O vice-presidente da Comissão Europeia, defende que o tempo dos sacrifícios em Portugal e na União Europeia acabou. É preciso, agora, promover a indústria e gerar emprego.
Antonio Tajani, vice-presidente da Comissão Europeia, aponta os elevados preços da energia, o difícil acesso ao financiamento e o excesso de burocracia como os 3 maiores problemas de competitividade da Europa. O também comissário para a Indústria e Empreendedorismo defendeu mais democracia na Europa. Para Tajani, o presidente da Comissão Europeia deve ser eleito pelos cidadãos e o Parlamento Europeu deve ter mais poderes.
Ana Rute Silva e Ana Brito
A forma como a União Bancária está a ser desenhada vai reflectir-se na capacidade de financiamento da economia?
O acesso ao financiamento é o maior problema da economia, em conjunto com a burocracia e os preços da energia. É importante trabalhar na União Bancária mas, ao mesmo tempo, é necessário trabalhar em regras mais flexíveis no acesso ao financiamento. A Comissão Europeia, o Conselho Europeu e o Parlamento Europeu aprovaram o SME - Supporting Factor - para introduzir regras mais flexíveis no acesso ao financiamento no âmbito de novo acordo de capital (Basileia III). Ao mesmo tempo, foi aprovada uma estratégia para a reindustrialização da Europa e, pela primeira vez, há dinheiro na mesa para a competitividade industrial.
Mas como é que se consegue a reindustrialização em países como a Grécia e Portugal?
Na Grécia e em Portugal é importante não fazer apenas um trabalho de sacrifício, mas pôr em prática a Europa da solidariedade. Por isso é que, em Dezembro, organizámos em Portugal uma missão empresarial e vamos fazer outra daqui a 2 meses. Estamos a trabalhar muito para defender a economia real e as PME e estamos a dar à Europa uma mensagem de confiança nestes países. Em breve, vamos fazer missões em regiões onde há muito desemprego jovem, nomeadamente em Espanha, Bélgica e Itália. Levar as empresas a estes locais é também pôr em prática a Europa da solidariedade, porque a Europa não é só sacrifícios.
Isso significa que, na sua opinião, o Governo português deve privilegiar o crescimento e não a austeridade?
A situação em Portugal é melhor do que há um ano. Os portugueses fizeram muitíssimos sacrifícios e tiro-lhes o chapéu. É importante agradecer muito esse esforço porque também é um trabalho a favor da Europa. Agora é importante trabalhar mais na solidariedade e a favor da economia real. Portugal fez um bom trabalho e o que agora me parece importante é que a Europa também possa ajudar Portugal permitindo uma maior utilização dos fundos europeus, destinados às empresas e à economia real. Desta vez não há apenas dinheiro para a agricultura, há para a indústria e para as PME. Utilizar bem esse dinheiro é importante para motivar mais jovens empreendedores e conseguir uma indústria mais moderna e competitiva.
Cavaco Silva disse esta semana que as exportações portuguesas deveriam estar mais focadas em sectores de alta tecnologia, mas há cada vez menos investimento na educação e ciência...
A educação e a formação são fundamentais. Portugal pode usar mais o dinheiro da Europa para, por exemplo, criar clusters, que juntem universidades, PME e grandes indústrias. Estou de acordo com o que diz Presidente da República. Nós só podemos competir em qualidade. Em Portugal há uma indústria aeroespacial de alto nível. O sector agroalimentar também é de elevada qualidade, tal como o turismo. A internacionalização é sempre uma alternativa para as empresas portuguesas, por exemplo, no sector hoteleiro. Portugal pode ser uma bandeira da qualidade da Europa no sector turístico e na gestão hoteleira. E também pode usar mais a língua portuguesa para ganhar presença exportadora através, por exemplo, de mercados como Angola e Moçambique.
Da forma como fala, parece que há muito financiamento e meios e não há impedimentos…
Nada é fácil, mas há possibilidades. Os portugueses são espertos, têm o presidente da Comissão Europeia… Mas vamos simplificar o acesso das empresas aos fundos e apresentar propostas legislativas que simplifiquem as regras de criação de empresas e de aprovação de patentes. Vamos também aligeirar os critérios para permitir que empresas com ordenados e pagamentos em atraso, em situações de insolvência ou envolvidas em processos judiciais possam ter uma segunda oportunidade.
A Europa já só atrai 20% do investimento directo estrangeiro. O que está a ser feito para travar este declínio?
Durante muitos anos, a Europa foi a rainha da finança e dos serviços. Há muita burocracia, problemas de acesso ao financiamento e não há um ambiente favorável para as empresas. Por isso estamos a mudar as regras para estimular o financiamento e o capital de risco. A União Bancária também é importante: como há mais circulação de dinheiro isso ajuda as empresas. Mas parece-me que o essencial para um norte-americano ou outro investidor estrangeiro é reduzir a burocracia. É um desastre. Tem de ser usada não para bloquear, mas para ajudar.
Se fosse industrial investia em que país?
A indústria não é igual em todos os Estados-membros. Em Portugal há sectores como o agroalimentar, o turismo, tecnologia. Na Alemanha, a indústria é diferente. O importante é ter uma estratégia e ter regras mais flexíveis para a estabilização do mercado interno. Apenas 13% das nossas PME têm negócios fora da União Europeia. É importante olhar para África, América do Sul…
Portugal tem uma vantagem nas relações com África.
Sim e é esse o futuro. África é o futuro. Precisamos de mais presença de países da União Europeia neste continente, tal como na América do Sul. Por isso organizo muitas missões empresariais nestas geografias para estimular a internacionalização.
As eleições europeias que se aproximam vão reflectir uma Europa cansada de austeridade?
É um grande erro exigir apenas sacrifícios. Não é uma estratégia para o crescimento. Por isso, precisamos de uma reindustrialização europeia, para gerar emprego. A solução contra os eurocépticos é ter estratégias a favor dos cidadãos, das pessoas. E menos sacrifícios.
Mas os eurocépticos estão a aumentar…
A minha ideia é ter um grande pacto para a industrialização, com decisões concretas a favor deste sector. Precisamos de reformas e novas ideias. Se queremos mais votos a favor de partidos europeus, precisamos de mais acções a favor da economia real.
Espera pouca adesão nas eleições de Maio?
Ainda falta muito até lá. Mas há muitas pessoas contra a Europa. É preciso transformar esta posição numa nova energia. Precisamos de uma nova Europa. Ficar onde estamos é um grande erro. Precisamos de reformas a nível institucional.
O que quer dizer com reformas institucionais?
Mais democracia. Ter o presidente da Comissão Europeia eleito pelos cidadãos, por exemplo. Mais poder ao Parlamento Europeu e ao Banco Central Europeu.
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