Os números da economia divulgados esta quarta-feira pelo INE surpreenderam tudo e todos. O PIB cresceu 1,1% entre Abril e Junho, mais do dobro das melhores previsões dos analistas.
Portugal foi o que mais cresceu em toda a zona euro e em toda a União Europeia e o 2.º trimestre coloca um travão a uma série de quase 1.000 dias de recessão.
São boas notícias? A crise acabou? É preciso continuar com a austeridade?
Vamos perguntar ao Sr. Contente e ao Sr. Feliz?
O Sr. Contente, o socialista José Junqueiro, diz que os números do PIB são razão de um "contentamento descontente", já que o PIB apesar de ter crescido 1,1% em cadeia, não apaga o facto de a economia nacional ter contraído 2% face ao período homólogo. Logo, o Sr. Contente diz que é preciso travar a austeridade.
E o que diz o Senhor Feliz? Pedro Pinto, vice-presidente do grupo parlamentar do PSD, estava visivelmente feliz na conferência para reagir aos números do PIB. Diz que os dados confirmam que o caminho de política económica percorrida pelo Governo PSD/CDS-PP "é o correcto e está a dar os seus primeiros resultados".
Então Senhor Feliz, terminou a austeridade? Já não é preciso tirar 4,7 mil milhões de euros aos funcionários públicos e pensionistas? O Senhor Feliz é cauteloso: “Sabemos que é necessário continuar os esforços no sentido do saneamento das contas públicas”.
O Governo naturalmente não quer abrir a garrafa de champanhe, caso contrário fica sem moral para abrir a porta ao despedimento de funcionários públicos e pedir aos pensionistas da CGA que abdiquem de 10% da sua reforma no próximo ano.
E o que diz o Senhor Alegre? O porta-voz do CDS-PP, João Almeida, diz uma coisa bastante sensata: “O mérito do crescimento económico é das empresas e dos trabalhadores”. E puxa a brasa à sua sardinha: “Terão contribuído também as reformas estruturais e a diplomacia económica”. Por coincidência, as duas pastas da responsabilidade de Paulo Portas, no presente e no passado recente. E sobre o fim da austeridade? O CDS-PP, como sempre, não se compromete, nem com uma coisa, nem outra.
E o Senhor Mal Disposto, o senhor que manda nisto tudo, o que tem a dizer? O comissário europeu para os Assuntos Financeiros e Monetários, Olli Rehn, é taxativo: “Espero que não se crie a ideia prematura e auto-congratulatória de que a crise acabou”. Mais: “Os dados económicos são agora positivos, mas não há espaço para complacências”.
“Então diga lá como vai este país”?
Perante tantas contradições, o leitor perguntará, tal como na rábula do Senhor Contente e Senhor Feliz, “Então diga lá como vai este país?”.
E a resposta tem tanto de simples como de ambíguo. Terminou a crise? Terminou a recessão técnica, mas é altamente exagerado dizer que começou a retoma. Não subestimem a capacidade de a Europa continuar a dar tiros no próprio pé.
E a austeridade vai continuar? Vai. Pelo menos até à reeleição da chanceler Merkel estar garantida.
E a economia está realmente melhor? Há um sem número de indicadores que mostram que sim: a venda de automóveis, as receitas das portagens, o consumo de combustível e electricidade, a construção e o imobiliário, mais empresas a abrir do que a fechar. Ainda hoje o INE diz que o índice que mede o custo do trabalho aumentou pela primeira vez desde o início de 2010 e que as dormidas na hotelaria portuguesa aumentaram 8,6% em Junho.
É seguro que esta dinâmica vai continuar? Não. As exportações, actualmente o grande motor da economia, abrandaram em Junho e continuam a ser muito influenciadas pela entrada em funcionamento de uma nova unidade de refinação da Galp em Sines. E a produção industrial em Portugal registou, em Junho, a segunda maior queda na Europa, só ultrapassada pela Holanda.
E o desemprego vai cair? Não no curto prazo. Passados os efeitos da sazonalidade no turismo e nas apanhas na agricultura, o desemprego deverá voltar a crescer. E mesmo que a economia entre numa trajectória de crescimento, existe um desfasamento de 6 meses a um ano entre o crescimento do PIB e a capacidade de a economia voltar a gerar emprego.
Enquanto a retoma não chega, vamo-nos entretendo com as discussões entre o Senhor Contente e o Senhor Feliz.
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