres diferenças entre antigos e novos Estados-membros, mas também às consequências da procura exclusiva do lucro a curto prazo. Que são, atualmente, esmagadoras: o valor do trabalho, o investimento em formação, a regulamentação do mercado de trabalho em função das novas tendências económicas que aparecem no mundo, exigem maior rapidez de reação.
E quando a reação se produz, por fim, como por exemplo no caso da agricultura, das pescas ou das indústrias criativas, os esforços que visam traduzi-la em pacote legislativo comunitário engendram diferenças e reações sociais por toda a Europa.
A Europa continua a ser demasiadamente uma Europa dos governos, e não suficientemente uma Europa dos povos. Os valores europeus merecem ser redescobertos. A comunicação desses valores deveria ser o maior objetivo da UE. Deixada na mão dos governos e de instituições especializadas, a comunicação sofrerá sempre de falta de criatividade e a Europa só se afastará cada vez mais de nós.
Só uma visão criativa dos governos poderá recolocar nos eixos o processo de uma Europa unida sob o signo do desenvolvimento pessoal de cada cidadão dos países-membros. Conseguir coisas simples (um emprego, uma casa, um nível de vida aceitável) é o único caminho para as coisas mais complexas.
Quando o governo de um Estado tiver conseguido convencer tudo e todos de que não há lugar no mundo melhor do que este, só então, o objetivo terá sido corretamente cumprido para toda a gente.

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