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segunda-feira, 9 de abril de 2012

Mudam-se os tempos, muda-se a “confiança”?

Bancos, sociedades petrolíferas, meios de comunicação social, empresas de telecomunicações... aguçado pela crise, o apetite dos angolanos pelas empresas portuguesas parece insaciável. Por um lado, a falta de dinheiro, por outro, a sua abundância podem explicar esta tendência que está longe de abrandar. Mas não só.
Entram devagar, através da compra de pequenas participações no capital de uma empresa. Depois, esperam que a empresa ou algum outro acionista tenha necessidade de dinheiro, algo que não falta aos grandes investidores angolanos.
Aos poucos, vão reforçando as suas participações até conseguirem ascender a uma posição dominante, nomear administradores e assumir o poder.
A banca, símbolo inequívoco de poder e Angola tem posições significativas em várias instituições financeiras portuguesas, não é o único alvo do interesse africano. Outros setores são objeto da atenção de cada vez mais investidores, próximos do poder político angolano, concentrado no Presidente José Eduardo dos Santos, mas com estratégias próprias, menos concertadas do que possa parecer à primeira vista.
Há tomadas de posição na comunicação social, na energia e até no setor agroindustrial. Nos últimos anos, têm passado para mãos angolanas várias quintas, em quase todo o território nacional, desde o Douro até ao Algarve.
"O vinho e o azeite são produtos com uma grande procura e que atingem preços exorbitantes em Luanda. Por essa razão, alguns angolanos decidiram comprar quintas produtoras, em Portugal, e, deste modo, controlar todo o processo de um negócio garantido", diz um empresário de import-export.
O caso mais emblemático da estratégia angolana para Portugal é o BCP. Não foi muito difícil para a Sonangol comprar, em 2008, assim que estoirou a crise, 469 milhões de ações do banco, correspondentes a 9,99% do capital. No final do ano passado, a posição da petrolífera era de 12,44 por cento. Já na condição de maior acionista, tomou as rédeas da instituição bancária e substituiu a estrutura administrativa.
Uma aposta pessoal da filha do presidente
O apetite angolano não se detém com o BCP. Isabel dos Santos, filha do chefe de Estado, controla mediante a empresa Santoro Finance, 9,99% do BPI (Banco Português de Investimento), de que atualmente é a terceira acionista mais importante, logo a seguir à entidade espanhola La Caixa e aos brasileiros do grupo Itaú. Esta empresária possui ainda 25 % do Banco BIC Angola, o maior beneficiário da reprivatização do Banco Português de Negócios (BPN).
Apesar das dificuldades por que passa o setor bancário, que deve reforçar os seus capitais próprios e enfrenta problemas de liquidez, continua a ser o que mais atrai os investidores angolanos.
Porquê? “É algo que dá um certo status, sobretudo quando conseguem uma participação suficientemente importante para designar um representante nos órgãos diretivos”, explica uma fonte próxima dos meios bancários. Sem contar, como acrescenta um alto diplomata português, com o facto de que “o banco pode servir de trampolim para outros setores de atividades”.
Analisemos outro setor, o do petróleo. O investidor continua a ser o mesmo, a empresa Sonangol. O objetivo neste caso é claro: a empresa portuguesa Galp. E a estratégia de conquista começou com a adquisição de 45% da Amorim Energia, que por sua vez possui 33,4% da Galp. Como é evidente, o objetivo é ir mais longe. Quanto ao dinheiro não é problema, como o demonstram os numerosos investimentos noutros setores, entre os que se destacam as telecomunicações e os meios de comunicação.
No que respeita à ZON, é uma aposta pessoal de Isabel dos Santos. Mediante a sua holding Kento, comprou 10% desta empresa de televisão dirigida por Rodrigo Costa. E o mais provável é que não se detenha por aqui. Noutro âmbito de atividades, Newshold, controlada em 91,25% por Pineviews Overseas (com sede na cidade do Panamá), possui participações em vários grupos de imprensa portugueses.
Oficialmente, é dona de 15% da Cofina, proprietária de vários diários entre os que se encontra o Record, Correio da Manhã e o Jornal de Negócios. Também está presente no capital da Impresa, que por sua vez é dona das revistas Visão e Expresso e da cadeia de televisão SIC.
Políticos que atuam como representantes comerciais
Mas por que Angola se interessa tanto por Portugal há uma dezena de anos? O aspeto económico, já que estamos em recessão e eles em plena expansão, é só uma parte da resposta.
A outra parte é de caráter político. Os Acordos de Bicesse [que puseram fim à guerra civil angolana em 1991], assinados sob o patrocínio de Portugal, marcaram uma mudança nas relações entre os dois países. Além do mais, há um antes e um depois de Aníbal Cavaco Silva [então primeiro ministro português e hoje presidente da República].
Lisboa propôs-se a favorecer um ambiente de harmonia entre as instituições dos dois países, algo que continua a fazer, o que contribuiu a abrir definitivamente aos portugueses as portas da economia angolana pacificada.
E com a aproximação política chegaram os negócios. Em cada visita de Estado (José Eduardo dos Santos esteve em Lisboa em 2009), tanto de uma parte como da outra, não só se observa um séquito de ministros, secretários de Estado e deputados, também os acompanha sistematicamente um grupo de chefes de empresas, geralmente dirigidos pela Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP). No fundo, os políticos atuam como representantes comerciais. E quanto mais aumentam os vínculos bilaterais, melhor lhes corre.

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