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sábado, 25 de agosto de 2012

Disciplina orçamental: trabalhar mais e ganhar menos?

Corolário indispensável da união monetária e fiscal, a união política evocada pelos dirigentes europeus e pela Constituição que os acompanha não será legítima, a menos que seja adotada de forma democrática. Para isso, deve passar por uma consulta pan-europeia, estima um colunista flamengo.
A Europa enfrenta 3 problemas gigantescos que se resumem à liquidez, solvabilidade e legitimidade. O problema de liquidez explica-se pelo facto de a Grécia, a Espanha, a Itália, Portugal e a Irlanda estarem cada vez mais à deriva. Devemos garantir que estes Estados são capazes de cumprir as suas obrigações financeiras.
É esta a mensagem que Mario Draghi, presidente do Banco Central Europeu (BCE), se esforça para passar durante a sua conferência de imprensa no início de agosto. Deixou claro que o BCE tem, de facto, o poder necessário e que o utilizará. Reunir centenas de milhares de euros adicionais para evitar temporariamente que certos países vão à falência nunca esteve na base do problema.
No entanto, os países problemáticos têm uma dívida de tal forma elevada que ninguém está disposto a emprestar fundos sem impor condições insustentáveis. Esta perda de solvabilidade constitui o segundo problema. O Eurosistema deverá cobrir cerca de 2.500 mil milhões de euros de dívidas adicionais. Enquanto não conseguirmos encontrar uma solução para este problema, o nosso setor financeiro está virtualmente falido. Os bancos alemães têm cerca de 500 mil milhões de euros de dívidas no sul da Europa! Os franceses encontram-se ainda numa pior posição. E as dívidas destes bancos proveem em parte das dívidas dos aforradores destes bancos.
Regresso da confiança
De qualquer forma, a crise da dívida continuará a exercer uma pressão muito forte sobre as populações europeias. Por enquanto, esta pressão visará equilibrar os orçamentos, na medida em que não vale a pena tentar reduzir uma dívida quando tudo o que contribui para a sua acumulação persiste. Para não referir o facto de que é necessário eliminar progressivamente a dívida existente.
O crescimento económico poderia obviamente ajudar a melhorar a situação, e criar uma ligeira inflação, mas exige uma certa confiança. A confiança no futuro, um sentimento que, de forma geral, todos nós tínhamos desde a II Guerra Mundial. Para restabelecer esta confiança e para incentivar as populações a trabalhar mais e ganhar menos, os nossos políticos precisam de agir com legitimidade. Estes devem dispor de um mandato democrático, que possamos renovar a cada 5 anos.
Devem receber este mandato de toda a zona euro. Portanto, a União Europeia, ou pelo menos a zona euro, deve tornar-se uma união política. Esta união teria o poder de decisão no que diz respeito a todos os orçamentos de todas as administrações públicas subjacentes. Neste contexto rigoroso, os países e as regiões continuariam a ter a liberdade de cobrar impostos ou aumentar as prestações sociais. Estaríamos perante uma verdadeira reforma dos poderes políticos!
"Burocracia pós-democrática”
Na Alemanha, a Constituição proíbe expressamente a transferência dessas competências. No entanto, houve recentemente diversas personalidades políticas alemãs que se mostraram a favor de um referendo neste sentido, ainda que sem grande entusiasmo. Seguem desta forma o exemplo do filósofo octogenário Jürgen Habermas, cuja obra La Constituition de l’Europe (Gallimard) está agora disponível nas livrarias francesas.
Segundo a interpretação de Habermas, a constituição simboliza tanto a construção como o texto fundamental, o que abrange ambos os termos Konstituierung e Verfassung. Jürgen Habermas defende que devemos evitar que este projeto europeu repleto de esperança se transforme no oposto, nomeadamente numa “burocracia pós-democrática” vista pelos povos europeus como opressora e hostil.
A Europa deve voltar a ser um projeto positivo. A Europa é, aos olhos de Jürgen Habermas, o elemento indispensável de um mundo que podemos melhorar, enquanto cidadãos regidos pela ética. Se não salvarmos a Europa, o que restará de outros sonhos cosmopolíticos como a universalidade dos direitos humanos?
Na Alemanha, muito provavelmente haverá um referendo. Segundo Der Spiegel, poderá assumir 3 formas: uma votação sobre a modificação da constituição alemã, uma votação sobre as últimas decisões europeias (o pacto orçamental e o Mecanismo Europeu de Estabilidade – MEE) ou um referendo em toda a Europa sobre a possibilidade de se fazerem profundas modificações ao tratado.
Por outras palavras, um referendo sobre uma nova construção democrática do nosso Continente. Quem está disposto a lutar por isto? Comecemos por uma petição.
Alemanha - Manifesto por uma União mais democrática
A um ano das legislativas alemãs, 3 intelectuais pegam na pena para alimentarem o debate entre os sociais-democratas, a pedido do líder, Sigmar Gabriel. Um artigo de opinião publicado no Frankfurter Allgemeine Zeitung, intitulado “Oposição à democracia de fachada”, os filósofos Jürgen Habermas e Julia Nida-Rümelin e o economista Peter Bofinger defendem a convocação de uma Convenção Constituinte na Alemanha e a realização de um referendo sobre a Europa nos países da zona euro. Os autores, cujo texto desencadeou um aceso debate na Alemanha, pedem aos Estados que cedam mais soberania às instituições europeias para que estas tenham, finalmente, a legitimidade necessária para imporem a disciplina orçamental que garantirá um sistema financeiro estável.
Este movimento em direção a uma maior integração não se justifica apenas pela atual crise da zona euro. Justifica-se, igualmente, pela necessidade do político de se permitir a retomar as rédeas do fluxo que constitui o universo paralelo e fantasmagórico que os bancos de investimento e os fundos especulativos criaram ao lado da economia real que, ela sim, produz bens e serviços.
O objetivo é o seguinte: reforçar uma democracia dos cidadãos num Estado Providência e deixar a via de uma “democracia de fachada que se conforma aos mercados”. De facto, afirmam,
O sentimento, largamente difundido, de uma justiça ultrajada deve-se ao facto de, aos olhos dos cidadãos, os mecanismos de marcado anónimos exercerem agora uma influência política direta. A este sentimento junta-se a raiva, contida ou não, nascida da sua própria impotência. A isto se deve opor uma reafirmação do político.
Porque, num mundo globalizado, o regresso aos Estados-Nação não é uma opção, concluem os autores:
Renunciar à união da Europa seria retirarmo-nos da história do mundo.

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