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sexta-feira, 21 de junho de 2013

Troika não eleita impõe-se aos parlamentos nacionais

Grandes decisões que afetam o funcionamento dos Estados-membros da União Europeia são tomadas pelos principais ministros e chefes de governo, e impostas pela não eleita “troika” da Comissão Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional. Mas os parlamentos nacionais dispõem de uma série de medidas para tornar as poderosas instituições europeias mais responsáveis perante os deputados eleitos.
A União Europeia há muito que sofre de falta de legitimidade, mas a crise do euro agravou o problema. Não há bala de prata que, de repente, consiga tornar a UE respeitada, admirada ou até mesmo popular entre muitos europeus. As suas instituições estão geograficamente distantes, são difíceis de entender e centram-se muitas vezes em aspetos técnicos obscuros.
A menos que os dirigentes da UE consigam tornar-se mais credíveis e legítimos aos olhos dos eleitores, parte da união pode começar a desmoronar. Por exemplo, num dado momento, governos da zona euro podem querer reforçar a moeda, dando passos importantes para um sistema mais integrado de políticas económicas. Mas, nessa altura, um parlamento nacional, uma eleição geral ou um referendo podem bloquear esses passos e ameaçar assim o futuro do euro.
As instituições políticas ganham legitimidade nos campos “externo” e “interno”. O externo tem a ver com os benefícios que se vê as instituições distribuírem. O interno integra basicamente as eleições que sancionam os que exercem o poder. A crise do euro enfraqueceu ambos os tipos de legitimidade.
As vantagens no domínio externo são pouco entusiasmantes. O crescimento económico é negativo em grande parte da Europa, o desemprego na zona euro está acima dos 12% e o desemprego dos jovens em Espanha e na Grécia é superior a 50%. Para muitos cidadãos, não é evidente que tanto a UE como o euro estejam a representar um grande benefício.
Tornar o poder mais responsável
Já a legitimidade no domínio interno é pouco evidente. Dada a complexidade das tomadas de decisão, com o poder partilhado entre muitas instituições, os circuitos de prestação de contas na UE nunca foram muito claros. Mas a constatação da existência de um défice democrático é crescente nos países altamente endividados da zona euro. Uma “troika” não eleita – Comissão Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional – forçou os parlamentos nacionais a aceitar cortes orçamentais e reformas estruturais. Grandes decisões sobre programas comunitários de recuperação económica são tomadas por ministros das Finanças e chefes de governo da zona euro.
O que pode, então, ser feito para aumentar a legitimidade da UE? Os dirigentes europeus devem acelerar a criação de uma união bancária, para fortalecer o sistema financeiro; a Alemanha deve estimular a procura, contribuindo assim para o crescimento das economias do Sul da Europa; e as reformas estruturais devem restaurar a competitividade dessas economias. Com isso, o desemprego começaria a descer, os dirigentes europeus pareceriam mais competentes e o apoio aos eurocéticos e populistas diminuiria.
Mas os dirigentes da União Europeia precisam também de tornar o poder mais responsável. Para muitos deputados europeus, a solução é simples: quando as decisões ocorrem ao nível da UE, o Parlamento Europeu deve exercer um controlo democrático. E se há mais decisões para serem tomadas a nível da União, o PE deve ver aumentado o seu poder sobre elas.
Parlamentares nacionais mais envolvidos
No entanto, o Parlamento Europeu – apesar do bom trabalho apresentado em alguns aspetos legislativos – não consegue convencer muita gente de que representa os seus interesses. Muitos deputados europeus têm pouca ligação aos sistemas políticos nacionais. Grande parte do tempo, a prioridade do Parlamento parece ser aumentar os seus próprios poderes. Pede constantemente um orçamento maior e um papel mais importante para a UE; mas não é garantido que muitos eleitores pensem dessa forma. Isso pode explicar por que a participação eleitoral diminuiu sucessivamente (de 63%, em 1979, para 43%, em 2009), apesar de os poderes do Parlamento terem crescido de forma constante desde as primeiras eleições diretas.
Outra razão pela qual o Parlamento Europeu não pode ser o principal garante democrático das tomadas de decisão da zona euro é que a maior parte do dinheiro para o apoio aos países em situações de crise vem de parlamentos nacionais e não do orçamento da União. Na verdade, as decisões sobre os modelos de recuperação económica e as condições que são aplicadas são tomadas a nível da UE, dos chefes de governo ou dos ministros das Finanças. Mas essas decisões têm de ser postas em prática pelos parlamentos nacionais, os quais, portanto, desempenham um papel crucial, tanto nos países credores como nos beneficiários: o Bundestag teve de aprovar a disponibilização de dinheiro para apoio a Chipre, enquanto o parlamento de Chipre teve que votar o encerramento dos bancos da ilha.
São boas razões para aumentar o envolvimento dos parlamentares nacionais na governação da zona euro. Nos últimos anos, várias estruturas “interparlamentares” começaram a reunir membros do Parlamento Europeu e deputados nacionais. E o recente tratado de estabilidade fiscal prevê uma “conferência” desses deputados – europeus e nacionais – para discutirem a política económica. No entanto, esses encontros, embora úteis, são meramente consultivos e não dão aos eleitos nacionais uma participação suficiente na UE.
“Cartão amarelo” e “cartão vermelho”
Os parlamentares nacionais podiam tornar a União Europeia mais responsável de 2 maneiras.
Em primeiro lugar, as relações entre os parlamentos nacionais deviam ser reforçadas. O Tratado de Lisboa criou o procedimento do “cartão amarelo”, em que, se 1/3 ou mais dos parlamentos nacionais considerarem que uma proposta da comissão viola a regra da subsidiariedade – a noção de que as decisões devem ser tomadas no nível mais baixo compatível com a eficiência –, podem exigir a sua retirada. A comissão terá de o fazer ou justificar porque pretende levá-la por diante. Este procedimento, até agora usado apenas uma vez, pode passar a “cartão vermelho”, permitindo que os parlamentos nacionais forcem a Comissão a retirar a proposta. O facto de William Hague, ministro dos Negócios Estrangeiros britânico, ter alvitrado essa ideia – bem como Douglas Alexander, o seu homólogo no Governo sombra dos Trabalhistas –, não deve impedir de ser equacionada. Tal sistema pode permitir aos parlamentos nacionais juntarem-se para proporem a retirada de uma lei exagerada, de iniciativa da Comissão.
Em segundo lugar, deve ser criado um fórum dos parlamentos nacionais em Bruxelas. Não para duplicar o trabalho legislativo do Parlamento Europeu, mas para levantar questões e escrever relatórios sobre aspetos da governação da União Europeia e da zona euro que envolvem decisões por unanimidade. Esse fórum poderia controlar o Conselho Europeu e pôr em causa decisões de política externa e de defesa, de policiamento e de combate ao terrorismo. Em matérias específicas da zona euro, o novo órgão poderia promover encontros em formato reduzido, sem deputados dos países de fora do euro, e votar os pacotes de apoio financeiro aos países endividados. Também poderia interpelar e mesmo nomear o presidente do grupo do euro. A longo prazo, os deputados nacionais vão ter de se envolver mais na UE, para darem às decisões uma legitimidade de que os parlamentares europeus por vezes carecem.

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