Uma rede social de partilha de sintomas já vai nos 108.558 utilizadores. Se vai viajar, pode ver num mapa se o destino tem algum surto activo
Podia ser John F. Kennedy a falar-lhe: não pergunte o que as redes sociais podem fazer à sua saúde, mas antes o que pode fazer por ela neste microcosmo. Depois de dezenas de estudos alertarem para impactos negativos, como a deterioração das relações reais e o aumento dos divórcios (nos EUA o Facebook é citado numa em cada cinco separações), chegou uma constatação mais optimista sobre efeitos das redes sociais. Doentes e profissionais de saúde estão cada vez mais conscientes da importância da internet para prevenir e ultrapassar doenças.
Nos EUA, uma rede social só para doentes, médicos e investigadores reunia ontem mais de 107.000 utilizadores - incluindo 48 portugueses. A comunidade PatientsLikeMe está online desde 2005, criada por três investigadores do Instituto de Tecnologia de Massachusetts. O irmão de dois deles, Stephen Heywood, foi diagnosticado, aos 29 anos, com esclerose lateral amiotrófica e depressa a família percebeu que comunicar com outros doentes e conhecer as suas experiências seria a melhor forma de prever e preparar a evolução da doença. Um motivo mais do que razoável para criar uma rede social e uma ideia que, desde então, só teve eco nos milhares de pessoas a tentar perder peso, campeãs na criação de aplicações.
O primeiro utilizador português da PatientsLikeMe inscreveu-se em 2006. A única forma de aderir à rede é estar doente ou ser especialista. Depois é possível ver a evolução dos utilizadores que sofrem da mesma patologia, no caso deste utilizador nacional, uma doença neuromuscular rara chamada esclerose lateral primária. Além de discutir ideias, o perfil dos utilizadores permite ver como evoluíram desde os primeiros sintomas e como se sentem em termos sociais, psicológicos e físicos.
No site, os fundadores defendem um mundo onde a troca de informação entre doentes, médicos, farmacêuticas, investigadores e investidores é "livre e transparente". Admitem ainda que a informação publicada pelos doentes, sob anonimato, pode ser vendida a empresas para "melhorar produtos e o mercado das doenças". Além de gerirem uma plataforma de discussão em torno de mais de 500 doenças, querem ter um papel mais activo. A PatientsLikeMe assinou este mês uma parceria com a recrutadora de doentes para ensaios clínicos BBK Worldwide para reforçar a participação nacional nestas iniciativas científicas.
Mas não é só na partilha de sintomas e de informação sobre doenças que a internet poderá fazer a diferença. Na semana passada o "The New York Times" referia que as redes sociais estão a mudar a forma como os epidemiologistas descobrem e acompanham a evolução de surtos - algo que depois do surto de proporções inéditas de E. coli na Alemanha, e de todas as incertezas que gerou, será também bem-vindo. Aqui o mote é agregar informação disponível e um exemplo é o site HealthMap, criado em 2006 por iniciativa da Google e do Centro de Prevenção e Controlo de Doenças dos EUA.
O site tem uma aplicação para telemóvel, com o nome "Surtos perto de mim", e é aconselhado a quem vai viajar. Assim, se ontem estivesse a fazer as malas, seria informado de que há um surto de escarlatina em curso em Hong Kong. Mas não são só estes sistemas mais formais que despertam a atenção dos especialistas. Taha Kass-Hout, responsável pelo departamento de informação do Centro de Controlo e Prevenção de Doenças dos EUA, explicava, citado pelo "The New York Times", que à velocidade a que surtos podem alastrar a outros países, as redes sociais permitem despistar actualizações sobre sintomas atípicos, por exemplo, uma contaminação alimentar.
Do Reino Unido, numa carta publicada na semana passada na revista "Lancet", chega outra ideia - se calhar um pouco mais conservadora, face ao peso crescente das conversações em tempo real. Helen Atherton, do Imperial College London, está a estudar a melhor forma de reforçar a relação entre médicos de família e doentes através de email.
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