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terça-feira, 15 de outubro de 2013

À noite todos os europeus são (cada vez mais) pardos

A vida na União Europeia parece ser melhor que em muitas outras zonas do mundo. Contudo, esse bem-estar está a ser prejudicado pela perda de confiança dos cidadãos nas suas instituições. Essa tendência será um dos principais desafios do próximo escrutínio europeu.
É interessante olhar para fotografias da Europa, tiradas durante a noite por um satélite. As manchas brancas e luminosas indicam abertamente as zonas mais desenvolvidas – o Benelux, a região de Paris, a bacia do Ruhr e o vale do Reno. A planície do Pó brilha igualmente, tal como Roma e os seus arredores e o Golfo de Nápoles. O Reino Unido, Madrid, Barcelona e a costa portuguesa apresentam-se banhados de luz. Na Europa Central, a mancha mais luminosa corresponde à Silésia e Praga, Budapeste, Varsóvia e Gdansk também são distinguíveis. Atenas e Belgrado cintilam. Ao longo do Bósforo e da Istambul das fábulas, avista-se um cordão de luz. Na Roménia, Bucareste – a zona mais iluminada – está ligada a Ploieşti e, mais adiante, um traço pálido rasga as trevas dos Cárpatos, até Braşov. Mais a Leste, há alguns pontos brancos (Kiev, Minsk), até Moscovo que surge como uma ilha branca na imensidade russa.
O Parlamento Europeu decidiu utilizar essa fotografia no cartaz das eleições do próximo ano, com o slogan “Agir. Reagir. Realizar”. Uma imagem vale mais que mil palavras. Na foto, as centenas de milhares de pontos luminosos quase desenham os contornos da União – mais iluminada, no conjunto, do que o Leste da Europa e a África do Norte. Apesar dos seus problemas, a UE continua a ser um lugar melhor que muitos outros nesta Terra: é o que parecem sugerir os criadores do cartaz. No entanto, visto de perto, o brilho europeu começa a esbater-se. A crise do euro, a austeridade – e os problemas sociais que dela resultam – e as dúvidas sobre a viabilidade do modelo social europeu prejudicaram a credibilidade de todas as instituições europeias. Na verdade, minaram a credibilidade do próprio projeto europeu.
União Europeia mais coesa?
Segundo o último Eurobarómetro, de julho de 2013, o número de europeus que perderam a confiança na União ultrapassa os 60%. É o dobro em relação a 2007, antes da eclosão da crise. Nas eleições europeias de junho de 2009, a taxa de participação foi de pouco mais de 43%, muito inferior às taxas de participação de 60% – 70% nas eleições nacionais nas democracias avançadas. Uma percentagem inferior à de 2009 poria seriamente em causa a legitimidade do Parlamento Europeu, que viu os seus poderes reforçados, como previsto no Tratado de Lisboa.
Pela primeira vez, os cidadãos da UE têm a possibilidade de escolher indiretamente, [ao votar um Parlamento que elegerá, por sua vez] a pessoa que ocupará o cargo de presidente da Comissão Europeia nos 5 anos seguintes. O Conselho Europeu proporá um candidato para essa função, tendo em conta os resultados das eleições para o Parlamento Europeu. Essa proposta será depois submetida à aprovação do Parlamento. Deste modo, os candidatos à presidência da Comissão terão de procurar apoios no interior dos Estados-membros, à semelhança do que acontece com os dirigentes políticos locais, nas eleições nacionais. Esse facto deverá estimular o debate e colocar as questões europeias mais perto dos cidadãos.
Mas o Parlamento Europeu já esteve envolvido em decisões cruciais para os cidadãos da UE: a contenção das derrapagens orçamentais, a resposta à crise da dívida soberana, a rutura da relação entre esta última e a dívida pública. Para já não falar do papel fundamental que o Parlamento Europeu conquistou na aprovação do orçamento. O Parlamento deu igualmente a sua luz verde à nova Política Agrícola Comum e à futura governação do espaço Schengen.
Ao longo das últimas décadas, as instituições europeias reagiram a alguns desafios de natureza política, como os deslizes de certos Estados-membros em matéria de normas da democracia e do Estado de direito. À frente dos Estados que cometeram deslizes estão a Hungria e a Roménia, ainda que só a primeira tenha sido alvo de uma resolução do Parlamento Europeu. O grande desafio para o futuro mandato dependerá da direção que o Parlamento imprimir à UE do período pós-crise. Iremos ter uma União Europeia mais coesa, mais próxima do modelo dos Estados Unidos da Europa? Iremos ter uma União de Estados mais ou menos integrados? Ou iremos assistir à dissolução da União? O desafio é imenso e vivemos tempos conturbados.
Propaganda eloquente
Na realidade, o extremismo está a ganhar terreno – e não apenas através da chegada ao poder de formações “marginais”. Os próprios partidos tradicionais utilizam a linguagem dos extremistas, numa tentativa desesperada de travar a fuga de votos. Alguns alcançam esse objetivo, em certa medida, e outros não. Contudo, uma coisa é certa: as eleições nacionais são ganhas mais fazendo campanha contra a UE do que a favor dela.
Na Áustria, a “grande coligação” entre socialistas e democratas-cristãos obteve uma maioria frágil após as eleições. Mas o Partido da Liberdade (FPÖ), fundado por Jörg Haider, foi o único a sair reforçado (21,4% – mais 4% que nas eleições de 2008). E estamos a falar da Áustria, o país que se orgulha de ter a taxa de desemprego mais baixa da UE e de estar a atravessar a crise sem demasiados danos, graças precisamente… ao alargamento da UE!
O que dizer da Grécia? Neste país, o crime político saiu à rua e a detenção dos dirigentes do Alvorada Dourada apenas veio fazer subir a “cotação” dessa formação neofascista. Em França, o lançamento da campanha para as eleições municipais de março próximo provou que tanto o partido de centro-direita UMP como o Partido Socialista irão “pescar” em grande escala ao arsenal propagandístico da Frente Nacional.
As manchas luminosas visíveis no cartaz de propaganda das eleições europeias são eloquentes, mas a verdadeira questão reside em saber se as manchas sombrias das realidades políticas irão ou não obscurecer a mensagem dessas manchas brilhantes.

2 comentários:

  1. A disseminação da informação europeia pelos países encontra-se,pelo que vejo em Portugal e Espanha truncada por não sei que "força" não chegando aos cidadãos e pelas perguntas que vou fazendo pelos próprios autarcas. claro que a democracia se faz por todos e não por "eles" como vemos muito a ignorancia imbecil clamar.Mas esse facto deve agradar aos capangas nacionais porque lhes permite fazer de arautos do que já foi decidido antes por outros,mostrando que têm um olho aberto.Se for isso é uma tristeza que os eleitores dêm os votos a tal gente( ou será que os merecem?)

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    1. Nem sequer há informação. Alguém sabe ou os media noticiam as alterações para as eleições europeias? As alterações de regras e de poderes?
      É certo que essas "coisas", como tudo que nos impõem, não se traduz nos bolsos dos cidadãos, ou melhor, traduz-se em roubos indecentes.

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