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sábado, 17 de março de 2012

Se não for verdade, também não deve ser mentira…

Até podia ser o porteiro, ou a senhora da limpeza a dizer o que este executivo disse, que não deixaria de ser notícia, pela simples razão de que os mais altos cargos a nível mundial, quer em governos, quer em instituições financeiras, estarem ocupados por ex-executivos deste banco e mais recentemente como primeiro-ministros não eleitos, como na Grécia e Itália, passando pelos presidentes do BCE e do Banco Mundial.
E fica o registo…
Greg Smith fez barulho no mundo ao expor o relacionamento do banco com clientes em um texto enviado ao New York Times.
A fama de um grande banco nunca foi - e dificilmente será um dia – tão bonita quanto querem os seus técnicos de marketing. Apesar disso, grandes e centenárias instituições financeiras fascinam muitos pelo poder que possuem. São elas que aconselham os investimentos dos grandes bilionários e conseguem recursos para os empreendedores. E era todo esse amor e crença que o ex-diretor do Goldman Sachs, Greg Smith, dizia ter.
Agora, porém, ele deu mais um trabalho para quem cuida da imagem de um dos maiores bancos do mundo, já bastante esfolada por vários escândalos durante a crise financeira internacional. Smith pediu a demissão do seu cargo de líder da unidade de derivativos para a Europa, Médio Oriente e África e enviou uma carta ao The New York Times para relatar toda a sua decepção com as práticas do banco, sobretudo na hora de tratar os interesses dos seus clientes.
O texto, que acusa o Goldman Sachs de passar por cima dos clientes para garantir em primeiro lugar o seu próprio lucro, espalhou-se pela internet e já provoca reações de todos os tipos. Há quem ironize a “boa alma” que passou 12 anos num dos maiores bancos do mundo sem perceber a cultura predominante,  até os que lhe dão os parabéns pela coragem de elucidar a postura do Goldman em relação aos clientes.
Confira abaixo a íntegra do texto:
Por que estou a deixar o Goldman Sachs
"Hoje é o meu último dia no Goldman Sachs. Depois de quase 12 anos na empresa – primeiro com um estágio de verão enquanto estudava em Stanford, depois em Nova York durante 10 anos, e agora em Londres – acredito que trabalhei o bastante para entender a trajetória da sua cultura, pessoas e identidade. E acredito, honestamente, que o ambiente está tão tóxico e destrutivo como nunca vi.
Para colocar as coisas em termos simples, os interesses dos clientes continuam deixados de lado de uma maneira que a empresa continue a operar e pensar em ganhar dinheiro. O Goldman Sachs é um dos maiores e mais importantes bancos de investimentos do mundo e é muito essencial às finanças globais para continuar a trabalhar dessa forma. A companhia desviou-se tanto do ponto em que eu entrei, logo após sair da faculdade, que não posso mais, em sã consciência, dizer que me identifico com o que ela representa.
Isto pode parecer surpreendente para os céticos, mas a cultura sempre foi parte vital do sucesso do Goldman Sachs. Ela girava em torno do trabalho em equipa, integridade, espírito de humildade, e em sempre fazer o certo para os nossos clientes. A cultura era o tempero secreto que fazia este lugar ótimo e nos permitiu ganhar a confiança dos clientes ao longo de 143 anos. Não era apenas para fazer dinheiro; isso sozinho não sustentaria uma empresa por tanto tempo. Tinha alguma coisa a ver com orgulho e crença na companhia. Estou triste em dizer que olho à minha volta hoje e não vejo traço algum da cultura que me fez amar trabalhar aqui durante tantos anos. Não tenho mais o orgulho, ou a confiança.
Mas não foi sempre assim. Durante mais de uma década recrutei e fui o mentor de candidatos ao longo do nosso esgotante processo de contratação. Fui selecionado entre 10 pessoas (de uma empresa com mais de 30.000 funcionários) para participar de um vídeo de recrutamento exibido em todos os campus de Faculdade que visitei no mundo. Em 2006 geri um programa de verão interno sobre vendas e negociações em Nova York para 80 universitários que passaram nos testes entre os milhares de inscritos.
Eu sabia que era a hora de sair quando percebi que não poderia mais olhar nos olhos dos estudantes e dizer-lhes o quão formidável era trabalhar lá.
Quando os livros de história forem escritos sobre o Goldman Sachs, eles deveriam refletir que o CEO atual, Lloyd C. Blankflein, e o presidente, Gary D. Cohn, perderam a cultura da empresa que lideram. Eu realmente acredito que a queda na fibra moral da empresa representa a única ameaça mais séria para a sobrevivência no longo prazo.
Ao longo da minha carreira tive o privilégio de aconselhar os 2 maiores hedge funds do planeta, 5 dos maiores gestores de fundos dos Estados Unidos, e 3 dos mais proeminentes fundos soberanos do Médio Oriente e Ásia. Os meus clientes têm uma base total de ativos superior a um trilhão de dólares. Sempre tive bastante orgulho em orientar os meus clientes a fazer o que acreditava ser o correto, mesmo que isso significasse menos dinheiro para o banco. Essa visão está a ficar cada vez menos popular no Goldman Sachs. É outro sinal de que era a hora de sair.
Como chegamos aqui? A empresa mudou a forma com que pensa a liderança. A liderança tinha a ver com ideias, ser o exemplo e fazer a coisa certa. Hoje, se você fizer mais dinheiro para a empresa (e não for um assassino) então será promovido para uma posição de influência.
