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sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

Porque não basta amar só Deus, também os homens…

"Os pastores foram os primeiros que receberam o anúncio do nascimento de Jesus. Foram os primeiros porque estavam entre os últimos, os marginalizados", disse o Papa na sua breve homilia da Missa do Galo.
"Se amamos Deus e os irmãos, caminhamos na luz, mas se nosso coração se fecha, se prevalecem o orgulho, a mentira, a busca do interesse próprio, então as trevas rodeiam-nos, interiormente e por fora."
Há neste Papa algo que simultaneamente entusiasma e perturba.
O Papa Francisco foi, sem dúvida alguma, a figura mundial que emergiu no ano de 2013, que agora está quase no fim.
Eduardo Oliveira Silva
Neste dia de Natal é justo dizer que Francisco, o Papa argentino, que apareceu na varanda do Vaticano no dia 13 de Março, já marcou profundamente a comunidade católica, a hierarquia da Igreja e o mundo em geral, independentemente de credos e opções políticas e sociais.
Logo que surgiu, e passada a surpresa da nacionalidade de origem, desenvolveu-se em poucos minutos e à escala planetária uma vaga de empatia, logo que se percebeu a forma simples como se apresentou mal chegou ao Vaticano.
Nos actos e nas palavras que foi praticando e proferindo, Francisco foi surpreendendo tudo e todos, ao misturar-se com os crentes e ao falar de coisas simples e complexas de forma descodificada para que todos entendam. Por tudo isso, mas também pela firmeza com que tem actuado contra as fraquezas da Igreja, que tem ajudado a eliminar e a denunciar, Francisco mostrou já ser um Papa fracturante relativamente aos seus antecessores imediatos.
Apesar de a sua condição de chefe religioso lhe impor certas limitações, o novo Papa atingiu uma projecção e um grau de respeitabilidade que o tornam já o único ser humano à escala mundial que pode ombrear com Mandela.
Sem ter um passado comparável, tem, porém, palavras de afecto e actos de bondade que remetem, embora noutro plano, para o exemplo do grande líder sul-africano e mundial que era Mandela.
O Papa Francisco está preocupado com a missão da Igreja, a sua mensagem e a sua adaptação aos novos dias, procurando novas respostas para problemas dos quais a hierarquia católica vinha fugindo como o Diabo da cruz.
A sua mensagem não se limita a ser doutrinária ou pastoral, passando para o plano político e enfrentando problemas concretos da sociedade que eram tabu até há bem pouco tempo nas sociedades civis, quanto mais nas confissões religiosas.
Por isso, lembrou, por exemplo, que "uma fé autêntica comporta sempre um profundo desejo de mudar o mundo e transmitir valores", verberou o actual sistema económico, preso a um mercado divinizado, e falou da homossexualidade sem a estigmatizar.
Há neste Papa algo que entusiasma e simultaneamente perturba. Entusiasma o seu discurso, a sua abertura aos problemas concretos das pessoas e a sua simplicidade, bem distante do racionalista Bento XVI ou do empático mas conservador João Paulo II. Do mesmo modo que João Paulo II viveu o comunismo mais duro, Francisco conheceu a opressão do regime militar que subjugou a Argentina e as ditaduras de todo o tipo que afectaram a América Latina. São experiências das quais ambos tiraram ensinamentos profundos.
No entanto, Francisco pode ser referenciado em primeiro lugar como um seguidor de João XXIII, que foi reformista de vanguarda no seu tempo. O novo Papa remete para esse antecessor de boa memória, mas com o ritmo instantâneo dos dias de hoje.
Esse imediatismo envolve riscos, pois as interpretações e as modificações súbitas são susceptíveis de retirar à Igreja uma parte mística e doutrinária essencial, que não se pode desconstruir porque é o fundamento da sociedade judaico-cristã, cuja influência é absolutamente determinante em todos os comportamentos, até daqueles que não são crentes embora estejam ocidentalizados.

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