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sábado, 26 de julho de 2014

Uma crónica repetida ciclicamente… A próxima será uma cópia!

Homenagem a 1.700.000 de seres humanos sob cerco em Gaza, em que cada dia parece uma eternidade. E de nada serve dissertar sobre o silêncio do mundo, escreve este editorialista palestiniano.
Shaffaf | Hassan Khader
Cerca de 1.700.000 de seres humanos na banda de Gaza. Meninos e meninas, maridos e esposas, pais e mães, crianças, adolescentes, idosos, doentes, saudáveis, ricos e pobres: todos estão expostos a uma morte que atinge cegamente. Ninguém sabe quando vai morrer, mas as explosões que às vezes soam tão longe como perto, fazem da morte uma hipótese mais do que provável.
Não há heroísmo na guerra ou na morte. O pior não é a morte; é esperá-la. O verdadeiro heroísmo é o que 1.700.000 de seres humanos, durante 7 dias por semana, 24 horas por dia, 60 minutos por hora, 60 segundos por minuto, a fim de permanecer vivo, não enlouquecer e não cruzar a linha tênue que separa o humano do animal.
Em Gaza, não há abrigos onde se refugiar, nem sirenes para alertar as pessoas para a aproximação de um avião de combate, nem "Iron Dome" [nome do escudo antimísseis israelita], nem defesa antiaérea, nem médicos com equipamentos médicos de ponta, nem todos os tipos de outras maneiras de salvar vidas.
Nada de novo
Se uma casa desaba sobre os seus habitantes, o problema está resolvido. Mas se os habitantes sobrevivem, o problema permanece sem solução. Porque então passam por novos horrores: desprovidos, nus, condenados a encontrar um outro lugar para se abrigar.
1.700.000 de seres humanos sob um céu de chumbo, numa terra quente. Nada serve dissertar sobre a impotência árabe. Há muito tempo que já se constatou. De nada serve denunciar o silêncio do mundo e a falta de consciência internacional. Há muito tempo que isto acontece. De Nada serve falar dos crimes de guerra do Estado de Israel contra civis. Há muito tempo que se diz.
Todas essas palavras fazem parte de um universo familiar ao que o jornalista recorre quando é forçado a escrever sobre este assunto sobre o qual ele já desenvolveu todas as análises, interpretações e comentários imagináveis ​​e inimagináveis. Nada de novo. Por que a guerra atual seria diferente das anteriores e, sobretudo, das que virão daqui a um ano ou dois?
Viver no inferno
Tudo isso não tem nenhum interesse para 1.700.000 de seres humanos para que cada dia pareça uma eternidade, já que nada no mundo lhes pode garantir que esse não será o último, mas que não esperam muito da noite, que nada lhes garante ter a certeza se vão acordar no dia seguinte.
As pessoas não sabem a realidade dos horrores por que eles passam, depois de poderem respirar novamente. Só nestes momentos é que podem explicar o que significa viver no inferno. Só então é que eles entendem o heroísmo da vida quotidiana com tudo o que isso implica de banalidade, de rotina, as coisas insignificantes.
O heroísmo de se comportar normalmente, apesar da morte que ronda, entre uma mãe e os seus filhos. O heroísmo dos pais que não podem salvar os seus filhos da morte, procurando manter algo do papel paternal.
Esperando a próxima guerra
Todos nós, a diversos graus, caímos na armadilha de contos heroicos que colocam pessoas comuns ao serviço de uma causa e que querem a todo o preço tornarem-se figuras exemplares. Não entendemos que, fazendo isso, privámo-los do seu direito de serem reconhecidos pelo seu heroísmo comum.
Haverá ainda que vai morrer, ou que viverão à mercê do acaso. Depois, todo este desastre acabará por parar. Então os comentadores esquecerão o que aconteceu e os ecrãs de televisão serão ocupados por outras cenas, de outras mortes em outros lugares. Os correspondentes especiais, os fotógrafos e os jornalistas de agências noticiosas partirão para deixar no desemprego técnico os porta-vozes e outros especialistas em declarações à imprensa.
Então 1.700.000 de seres humanos tirarão a cabeça das nuvens de fumo, de poeira e de pó, depois de ter escapado à morte que atinge cegamente. Esperando a próxima guerra.
Tradução minha

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