Quais são as três maneiras mais rápidas para se tornar um líder?
a) Passe a usar a linguagem do banco para persuadir os clientes a investir em ações e outros produtos de que nos estamos a tentar livrar porque não têm mais potencial de lucros;
b) “Cace Elefantes”. Em inglês: consiga os seus clientes – alguns deles sofisticados e outros não – para negociar qualquer coisa que traga o maior lucro para o Goldman. Chamem-me de antiquado, mas não gosto de vender aos meus clientes o produto errado,
c) Encontre-se sentado numa cadeira onde o seu trabalho é negociar qualquer produto ilíquido e sombrio com uma sigla de três letras.
Hoje, muitos desses líderes apresentam um quociente de 0% da cultura do Goldman Sachs. Eu presenciei reuniões para vendas de derivativos financeiros onde nem um único minuto foi gasto com questões sobre como poderíamos ajudar os nossos clientes. É tudo puramente sobre como podemos tirar-lhes o máximo de dinheiro. Se você fosse um alienígena de Marte e se sentasse numa dessas reuniões, acreditaria que o sucesso ou progresso do cliente não faz parte do processo de maneira nenhuma.
Deixa-me doente como essa gente fala sobre acabar com os seus clientes. Durante os últimos 12 meses, eu vi 5 diretores diferentes referirem-se aos seus próprios clientes como “muppets”, às vezes até por e-mails internos. Mesmo depois da SEC, do Fabuloso Fab, do Abacus, do Trabalho de Deus, Carl Levin e das Garras de Vampiros [referência ao regulador do mercado americano e depois aos escândalos e operações financeiras duvidosas que o banco já se envolveu]? Nenhuma humildade? Por favor. Integridade? Está desgastado. Eu não sei sobre comportamento ilegal, mas as pessoas vão empurrar produtos lucrativos e complicados para os clientes mesmo que existam investimentos mais simples ou mais alinhados com os objetivos dos clientes? Com certeza. Todo dia, na realidade.
Espanta-se como os diretores mais experientes levam tão pouco a sério uma verdade básica: se o seu cliente não confiar em si, ele vai eventualmente parar de fazer negócios consigo. Não importa quão esperto você é.
Atualmente, a pergunta mais comum que eu ouço dos jovens analistas sobre derivativos é: “Quanto dinheiro conseguimos fazer com este cliente?”. Incomodo-me cada vez que ouço isto porque é um claro reflexo do que eles observam dos líderes sobre a maneira como se devem comportar. Agora, imagine daqui a 10 anos: não é preciso ser um cientista para adivinhar que esse analista júnior, sentado no canto do escritório, ouvindo coisas como “muppets”, “arrancar os olhos da cara” e “receber o pagamento” não vai tornar-se, necessariamente, um cidadão modelo.
No meu primeiro ano como analista, não sabia onde ficavam os banheiros ou sequer como amarrar os cadarços. Fui ensinado a preocupar-me em aprender o funcionamento das coisas, descobrir o que é um derivativo, entender finanças, conhecer os clientes e o que os motivava, aprender a definir como eles teriam sucesso e o que eu poderia fazer para ajudá-los.
Os meus momentos de maior orgulho na vida – conseguir uma bolsa de estudos integral para sair da África do Sul para a universidade de Stanford, ser selecionado como finalista da Rhodes [bolsa de estudos para Oxford], ganhar uma medalha de bronze em ténis de mesa no Maccabiah Games em Israel, conhecido como as Olimpíadas Judaicas – tornaram-se muito menores momentos do que grandes conquistas. Isso simplesmente já não me parece mais certo.
Eu espero que isto sirva de alerta para a direção. Tornem o cliente o ponto central do negócio novamente. Sem clientes, não se faz dinheiro. Na verdade, não se existe. Parem de abusar de pessoas moralmente falidas, não importa quanto dinheiro eles tragam para a empresa. E recuperem a cultura corporativa novamente para que as pessoas queiram trabalhar aqui pelas razões corretas. As pessoas que se preocupam apenas em fazer dinheiro não vão sustentar esta empresa – ou a confiança dos clientes – por muito mais tempo".
Depois de ver publicada uma saraivada de críticas de Greg Smith, o executivo que causou furor ao pedir a demissão do banco e escrever a propósito no The New York Times, o Goldman Sachs resolver reagir em comunicado aos funcionários.
Lloyd Blankfein, presidente executivo do Goldman, e Gary Cohn, diretor de operações, disseram estar profundamente decepcionados com as afirmações feitas por Smith. "Elas não refletem os nossos valores, a nossa cultura e o que a vasta maioria dos funcionários do Goldman Sachs pensa sobre a firma e sobre o trabalho que realiza em nome dos seus clientes", assinaram.
Segundo o Goldman, 85% dos empregados do banco responderam à última pesquisa de clima na empresa. E 89% deles consideraram o serviço prestado aos clientes excepcional. Alfinetando o funcionário desertor, o comunicado reforçou ainda que a percentagem de satisfação foi igualmente alto entre os 12.000 executivos que ocupam hoje o mesmo cargo recém-abandonado por Smith.
Antes, um porta-voz não identificado do banco afirmara ao The Wall Street Journal que a posição do executivo era relativamente júnior e que Smith não chefiava nenhum funcionário além de si mesmo.
No polémico texto do NYT, Greg intitulou-se diretor executivo responsável pela área de derivativos na Europa, Médio Oriente e África.

2 comentários:

  1. Respostas
    1. Se não se põe a pau ainda é julgado como terrorista, mas comparado com o Wikileaks, o homem é um santo, ou evangélico...

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