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sábado, 11 de janeiro de 2014

Ganhando o céu rapinando a terra…

Há católicos tão bem, tão bem, tão bem, que tratam Deus por tio. De facto, chamá-Lo pai seria ficar automaticamente irmã, ou irmão, dessa gentinha pé-descalço e malcheirosa que vai à Cova da Iria de xaile e garrafão. Tratá-Lo por Senhor seria reconhecer-se de uma condição servil, que está muito bem para as criadas e para os chauffeurs, mas que não é compatível com quem é, há várias gerações, gente de algo.
Gonçalo Portocarrero de Almada 
Os sobrinhos de Deus gostam muito de Jesus, porque Ele é superfantástico: andou sobre o mar e fez montes de coisas giríssimas. Gostam tanto d’Ele que até Lhe perdoam o ter sido carpinteiro, pormenor de gosto duvidoso, que têm a caridade de omitir, sempre que, ao chá, falam d’Ele. Também têm muita devoção ao Espírito Santo: à família do banco, claro, pois conhecem-na toda da Quinta da Marinha e de um ror de sítios muito in, que tudo o que é gente frequenta.
Alguns foram a Fátima a pé e acharam o máximo. Levaram uns ténis de marca, roupa desportiva q. b. e um padre da moda. Rezaram imenso, tipo um terço, sei lá. O resto do tempo foi à conversa, sobretudo a cortar na casaca de uns quantos novos-ricos, um bocado beatos, que também se integraram na peregrinação (já agora, aqui para nós, mais por fervor aos sobrinhos de Deus do que a Nossa Senhora, mas note-se que isto não é ser má-língua, mas a pura verdade, à séria).
Têm imenso gosto e casas estupendas. Quando olham para um crucifixo em pau-santo, com imagem de marfim e incrustações de prata, são capazes de reconhecer o estilo, provavelmente indo-europeu, identificar a punção, pela certa de algum antigo joalheiro da Coroa, e a data, até porque, geralmente, é igualzinho a um lá de casa, ou muito parecido ao da capela da quinta. Só não vêem o Cristo, nem a coroa de espinhos, nem as chagas, que são coisas de menos importância.
Detestam essas modernices do abraço da paz ou da Igreja dos pobres, mas não é que tenham nada contra os pobres, apenas receio de doenças contagiosas.
Também não são muito fãs do senhor prior, nem do Papa Francisco, simplórios de mais para os seus gostos sofisticados. Mas derretem-se quando se cruzam, nalgum cocktail, exposição ou concerto na Gulbenkian, ou em São Carlos, com alguém que os fascine pelo seu glamour, pela sua cultura, pela sua inteligência ou poder porque, na realidade, o principal santo da sua devoção é o príncipe deste mundo.
Uma só coisa aflige os sobrinhos de Deus: que o céu, onde já têm lugar reservado, esteja mesmo, como se diz no sermão das bem-aventuranças, cheio de maltrapilhos. 
1) Qualquer relação com a realidade não é coincidência, mas um azar dos diabos.
Não só católicos, mas também cristãos, de cá ou de qualquer outra latitude, procuram ganhar o céu rapinando na terra, trilhando os caminhos espinhosos de servir os outros, fazendo política…
Metade dos atuais membros do Congresso dos Estados Unidos, democratas ou republicanos, são milionários, o que ocorre pela 1.ª vez na história da instituição, segundo uma organização que avalia a influência do dinheiro na política.
Pelo menos 268 dos 534 congressistas atualmente na Câmara dos Representantes e no Senado teve em 2012 um rendimento líquido igual ou superior a 1.000.000 de dólares (cerca de 732.000 euros), segundo as declarações anuais obrigatórias.
O rendimento líquido médio é de 1.008.767 dólares mas, em alguns casos, o rendimento eleva-se a centenas de milhões, segundo a análise divulgada pelo Center for Responsive Politics (CRP) no site 'OpenSecrets.org'.

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